Fichamento de Sociologia 08/11/2002
Magno Inácio Rodrigues
Direito “A” Noturno
Prof. Artur
FAPE
Crime, Justiça Penal e Desigualdade Jurídica.
Sergio Adorno
CRIME, JUSTIÇA PENAL E DESIGUALDADE JURIDICA.Autor.: André – Sergio AdornoAluno Magno Inácio RodriguesProf.: ArturCurso de Direito Noturno “a” Segundo Termo
Pág. 311 ... objetivo problematizar um dos axiomas fundamentais de nossa modernidade: aquele que estabelece uma correlação inexorável e necessária entre justiça social e igualdade jurídica. É legado do pensamento político clássico o principio da igualdade de todos perante as leis... todos os cidadãos devem estar submetidos à mesma lei, independentemente de suas diferenças de classe, gênero, etnia, procedência regional, convicção religiosa ou política.; ...
Pág. 312 ... entre fins do século XIX... Nas sociedades modernas onde essa experiência não se verificou ou não se consolidou, o principio da igualdade jurídica, ainda que reconhecido, permaneceu não raro contido em sua expressão simbólica. Em situações como esta, a distribuição da justiça acaba alcançando alguns cidadãos em detrimento de outros, o acesso da população aos serviços judiciais é dificultado por razões de diversas ordens e, muito dificilmente, as decisões judiciárias deixam de ser discriminatórias.
Pág. 313 ... observou-se que o desfecho processual resultava da conexão de duas ordens de motivação da conduta institucional: por um lado, motivações de ordem burocrática, presas aos códigos e aos procedimentos formais e que se atinham às posições previamente demarcadas de vitimas, agressores ou acusadores. Sob essa ótica, o objeto do ilícito gravitava em torno do crime, das informações processuais, dos documentos anexados aos autos, do estrito cumprimento dos dispositivos legais.... os embates do tribunal concentravam-se menos na proteção da vida enquanto um dos valores capitais de nossa cultura ocidental porem gravitavam em torno dos dilemas entre moralidade privada e moralidade publica, cujo desfecho podia convergir arbitrariamente para condenação ou absolvição.
Pág. 314 ... busca-se dar continuidade a essa reflexão. Retomando os dados dessa pesquisa, cogita-se explorar o sentido e alcance desta injustiça. Trata-se de explorar as relações entre justiça, igualdade jurídica e juízo, mediante exame das sentenças condenatórias ou absolutórias decretadas naqueles processos penais anteriormente observados. ... as conclusões sugerem arbitrariedade na distribuição das sentenças, identificam grupos preferencialmente discriminados e apontam algumas evidencias de desigualdade no acesso à justiça penal.
Pág. 315 BANALIDADE DA VIOLENCIA COTIDIANA... A violência não é estranha e se quer estrangeira. O risco esta em todos os cantos: nas vias publicas, dentro das casas, nos ambientes de comercio e lazer, nos transportes, nos locais de trabalho. Não escolhe hora ou momento do dia. Todo espaço e todo tempo estão empregados de perigo, sentimento que se intensifica quando a violência envolve mortes, algumas das quais precedidas de ameaças e cometidas com requintes de brutalidade.... Quando se comparam as representações coletivas sobre a criminalidade violenta com os fatos cotidianos, vê-se que a distancia que separa ambas as dimensões da realidade social é cada vez menor. Aa vida imita a arte e vice-versa.
Pág. 316 ... à medida que o Brasil se torna rota necessária n trafico internacional e aceita participar da luta contra essa modalidade de organização delinqüente, acirram-se as disputas pelo controle da distribuição da droga. Trata-se de uma guerra que se espraiou rapidamente entre as classes populares...
Pág. 317 ... A maior parte das vitimas era do sexo masculino, concentrados na faixa etária de 15-17 anos. Em sua maioria negros. Haviam sido assassinados mediante emprego de arma de fogo, circunstancia indicativa da intencionalidade na consumação da morte.A Policia Militar também tem sua parcela de responsabilidade no crescimento das mortes violentas. ...vem recebendo o controle da criminalidade como uma espécie de guerra civil entre autoridades e bandidos.
Pág. 318 ... Os bares parecem ser espaço privilegiado entre os homens se confrontarem. Um olhar atravessado, um desafio lançado, uma opinião mal acolhida, tudo serve de pretexto para o desencadeamento de uma luta, como de fato ocorre, convergir para um homicídio... Nos lares o desfecha se da como ponto culminante de tensões que vem desencadeando dia-a-dia... Nas ruas as mortes acontecem por terem sido premeditada em outros espaços de realização social.
