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Contos-->OH, MY GOD! -- 05/10/2000 - 21:51 (Luiz Paulo Pieri) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos





OH, MY GOD!


Luiz Paulo Pieri


Todos os personagens deste livro são fictícios e qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas, terá sido mera coincidência.
Alguns lugares aqui descritos existem verdadeiramente e alguns foram citados com seu nome verdadeiro. No entanto, os fatos acontecidos são frutos, única e exclusivamente, da imaginação do autor.


Esta é uma estória para aqueles que acreditam que a ficção científica, por mais absurda que seja, pode vir a ser um dia uma feliz ou uma triste realidade.


"Nunca ande pelo caminho traçado, pois ele conduz somente até onde os outros foram."
( Alexandre Graham Bell )




Sumário

PARTE 1- A BUSCA

1 - Sozinhos no Infinito
2 – O Pequeno Ateu
3 – Sonhos de Escritor
4 – Lições de Astronomia
5 – Experiências Angustiantes
6 – A Mudança
7 – Um Astrônomo de Carreira
8 – Angela
9 – Viagem interrompida

PARTE 2 – A VIAGEM
10 – O Fim do Mundo
11 – Espanto e Medo em Alto Paraíso
12 – A Constatação do Fim
13 - A Odisséia Espacial

PARTE 3 – O ENCONTRO
14 - Primeiro Contato com God
15 - Oh, My God!
16 - Alganor, o Inferno de God
17 - O Arrependimento
18 - O Perdão de God



