Usina de Letras
Usina de Letras
161 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62266 )

Cartas ( 21334)

Contos (13267)

Cordel (10450)

Cronicas (22539)

Discursos (3239)

Ensaios - (10379)

Erótico (13571)

Frases (50656)

Humor (20039)

Infantil (5450)

Infanto Juvenil (4776)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140816)

Redação (3309)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1961)

Textos Religiosos/Sermões (6203)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Contos-->E-mãe -- 18/11/2003 - 17:17 (Rose Oliveira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
E-mãe

Sentada no pátio da escola dos filhos, olhava impaciente para o relógio, aguardando tocar o sinal de saída.
Com tanto por fazer...
Quando ligasse o micro, teria “trocentos” e-mails na caixa.
Tocou a sirene. O caçula chegou correndo, suado, sorriso largo no rosto. Sentou em seu colo.
Faltava o mais velho.
Ao seu lado, duas outras mães trocavam impressões:
— Sou daquelas que mantêm a rédea curta. Se deixar, esses meninos tomam conta da gente. É pra fazer o que querem, senão... — disse a gordinha, sentada no meio.
A mãe sentada na ponta do banco respondeu:
— E eu não sei? A minha queria uma calça nova, para uma festinha na casa de não sei quem. Tem um “monte” no guarda-roupa, mas cismou que estão “fuçadas”. Levei pra comprar uma nova, arrochando o orçamento, e adivinhe... ficou emburrada porque só queria de grife famosa.
Não basta ser nova, tem que ter grife! Cada uma, viu?
— E você? É como?
Ajeitando-se no banco, ainda impaciente, olhou o relógio. Só então se deu conta de que falavam com ela.
Sorriu encabulada e, antes que pudesse responder, o caçula, rindo, falou:
— E-mãe.
As outras olharam-no boquiabertas.
— Como?
— E-mãe. Mamãe trabalha tanto tempo no micro... quase não sai da frente dele. Meu tio só consegue falar com ela se mandar e-mail. Papai um dia ficou uma fera: ligava e dava ocupado. Mandou um e-mail dizendo assim: “Desliga o fone! Preciso falar com você!”. Num foi, mãe? O fone fica ocupado, na conexão. Acho que ela é e-mãe.

As mulheres olharam-no risonhas, abanaram a cabeça com ar de troça e levantaram.
Chocada, recebeu a mochila do mais velho que finalmente chegara, enquanto dirigia-se ao carro, no estacionamento.
Olhou para os filhos como se os visse pela primeira vez.
E-mãe! Deus... seria verdade? Estaria tão ausente assim?
Realmente, preferia ficar no chat das listas, com amigos, que torrar na praia, naquele calorão, soltando pipa, jogando bola, peteca e tudo que quicasse. Arre!
Verdade seja dita, nunca mais fora ao cinema com eles, como antes fazia, em verdadeiras orgias de pipoca, pizza, doces e refrigerantes.
Minha nossa! Também já não participava das festinhas chatas de seus amiguinhos.
Pudera, festa de criança é um saco. Tinha mais o que fazer.
Nada mais de “ver” games, locar filmes poke-horrorosos, boliche (onde dava vexame, já que a maldita bola, pesada, não lhe obedecia nunca).
Caramba... Percebeu que até quando tentavam conversar, mal ouvia. Pudera, era uma só! Como ouvir com o olho no monitor e os fones no ouvido?
Mas a sensação de choque não passava. Sentia que o caçula viu, o que nem ela vira: se distanciara.
Brecou o carro, pegou o retorno e dirigiu-se a orla.
— Ué, mãe... vamos à praia? — Estranharam.
— Vamos sim.
Estacionou, enquanto os dois sapecas desciam dando gritinhos de prazer.
Compraram água de coco, andaram pela orla, correram para lá e para cá.
Vendo-os assim, estimulados e felizes, pensou no que estava fazendo.
Começou a mudar ali.
Será? Seria?

Sorriu despreocupada. Não estava a fim de analisar nada.
Na tentativa de compensar, passou o dia em torno deles, obsequiosa. Maldito sentimento de culpa. Afinal, o que fazia de errado?
Nada. Usava o seu direito de ocupar-se no que gostava. E seguiu nesse monólogo íntimo até recolher-se para dormir.
...no dia seguinte...
Uma pequena recaída, justificava enquanto abria o Outlook.
Ansiava por ver os e-mails.
Devia saber que nada muda assim, da noite para o dia.
Lentamente foi sendo engolfada na rotina de sempre: triar, responder, enviar, escanear, editar, enquanto falava com fulana e sicrana pelos comunicadores de mensagens instantâneas. Tinha um único diferencial: continuava chocada. Incomodada.
Seus amigos riram quando narrou o fato. “E- o quê???? (rindo muito)”; “e-mãe????? Essa é nova, amiga!”
Fizeram gozações com isso o dia inteiro. Dia que escoou, sem que se desse conta.
Na madrugada, tentando conciliar o sono, foi forçada a admitir: não seria fácil abandonar a rede, os amigos (tão queridos), os afazeres que lhe davam tanto prazer. Era responsável pelos amigos que reunira e conquistara, pelo trabalho que assumira. Teria que achar o ponto de equilíbrio entre sua vida real e a virtual; podar os excessos, sem traumas, dramas ou dores.
Era importante que seus filhos soubessem o quanto eram amados, que estaria presente, sempre, como aliada, parceira, confidente.
Afinal, antes de qualquer outra coisa, era mãe.
Riu silenciosamente. Aliás, era e-mãe.
Refaria sua rotina.
Ainda sorrindo, adormeceu.

Rose Oliveira
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui