Juízes franceses e os nossos
Publicado no jornal Diário do Nordeste, em 23 de julho de 2001
Marcus Vinícius A. de Oliveira, Assessor Jurídico no Tribunal de Justiça, mestre em Direito
Aconteceu em Paris. A edição on line do jornal ‘‘Le Monde’’, no dia 19 de janeiro deste ano, noticiou que cerca de 700 magistrados, num universo de 6.700, mobilizaram-se numa passeata pelas ruas da capital francesa, chegando à famosa praça Vendôme, defronte ao Ministério da Justiça, onde se enfileiraram, com as suas togas, num muro simbólico. Tudo isso para protestar contra a falta de recursos destinados ao Judiciário e o excesso de processos em suas províncias.
Valéry Turcey, presidente da União Sindical dos Magistrados - sim, lá eles têm sindicatos para a judicatura - afirmou na ocasião que o Judiciário representa apenas 0,8% das despesas públicas francesas e, mais, que o Estado francês não quer pagar por sua justiça.
É de se imaginar, a propósito, se tal evento teria lugar no Brasil, onde nem todos os juízes despertaram consciência para o fato de que, tanto quanto outras carreiras públicas, são eles agentes do Estado e, como tais, merecedores de condições condignas de trabalho. Entenda-se por isso, dentre outras coisas, disponibilidade de artefatos materiais, número razoável de processos para julgar e remuneração à altura da relevância social de suas funções.
Porém, aqui o juiz é, via de regra, submetido a um volume estressante de trabalho, tem a sua disposição um aparelhamento - policial, sobretudo - incapaz de atingir na plenitude as metas desejáveis além de não encontrar, em seu próprio meio profissional, um organismo suficientemente forte que lhe faça voz para reivindicar tudo aquilo que achar necessário, inclusive no plano salarial.
Quero crer que o baixo nível de democratização interna do Judiciário está diretamente relacionado à frágil mobilização interna dos juízes, principalmente entre aqueles de primeira instância. Se no âmbito estritamente interno a organização é precária, que dizer da idéia de existir um sindicato, como na França.
É preciso ressalvar, contudo, que vêm nascendo sucessivas associações de magistrados de natureza explicitamente mais política, ao invés dos tradicionais objetivos culturais ou recreativos. Acredito que esse é o verdadeiro aceno para uma efetiva reforma da estrutura do Judiciário brasileiro. Talvez aí os nossos juízes fiquem um pouco mais parecidos com os colegas franceses e se vejam estimulados a invadir as ruas para exigir melhores condições de trabalho.
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