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Cordel-->O CASO DO PADRE JOSÉ GONÇALVES DE SÃO LUIZ GONZAGA -- 28/04/2006 - 14:47 (JOAQUIM FURTADO DA SILVA) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O CASO DO PADRE JOSÉ GONÇALVES DE SÃO LUIZ GONZAGA DO ALTO MEARIM
© 2006, abril Escrivão Joaquim Furtado


1. O padre José Gonçalves
Lá de são Luiz Gonzaga
Num período de dez anos,
Viveu verdadeira saga.
Mas um seu paroquiano
Fez-lhe desatino insano,
Segundo li em “Sanzaga” 1.

2. A delação sempre estraga
Ao próprio delator.
Pois corrói suas entranhas
De servil bajulador,
Mas também a outros fere,
Como feriu Rosa Néri,
Que perdeu seu benfeitor.

3. Consoante o autor –
Caro Josafá Bonfim,
O caso do sacerdote
Citado se deu assim:
Nascido em São Vicente
Férrer, era diferente
Da gente do Mearim.

4. Além de falar latim,
Necessário à função,
Falava fluentemente
Com bastante precisão,
O idioma inglês;
Também sabia francês
Aquele padre cristão.

5. A sua nobre missão,
Como padre franciscano,
Não sei onde começou,
Nem sei informar o ano.
Sei que em terras maranhenses
Foram mesmo os gonzaguenses
Seus últimos paroquianos.

6. Igualmente a ciganos
Padre não tem pouso certo.
Às vezes fica em cidades,
Outras em local deserto,
Sempre longe da família,
Isolado como ilha,
Mesmo com pessoas perto.

7. Com o coração aberto
Para pessoas estranhas,
A quem trata como filhos,
Como de suas entranhas,
O sacerdote cristão,
Nessa difícil missão,
Poucas espórtulas ganha.

8. A beata se assanha
Se o padre é moço e bonito.
Esquece a eternidade
A oração, o bendito,
Oculta o rosto no véu
E promete um outro céu
Ao vigário aflito.

9. Ele troca o infinito
Pelo mundo secular
Se a tanta tentação
Não consegue suportar
Se forte, mantém a calma,
Pois, como pastor de almas,
Ao Demo sabe afastar.

10. Mas o que ocorreu lá
Nas margens do Mearim,
Lá em São Luiz Gonzaga,
Como Josafá Bonfim
Escreveu na sua obra,
Foi uma astuta manobra
Que teve trágico fim.

11. Acho uma coisa ruim
Que a nossa Santa Igreja
Proíba padre casar-se,
Quando ele assim deseja -
Ter esposa, ter um lar,
Onde possa descansar
Sob aura benfazeja.

12. Onde quer que o padre esteja
No mais distante rincão,
Sempre terá no caminho
A humana tentação;
Pois seria desconexo
Homem não gostar de sexo,
Em sadia relação.

13. A cruel proibição,
Que impõe a Santa Sé,
De um padre não poder
Unir-se a uma mulher,
Depõe contra a natureza.
Carne fraca, com certeza
Faz atraiçoar a fé.

14. Assim, o padre José
Gonçalves de Oliveira,
Lá de São Luiz Gonzaga
E da vizinha Pedreira,
Às escondidas prefere
Deitar-se com Rosa Néri,
Por não ver outra maneira.

15. Por uma década inteira
Durou o amor dos dois
Cinco filhos teve ela
O povo soube depois.
Ela chegou na ribeira
Como fosse mãe solteira
Ninguém a isso se opôs.

16. Um ou outro até supôs
Fosse uma pobre viúva
Que, não tendo casa própria,
Queria abrigar da chuva
Os cinco filhos que tinha;
Sendo do padre vizinha
Caiu-lhe como uma luva.

17. Não foi somente da chuva
Que ela foi se abrigar.
Foi também da solidão.
O padre era seu par.
Os filhos dela eram seus
Ocultava-os, não de Deus,
Mas do povo do lugar.

18. Ela resolveu mudar
Para São Luiz Gonzaga,
A pedido dele mesmo:
“-Vá. Tem uma casa vaga.
Fica na margem do rio,
Mas é quente, não faz frio
Nem a correnteza alaga...”

19. A cada criança afaga
O afetuoso padre,
Tal qualquer filho de Deus,
Não seus filhos de verdade;
Evita grande efusão,
Que não desperte atenção
Das pessoas da cidade.

20. Mostra rigorosidade
Alternada com carinho
Dependendo do momento,
De estarem os dois sozinhos,
Pois se há gente por perto
O sacerdote esperto
Muda da água p´ro vinho.

