Marlúcia de Araújo Bezerra Pedrosa
Juíza da 17ª Vara Criminal de Fortaleza
Publicado no jornal O POVO, dia 24 de janeiro de 2003
Inquietantes notícias de supostas práticas delituosas por magistrados me incentivaram a externar opinião sobre o perfil dessas pessoas, cuja importância da função deixa-as sob permanente vigília da sociedade. Ouso afirmar que a crise que assola o Judiciário reside fundamentalmente na falta de vocação. Os vocacionados se adjetivam pela humildade e coragem, conscientes de sua dimensão humana, falível por natureza. Não é o juiz membro de uma casta privilegiada, senão alguém de quem se pode cobrar sacrifícios imensuráveis. Ao insuperável RUI se atribui a assertiva: o juiz deve se caracterizar, acima de tudo, pela honestidade. Rogando vênia ao grande baiano, não basta. Honesto sim, e corajoso. A omissão é, sem dúvida, imperdoável no crucial instante. O magistrado se destaca não só pela sua idoneidade moral e saber jurídico, mas pela coragem cívica, cuja fonte é o inarredável compromisso com a ética. O judicante ideal não ingressa na carreira atraído pelo salário, em busca de posição social ou vislumbrando nela oportunidade para beneficiar-se do cargo, contemplando familiares e áulicos. Vê na magistratura um ideal, sonhando com o engrandecimento da instituição e lutando sem tréguas pelo objetivo, mesmo sujeitando-se a retaliações, ao contrário de outros que se deixam escravizar na vaidade ou covardia. Míopes por conveniência e surdos por subserviência, ignoram a realidade, omitindo-se no movimento de moralização. A indiferença diante do caos que se estabeleceu em algumas áreas do Judiciário é inaceitável. Louve-se, por oportuno, a posição da Associação Cearense de Magistrados que, embora não tendo voto para influir no processo, levanta sua voz, firme e forte. Os obstinados, apesar dos pusilânimes, hão de vencer, lembrando: “Não procures tornar-te juiz se não fores bastante forte para destruir a iniqüidade”(ECLES. 7, 6 ).