Usina de Letras
Usina de Letras
124 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62228 )

Cartas ( 21334)

Contos (13263)

Cordel (10450)

Cronicas (22536)

Discursos (3238)

Ensaios - (10364)

Erótico (13569)

Frases (50620)

Humor (20031)

Infantil (5433)

Infanto Juvenil (4767)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140803)

Redação (3305)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1960)

Textos Religiosos/Sermões (6190)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Cordel-->Louro do Pajeú-IN: Interpoética -- 24/10/2006 - 23:41 (m.s.cardoso xavier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Louro do Pajeú
Faraó Cabra da Peste
Repassando de Interpoética

06/01/1915 - 05/12/1992

desenho de Gregório Vieira

LOURIVAL BATISTA, MEU PAI!

por Maria Helena, em 05/12/93

Escrevendo sobre meu pai, Dimas disse:

LOURIVAL!

Meu irmão quantas vezes eu cogito
Que não és como nós, de carne e osso
Foi por certo algum Deus, um anjo, um mito
Que te fez esplêndido colosso.

Não pode o tempo deformar-te o esboço
A cada dia fica mais bonito,
A cabeça tão firme no pescoço
E as palavras tão livres no infinito.

Meu desejo é te ver na plenitude
Das belezas da vida, encantadoras
Porque sei que a vaidade não te ilude.

Tens na fronte, do céu, as luzes louras
E o prodígio da eterna juventude
Tão criança na vida, o quanto foras.

Um ano está fazendo que LOURO foi chamado daqui. Tentei escrever alguma coisa para homenagear o homem, o poeta, o cantador, o trocadilhista. Nada do que escrevi me agradou porque eu estava mostrando as facetas de LOURO que todos vocês conhecem. Resolvi mostrar um aspecto dele, que só oito pessoas conheceram. Eu, Branco, Laro, Val, Zá, Nana, Bate e Bia.

Já nascemos ouvindo o toque da viola de Papai e passamos a vida inteira fazendo parte dos versos, misturados aos trocadilhos que soube fazer. Papai alimentou nossa vida com o gosto de nossa gente, com o baião depois da janta cantado e acompanhado de um jeito bem ritmado na mesa onde se jantou.

Sim, nós tínhamos o costume de ficar na mesa depois do jantar, conversando, cantando, recitando, participando de dissertações orais que Mamãe começava e onde todos tinham que criar sua parte na história, ou ouvindo Papai contar as proesas dos valentões do Teixeira, dos cabras das Umburanas e tudo isto tinha pra nós o valor das grandes epopéias.

Papai sempre nos incultiu valores como amor, fé, caridade, compreensão, coragem. Dava pouco mérito ao que era material. Sempre disse que o verdadeiro estavo no espírito, que só valia o que se podia guardar na cabeça ou no coração. Papai foi uma pessoa altamente espiritual. Foi aquele homem que o grande escritor JORGE LUIZ BORGES quis ser. Só que o escritor descobriu as belezas e o sentido da vida, aos 85 anos, quando já estava morrendo e Papai sempre soube viver intensamente. Acho mesmo que ele fez todas as viagens, contemplou todos os amanheceres, subiu todas as montanhas e nadou todos os rios.

Um sentimento comum dos filhos em relação aos pais é o medo. Este, ele nunca nos fez sentir. Nossa confiança era tão grande nele que nunca nos lembramos que um filho pode ter medo do Pai.

Na nossa casa Papai era a emoção e Mamãe a razão. Não sei se por amor, por acomodação ou simplesmente por não querer se indispor conosco, ele sempre deixou para Mamãe a difícil tarefa de nos repreender, de admoestar, quando necessário. Quantas vezes Laro e Val depois de fazerem algumas estripulias ficavam horas na esquina de seu Lon à espera de Papai para entrarem em casa com ele porque sabiam que ele os defenderia e que escapariam da disciplina que seria aplicada por Mamãe.

Quando adolescente, enquanto colegas de minha idade tremendo a voz, ensaiavam dezenas de vezes a maneira de chegarem ao pai e pedirem para irem a alguma festa, o nosso tomava a iniciativa e nos dizia: a festa vai ser animada, se arrumem e vão.

Nunca no privou, nunca nos chantageou, nunca nos proibiu.

Afável, carinhoso, meigo, nunca esqueceu de nos presentear. Nós ganhávamos versos quando nascíamos, em cada aniversário, na primeira comunhão, em cada conclusão, em cada formatura. Todo acontecimento era uma inspiração, uma razão pra cantar.

