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Contos-->Os melhores anos de nossas vidas -- 26/12/2003 - 03:57 (Paulo Milhomens) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Os melhores anos de nossas vidas...



Não foi a aula hoje? – perguntou isso numa secura quase profética. Não, estava um pouco ocupado com o trabalho. Nunca tinha tempo de responder mais ativamente, sua boca, quase sempre estava anestesiada Por uma morbidez estranha. Clara era assim. Era forte, mas tão frágil e doce. “Como eu gostaria de pecar”... Mas isso ela não fará. Não existe alternativa para sua insegurança. Ela é como eu: uma imensidão de sonhos distantes, alguns já realizados, outros, bastante esperados. “Paulo, nós não podemos esperar não é ?” Clara sabe que é difícil para nós, amigos de muito tempo, guerreiros de vidas passadas. Mas o fato é que ela vai embora, e talvez não nos vejamos nunca mais! Não gosto de despedidas, é como se um pedaço de mim também fosse... Estive com o Lindomar, ele foi embora. Disse que iria trabalhar numa empresa de vendas, a Prodac. Estava terminando um trabalho de faculdade ( por injúrias do destino não foi entregue ) quando ele entrou na biblioteca. “Fala garoto!” Enquanto me contava o que tinha acontecido, eu pensava na faculdade, depois que a merda do projeto de teatro começou, não tive mais tempo para nada. “Pois é cara, parto as duas”. Vá com Deus...

- Paulo? Você está bem?
- O quê? Sim, claro! Só estava aqui pensando um pouco.
- Pensando em quê ?
- Na vida.
- Não é todo mundo que pensa na vida desse jeito, você estava no mundo da lua.
- Se bem que faz um tempinho que não olho para ela. Está lá, sempre tão linda, e nós nessa mesquinhez aqui em baixo.
- Por favor Paulo, não venha com esse papo de “sistema desgraçante” de novo. Você não precisa sentir as dores do mundo sozinho...
- Mudando de assunto, estou mandando textos para uma jornalista de São Paulo publicar em seu jornal local. Chama-se Isis Brum.
- Tá namorando pela internet, não é? Logo você que vivia criticando isso.
- Não estou namorando pela internet, só trocamos uns e-mails bem consistentes, aliás, nem eu sei o que é namorar pela internet.
- Tudo bem, você brinca maravilhosamente bem com sua cabeçinha. É uma pena eu não existir não é Paulo?
- Como assim?
- Você pode me ter... Eu não existo pra você, só isso !
- Não diga isso Clara, que bobagem !
- Bobagem? Eu sou apenas uma personagem fictícia dos seus contos de merda ! Ao invés de Clara, poderia ser Rosa, Carla...
- Ou Pâmela !? Não, ficaria muito desconfortável. Vou tomar um copo de água, depois eu volto.
- Vá se danar !
- Tudo bem. ( sai Carla )

Eu volto. Carla não está mais aqui. Ela cançou-se de mim. E eu dela. Como ela pensou: nada é o que parece ser. Nossas vidas são muros, a maioria está numa grande prisão sem se dar conta disso. O mundo é maravilhoso, mas terrivelmente traiçoeiro. Já houve dias que eu tive medo de levantar do quarto, atravessar a porta. Televisão nem pensar. Livros, um refúgio. Até quando vais ser assim. As coisas estão dando certo e eu deveria estar feliz, mas não. Estou um pouco irritado, está uma tarde de sol muito quente. Isso é uma reflexão muito doentia. Há pânico nas ruas de Palmas, o Calazar – a doença dos cães e gatos – e a Dengue estão acabando com a consciência das pessoas. O surto da música ruim também é um problema sério. A monocultura musical deste lugar é absurda. O processo de assimilação comportamental da região é bizarro, imbuído de falso otimismo e negligente com seu caráter ético. Se bem que essa discussão está num campo bastante conjectural. Carla dizia que matrimônio civil é tarefa dos seres pós-quarenta ou trinta. Os shows musicais de conotação pré-eleitoral já começaram por aqui. O Tocantins é uma província de caboclos querendo ser ingleses, uma massa de manobra bem resolvida. O batuque que parece ser verdadeiro é medíocre. Só que Carla defende a teoria de Descartes ao contrário: “Não penso, logo não existo”. Pode ser que em determinados momentos da vida a inoperância de um cidadão seja um bom motivo ( justificativa ) para não existir. Eu poderia até escrever um conto para a Isis falando sobre isso, seria um assunto interessante. “ As nuances do psiqué-existencial”, bom título, soa bem. Mas é possível escrever sem uma linha – ou melhor, sem a forma que um texto pede – especificamente planejada? As pessoas estão sempre inovando. Carla me ensinou muita coisa, uma razão para não deixar a mente relaxar. Minha mente não pára. Volta e meia um enorme formigueiro cinzento paira nos meus pés. As formigas são tão grandes e fortes que me derrubam, me sacodem no chão. Outro dia, uma criatura alada desceu do céu par tomar uma cerveja e avisar que por lá as coisas vão mal. Tem piranha no Pirarucu, o Brasil está calmo, calmo, quase dormindo... Volta a abrir as pálpebras, relaxa novamente. Já pensei em aplicar-lhe um sonífero eterno, aí tudo estaria terminado. Mas não haveria mais graça...