1

SOZINHOS NO INFINITO

- Arthuzinho, sai da beira do trilho, que o trem já vai passar, meu filho. Tá na
hora do almoço dos homens, menino.
Esta era Dona Almerinda Conceição da Costa, mulher do meu paí e mãe do menino
que trabalhava de levar almoço para os mineiros na Mina do Canto. Um buraco profundo sobre a terra que continuava num túnel estreito e sombrio por baixo da crosta, onde os mineiros escavavam carvão mineral que depois de lavado e beneficiado se transformava na principal fonte econômica da cidade em que morávamos.
Minha mãe era uma heroína viva que conseguira criar seus dezenove filhos sem nunca ter deixado qualquer um deles passar fome.
- Mãe, tem estrelas novas hoje no céu. Aquelas ao lado de Siriús, são as Plêiades.
Dona Elza me disse.
- Não aponta para as estrelas menino! Dá verruga nos dedos. Sai desse frio e vem para dentro.
Este era eu tentando contar as estrelas do céu. Cada dia procurava aumentar a quantidade das que eu contava. Nunca consegui passar de mil. Mas todo dia que o céu tivesse estrelado, ali estava eu tentando contar mais de mil. Começava sempre pela constelação Cruzeiro do Sul até contar a estrela Vênus.
- Vênus não é estrela seu burro. É planeta.
Esta era Celina, minha irmã metida a sabida, porque já estava no quarto ano da
escola. Ela era um ano mais velha que eu e vivia tentando se impor a mim.
- Arthuro, papai disse que você tem que me obedecer porque eu sou a mais velha,
insistia.
Ela era tão chata que, as vezes, para me humilhar para os outros garotos, me
obrigava a pegar em sua mão para atravessar a rua e aquilo me irritava a ponto de, algumas vezes, ter que lhe dar uns tapas. Quando chegava em casa apanhava da minha mãe e ainda ficava de castigo.
Eu tinha apenas 9 anos e já era um profissional almoceiro que ganhava cinquenta
cruzeiros por mês. Dava para comprar um par de tênis, se não tivesse que dar para
ajudar nas despesas da casa. Os poucos trocadinhos que me sobravam, comprava revistas especializadas em astronomia ou livretos de contos de ficção científica. Sempre fui diferente dos garotos da minha turma. Não gostava de jogar bola, nem das correrias que eles inventavam pelos becos da nossa rua.
Quando a primeira estrela apontava no céu, anunciando o anoitecer, recolhia-me a minha velha e surrada caminha, com um sôfrego colchão de palha, e folheava ansiosamente as revistas que havia comprado durante aquele dia. Deslumbrava-me com as lições sobre a posição dos astros, as descobertas de novos planetas, estrelas ou galáxias no universo e então adormecia sonhando com o dia em que pudéssemos alcançá-las.
Não resignava-me, de forma alguma, em aceitar que toda a grandiosidade, que existia além da terra, servisse apenas para a contemplação dos seres humanos. E as vezes meditava profundamente sobre que espécie de divindade teria construído tudo aquilo e porque não permitia que, nós terráqueos, as explorassem.
Deus e o Universo foram as duas coisas que sempre me intrigaram profundamente.
Vivia questionando o porque da extensão incalculável do universo, se não passava de um vazio enorme e sem vida, até então, descartada a existência de qualquer forma vivente em todos os seus quadrantes.
- Quem sabe onde fica a Via Láctea?, perguntava dona Elza, minha professora
primária.
Rapidamente levantava o dedo e punha me de pé orgulhoso e dizia:
- Fica no Céu. A Via Láctea é a nossa galáxia. Ela tem mais de 100 bilhões de
estrelas e eu até agora só consegui contar mil.
As garotas da sala me olhavam furtivamente e via algumas comentarem:
- Ele é metido a saber de tudo, dizia Marina.
- Mas é almoceiro. Minha mãe disse que quem é almoceiro é porque é muito
pobre, emendava Gladis, a menina de olhos azuis do lado.
- É só porque ela é filha do seu Ageu. Ele é rico sabia?
Esta era Aninha. Uma garota mirradinha que dizia prá todo mundo gostar de mim.
- Sabia. Ele é o dono da casa onde você mora e se o seu pai não pagar o aluguel atrasado ele vai expulsá-los de lá, intervia logo Cesário, um garoto sardento e que usava uns óculos de fundo de garrafa que o tornavam a gozação da turma da sala.
Mesmo não querendo que fosse, Aninha sempre ia contar estrelas comigo. Mas
Sempre que ia, só conseguia contar até cem. Pouco tempo depois ela começava a bocejar e ia embora prá casa. Eu permanecia ali, estupefato, observando o céu, até que minha mãe viesse me buscar e, forçosamente, levar-me para casa.
Nesta época minha convicção era de que a Via láctea tivesse apenas cerca de 100
bilhões de estrelas, quando, hoje, já se sabe serem elas mais de 400 bilhões. São números assustadores e para alguns inconcebíveis, visto que há constatação de que algumas delas podem ser até milhões de vezes maior que o nosso sol.
Pensava no porquê dos astros celestes parecerem tão próximos, quando, na verdade, eram todos inalcançáveis ao ser humano.
Veio o ano de 1969 e as imagens dos astronautas pisando o solo lunar trazia espanto e medo a população. A maioria dos habitantes de minha vila não acreditou que aquilo estivesse realmente acontecendo. Diziam que era mais uma armação dos americanos. Mas eu, cada vez mais deslumbrado, via naquele momento, até então impossível para a humanidade, um grande início para a desvendação dos mistérios cósmicos que sempre desafiaram a imaginação humana.
- Quando crescer vou ser astronauta, para poder estudar melhor todos os pontos
brilhantes que cintilam no céu a noite, dizia sempre para Cesário, que também era o meu melhor amigo.
- Mas, para estudar as estrelas tem que ser astrólogo, retrucava ele, tentando
mostrar ser mais sabido que eu.
- Não é astrólogo. É astrônomo. Intervia logo Celina, provando ser realmente a mais sabida de todos.
Fitava as estrelas com nostalgia e sonhava com a imensidão do espaço, imaginando, se existisse Deus, como seria ele, que conforme diziam, era o articulador de toda aquela grandiosidade.
- Deus é uma entidade gigantesca que mora no espaço e com uma de suas mãos
segura o nosso planeta. Imaginava Aninha, alegando também que quando Deus mexia a mão esquerda aconteciam os terremotos.
- Quando ele fica gripado e espirra muito, aí vem as tempestades, os furacões e os
redemoinhos, completava.
- Mas no Brasil não temos terremotos, furacões e nem redemoinhos, retrucava,
tentando desclassificar sua versão sobre o criador.
- Acho que Deus só existe para uma parcela da humanidade. Para aqueles que
tem minas de carvão, fábricas de azulejos e muitas casas para alugar para os outros, desabafava, inconsolado pelo aluguel atrasado e as ameaças de despejo que muitos dos meus vizinhos ouviam do seu senhorio.
Reginaldo Pfteuzenryter e Ageu Dalfovo eram donos de quase toda a vila onde eu morava. Apenas a nossa casa e três ou quatro outras não eram deles.
Eram dois homens brutos, frios e insensíveis que não queriam saber porque o mineiro, muitas vezes, não tinha dinheiro para pagar o aluguel em dia. Certa vez, um deles, dirigindo um caminhão basculhante, pegou todas as coisas de um inquilino e jogou-as no depósito de lixo da cidade, porque este estava com o aluguel atrasado dois meses.
- Se existir inferno estes aí já estão batendo na porta, pensei comigo, imaginando
que tanta maldade não poderia vir de um ser humano.
E o pior é que estes crápulas eram os primeiros a chegarem na porta da Igreja para a missa dominical.
Com apenas 10 anos de idade, fui proibido, pelo padre de nossa paróquia, de entrar na Igreja, porque, certa vez, durante um dos seus sermões sobre a bondade de Deus, perguntei-lhe se ele só era bondoso com o Reginaldo e com o Ageu e por isso tinha lhes dado tantas casas, enquanto a maioria não tinha sequer um casebre para abrigar sua família, enquanto trabalhavam, duramente, nas minas de carvão da cidade.
- Este menino tem parte com o coisa ruim, dizia aos passantes quando me encontrava. Mas nunca teve ousadia de responder a pergunta que lhe fiz em pleno sermão dominical.


2 O PEQUENO ATEU

Meu pai tinha uma casa que ele mesmo fizera de tábuas e coberta com telhas de
barro, num terreno próximo a um grande depósito de pirita. Parecia um casarão abandonado, mas seu interior abrigava uma família numerosa e feliz.
Pirita era um resíduo do carvão mineral que quando queimado soltava uma enorme quantidade de gases insalubres que sufocava e fazia um mal terrível ao aparelho respiratório das pessoas.
Nessa época eu ainda não entendia muito bem o que era proletário. Mas sempre ouvia meu pai dizer que os proletários deveriam se unir se quisessem ter uma vida melhor.
Lembro das reuniões que fazia em nossa casa a noite, na qual iam muitos mineiros e operários das fábricas de azulejo da cidade.
- A situação está cada vez pior. Agora acabaram com nossas horas extras e
retiraram nosso adicional de insalubridade, discursava meu pai.
- Precisamos nos organizar, bradava um mineiro.
- Vamos entrar em greve, diziam outros.
Ouvia tudo atentamente sem, no entanto, entender a linguagem deles. Não entendia bem o que era greve. Só lembro que da última vez que fizeram uma greve muita gente ficou sem emprego. Foram despedidos da Mina do Canto e impedidos de trabalharem em qualquer outra mina de carvão da cidade.
Por isso ficava com muito medo, quando meu pai fazia aquelas reuniões e falavam em greve, pois conhecia o destino dos que se opunha aos patrões. Muitos viravam alcoólatras e viviam a mendigar pelas ruas da cidade. Eram tão massacrados pelos ex-patrões que perdiam toda a dignidade.
Sentia nas noites mornas e acaloradas do verão do sul, quando punha-me a fitar as estrelas, que a vida não podia ser um simples passar pelo plano terrestre, nem uma sofisticada desconcentração na linha ríspida do universo, espelhada no conceito existencial de nascer, crescer e depois morrer.
Acreditava, do fundo da alma, que havia uma razão muito maior, uma inconfundível destinação para se estar aqui e agora, num lugar qualquer de um espaço infinito, cujas fronteiras eram inconcebíveis a filosofia terrestre.
- Aninha, você acredita em ET?
- O que é um ET?
- ET são os seres escolhidos por Deus para viverem em lugares bem melhores. Em
outros planetas, onde não há fome, miséria e nem exploração. Os ETs são criaturas que vivem em harmonia e dividem tudo o que tem.
Esta era uma forma de eu desabafar minha revolta com a exploração que os donos das minas exerciam sobre os mineiros.
Querendo imitar meu pai, também reunia meus amigos em minha casa a noite para conversar sobre coisas que ouvia nas reuniões dos mineiros, mas sempre acabava transformando o encontro em aulas de geografia e astronomia. Fazia mapas do céu com lápis e tinham orgulho em mostrar a meus amigos o pouco que sabia sobre o sistema solar e a nossa galáxia.
- Embora o ser humano ouse cada vez mais se aventurar na desvendação dos
segredos cósmicos, ainda é muito pequena a jornada até aqui empreendida, explicava para eles.
- Mas, o homem já foi na lua. Isso é um grande passo para a humanidade,
retrucava, Cesário.
- Sei disso e por isso cada vez mais continuo achando que deve haver uma razão
maior para vivermos num planeta chamado terra...
- ... Um corpo celeste minúsculo, se comparado a bilhões de outros que brilham na vastidão universal, completava Celina, tentando mostrar a todos que também tinha sua própria opinião sobre as coisas que muitas vezes acirradamente discutíamos nas reuniões amenas que realizávamos.
Disse amenas, mas no fim sempre saíam brigas terríveis, como a que deixou Gladis
cheia de manchas roxas, quando tentou impor-nos que quem tivesse dinheiro seria o dono do universo.
Minha mãe se desesperava com o meu ateísmo. Principalmente ela que tinha recentemente se convertido à Igreja Evangélica Assembléia de Deus, a qual pregava um Deus rígido, rigoroso e que preparava um destino cruel e terrível para aqueles que não seguissem a risca todos os seus mandamentos. Ela com as interpretações bíblicas que lhes condicionavam os evangélicos se fechara em si, como se mais nada existisse no mundo. Coitada tinha sido mais uma vítima da ignorância religiosa que pregava Deus como um ser terrível, vingativo e que reservaria castigos inimagináveis para os seres humanos que não lhe fosse totalmente puros.
Aí é que as coisas pioraram. Então, com apenas 10 anos, teria que seguir na marra suas determinações e por isso várias vezes tive quer ir ao culto evangélico com ela. Ia forçado e não agüentava ficar uma hora ouvindo a gritaria que faziam dentro do templo. Aquilo me atormentava muito e eu cheguei a pensar em fugir de casa. Ir para qualquer lugar em que não fosse obrigado a ouvir coisas que para mim eram puras baboseiras.
Minha convicção era de que Deus era fruto da solidão do ser humano no espaço. Ao contemplarem as belezas universais, concluíam que deveria existir uma força superior que tivesse criado toda aquela maravilha. Eu também acreditava em forças superiores, mas condicionadas em outras raças alienígenas que provavelmente serão muito mais avançados que nós e devem ter tecnologia tão desenvolvida que comparada a terráquea seria o mesmo que um homem das cavernas ver de repente surgir a sua frente um avião a jato.
Para mim viver era um milagre, como se algo ou alguém, que não o Deus opressor dos templos frios e luxuosos, influísse diretamente na vida de cada um de nós. Pensava, seriamente, que a vida não poderia ser apenas um simples passar de planos, que uma simples existência terráquea.
Estes questionamentos sobre a existência humana me levavam, embora muito pequeno ainda, a meditar profundamente e afundar-me em leituras que mesmo para um adulto já seriam um pouco pesada.
Foram questionamentos que se tornaram cada vez mais freqüentes em minhas meditações e me faziam buscar nas definições que alguns grandes nomes da nossa filosofia davam a existência, um consolo e uma aceitação.
Demócrito acreditava que tudo seria feito de átomos, inclusive a alma. Platão pregava que a pessoa era composta de um corpo físico, perecível, e de uma alma imortal e Descartes teorizava que o corpo humano era algo físico, porém, a mente seria espiritual.
Queria ter uma fé inquebrantável em Deus, como a minha mãe tinha. As vezes até conseguia mentalizar um Deus benevolente, mas isso sempre se dissipava quando me colocava de frente com o destino dos seres humanos pobres, humildes e explorados. A desgraça da miséria e da fome sempre me colocava em confronto com ele, principalmente porque sentia na pele as auguras da pobreza e da desilusão, notadamente, quando me confrontava com a vida miserável e sem esperanças dos trabalhadores das minas de carvão da cidade.
Por isso buscava, insistentemente, saber se haveria realmente uma desígnio maior para o ser humano, tão carente das coisas divinas e mergulhado na esperança de um dia ser redimido pelo criador. As vezes imaginava se o criador não passava de um mito colocado na cabeça dos tolos para impor-lhes medo e respeito pelas igrejas e pelas religiões que se espalhavam pelo mundo. Ou, senão, tudo não passava de desespero e temor diante das vicissitudes que a vida a muitos reservava.
Não acreditava nos velhos chavões de céu e inferno, vida terrestre e vida eterna após a morte, nem tampouco na concepção espiritualista de que um só espírito poderia viver várias vidas. Concebia a vida como uma prerrogativa da capacidade de agregação de todas as coisas existentes no universo.
Tinha uma certa sublimação em descobrir o porque do ser humano ter alcançado tão elevado grau de evolução diante das outras criaturas terrestres, enquanto milhões de outros seres, dividindo o mesmo espaço, sequer conseguiram sair de seu estado de submissão e dependência, e porque a própria evolução humana se desdobrava em inúmeras versões, sem nunca se ter chegado a um consenso comum sobre a origem da vida no nosso próprio planeta.
Não entendia o porque das contradições históricas sobre o início da vida na terra, mas ficava sempre com a versão científica, porque, decididamente, achava a ciência mais humanizada que a própria religião. Ironizava comigo mesmo que se o homem acreditar na evolução das espécies, não pode, de forma alguma, aceitar a versão bíblica da criação, porque ela se contradiz plenamente com a teoria darwiana.
Meu nome é Arthuro Conceição da Costa e depois de tudo o que me aconteceu,
transformei-me numa espécie de Monge Tibetano do Planalto Central. Depois das coisas incríveis que presenciei, nesta história que vou contar, abandonei tudo o que tinha na vida para meditar pelo resto dos meus dias sobre Deus e sobre sua mais sublime criação.
Durante quase toda minha vida fui um ateu confesso e regozijava-me em desmentir a existência de Deus. Como astrônomo profissional sempre procurei espalhar a lógica científica acerca do Criador. Lógica que negava veementemente sua existência.
Daqui em diante minha narrativa será solitária. Porque, pouco tempo depois, pela minha teimosia em não acreditar em Deus, meus amiguinhos foram sendo afastados de mim pelas suas famílias.
Lembro, com nostalgia e as vezes com fascinação, do cheiro inconfundível da pirita, resíduo do carvão mineral, transformada pelas cinzas do enxofre que exalava da grande quantidade de buracos que levavam a exploração deste valioso metal, em lugares profundos, escavados pelas mãos humanas, e iluminados por fachos de luz produzidas pelo gás do carbureto, num lugar situado um pouco mais ao sul do equador.
Muitas vezes desci a Mina do Canto, para levar o almoço dos mineiros que moravam na minha rua e ouvia falarem de esperanças de um dia poderem melhorar de vida e da espera ansiosa pelo dia 15 para receber o tosco salário que mal dava para suprir as necessidades alimentares de suas famílias.
