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Artigos-->A Nova Pasárgada -- 08/07/2002 - 09:59 (Domingos Oliveira Medeiros) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
A NOVA PASÁRGADA ()

(Domingos Oliveira Medeiros)



Aproveitando uma folga resolvi conhecer a tão famosa Pasárgada. Peço desculpas ao saudoso Manuel Bandeira. Mas, devo confessar, não fiquei satisfeito com o passeio. O lugar não é lá estas coisas. Nada de tão surpreendente. Aliás, é até muito parecido com tantas outras localidades que conheço. Assim que cheguei na cidade, fui direto para o parque de diversões. Na verdade, fui conferir o que dela falou o poeta Bandeira. Havia, realmente, o pau de sebo, untado de gordura; e que até premiava, com dinheiro, quem conseguisse chegar ao seu topo; só que o valor do prêmio não cobria o valor do ingresso. Nem era suficiente para compensar as despesas com lavagem da roupa.



Encontrei, também, muitas bicicletas para alugar; porém, enferrujadas e sem qualquer manutenção; e com os preços de locação impraticáveis para grande parte da população. População, diga-se de passagem, muito pobre e sem esperanças de melhorias. O desemprego era grande. Poucas vagas nas escolas públicas. Muita gente fora delas. E os que estudavam, reclamavam da qualidade do ensino. Havia muitos analfabetos.



Constatei a existência do tal burro brabo, a que se referiu o poeta. Sempre à disposição dos mais ousados, que se dispusessem a montá-lo. A surpresa, em relação ao burro brabo, era o risco de queda, com fraturas de ossos, sem que o valente herói - geralmente na classe menos favorecida - pudesse contar com assistência médica adequada. A rede hospitalar pública deixava muito a desejar. E os particulares, que aceitavam convênios, não guardava correlação com o poder aquisitivo da população.



A questão da prostituição em Pasárgada era generalizada. Competia, em larga escala, com o descaso e o desrespeito em relação às poucas famílias que ainda preservavam suas crenças e seus valores éticos e morais. Não era à toa que o local registrava grandes índices de pessoas contaminadas com AIDS, Sífilis, Blenorragia e tantas outras doenças da espécie. Até um surto da dengue já começava a se alastrar pela cidade. E havia troca de farpas entre as autoridades. O Monarca colocava a culpa nos governadores, e estes nos representantes municipais. E a população, ficava sem solução.



A imprensa, de modo geral, contribuía para aumentar as incidências daquelas patologias infecto-contagiosas. Fazendo a apologia do sexo pelo sexo. Sexo como sinônimo de liberdade. Propagavam, como arte, a nudez bem remunerada das mulheres famosas e dispostas a despir-se em páginas de revistas.



As televisões exibiam programas de gosto duvidoso e levados ao ar no chamado horário nobre. Briga de marido e mulher; estrelas e atrizes mostrando para o público, ao vivo e a cores, a cor de sua calcinha; a posição sexual de preferência do artista tal, câmaras indiscretas, atores confinados em casas de artistas, conversando bobagens insinuando a prática de sexo explícito, enfim, a cultura do grotesco, o desperdício de uma invenção tecnológica tão interessante como a televisão. E tudo por conta da busca frenética pela audiência, vale dizer, pelo patrocínio, sinônimo de dinheiro.



Em Pasárgada, pude constatar que o sistema de governo é semelhante a uma Monarquia Parlamentarista, onde, a rigor, quem manda é Sua Majestade, o Rei. O Parlamento apenas homologa suas decisões. Em contrapartida, todos são agraciados com presentes de Sua Majestade: empresariado local, banqueiros e outros amigos do Rei.



E o poeta Manuel Bandeira, como é sabido, gozava da amizade do Monarca. Boêmio e amante da bebida e das noitadas, gozava, por isso mesmo, do privilégio da companhia de belas mulheres, que lhe era destinado pelo Rei. Assim, nosso poeta podia escolher a mulher e a cama que quisesse. Na hora que melhor entendesse. Talvez por isso, o poeta tenha elogiado, em versos e em prosa, a cidade de Pasárgada. Posto que, a libertinagem, as facilidades, a apologia ao sexo e a vida fácil, eram, ppor assim dizer, garantidos pelo rei aos seus amigos. E Manuel Bandeira, sendo um de seus melhores amigos, não poderia deixar de ser agraciado com tanta pompa. Por isso, tudo indica, não poderia ser diferente. Pasárgada era, para o poeta, o melhor lugar do mundo.



Fiquei em Pasárgada, aproximadamente, uma semana. Tempo mais do que suficiente para desvendar quase todos os seus mistérios e segredos. Depois, soube de outra localidade próxima dali cerca de 50 ou 60 quilômetros, ainda em fase de construção.