Papai cantou todos os motivos, e eu acho que é esta minha razão de sentir tanta vontade de cantar todas as vezes que sua ausência se faz presente em minha vida. Parece que quero me compensar da falta do canto dele.

Lembro-me bem pequena (e como acaricio esta lembrança), das inúmeras vezes que ao me encontrar brincando, deitada no chão, tirava a sandália que nunca se deu trabalho de abotoar e com o dedo grande do seu pé babeco, me fazia cócegas até me ver desfalecer de rir.

Devido a sua profissão, Papai viajava muito, mas cada volta sua, era uma festa pra gente. Quantas vezes brincando na calçada, à tarde, de repente víamos a figura de Gonga, seu carregador de confiança, aparecer na saída do beco de Zefa Gia, com uma maleta na cabeça e uma viola na mão. Era Papai que vinha chegando. O primeiro que via começava a gritar: Papai chegou! E corríamos todos para encontrá-lo na boca do beco que no nosso afã de abraçá-lo parecia ter quilômetros de comprimento.

E há pouco mesmo! Quantas vezes ele chegou no Banco, tirando do bolso da calça, enrolado num papel de embrulho, um pedaço de preá torrado no barraco de Jaime, porque sabia que eu gostava. E eu diante de olhares de colegas, talvez até enojados, comia ali, na hora que recebia pra ele ver que eu tinha gostado da lembrança e porque aprendi com ele mesmo que quando se gosta de algo ou de alguém, devemos demonstrar este gostar, este amos e a satisfação que causa.
Achou Dimas, que o tempo não teve o poder de deformar o físico nem o espírito de LOURO. Eu vou além do tempo. Eu cogito, eu penso, eu digo, nem a morte conseguiu, porque ela com toda ausência que impõe, com toda saudade que gera, não conseguirá com amor, compreensão, alegria, força, coragem. Sentimentos que geram vida e que compõem o acervo da nossa herança.

Temos muito que agradecer a natureza, que além de nos ter dado um Pai desse quilate, nos deu a oportunidade de conviver tanto com ele!
Nós tivemos um Pai maravilhoso! Foi isto que eu quis mostrar pra vocês.

PAI! Você não tem parelha.

Lourival Batista Patriota,
o Louro do Pajeú
e a Árvore da Poesia *

Por Meca Moreno

No dia 05 de abril do ano de 1887, no sítio Angico Torto, município de São José do Egito, banhado pelo rio Pajeú, Pernambuco, nascia o Rei dos Cantadores ou a Águia do Sertão, codinomes de Antonio Marinho do Nascimento, o primeiro da dinastia dos “Faraós do repente”, pertencente
Do gosto para o desgosto

O quadro é bem diferente,

Ser moço é ser sol nascente,

Ser velho é ser um sol-posto,

Pelas rugas do meu rosto

O que eu fui, hoje não sou,

Ontem estive, hoje não estou,

Que o sol ao nascer fulgura,

Mas ao se por deixa escura

A parte que iluminou.

Lourival Batista

ao “Reino dos Cantadores de São José do Egito”, segundo estudos genealógicos do pesquisador, poeta, apologista e professor José Rabelo, apresentado em belíssima obra poética. Em 13 de novembro de 1891, no sítio Jatobá, Itapetim, São José do Egito, veio ao mundo Antonio Pereira de Moraes, O Poeta da Saudade. Já no final do século XIX, nascia em Monteiro, no Cariri paraibano, Severino Lourenço da Silva Pinto, mais conhecido como Pinto do Monteiro, A Cascavel do Sertão. Aos 12 dias do mês de maio do ano de 1912, em São José do Egito, era apresentado à luz o poeta João Batista de Siqueira, o conhecido Cancão. Em 30 de junho de 1920, outro grande nome da poesia apresentava-se ao mundo no sítio Cacimba Nova. Era o segundo gigante da dinastia dos “Faraós do Repente”, com o nome de Rogaciano Leite, em Itapetim, de São José do Egito. Também em Itapetim, no dia 01 de janeiro de 1929, no sítio Cacimbas, nascia Job Patriota de Lima, o Jó Patriota. No dia 13 de outubro do ano de 1930, foi a vez da cidade de Afogados da Ingazeira agradecer ao céu, por ter o privilégio de haver nascido ali, na fazenda Taboado, povoado de Jabitacá, o grande vate Manoel Filomeno de Menezes, mais conhecido como poeta Manoel Filó. E mais e mais. Todos da mesma região, destacando-se São José do Egito. Todos frutos da árvore maior da poesia que brotou no sertão nordestino a partir da inspiração divina.