Recordo, também, do céu lúgubre das tardes das quartas feiras, quando os restos de pirita depositados ao céu aberto espalhavam um odor terrível e enojado, que machucava as narinas dos mais fracos. Dos buracos cavados por sobre a terra, numa sucessão de túneis intermináveis que iam de encontro ao precioso minério.
Relembro, com precisão, das procissões solenes, nas manhãs ensolaradas e frias, quando centenas de mineiros prostravam-se em frente a minha casa a espera do trem que os levaria até as várias minas de carvão existentes naquela cidade sulina, construída por cima de buracos profundos e de uma sucessão de túneis sombrios que geralmente acabavam em ricos filões do valioso minério.
Eram homens fortes, robustos, mas com pouco tempo trabalhando nas minas de carvão, tornavam-se sofridos e desgastados pelo mal que lhes causava o resíduo do carvão, a substância chamada pirita, que se encontrava no carro forte da economia da cidade.
Doía-me, pesadamente, na alma, saber que meu pai e meus irmãos faziam parte daquela trupe desesperançada, que tinha na exploração do carvão o único meio de sobrevivência e amargavam o desprezo que a elite insana lhes impunha para a exploração das riquezas escondidas no subsolo da região.
Vejo ainda as casas simples, construídas de tábuas beneficiadas, contrastando, grotescamente, com as mansões de concreto, com seus detalhes parnasianos, onde residiam os donos e os capatazes das minas.
Eram pessoas opulentas e insensíveis, para quem o mundo tinha sido criado somente para elas e para quem o resto era apenas um detalhe que lhes garantiam a elevada posição econômica que sempre buscaram sustentar. Pessoas que praticavam, em nome de uma falsa concepção cristã, uma caridade hipócrita, como a distribuição de cestas básicas para as famílias de seus empregados, enquanto degustavam vinho francês e caviar.
Acompanhava tudo com tristeza e dor, pois não concebia razão lógica para aquilo e questionava, amarguradamente, porque tudo acontecia tão rapidamente para aquelas pessoas, que não tinham mais esperanças. Via, de perto, o quanto sofriam com a exploração dos donos das minas. As diferenças sociais gritantes, que transformavam homens em burros de cargas, me deixavam transtornado e cada vez mais estupefato com a estupidez humana.
Tinha agora 12 anos de idade e já encarava de frente a dura realidade do trabalho insano a que se submetiam milhares de homens, mulheres e crianças. Era eu agora um lavador de carvão. Ficava no final de uma enorme calha de água, separando as pedras maiores e também as que tinham mais consistência.
Enquanto meus amigos de infância divertiam-se jogando futebol e brincando de pega-pega, eu vivia fechado em casa, lendo muito, como se buscasse uma forma para driblar a dura realidade.
Um dia, peguei um livro que meu pai carregava sempre consigo e descobri que era de um tal de “Bertold Brecht”, comecei a folheá-lo e a me interessar cada vez mais por ele. Tinha um poema intitulado “Perguntas de um Trabalhador que lê”, o qual li muitas vezes porque parecia me confortar. Ele dizia: “Quem construiu a Tebas de sete portas? Nos livros estão nomes de reis. Arrastaram eles os blocos de pedra? E a Babilônia varias vezes destruída? Quem a reconstruiu tanta vezes? Em que casas da Lima dourada moravam os construtores? Para onde foram os pedreiros, na noite em que a Muralha da China ficou pronta? A grande Roma esta cheia de arcos do triunfo. Quem os ergueu? Sobre quem Triunfaram os Césares? A decantada Bizancio. Tinha somente palácios para os seus habitantes? Mesmo na lendária Atlântida, os que se afogavam gritaram por seus escravos, na noite em que o mar a tragou. O jovem Alexandre conquistou a Índia. Sozinho? César bateu os gauleses. Não levava sequer um cozinheiro? Filipe da Espanha chorou, quando sua Armada naufragou. Ninguém mais chorou? Frederico II venceu a Guerra dos Sete Anos. Quem venceu alem dele? Cada pagina uma vitoria. Quem cozinhava o banquete? A cada dez anos um grande Homem. Quem pagava a conta? Tantas historias. Tantas questões”.
Não sei se era porque a burguesia me incitava, ou se era a minha fixação pela literatura proletária, que me fazia sofrer muito com a situação social dos trabalhadores da minha terra, e também do país, porque não me entrava na cabeça tantas disparidades sociais.
A burguesia insana do carvão também me lembravam uma citação de Voltaire: “Os homens devem ter corrompido um pouco a natureza, pois não nasceram lobos e acabaram se tornando lobos”.
Sonhava, um dia, sair dali, buscar novos horizontes, quebrar a tradição operária da família. Via-me no futuro como um sujeito totalmente diferente de meus irmãos, com um emprego digno, com um diploma, pendurado na parede e com as pessoas da cidade trazendo seus filhos para meu consultório. E, então, sonhava com uma vida melhor, em um lugar aprazível, perto do mar, longe do odor nauseabundo da famigerada pirita.
