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Textos_Juridicos-->A liberdade constitucional envenenada pela religião -- 13/05/2002 - 10:21 (Douglas Lara) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O podre biombo da liberdade

Sunda Hufufuur*
A inutilidade sábia desta coluna é para lhe servir.

(Mais artigos do Mestre Sunda podem ser encontrados no endereço: http://www.hufufuur.com)

Do alto do Transimalaia, o Mestre Sunda Hufufuur anteviu uma aurora negra, um odor sufocante..Logo constatou que tudo aquilo se devia aos miasmas do fanatismo, o fundamentalismo religioso brasileiro, perigando sufocar a liberdade.

Conta-se que em seu leito de morte Voltaire recebeu no aposento um padre que viera encomendar a sua alma. Como jamais negara a fé, mas somente se insurgira contra o fanatismo religioso, assentiu passivamente. Eis que o padre comunica que lhe dará a extra-unção conquanto concorde em assinar um documento renegando tudo o que dissera contra a Igreja e o fanatismo em toda sua vida. De pronto o grande Leão da liberdade recobrou seu espírito retorquindo: "em nome de quem fala vc.?", ao que respondeu o clérigo: "em nome de Deus". Retorna Voltaire com sua eloqüência habitual: "em nome de Deus? Apresente pois as suas credenciais!"

O episódio continua atual, seguem vivas as falanges religiosas, com os autodenominados "Homens da Fé" a vicejar na incultura, germinando o fanatismo entre o seu séqüito, e sempre, sempre, falando em nome de Deus.

Não foi gratuitamente que nas décadas passadas, quando tornou-se ostensivo o advento do fundamentalismo islâmico, os clássicos muros de Paris voltaram a "falar" e neles se pôde ler: "clamemos a Voltaire!"

O fundamentalismo, como radicalização literal de princípios que leva à segregação de tudo o que não lhe é acorde, restringindo no seu estreito universo dogmático o pensamento e enfatizando a obediência absoluta dos fiéis, é uma possibilidade para todas as religiões.; na maior parte das vezes surge como fruto da deformação interpretativa ou interessada. Atualmente, no Brasil, muitos movimentos religiosos poderiam, assim, ser capitulados como fundamentalistas.

Pensando nesse fundamentalismo brasileiro recordo da cena do filme "O Grande Ditador", anterior à 2ª guerra mundial, na qual Chaplin imita um discurso colérico de Hitler, com gestos e expressões de indisfarçável raiva até que ao final, paradoxalmente, uma voz de locutor declara: "o Ditador acaba de falar que para o mundo só existe paz no seu coração". O mundo logo veria o quão catastrófico seria o resultado da contradição detectada por Chaplin. Pois bem, quando assistirmos a pregações religiosas nas quais nos vemos diante de prédicas de tônica medieval, com predominância de maniqueísmo pueril onde se promove a demonização da diferença e se estigmatiza como "diabólica" a religião vizinha, qual a razão que devemos ter para acreditar que os seguidores dessas religiões, uma vez ocupando o Poder Público, terão respeito pela liberdade e tolerância? Por que crer que de uma hora para outra seriam tão diferentes do que seus cultos perfilam ao ocupar o Poder Público? Acreditar que intimamente respeitam a liberdade de divergência seria o mesmo contra-senso de crer numa paz hitleriana!

Sinto portanto que o atual comedimento dos fundamentalistas de certos movimentos religiosos brasileiros é simples disfarce de quem ainda é "obrigado a tolerar a tolerância", até o dia em que tiverem, como é seu sonho, a força de impor um poder constituinte originário, através do qual volatizar-se-iam as cláusulas pétreas que asseguram a liberdade, ou seja, os mesmos direitos constitucionais que permitem a existência dos fundamentalistas ao garantir a liberdade de culto e expressão, seriam por eles eliminados.

Encontramo-nos aqui às voltas com um dos supremos desafios da democracia: conviver com manifestações potencial ou efetivamente antidemocráticas. Administrar os limites entre a exploração da credulidade popular e liberdade de culto, permitir a reivindicação de exclusividade da verdade comum a toda religião impedindo entretanto o discurso da intolerância, evitar a mercancia da Fé sem ferir o direito de propriedade (dentro do qual se encontra a livre disposição de bens para a doação), são problemas dos mais espinhosos.

O fundamentalismo se vale portanto de direitos fundamentais como biombo, o que chamo de BIOMBO PODRE DA LIBERDADE. Dia virá em que será solucionado o dilema através de uma norma legal que iniba os abusos sem no entanto arruinar os mais caros princípios constitucionais.

Dispensar às organizações religiosas a mesma disciplina jurídica das Fundações, com fiscalização de seu patrimônio pelo MP, impedir qualquer atividade lucrativa associada às mesmas que não seja estritamente relacionada à expansão e manutenção de suas sedes, Igrejas, Templos, etc., estabelecendo assim uma "curadoria de religiões", tipificar penalmente a incitação ao desprezo por outras religiões no ensejo de sua reivindicação de exclusividade da verdade ou por qualquer outro motivo, já seria um bom começo no intuito de impedir as psicoses religiosas.

O nosso fundamentalismo prospera com as garras da ameaça, não sendo de todo infactível, caso não abramos os olhos, que um dia venham a nos confiar "a palavra de Deus" como verdadeiro garrote! O Estado laico é uma vitória da liberdade na medida em que não arbitra a verdade subjetiva, por natureza intangível.

Finalizando, a sentinela da minha desconfiança fica em alerta quando vejo aqueles que em nome de Deus querem avalizar eleitoreiramente sua própria idoneidade pelo simples fato da sua religiosidade.; discernir quem entre os mesmos não passa de pantomimo da crendice e demagogo da Fé é lídimo exercício de cidadania.

Revista Consultor Jurídico, 13 de maio de 2002.
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Sunda Hufufuur Mestre em Direito Transcendental, autor da tese denominada "Entre a loucura e a Justiça fica o jurídico", vive no alto do Transimalaia entre o recôncavo da imanência e as espirais astrais do transetérico.
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