No final do ano de 1914, respirava-se uma certa expectativa. Os acontecimentos tendiam parecer dentro da normalidade, mas algo diferente estava por acontecer. Os anjos do natal daquele ano pareciam mais sorridentes. A expectativa só aumentava. Chegou o novo ano da graça de Nosso senhor Jesus Cristo. 1915, veio trazendo novas e boas venturas para os pastores de cabras e para os demais habitantes, mas ao invés das coisas voltarem ao normal, algo pairava no ar, prenunciando a bênção que aconteceria a qualquer momento. Passava-se o sexto dia do mês de janeiro, Dia de Reis, quando em Umburanas, que depois tornou-se Itapetim, à época, distrito de São José do Egito, deu-se o grande acontecimento.

O céu transformou-se num grande arco-íris de um lado ao outro do horizonte, por sobre as coisas sem vida e sobre os seres viventes. Casas, cercas, mourões, objetos, homens, plantas, animais e tudo que mais havia. Os cabritos do sertão inteiro resolveram berrar e pular, imitando o milho da pipoca na panela da família dos Batista Patriota. O gado alegremente mugia. Numa cena rara de se ver, o sol e a lua apareceram no céu para ninguém perder a festa. Ao mesmo tempo era noite e era dia. As criaturas mais diversas moviam-se como quem anunciava: vai ser agora! Vaga-lumes agitavam-se acendendo e apagando suas “lanternas”, enquanto os jumentos, animais sagrados, ininterruptamente repetiam todo o abecedário: Aaahh!, Ehhhh! Iiihh, Ooohhhh! Uuuhh! Ypsilone! Ypsilone! Ypsilone!...

As plantas pareciam mais viçosas, chuva de pétalas de todas as cores. Os peixes, reluzentes e saltitantes cruzavam o Rio Pajeú e seus afluentes numa velocidade nunca vista. Os vaqueiros, movidos por uma força maior e incontrolável, cantavam um aboio em uníssono por todos os recantos do sertão, formando um grande coro regido do céu, por um anjo visível apenas por eles, que intuitivamente faziam vênias na direção da casa dos Batista Patriota, sobre a qual flutuava o anjo-regente, em louvação ao acontecimento. Ouviam-se acordes de violas mágicas que vibravam plangentes, harmonizando-se à melodia angelical. Repentistas improvisavam em agradecimento a Jesus, referindo-se ao fenômeno.

De repente tudo parou. Silêncio total, quando ouviu-se um choro de criança que acabara de chegar e ser presenteada à luz. Mágico apresentado à magia envolvente daquele recanto de mundo, no sertão de Pernambuco. Um choro forte, grave, másculo. O que eu chamo aqui de choro, na verdade era um solfejo em DO, RE, MI, FA SOL, LA, SI. Todas as notas, em todos os tons, em várias escalas. Magia divina. Naquele momento, foi apresentado ao mundo aquele que veio para completar a dinastia dos “Faraós do Repente”, do “Reino dos Cantadores de São José do Egito”, do professor José Rabelo, que inspirou o poeta, compositor e artista plástico Karoba Nunes a projetar o memorial, em homenagem aos “Faraós do Repente” para ser edificado à entrada da terra natal dos três.

Assim, veio a nós um dos maiores poetas que já andou sobre a face da terra: LOURIVAL BATISTA PATRIOTA, O Louro do Pajeú, O Rei do Trocadilho, referência da sua geração e das gerações vindouras. Um homem grande como o sertão. E por ser tão grande, simples e humilde. Menino que gostava de brincar com palavras. Improvisador de uma rapidez de raciocínio estupenda. Comparável a poucos, em todas as épocas. Seu pai, Raimundo Patriota, mais conhecido como Raimundão e sua mãe Severina Patriota, que teve veemente influência sobre a veia poético-repentista de Louro, e dos outros filhos, ainda presenteariam ao mundo, mais dois gigantes da poesia, irmãos de Lourival, para formarem A Tríade Batista, com louro no cabeçalho: Lourival, Otacílio e Dimas Batista.