Pensava ser médico. Queria estudar e tornar-me alguém, sair daquele destino triste que era reservado aos mineiros: trabalhar durante quinze anos com uma picareta na mão cavando túneis sombrios em busca do carvão e pós quinze anos de dura labuta, aposentar-se ganhando uma miséria de salário mínimo que, a partir daí mal daria para pagar os medicamentos que seriam necessários para tratar a doença que os longos anos de convivência com a pirita causava.
Era um mal terrível chamado pneumoconiose, doença incurável que apodreciam os pulmões dos mineiros e colocava-os a mercê de tratamentos caríssimos para poderem viver um pouquinho mais.
Mas foi também com esta convivência que aprendi alguns valores que até hoje mantenho comigo. O valor do trabalho incansável, da honestidade, da pobreza com resignação e do respeito a dignidade humana.
Mas como nada dura para sempre, em 1973, a opulência começou a decair com a escassez do precioso minério. Esgotaram-se as reservas de carvão e apenas grandes buracos vazios foram sendo deixados para trás. Os ricos aumentaram suas fortunas e, em contrapartida, a cidade tinha agora milhares de miseráveis que sequer podiam contar com a boa ação das madames com suas cestas básicas. A elite, ainda com suas reservas financeiras, guardadas nas Ilhas Cayman, mudou-se da cidade, foi para outros pontos ainda onde existia carvão, mas antes deixavam casarões de concreto enormes, revestidos de mármore e jardins artificiais com cegonhas de porcelana importadas da indonésia, abandonados e contrastando, com sua opulência, com a miséria que também haviam deixado no lugar. As mansões altivas e alvissareiras, de longe, parecia um acampamento norte americano num paízinho do terceiro mundo.
Mas, enfim, eles foram embora, para lugares de mares de águas esverdeadas, areias brancas e aprazíveis, deixando uma cidade esburacada, poluída, com uma população adoecida pelos resultados da riqueza que somente alguns levaram, deixando a miséria, a solidão e a tristeza com a cidade que um dia lhes deixou ricos. O desemprego se tornou gritante e a fome passou a bater ás portas das casas dos mineiros, desenhando um quadro dantesco de desumanidade, aflição e tristeza.
E eu também tão pobre quanto qualquer um deles, sem qualquer perspectiva de uma vida melhor naquele lugar. Queria ir embora, buscar novos horizontes, mas não tinha para onde ir. Ademais, ainda era apenas um pré-adolescente, prestes a completar os 14 anos de idade.
Olhava o céu como se buscasse uma esperança ou encontrasse uma inspiração para burlar o destino que me estava reservado.
Não entendia o que era ser precoce, mas me chamavam assim na escola, porque aos 12 anos já havia lido Crime e Castigo de Dostoievisk e os Miseráveis de Victor Hugo, através dos quais comecei a entender um pouco mais do que era a exploração da miséria humana e porque o homem em sua ganância não aceitava dividir suas riquezas mas, ao contrário, utilizava-a para explorar ainda mais seus semelhantes. Tudo isso humilhava e desolava a ponto de me levar a não acreditar mais na humanidade. Passei a rotular toda a criação como imperfeita e Deus uma fraude religiosa, porquê não conseguia aceitar a lógica de que uns poderiam ter muito e outros sequer o suficiente para sobreviver.
De tanto ver prosperar a iniquidade e de tanto ver triunfarem os ricos e perderem o pobres, aos poucos fui me tornando aquilo que Aristóteles definiria “E os que foram maltratados e acreditam que foram maltratados são terríveis, pois estão sempre em busca de sua oportunidade”.
Desolado, buscava vingar minha pobreza. Não resignava-me, de forma alguma, com a situação a que havíamos chegado. Desesperava-me em buscar saídas para minha família que agora sequer o miserável salário de mineiro tinham.
Vivia sonhando com seres extraterrestres que um dia viriam do espaço sideral e mudariam toda aquela situação. Via vida em abundância espalhada por bilhões de planetas da Via Láctea e do restante do universo. Concebia, imaginativamente, um espaço, em que as estrelas cintilantes eram formas de vida inteligentes e que se sustentavam com a admiração que nós terrestres tínhamos por elas.
Em que pese, nesta época, ser moda negar religiosamente a existência de vida extraterrestre tornava-me cada vez mais convicto de sua existência. Acreditava profundamente que não viveríamos no universo apenas para contemplar a poeira das estrelas e por isso seguia a máxima de Voltaire de que ‘’A ignorância afirma ou nega veementemente; a ciência duvida.’’ Então, seguia meus instintos de ser pensante e de alguém que buscava na ciência a explicação para o vazio universal. Parecia querer conceber uma esperança vinda do espaço sideral. Esperava um milagre, na aterrissagem de uma espaçonave que trouxesse aos homens da terra lições de igualdade e justiça, de paz e harmonia e de bondade e compreensão. Mas tudo parecia cada vez mais distante desta sonhada realidade.