Pág. 319 QUE DIZEM OS AUTOS... Não raro os debates judiciais permitem flagrar microcenas de confronto entre manipuladores técnicos. Detrás de rebuscados elogios – “douta promotoria”, “empenhado defensor”, "sapientíssimo juiz” – esses debates tendem a delimitar fronteiras, seu domínio de saber e poder. Tudo caminha no sentido de produção da verdade jurídica, que compreende também a atribuição de responsabilidade penal aos possíveis autores de infrações quanto à construção de sujeitos enquanto entidades morais... a disputa processa-se em outro terreno. Nele, outros são os fatores que concorrem para a absolvição ou condenação dos réus.
Pág. 320 ... Não menos importante é o desempenho do corpo de jurados. Encarregados da soberana tarefa de julgar podem olhar os fatos a partir de cima e avaliar o maior ou menor ajustamento dos personagens a modelos de comportamento considerado legítimos e naturais, como sejam o de pai provedor do lar, boa esposa, filho prodígio, vizinho solidário. É desse maior ou menor ajustamento que parecem extrair as razões para condenar ou absolver.... Não é apenas o crime ou a pessoa do réu que constitui matéria privilegiada dos tribunais, mas, sobretudo a violência que eles representam e que se faz presente na vida de todos, inclusive testemunhas e jurados, geralmente habitantes da mesma região onde os fatos se desenrolam e onde vítimas e agressores circulam e vivem. É dessa complexidade do real e de suas formas de controle social que cuidam os autos.....mesclar-se com a interpretação racial dos códigos... três dessas teorias a dos três pés, a do MIB e a da nordestinidade. Pela primeira, réus são preferencialmente recrutados entre pobres, pretos, e prostitutas. Pela segunda, o que leva as pessoas a delinqüir são as misérias, a ignorância e bebida. Pela terceira, os réus e vitimas são infelizes migrantes nordestinos, que não conseguem se adaptar aos padrões civilizados da metrópole.
Pág. 321 ... não há quaisquer evidencias de que... a policia tenha abandonado os métodos violentos de repressão à criminalidade. ... não há igualmente sinais de tratamento dispensado aos presos.
Pág. 322 ... Compreendem não apenas desfechos violentos nas relações intersubjetivas cotidianas, como também desfechos nas relações entre delinqüentes procedentes de quadrilhas ou gangues adversárias... a maior parte das denuncias enquadra os réus pela pratica de homicídio qualificado ou tentativa de homicídio qualificado.
Pág. 323 Ao corpo de jurados cabe decidir pela condenação ou absolvição, sentença irrecorrigivel – “a decisão do júri é soberana” – amenos constatada a irregularidades processuais, fato que pode anular o processo em ensejar nova ação penal.Entre os réus, a maior parte acusou a existência de antecedentes criminais embora essa situação não caracterize necessariamente a condição de reincidente criminal. Raramente se requisitam antecedentes das vitimas a menos que se suspeite de seu envolvimento com a criminalidade. ... O experiente advogado construiu toda a estratégia de defesa no sentido de polui a imagem da vitima e enaltecer a imagem do agressor, qualificando-o como trabalhador, honesto, respeitador das leis e vitimas de provocações constantes por parte de um mal cidadão. ... No desfecho processual, o réu acabou absolvido.
Pág. 324 A manipulação e extrapolação dos fatos é, sobretudo saliente na fala das testemunhas. As testemunhas comparecem ao processo convocadas por manipuladores técnicos. Seu perfil social não difere do perfil social de vitimas e agressores. A rigor, todas são testemunhas de acusação ou de defesa por força da origem da convocação.
Pág. 325 Seja o que for, os depoimentos testemunhais abre espaço para a ingerência “normativa” dos agentes da lei na vida cotidiana dos protagonistas. Uma “vontade de saber” insinua-se por todos os labirintos da existência pessoal. Diluem-se as fronteiras entre a intimidade e a privacidade. Quando a matéria cuidado no tribunal do júri se atem aos crimes passionais, os protagonistas são domo que intimados a expor publicamente seus relacionamentos, preferências e práticas sexuais.Função não menos delicada é confiada ao corpo de jurados, constituído segundo procedimentos estatutários, fixos e precisos. Anualmente, o tribunal organiza uma lista de candidatos inscritos para a função de jurados. Assim, por exemplo, no julgamento de crimes passionais a maior ou menor presença de um dos sexos entre os jurados pode suscitar certa identificação com a figura do réu ou da vítima, resultando em desfecho condenatório ou absolutório sem consideração efetiva para com o crime cometido.