Definitivamente não quero falar de pessoas que não existem. Quero pensar com seres pensantes, vivos, indeléveis. Magistrais como ninguém sabe ser, causticantes e cosmopolitas. Esse é um ideal. Carla sempre me falou de pessoas que estão no mundo mas não sabem quem são. O escritor nigeriano Bem Okri, ganhador do prêmio Booker na Grã-Bretanha, sabe que o mundo está carregado de pessoas que não estão preparadas para estar ali. A vocação é imprescindível. O homem está quase sempre se matando todos os dias sem saber exatamente porquê. Talvez porque a liberdade custa caro, muito caro. Eu não sou livre, e você também não é. Você sabe disso, mas é estúpido se continua, então desista. Se mate de outra forma, não com um tiro na cabeça. Fazê-lo lhe trará arrependimentos seculares, um bando de criaturas tenebrosas torçem para que você antecipe sua ida. Eles estão lá, puxando o seu barbante. Querem sua ruína, mas isso é bom ficar atento. Preciso de um diálogo qualquer, algo que necessite de dois personagens para um bate-papo romântico. É verdade, os grandes romances são meras casualidades, só que possuem uma liberdade e uma resistência ao compromisso que sor si só é um casamento. Entenda, na amizade. Casar a amizade, depois o sexo. Por falar nisso, ultimamente vem ocorrendo o contrário. Tudo bem, não vamos nos aprofundar tanto nessa questão agora. Acho que sou um romântico perdido, meio pós-moderno, sonhador. Outrora tinha um olhar mais idealista, só que absorvi outras coisas. Talvez no fundo eu seja um pouco dos meus personagens, nada mais. Não, que burrice ! Não sou uma sombra. Sou um homem de 24 anos bem resolvido psicologicamente, mas financeiramente desastroso. Mas isso não significa que devo tratar a todos maquinalmente como diz a reza capital: “Derrube Carla antes que ela te derrube primeiro”. Para quê ? Esse discurso (ou melhor, enrolação de lingüiça, está irritante ) vai acabar agora – entenda leitor, nas linhas do caderno. Vou tomar um café, depois eu volto.

Há exatos dois dias e meio escrevendo esse texto para você Cibele, não consigo terminá-lo. Seus últimos e-mails foram bem sugestivos para uma obra inteira. Não poderia fazer uma coisa qualquer, mas naquele momento... quando lia suas palavras, eu fiquei quase louco. Eu precisava te ajudar, mas como? Uma pessoa tão jovem e uma bagagem, um objetivo de vida fantástico. Eu queria mais, se pudesse ficaria lendo aquelas mensagens todos os dias para entender melhor uma cabeça dessas. Uma força política lúcida e nobre eu descobri! Que coisa rara ! Enquanto vejo algumas pessoas indo para a faculdade junto comigo, imaginava nó dois, num bar, conversando coisas Descartes, Lênin, Balzac, Freud e claro, Kafka. São poucos os que possuem a consciência histórica que você me mostrou. Não existe na recente Universidade Federal do Tocantins um referencial ideológico “para essa gente jovem reunida” que me acompanha aqui. Carla é uma metáfora do vazio que eu sinto de não ter amado algumas mulheres que deveria – mas não havia sentido – em alguns momentos da minha vida. Por isso, agora você sabe: escrever é minha válvula de escape depois de Shakspeare e García Marquez. Ambos se confundem com a arte que prezo, uma arte que presenteia as pessoas comuns com a qualidade e o respeito que elas merecem. O direito à inteligência. O Brasil é pequeno para os artistas. Sabe do que eu lembrei agora ? Daquela canção do Chaplin, um ode ao palhaço e sua função. Sua missão de abarcar no coração das pessoas a importância de sorrir para a vida, para as crianças. A infância do homem é uma flor tão delicada que qualquer vento peralta arranca suas pétalas. Não deixaria o mais tímido rouxinol, ou o mais formoso dos beija-flores lhe dar uma carícia. Neste caso, uma brisa cheirando a orquídeas violetas e a beleza do sorriso verdadeiro seriam mais convenientes. Acredito no amor, não como o concebemos, mas como uma ponte que deve ser construída até o outro lado da divisa. A fronteira com outrém. Quem vai explicar isso ? Acho que o seu poeta favorito chegou a atravessar um pouco mais essa fronteira. Aliás, você sabe qual é a invenção do futuro? A Máquina Teletransportadora. Estranho ? Entenda minha analogia, já assistiu aquele seriado “Jornada nas Estrelas?” Pois é, eles utilizavam um aparelho que redimensionava os átomos de organismos vivos de um local para outro em questão de minutos, na verdade, de um planeta à Interprise, a famosa caravela em forma de disco pilotada pela turma do doutor Spock. Essa alusão científica gerou muita discussão no final dos anos 60, quando do lançamento da série nos Estados Unidos. Atualmente existem teorias e experimentos em laboratório na intenção de reproduzir a façanha da trupe espacial de forma real e naturalista. O que pode parecer ousado hoje, amanhã torna-se uma piada. Não é à toa que Copérnico e Galilleu passaram por maus lençóis, mas geraram teorias nas Ciências Exatas a posteriori revisitadas por Isaac Newton. Provavelmente, esse invento vai falir as empresas petrolíferas e a indústria automobilística, já que temos uma pressa gigantesca em diminuir o tempo e a distância. Você deve estar se perguntando: “Mas afinal, onde ele quer chegar ?”

É tão simples, eu poderia me transportar até você, em questão de segundos. Seria maravilhoso! Conversaríamos sobre tantas coisas... o mundo seria uma bola em nossas mãos.

A vida Cibele, é um labirinto, podemos encontrar saídas e prisões na tentativa do “novo” – que é a busca interior. O cuidado deve ser tomado no sentido de não perder a vontade de insistir naquilo. A preguiça mental é uma das características do mundo capitalista globalizado, onde tudo deve ser homogeneizado.

Fique tranqüila, você vai encontrar o que procura...


Palmas, 26 de novembro de 2003.
“The Boy With Thonr in His Side”.



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