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Textos_Juridicos-->A Justiça do trabalho no terceiro milênio -- 29/06/2002 - 21:08 (José Ronald Cavalcante Soares) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos



A Justiça do Trabalho no terceiro milênio
Ronald Soares*

Introdução

O quadro mundial neste início de terceiro milênio, infelizmente, não é nada animador. Apesar de todos os sofisticados desenvolvimentos tecnológicos, de tanto progresso, de tantos avanços culturais, milhões de pessoas em diferentes quadrantes da terra não têm o que comer: falta-lhes, além da comida, trabalho, educação, saúde, tudo. Enquanto isto, nas chamadas nações de primeiro mundo, a abastança é ostensiva, os alimentos excedentes apodrecem, a indiferença e a insensibilidade rimam com a desumanidade.
O dia 11 de setembro, por causa da divulgação massiva na mídia, tornou-se uma imagem viva e trágica deste milênio. O tombamento das duas torres gêmeas do World Trade Center, com a morte de milhares de pessoas entre os destroços e as chamas terríveis dos tanques de combustível ardendo, são as pontas de perigosos icebergs sociais que a brutalidade da globalização econômica colocou boiando no grande e proceloso oceano dos nossos dias.
A carnificina, o holocausto dos seres humanos que ali tiveram suas vidas ceifadas, é uma advertência dramática para os poderosos e insensíveis senhores do mundo, que julgam poder manipular com vidas humanas como quem brinca com bonecos.
A sofisticação tecnológica é geratriz de desempregos. Iniciada na indústria urbana, ela agora avança pela agricultura, com a invenção de máquinas capazes de substituir dezenas de homens.
Na indústria canavieira de São Paulo, ano passado, conheci uma máquina chamada pelos trabalhadores rurais de “aviso prévio”, porque, de uma só vez, quando é utilizada, substitui, se não me engano, duas dezenas de homens.
Este é apenas um pálido e isolado exemplo, mas a transformação da atividade agrícola está se processando numa velocidade jamais vista.
Jeremy Rifkin, no seu livro The end of work: the decline of the Global Labor Force and the Dawn of the Post-market Era, adverte: “A produção de alimentos através da cultura de tecidos eliminará milhões de empregos ao longo de toda a rede agrícola. Além de tornar a maioria dos agricultores redundantes – uma pequena percentagem deles será necessária para gerenciar as safras de biomassa - a produção de alimento por processo contínuo eliminará empregos nas indústrias auxiliares relacionadas ao setor agrícola, inclusive os fabricantes de implementos agrícolas e os de transportes de longa distância... Controlar genes no laboratório é menos trabalhoso do que controlar o clima, a terra e os trabalhadores num país de terceiro mundo”.1
O mundo do trabalho, portanto, sofre impactos nunca dantes imaginados, parecendo ruir na base de seus fundamentos.
O fenômeno é mundial. O salário encolhe, as oportunidades de emprego desaparecem e, principalmente nos países em desenvolvimento, milhares de pessoas ingressam diariamente na chamada economia informal, fugindo dos tributos, é bem verdade, porém perdendo todas as garantias que, ao menos em nosso país, se engastaram no mundo jurídico, inclusive, a nível constitucional.
Os arautos da competitividade dos nossos produtos apregoam a destruição de todos os entraves capazes de impedir as nossas exportações, tudo para reverenciar o mercado – senhor de todos os sonhos mais audazes dos centuriões deste novo mundo. A nossa legislação do trabalho não serve mais. Oferece muitas barreiras, dá direitos em demasia, encarecendo a mão de obra que, fatalmente, implicará no alto custo da produção e, por fim, no custo final do produto.
Mas, esqueceram - e o povo disso precisa saber – que o nosso salário já está corroído, debilitado, aviltado, podendo ser comparado com os dos países mais pobres e atrasados deste planeta.
Esqueceram, e o povo precisa saber, que a nossa legislação é tão flexibilizada, que é possível, neste país, demitir sem o mais mínimo motivo, isto é, torna-se viável aqui a denuncia vazia do contrato de emprego.
Esqueceram, e o povo precisa saber, que a CLT é muito bonita e muito recheada de regras protecionistas, que a Constituição possui um artigo elencando os direitos sociais dos empregados, porém, por faltar-lhes a garantia de permanência no emprego, todas aquelas regras só são buscadas quando o empregado sai do emprego, isto é, a Justiça do trabalho, nos nossos dias, na realidade, é a Justiça dos Desempregados.
Então, meu Deus, o que querem flexibilizar mais. Retirar do trabalhador toda e qualquer proteção, esvaziar os seus direitos por inteiro, deixar-lhes ao inteiro desabrigo.
A sede de modificações é tão violenta, que o Poder deseja ver realizado um sonho maravilhoso: flexibilizar o art. 7 da Constituição Federal, fazendo prevalecer o acordado sobre o legislado.
A face perversa desta sanha reside no fato constatado mundialmente do esvaziamento e enfraquecimento do poder dos sindicatos. Mas, em nome da liberdade, no slogan emblemático do liberalismo, “laisser fair, laisser passer”.
Inserida nessa paisagem espectral, dantesca e funérea, a Justiça do Trabalho no Brasil, já tão exaurida na sua importância, atravessa o portal do milênio desafiando poderosos desafetos e, ainda, desconhecida em sua essência da imensa maioria dos seus beneficiários.