21. Morando ela vizinho
À casa paroquial,
Faz a faxina completa
E cuida bem do local.
Zela também pelo templo,
Buscando dar bom exemplo,
De decência e de moral.

22. Evita ser social,
Sempre inventando pretexto.
Sabe que sua conduta
Não se insere no contexto.
Não se mete em comentários,
Fala quando necessário –
Em si mesma, põe cabresto.

23. Considera como honestos
Seus atos perante Deus,
Mas sabe que a Igreja
Não batiza os filhos seus.
E que a comunidade
Ao descobrir a verdade
Vai tratá-los como ateus.

24. Ela lembra os fariseus
Que fala a Bíblia Sagrada,
No caso da pecadora
Que seria apedrejada,
E enquanto dorme, sonha
Com a crueldade medonha
Contra a mulher condenada.

25. Acorda desesperada,
Encharcada de suor.
Não vê ninguém – era sonho! -
Mas não se sente melhor.
A casa parece tétrica,
Escura, sem luz elétrica
E ela se sente só.

26. Procura ver em redor
Acende a lamparina.
Vai ao quarto dos filhos
Dos meninos, das meninas...
Retorna pra sua cama
Mas não dorme, vive um drama
Até que a noite termina.

27. Também pensando na sina
Acha-se o Padre José,
Na casa paroquial,
Vizinha à da mulher.
A altas horas, desperta
E, junto à janela aberta
Passa a noite inteira em pé.

28. Sente vacilar a fé –
Vê no povo seu algoz
Recorda do Padre Amaro
Lá em Eça de Queiroz 2
Olhos sem sono e sem brilho,
Pensa na mulher e filhos,
Que terão futuro atroz.

29. Murmúrios a-meia-voz
Já ouviu a seu respeito,
Que ele, Padre José,
‘Apesar de bom sujeito,
Nem devia dizer missa
Pois tem caso c’a mestiça
E isso não é direito.’

30. A coisa ficou sem jeito
Somente meses depois.
Já corria o ano de
Mil novecentos e dois;
Estando em Coroatá,
O sacristão do lugar
A situação lhe expôs.

31. O coroinha lhe pôs
A par do que tinha ouvido.
Que o seu caso com Rosa
Já era fato sabido
Na Capital do Estado,
Até o bispo prelado
Sabia do sucedido.

32. O padre vê-se perdido,
O desespero o domina
Vai perder suas funções
Vão lhe tirar a batina.
Ele sabe, não se engana
A misericórdia humana
Não tem a ver com a divina.

33. Rosa Néri logo atina
Com a sensação do perigo
O padre já não conversa
Ensimesma-se consigo...
Sai ela do anonimato
Encara de frente o fato
Sem temer qualquer castigo.

34. Ela deixa seu abrigo
Abandona os bastidores
E vai cuidar que o padre,
O alvo de seus amores,
No auge da depressão,
Não vá ceder à pressão
Dos pérfidos traidores.

35. Seu mundo já não tem cores,
Pois vê que seu protetor,
O pai de seus cinco filhos,
Seu amante, seu amor,
Não suporta a traição
- Entregue à depressão –
É o retrato da dor.

36. Ele mesmo confessou
Que da Sé, da Capital,
Vem a São Luiz Gonzaga
Comissão episcopal
Pra julgar sua conduta
Enfrenta íntima luta
Que lhe abate a moral.

37. Na casa paroquial
Ela vai fazer vigília,
Vigia os passos do padre
Diz que pense na família
Que tanto não se consuma
Publicamente assuma
A ela, filhos e filhas.

38. O olhar dele até brilha
Porém só por um segundo,
E volta à letargia
De quem já deixou o mundo
Ela toca ainda nele
Todavia vê que ele
Já cai num sono profundo.

39. Ela lembra do seu mundo –
Criança, em Barra do Corda...
E, exausta, adormece;
Só na madrugada acorda;
Sente a falta do amado...
Vai encontrá-lo, enforcado,
Suspenso por uma corda.

Josafá Bonfim aborda
O caso, com muito tato.
A nossa Igreja Romana
Quando impôs o celibato
Uma coisa só previu
Impedir pensão civil
Mas, eis aí o retrato.



____________________
1. “SANZAGA” – Resgate de uma História
Autor. Josafá Bonfim. Edição do Autor. 2004, São Luís-MA

2. O Crime do Padre Amaro. Romance do escritor português Eça de Queirós. Conta a história de jovem sacerdote, Amaro, em Leiria. Lá conhece ele vários tipos de tentações, uma das quais é a beata Amélia, com quem Amaro acaba tendo um envolvimento amoroso, proibido diante da "fé divina" e sociedade.



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