O Direito Penal volta seus olhos para a proteção dos bens coletivos essenciais para a mantença da vida intergrupal. As leis, ponto máximo de um Estado Democrático de Direito, além de expressão da soberania popular, se manifesta como o liame que separa o lobo-do-homem do homem-bom-selvagem, ou seja, a concepção hobbesiana da rouseauniana.
Os instrumentos, com os quais o legislador penal se socorre para proteger bens jurídicos, são os tipos penais. A doutrina penal, ao longo de sua evolução, consagrou o conceito de crime como uma entidade analítica, composta por tipificação, antijuridicidade e culpabilidade.
O ordenamento jurídico brasileiro é patente quando se trata em punir criminosos. O perfil dos condenados, que se encontram cumprindo penas nas penitenciárias, demonstra a vergonha de nosso sistema punitivo. Mas essa situação não se deve atribuir ao Direito Penal. Esse ramo da ciência jurídica trabalha de maneira a estabelecer princípios e tipificar condutas que controlem e apazigúem a vida em sociedade. A administração estatal e nosso poder legiferante, a esses sim, pode-se atribuir o status quo de nosso sistema punitivo.
Atualmente, ocorre uma inversão de valores dentro do sistema penal. Os chamados “criminosos” foram criados por uma elite, detentora de influência política, que estereotipou a atual figura do “fora da lei”. Com isso, deve-se aceitar com restrições os fatos impostos como crime.
Os agentes políticos que detêm o múnus de criação das leis criaram e mantêm um paradigma dentro do qual se inserem os criminosos que ferem a sociedade e que devam ser temidos. Com a atenção da sociedade voltada para este parâmetro, a ação imoral e ímproba dos criadores de tal estigma sai intocada. Como forma de se apaziguar as mentes que se rebelam contra tal situação, criou-se a chamada lei de improbidade administrativa, ora tratada nas linhas acima. Porém, este diploma legal não trata os verdadeiros criminosos da maneira que merecem. Na verdade, perante a atual legislação, nem ao menos se pode atribuir o título de criminoso aos agentes administrativos. Isto porque a lei 8429/92 não trabalha com tipos penais, exceto um, mas apenas com sanções administrativas e civis.
Esse tratamento não é o adequado para a satisfação da justiça. Como salientado supra, o desvalor da ação de um criminoso de colarinho branco é superior ao do criminoso comum. Em conseqüência, a reprovabilidade de sua conduta deveria ser mais acentuada.
O conceito de crime deve ser entendido de maneira mais ampla, para que se possa satisfazer o senso de justiça imanente no coração humano. A concepção durkheimeana prega o conceito de crime num sentido mais amplo que o entendido pela doutrina penal. Toda conduta, ação ou omissão, que agrida os imperativos sociais e, conseqüentemente, a consciência coletiva, é encarada como criminosa. Nesse passo, pode-se buscar atrás do cenário criminoso estereotipado a verdadeira figura do criminoso de colarinho branco.
De lege ferenda, os representantes do povo, que exercem atribuições legislativas, devem voltar seus olhos para a macro-criminalidade, ou seja, as condutas antijurídicas que prejudicam em monta a vida e justiça social. Através de meios mais eficazes ao combate à criminalidade do colarinho branco, a criminalidade estigmatizada tende a se reduzir. E isto porque, na medida em que o patrimônio público for resguardado de práticas ilícitas, o Estado deverá voltar seus recursos financeiros em atenção ao bem comum, ou seja, investimentos em educação, moradia, trabalho, saúde e nos demais direitos sociais que nossa Constituição tanto se orgulha em defender. Destarte, no momento em que a justiça distributiva-social atingir seu ideal, a criminalidade diminui e, em decorrência disto, as aspirações sociais se saciarão com a dádiva da paz social.
|