O Terceiro Milênio e a Justiça do Trabalho



A Justiça do Trabalho, aos trancos e barrancos conseguiu ultrapassar a barreira do milênio, a despeito das procelas que teve de enfrentar e vencer, mormente, durante o ano de 1999, quando esteve ameaçada de extinção.
Houve, entretanto, um movimento de âmbito nacional no sentido de preservar a instituição, mas as ameaças persistem porque, na visão neoliberal do Estado, as negociações devem estar presentes e o acordado deve prevalecer sobre o legislado.
O abominável projeto do Executivo, na sua pertinaz e indormida batalha de destruir todo e qualquer empecilho no caminho das grandes empresas, apesar de ter tido adiada a sua votação, tem muitas chances de ser aprovado, sem qualquer consulta à Nação.
Mas, o povo ordeiro, pacato e sofrido do nosso país, poderá um dia sublevar-se, repudiar os representantes perjuros, virar a mesa e colocar no congresso representantes que realmente auscultem os seus anseios.
O ataque terrorista contra a Justiça do Trabalho, minando-a por todos os flancos, é feito agora de modo muito mais perverso e inteligente: são comissões de conciliação prévia, transcendências, flexibilização do art. 7o da Constituição...Tudo armado sem a participação dos operadores do direito, sem que os intelectuais e os juristas sejam ouvidos.
É bom que se esteja atento para o processo em marcha no sentido de implodir a Justiça do Trabalho e, junto com ela, toda a legislação protecionista que foi elaborada nos últimos sessenta anos.
A preocupação maior reside no fato inconteste que a nossa legislação, embora aparentemente rígida é, talvez, no mundo inteiro a mais flexível: aqui se permite a despedida imotivada, ou seja, o empregador tem o direito potestativo indiscutível de resilir. Não necessita justificar, o nome escolhido pela doutrina e vigente em nossa pátria para tal tipo de ruptura é despedida sem justa causa.
Então, vale dizer que todo o aparato contido na CLT, salvo inexpressivas exceções, funciona apenas para aqueles que já deixaram seus empregos porque, obviamente, sem que exista um sistema de proteção e de garantia de permanência no emprego, é uma aventura arriscada e quase sempre desastrosa buscar socorro da Justiça do Trabalho no curso do contrato de emprego.
Por tal razão, costuma-se dizer que a Justiça do Trabalho no nosso país adquiriu a fama de ser a Justiça dos desempregados.
No projeto de Reforma do Judiciário, cujo relator é o Senador Bernardo Cabral, coincidentemente o mesmo senador que relatou a Constituição de 1988 - temos muita confiança na força do seu trabalho - a competência da Justiça do Trabalho será grandemente ampliada, cuidando de danos morais imbricados com o contrato de emprego, disputas envolvendo os sindicatos, exame de questões de servidores públicos, entre tantos outros.
Tal ampliação, pelo menos por enquanto, é uma garantia de permanência da instituição. Além de tal garantia, temos que concordar com a idéia de que o poder político advindo de tal ampliação servirá para trazer maior prestígio para a instituição.
Não se concebe que num país onde existe uma justiça especializada em questões de trabalho, os servidores públicos tenham suas questões conhecidas, examinadas e julgadas por outro ramo da justiça federal.