Pág. 326 ... De igual modo, o comportamento do magistrado não se nutre de total neutralidade. Nas sessões do tribunal abertas ao publico, seu pronunciamento, retórico, carregado de fortes conotações morais e decisivamente cativo de crenças e convicções pessoais, constitui uma fala de autoridade.... Como se sabe, a existência de antecedentes é agravante que pressiona a decisão judiciária no sentido da condenação.... Conforme se pode constatar, há maior incidência de advogados dativos do que advogados constituídos. ... Os altos custos dos processos penais, o desconhecimento por parte dos cidadãos procedentes das classes populares quanto a seus efetivos direitos, a hesitação em se apresentar diante dos tribunais motivada por desconfiança ou resignação diante de um destino que se apresenta como inevitável acabam promovendo a discriminação ao acesso a justiça (Souza Santos, 1986). Como demonstrou outro experiente pesquisador (Lopes, 1989), a problemática do acesso das classes populares à justiça “não se resolve apenas com a ampliação física dos serviços de justiça, mas exige, progressivamente, alterações no modo de encarar a função judiciária e o próprio direito”.
Pág. 327 Mais significado ainda foi verificar maior incidência de sentenças condenatórias em processos nos quais atuam advogados dativos do que em processos onde atuam advogados constituídos.
Pág. 328 Ao contrário, a maioria dos advogados constituídos elabora defesa reportando-se às testemunhas, apoiando-se na jurisprudência, que é pesquisada, bem como buscando explorar ao máximo as potencialidades oferecidas pelas provas documentais, orais e oculares. Percebe-se, com alguma clareza, a figura do “advogado de porta de cadeia”, experiente, ardiloso, que orienta o depoimento do réu e das testemunhas de defesa, aproveita-se das lacunas da legislação penal para obter a absolvição ou a atenção da pena.CONTROLE SOCIAL E IGUALDADE JURIDICAEm perspectiva teórica distinta, inúmeros estudos americanos já haviam demonstrado o quanto preconceitos sociais e culturais, em particular o racismo, comprometiam a neutralidade dos julgamentos e a universidade na aplicação das leis penais. ... A superpenalização dos negros resultava de um processo mais complexo que tinha inicio na policia, cujas estratégias de vigilância, ao privilegiar o comportamento de cidadãos negros, redundam em taxas de encarceramento muito superiores aos demais grupos, circunstancia que influía decisivamente na distribuição de sentenças condenatórias.
Pág. 329 ... Quando a distribuição das sentenças é visualizada segundo os grupos étnicos, o preconceito e o racismo ressaltam. Embora, à primeira vista, brancos e negros sejam condenados em igual proporção, é preciso considerar a participação relativa de cada uma das etnias na composição demográfica da população urbana...... Durante o desenrolar do processo penal, a cor do réu converge para uma espécie de ponto médio. Em determinados casos, negros clareiam e se tornam pardos.; em outros casos brancos escurecem e se tornam, eles também pardos.
Pág. 330 ... Quanto à procedência regional, a maior parte dos réus condenados provem do estado de São Paulo... Confirma a suspeita de que intensas correntes migratórias procedentes do Nordeste respondem pelo crescimento da violência criminal urbana.
Pág. 331 Finalmente quanto ás ocupações, a maior incidência de condenações recai sobre réus ocupados em atividades ”mal definidas”, seguidas dos trabalhadores da industria, do comércio e dos serviços. ... Ao que parece no imaginário de manipuladores técnicos e jurados, imunidades somente se aplicam aos réus que comprovem “ocupação digna”, isto é atividade sistemática, metódica, regulamentada pelo contrato formal de trabalho.Conforme sustentava Foucault em pagina anterior, é evidente que a justiça penal não foi concebida para neutralizar as diferenças de classes.
Pág. 332 ... Se o crime não é privilegio de classe, a punição parece se-lo. Longe do que sonhavam, no final do século XVIII e ao longo do século XIX, dispensada a quem quer que seja permaneceu apologia do discurso jurídico-político liberal.“Não, se entende por igualdade uma igualdade de fato (...).; sim, se trata de reduzir as desigualdades julgadas ’anormais’, isto, é, que excedem certos limites ou certos liminares, eles próprios variáveis. (...) A norma é uma tentativa de reconciliar o fato e o direito. A articulação do direito com a norma deve permitir uma jurisdicização do fato: fazer valer o fato, em particular o fato das desigualdades”. ... Daí que os debates em torno da racionalização da justiça, que apelam para códigos cada vez mais aperfeiçoados e modernizados, para quadros administrativos melhor preparados, para instrumentos de gestão capazes de conferir maior celebridade aos procedimentos formais, pouco contribuam para facilitar o acesso das classes populares à justiça ou para assegurar tratamento jurídico imaginário.
Pág. 333 ... Tudo releva de outra origem: a de uma justiça penal incapaz de traduzir diferâ…Ð9¤POST http://wmsao2.terra.com.br/mibtvterra?URL=51202022223114R16079 HTTP/1.0
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