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Contos-->Inércia -- 18/11/2003 - 17:18 (Rose Oliveira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Inércia

Amanhecia quando desligou o micro. Ar cansado, olheiras fundas, mãos trêmulas pelo excesso de tabaco, espreguiçou-se, apagando as luzes da sala.
Foi até a cozinha, tomou o último cafezinho. Deitou. O sono não vinha e revirava na cama inquieto. Desistiu. Ligou a TV, acendeu um cigarro.
Tossiu convulsivamente.
“Droga de pigarro!”, pensou enquanto tragava a fumaça.
Tentou relaxar, mas as lembranças atormentavam-no. Levantou e olhou-se no espelho. Já estivera melhor... Não se dera conta da barriga proeminente que o sedentarismo lhe acrescentara. Encolheu-a, prendeu a respiração... Não adiantava.
Passou as mãos no cabelo, já rareando no alto. Olhou clinicamente a área: mudaria o corte e a forma de penteá-lo. Disfarçaria. Alisou a pele do rosto e sorriu: pelo menos ela permanecia em forma, exceto umas rugas minúsculas na área dos olhos, estava bem.
Ficou de perfil. Não gostou da silhueta recortada que viu. Estava até meio curvado! Corrigiu a postura.
“Preciso fazer algo”, disse a si mesmo, voltando para a cama.
Os anos passaram e ele não vira. Envelhecera. A alma, aflita, não aceitava o fato.
Idade crítica, diriam.
Nada sabiam. Sequer supunham o que lhe consumia. Era um homem amargo, de futuro indefinido, malresolvido. Rascunho torto do que desejara ser.
Gostava de pensar que não era má pessoa. Era bonzinho. Um cara decente.
Opinião questionável se atentasse para o que fazia quando trabalhava. “Atravessava” serviços: do sufoco de outrem arrancava seu “rico quinhão”, e ia para casa satisfeito.
Não distinguia que a Lei do Retorno é dura. E mesmo que não admitisse, amargava suas escolhas e atos. O que fácil viera, fácil se fora, deixando-o na miséria. Na compulsão de “se dar bem”, pois era esperto, esquecera-se de escolher uma profissão e estudar.
“Não tinha tempo pra isso... eu tinha que ‘ganhar’!”
...E o tempo não perdoa.
“E agora? No que trabalhar? O mercado abarrotado de jovens, ávidos e prontos, que chances teria? Talvez pudesse recomeçar... estudar... E pagaria como? Faculdades são caras!”
Vaidoso, não se humilharia trabalhando em padarias, mercearias, ou qualquer trabalho menor, braçal. Nasceu para mais que isso. Era inteligente. Combinava com dirigente, autônomo... algo de que fosse o dono.
“Porcaria de vida!”, pensou, deixando o curso dos pensamentos mudar. “Tudo se resolve. Mais dia, menos dia... é só esperar”.
E aprendeu a esperar que “caísse do céu” o que precisava.
Despudoradamente pedia. Descaradamente aceitava. E gozava a vida.
Sorriu... Gozar era ótimo, lembrou-se daquela tara, secreta, que não o largava: preferia como companhia menininhas, lindinhas, inocentes, decentes. E como isso o seduzia.
Precisava do frescor que delas emanava, para continuar a ser. Se obtinha sucesso na conquista, exultava! Era o tal. Com oratória e sedução, conseguia o que queria. Mostrava, assim, como estavam errados os que o consideravam acabado.
Rejuvenescia, sonhava, planejava ... e agia. Maculava sem ver. Prometia sem ter.
Inviso, somavam-se vidas por ele desmanteladas: mulheres sofridas, mal-amadas, desoladas, frustradas, ignoradas... largadas. Filhos paridos, não planejados, e entregues à própria sorte.
Não se culpava... até os amava! Fazia o que podia. No mais... Deus cuidaria.
Nada fazia, achando que nada fizera.
Apenas era. Descaradamente.
Nada aprendera. Desavergonhadamente.
E vegetava... enquanto a vida corria.

Rose Oliveira
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