Uma das maiores garantias para a segurança nas relações jurídicas, no ambiente democrático, reside na independência dos juízes. O magistrado tem que exercer a função livre de influências, imune a qualquer tipo de pressão, constrangimento ou violência, sejam de que natureza forem, sob pena de se verem fragilizados os princípios constitucionais vinculados ao exercício do poder e da jurisdição.
O ingresso na magistratura pressupõe uma rigorosa seleção para avaliar componentes da personalidade, habilidades, aptidões e conhecimento politécnico do candidato. Além disso, um estágio probatório de dois anos ao final do qual devem ser dispensados os candidatos cujas características não correspondam àquelas do cargo, de modo a manter apenas os capacitados e vocacionados.
Dirimir conflitos e pacificar o meio social é primordialmente missão e honraria dos juízes que, quando conscientes, acreditam que o interesse pessoal e o coletivo se identificam. Por oferecerem uma contribuição maior ao conjunto da sociedade, os juízes devem ser remunerados generosamente, não por privilégio, mas pela natureza do seu árduo trabalho pela coletividade, em que julga atos e direitos dos semelhantes.
No entanto, o cotidiano tem revelado quão imperfeito tornou-se o critério de merecimento nas promoções de juízes. Os Tribunais do País, em regra, inobservam os reais méritos dos magistrados para promovê-los porque não há como determinar, objetivamente, os elementos delineadores de tal encômio, com a isenção digna dos “justos”. Muitas são as variáveis e poucas têm caráter objetivo, o que torna referida forma de escolha ensejadora de atos das influências negativas, gerando até casos de tráfico de influências. A experiência revela a impossibilidade constatar a qualidade do trabalho dos juízes, pela produtividade nas atividades exercidas, uma vez que a subjetividade é a tônica do livre convencimento do judicante na atividade de dirimir os conflitos.
Pouco adianta o exame de títulos ou da produtividade dos juízes dado o subjetivismo presente nas votações dos Tribunais. A ausência de objetividade no processo de escolha tem provocado manobras políticas irrecomendáveis. Relações estreitas - que não quero aqui definir como promíscuas - entre candidatos à vaga e os desembargadores votantes, usualmente definem o rumo das votações.
A constatação é de que se instalou a desigualdade entre pessoas que exercem a mesma atividade e fornecem a mesma contribuição à atividade jurisdicional suas capacidades.
Diante de tudo isto, apresentamos proposta de substituir o critério de merecimento por sorteio, nas promoções de entrância e para o acesso aos tribunais – observada a exigência de que seja entre os juízes do primeiro quinto.
O sorteio, critério proposto, se aproximará mais do essencial: que o juiz adquira a firme certeza de encarreiramento e progresso funcional sem protecionismos e apadrinhamentos, e, destarte, possa julgar com independência e foco nos objetivos fundamentais elencados no art. 3.º da Constituição Federal. Isto já ocorre com o critério da antigüidade - elogiado por muitos e pouco criticado.
O sorteio dará objetividade ao processo de escolha evitando que juízes vejam-se obrigados à famigerada “via crucis” de pedir votos aos Desembargadores. Há exemplos de Magistrados honrados, probos, de notável saber jurídico e que somente atingem o desembargo quando estão prestes à aposentadoria compulsória por não terem caído nas graças dos tribunais, e outros saem precocemente. E há juízes com expressiva crise de auto-estima, com desmotivação perceptível.
O critério de merecimento veio para desnivelar as oportunidades! E aqui cabe uma pergunta: e as juízas, por que somente chegam ao Tribunal de Justiça do Ceará por antigüidade? É induvidoso que elas também se destacam pela inteligência e pela sensibilidade no trato dos assuntos afetos à jurisdição. O problema é grave e interessa a todos. Um juiz sem independência não julga conforme sua consciência, mas sob as regras de conveniências desprezíveis e abominadas por quem tem a noção do que representa a judicatura. A coragem de decidir com liberdade é pressuposto para a carreira de magistrado – e esta última incompatível com a subserviência.
Sobre as críticas ao critério de sorteio, convém lembrar que o método já vem sendo utilizado pelos tribunais na escolha de juízes quando necessária a convocação para substituição interina de desembargadores, na forma do art. 118 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional. É legal e usual em todo o País.
Não haverá Judiciário reconhecido pela sociedade sem que seus membros gozem de independência. O sorteio decretará o fim da desmedida lisonja.