Em 1930, ainda com 15 anos, enfrentou o seu primeiro desafio como cantador. No ano de 1932, não fosse pela intervenção de sua mãe, que o retirou das colunas do pelotão ao não autorizar, teria ido, aos 17 anos, lutar na revolução constitucionalista, em São Paulo. Em 1933, enfrentou uma empreitada de 97 dias andando do Recife até Itapetim, em São José do Egito, distante 422 km do Recife. Antes, porém, cruzou a Paraíba e esteve no Rio Grande do Norte, para depois seguir ao seu torrão natal. Como cantador, fez um caminho ao contrário dos que chegam à capital. Começou a cantar no Recife e depois partiu para o interior, quando o mais comum é inverter-se o fluxo. A partir de então, não parou mais. Levou poesia aos 4 cantos do mundo. Participou de muitas cantorias, ganhou muitos festivais, muitos prêmios, muitos amigos e o respeito de todos.

Em resposta a Canhotinho, companheiro de cantoria, que terminou sua estrofe dizendo: Já sinto o peso dos anos / querendo roubar-me a paz.

Louro pagou assim:

Eu já não suporto mais
Do tempo tantas revoltas
Prazer, por que não me prendes?
Mágoa, por que não me soltas?
Presente, por que não foges?
Passado, por que não voltas?


Campina Grande/PB, 05/10/84 (foto de Djair Freyre)

Casado com Helena, filha de Dona Isabel e Antonio Marinho, a Águia do Sertão. Sendo mais bela, mais forte e mais corajosa do que a grega, por causa de quem houve a famosa guerra de Tróia. Mas por causa da Helena escolhida por Louro, guerra não houve, mas paz, amor e poesia, muita poesia. Da união, à luz vieram 8 filhos, sendo 4 mulheres e 4 homens que, com o sangue de artistas correndo-lhes nas veias, não poderia ser diferente. São extensões artístico-helênicas de Louro, que multiplicaram-lhes e multiplicaram-se.

Lourival Batista Patriota encantou-se no dia 05 de dezembro de 1992, aos setenta e sete anos. Do céu, caía uma chuva de pétalas brancas, novamente a noite virou dia e o dia virou noite. Sobre a cidade do Recife, Pernambuco, o arco-íris, um coro de anjos que era regido por um outro, trajado de vaqueiro tipicamente encourado. Chapéu, gibão, para-peito, luvas contra os espinhos dos xiquexiques da vida (mesmo sendo vida de anjo), perneiras, alpercatas de rabicho, no lado direito um alforje com rapadura, farinha, sal, carne seca. Do lado oposto, enrolado um comprido laço de couro e um cantil com água fria. Estrelas desenhadas no gibão, brilhavam, confundindo-se com as do céu. Ladeava-lhe um lindo cavalo alado, de crina amarela como ouro. Bem paramentado. Completo em sela, estribos reluzentes e demais arreios. Uma manta de couro, recoberta de estrelas de prata sobre o peito, descendo-lhe até os joelhos dava-lhe um ar imponente.

Pequeno intervalo e sobressaiu-se o anjo-regente improvisando, solou um aboio em septilhas:

Que não fique a terra triste
Porque o céu está em festa
Daqui tudo que existe
Amar é o que nos resta
Lourival foi convidado
Porque é nome consagrado
É Jesus quem diz e atesta

Lourival está partindo
Mas vai deixando alegria
Vai juntar-se a mais poetas
No céu vai ter cantoria
Deixa seu nome gravado
Em cada mourão fincado
No reino da poesia

As mágicas violas tocavam. A música era de paz. Os vaga-lumes voltaram a acender suas “lanternas”, as pétalas brancas que caíam do céu formavam um caminho, sobre o qual, lentamente, com um suave sorriso no rosto, o grande Louro do Pajeú, com seus cabelos brancos como o algodão das nuvens, lembrando os bons tempos do ouro branco do sertão, acenava para todos, enquanto caminhava em direção a um grande e iluminado portal, onde foi recebido ao som de trombetas angelicais. De repente, silêncio total e um choro coletivo ecoou em uníssono: O choro de todos os poetas do planeta terra.

Depois compreendemos. Era tempo de retribuição. Um presente da terra para o céu, que estava em festa pela sua chegada a fim de preparar-lhe para uma nova missão. Daquelas que não basta ser anjo, profeta ou poeta para cumprir com êxito. Tem que ser especial. Por isso não morre jamais. O que justifica o adágio: “Poeta não morre. Tem encantamento.”

* confira o texto na íntegra

desenho de Gregório Vieira
gregoriosim@yahoo.com.br

Neste mês de outubro de 2006, aniversário de um ano da página INTERPOÉTICA, homenageamos, na seção FIGURA DA VEZ o poeta, rei dos faraós, Louro do Pajeú, para tanto, publicamos texto da sua filha Maria Helena e trechos do ensaio do poeta e apologista Meca Moreno.

Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui