O casal estava num ponto de ônibus, sete da noite, São Paulo. Cheio de gente se apertando naquele curralzinho feito de acrílico com telhado de zinco. A chuva, paulistana como ela só, batia de todos os lados. Eu me encolhi no canto menos molhado e, na minha frente, duros e afastados, ele e ela. Deviam ser namorados, pela troca que estava acontecendo entre eles. O que eles diziam era dito sem um sequer olhar para o outro, com exceção do homem que, às vezes, girava o pescoço e a fitava. Mas logo voltava para o lugar onde estava, olhando para a frente, para o nada. Aqui vou reproduzir o diálogo que consegui escutar:
Ela: É bom mesmo.
Ele: É bom o quê?
Ela: ... que você não me telefone mais. ... que a gente não se veja mais.
Ele: E por quê?
Ela: Esta resposta você tem.
Ele: Não tenho resposta alguma. Me diga por quê pra eu entender.
Ela: Já disse. Você sabe.
Ele: Não sei po... coisa nenhuma. Como vou saber? Vou adivinhar? O que houve?
Ela: Enjoei. Tá bom assim? Enjoei. Chega. Não dá mais.
Ele: Não dá mais o quê? Você sabia desde o começo que não posso me casar com você. Não é novidade nenhuma. É isto?
Ela: Pode ser. Mas não. Quem disse que eu queria casar com você? Não é isso. E não me pergunte mais.
----- O caramanchão - se se pode chamar assim o curralzinho do ponto do ônibus - já se esvaziava. Pouco a pouco ficamos só eu, completamente fascinada pelo casal e o próprio - e eles nem se davam conta da minha presença.
De repente, aparece um ônibus e pára no ponto. Ela dá um salto, vai em direção à porta de entrada. Ele grita:
- Espere! este não é o seu ônibus! Eu não posso viver sem você!
Ainda houve tempo de ela se voltar para ele e dizer:
- Eu sei. --- E subiu, e sumiu.
Ele ficou consternado, embaixo da chuva, o ônibus partiu. Olhei para o rosto do homem. Estava molhado. Não sei se de lágrimas ou da água da chuva paulistana.
Olhando para ele, me enterneci. E o meu rosto ficou molhado. E não era da chuva, pois fiquei embaixo do caramanchão.