Acreditamos, também, que seria de bom alvitre, dada a importância fundamental do tema nos dias que correm, a inserção das questões do direito ambiental relacionadas com as atividades dos trabalhadores deveriam integrar a competência da Justiça do Trabalho. Afinal, o direito ambiental, nesta fase da civilização em que o homem atingiu uma plena conscientização de que não pode predar inconseqüentemente a natureza ao derredor de si, se deseja realmente viver neste planeta por alguns milhares de anos ainda.
São inúmeros os desafios a serem enfrentados pela Justiça do Trabalho no cenário do mundo moderno. A pressa que preside todas as ações hodiernas cobra soluções rápidas. São as soluções rápidas que as grandes empresas almejam para que o fluxo dos seus negócios não sofra qualquer engasgo.
Então, a Justiça terá que se valer dos meios tecnológicos para agilizar a tramitação dos processos.
Mas, o Poder Legislativo, assessorado pelos juristas mais notáveis de nossa pátria, terá que modificar e aperfeiçoar a legislação, evitando os inúmeros recursos que ocasionam delongas infindáveis nos processos, dificultando a rápida resposta aos anseios dos jurisdicionados, provocando a perda de precioso tempo de todos os envolvidos e que, na realidade, poderia ser utilizado na concretização de outras atividades mais proveitosas.
Entendo, talvez na contra-mão do pensamento mais avançado, de que o Poder Normativo da Justiça do Trabalho deveria ser preservado, pelo menos por enquanto, já que o enfraquecimento dos sindicatos é uma contundente realidade e, também, porque o nosso trabalhador ainda não atingiu uma esfera de conscientização capaz de coloca-lo, comparando-se com o empregador, num nível que não seja tão desequilibrado.
Temos diante de nós um quadro cambiante e inconsistente: o emprego adquire conotações dantes jamais imaginadas: trabalho temporário, trabalho informal, trabalho em cooperativas, consórcios de empregadores.
É uma realidade diferente que a lei não pode ignorar. Mas, é preciso ter cautela para não cairmos na falácia daqueles que apregoam a derrocada do antigo em prol do surgimento de um quadro escorregadio no qual o direito conquistado pela classe obreira desapareça no sorvedouro.
Aos que gostam de estatísticas e se refestelam com dados relacionados ao custo benefício, temos que oferecer o seguinte: De acordo com levantamentos feitos por fontes fidedignas, cada vara do trabalho, em face da nova competência para cobrar os débitos da previdência social relacionados com as questões por ela julgadas ou conciliadas, arrecada, em média, R$ 100.000,00 (cem mil reais) e os seus gastos com pessoal atingem, em média, apenas R$ 45.000,00 (quarenta mil reais). Quer dizer, as varas do trabalho justificam-se, também, em termos financeiros.
A Justiça do Trabalho – e os magistrados que a integram – irão palmilhar novos caminhos nestas primeiras décadas do novo milênio, buscando uma rota segura para que o direito do trabalho, que se renova a cada dia, leve os descamisados, os excluídos, os deserdados ao abrigo do porto seguro da Justiça, dentro de uma sociedade muito mais solidária e mais humana.

* Ronald Soares é Juiz do Trabalho do TRT da 7a Região, Fortaleza.
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