Neste outro lugar não havia desempregados. A educação recebia tratamento privilegiado do governo. Os colégios e as universidades eram de ótima qualidade, com vagas, o ano todo, para quem quisesse ou se dispusesse a cursar esta ou aquela faculdade. Uma vez formado, o emprego , tanto no setor privado como no público, era garantido. Não havia déficit previdenciário. Os aposentados tinham assistência médica e social gratuitas. E os salários eram suficientes para sua manutenção e de sua família.



Neste lugar, que se chamava Nova Pasárgada, todos pagavam impostos. Proporcional aos seus rendimentos. Havia justiça fiscal. Quem ganhasse mais, contribuía com mais. Inclusive os banqueiros. A educação, a saúde e a segurança Pública eram de boa qualidade e prestados sob à responsabilidade do Estado. Habitação e Transporte, idem. A cidade era muito limpa e bem cuidada. E não havia registros de roubos, furtos e assassinatos.



Em Nova Pasárgada todos participavam ativamente das ações políticas: sugerindo, reclamando, cobrando, e assim por diante. A re-eleição em Nova Pasárgada era proibida. Primava-se pela rotatividade do poder, como forma de oxigenação das idéias. Nada de vitaliciedade após deixar o governo. Conforme querem adotar aqui no Brasil. E os deputados e os senadores,que eram eleitos, não recebiam salários pagos pelo governo. Eram pagos pelas empresas de origem. Fossem proprietários ou mesmo assalariados. Apenas quem comprovasse não ter qualquer renda, recebia uma ajuda de custo do governo para cobrir suas despesas com o mandato. Os parlamentares eram obrigados, ainda, a apresentar, pelo menos, dois projetos de lei à cada ano de mandato. E eram, igualmente, obrigados a comparecer ao Congresso todos os dias.





O mais curioso de tudo, e de certa forma surpreendente, é que governo e população, numa espécie de Carta de Intenções, sobre o futuro de Nova Pasárgada, utilizou ensinamentos colhidos no livro de um brasileiro, intitulado "A Cortina de Ouro", do Prof. Cristovam Buarque, onde estavam definidos os caminhos que norteavam as ações de Nova Parsárgada, de onde republicamos alguns trechos:



"Há cerca de mil séculos o homem dobrou um esquina biológica: diferenciou-se de seus ancestrais, adquirindo um cérebro dotado de inteligência suficiente para perceber o mundo, entender parte dele e desejar dominá-lo. Há cem séculos, uma esquina técnica foi dobrada: o homem aprendeu a manejar a produção agrícola e criou uma vida sedentária (...)) Há vinte e cinco séculos (...) o surgimento da esquina ideológica: os gregos inventaram a lógica e construíram uma organização social e política que caracterizaria a civilização ocidental até a queda do Império Romano, quinze séculos atrás. A partir de então, até o Século XVIII de nossa era, a sociedade medieval (...) do qual surgiram o Iluminismo e a Revolução Industrial, que provocaram a esquina da civilização industrial. Hoje a humanidade chega outra vez a um caminho (...) Mas, pela primeira vez em sua história, os homens têm conhecimento do que ocorrerá e têm diante deles a possibilidade de escolha. Em vez de uma esquina dobrada involuntariamente, sem escolha, a próxima dobra é um encruzilhada ética, definida pela vontade do homem, com dois caminhos alternativos: continuar com a ética do progresso deste século, ou fazer um progresso da ética para o próximo".

"Ao não se perguntar para que, mas apenas como, o homem perdeu o sentido crítico da sociedade que construiu, e, ao construí-la sem o sentido crítico, caminhou para o desastre".



E assim, a cada dia, nascem novas Pasárgadas, totalmente libertas de esquemas e classes do século passado, sem medo de sonhar e de retomar o gosto "pela aventura de imaginar e navegar um futuro incerto, sem mapas pré-fabricados, sem dicionários confiáveis, sem destino previamente definido com clareza.



De volta para casa, fiquei pensando como seria bom se o Brasil pudesse seguir os passos, os sonhos e as utopias praticadas em Nova Pasárgada. Ao invés de procurar ser eternamente o amigo do Rei. Principalmente de um Rei que não fala a nossa língua, que não é brasileiro, e que já deu mostras de que não tem nenhum apego ou interesse por esta pátria e por este povo. A não ser o de explorar nossas riquezas.



Talvez assim, ninguém precisaria ir embora para outros cantos. Procurar uma vida melhor. Procurar um emprego. Um salário decente. Um lugar para educar a si e seus filhos. Um lugar para morar. Um local onde tivesse garantida sua segurança e sua dignidade como pessoa humana. Aqui mesmo, em terras brasileiras, todos poderíamos ser amigos não do só de um rei bondoso, sábio, justo e sensato. Um rei que acreditasse mais no seu povo. Um rei que não se curvasse diante de outros reinados. Um rei que buscasse o desenvolvimento sustentado e praticasse a justiça social.



DOM.2002

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