3
SONHOS DE ESCRITOR

Há poucos quilômetros da cidade, ficava a praia, um lugar conhecido como Rincão, onde ainda, dunas de areia gigantes tornavam o lugar paradisíaco e onde o mar se rompia, formando pequenas lagoas nas quais as crianças nadavam e brincavam, alheias ao sofrimento e a amargura que acompanhavam os pescadores locais.
Também havia um arroio – pequeno riacho - que dividia o lugarejo onde ficava a praia e despejava crustáceos e frutos do mar, trazidos de longas alturas do oceano e depositando-os, em suas margens, contribuía para a alimentação e a subsistência de uma população de cerca de 15 mil pessoas, todas trabalhadores, marisqueiros e pescadores artesanais.
Vislumbrei no Rincão, uma oportunidade de começar uma vida nova e uma forma de garantir o sustento de nossa família.
Poderíamos viver do que nos desse o mar e então convenci meu pai a vender a tosca casa de madeira que tínhamos e mudamos para o Rincão, onde compramos uma casa de cinco cômodos, com um quintal imenso onde se poderia cultivar uma boa horta e também um bom pomar.
Foi ali que comecei a desenvolver minhas habilidades de escrever e acabei escrevendo meu primeiro livro: um poema épico chamado “Os Brasíliadas”. Como admirador de Camões e dos Lusíadas quis, então, contar a saga dos Descobridores e colonizadores do Brasil em Versos. Assim, consegui transformar minha ânsia literária num enorme calhamaço de papel amassado e escrito com tinta azul, vermelha e preta, além de alguns trechos a lápis. Lembro que em certa época dei uma parte do livro para a diretora do meu colégio ler e revisá-los e ela nunca me devolveu a parte que tive que rescrever novamente.
- No mínimo, Dona Julia deve ter chegado em casa e jogado aquela montanha de papel com garranchos num canto e pensado que eu era apenas mais um pequeno idiota achando que poderia escrever um livro, imaginava.
O poema, “Os Brasíliadas”, era um chamamento a compreensão de uma nova versão histórica para a chegada da família imperial portuguesa ao Brasil e porque ela realmente se dera. Começava assim: “Ecoam na Europa os tiros, que de austeros fuzis saem, desfaz-se a densa neblina e vê-se, o destronar de reis que caem. E entre manchas de misturados sangues, vê-se a sombra do general que passa e tange, ao toque dos sinos que ribombam. Europa estava em mãos suas, Portugal e a Bretanha a exceção, mas um Rei quando conquista um continente, não quer deixar ou desistir de um só torrão. E por mares já dantes navegados, rei e corte fugindo a escravidão, do prepotente europeu conquistador, general do general Napoleão”.
Para mim que o escrevi era um baita poema épico, contando em seu primeiro verso a entrada do General Francês, Junot, em Portugal, situação que fez com que Dom João VI embarcasse para o Brasil com sua Corte e aqui se estabelecesse, tornando-se o senhor das terras que Cabral um dia avistou.
Embora nutrisse uma grande paixão pelo que escrevi, com o tempo esqueci-o e deixei jogado num canto da casa e desisti de tentar publicá-lo. Lembro que cheguei a mimeografar algumas exemplares, as quais distribuí entre professores e alguns colegas do colégio em que estudava. Mas tudo ficou por ali mesmo. Não conseguia impressionar-me com “Os Brasiliadas”, queria, no fundo, escrever sobre meu assunto predileto: ficção científica.
Sempre tive uma admiração muito grande por Galileu Galilei e li incontáveis vezes um dos seus textos mais famosos, porque sentia nele uma força impulsora incrível para buscar o novo, entender o incompreensível e tentar desvendar o até então impossível.
O texto “Tudo se move meu amigo” dizia: “Há dois mil anos a humanidade acreditou que o sol e as estrelas do céu giram em torno dela. O papa, os cardeais, os príncipes, os sábios, capitães, comerciantes, peixeiras e crianças de escola, todos achando que estão imóveis nessa bola de cristal. Mas agora nós vamos sair para fora, Andréa, para uma grande viagem. Porque o tempo antigo acabou, e agora é um tempo novo. Já faz cem anos que a humanidade está esperando alguma coisa. As cidades são estreitas, e as cabeças também. Superstição e peste. Mas, agora, veja o que se diz: se as coisas são assim, assim não vão ficar. Tudo se move, meu amigo. Gosto de pensar que tudo tenha começado com os navios. Desde que há memória, vinham se arrastando ao longo da costa, mas, de repente, deixaram a costa e exploraram os mares todos. Em nosso velho continente nascia um boato: existem continentes novos. E agora que os nossos barcos navegam até lá, a risada é geral nos continentes. O que se diz é que o grande mar temido é uma lagoa pequena. E surgiu um grande gosto pela pesquisa da causa de todas as coisas: saber por que cai a pedra se a soltamos, e como sobe a pedra que arremessamos. Não há dias em que não se descubra alguma coisa. Até os velhos e os surdos puxam conversa para saber das últimas novidades. Já se descobriu muita coisa, mas há mais coisas ainda que poderão ser descobertas. De modo que as novas gerações têm o que fazer. Em Siena, quando moço, vi uma discussão de cinco minutos sobre a melhor maneira de mover blocos de granito; em seguida, os pedreiros abandonaram uma técnica milenar e adotaram uma disposição nova e mais inteligente das cordas. Naquele lugar e naquele minuto fiquei sabendo: o tempo antigo passou, e agora é um tempo novo. Logo a humanidade terá uma idéia clara de sua casa, do corpo celeste que ela habita. O que está nos livros antigos não lhe basta mais. Pois onde a fé teve mil anos de assento, sentou-se agora a dúvida. Todo mundo diz: é, está nos livros, mas agora nós queremos ver com nossos olhos. As verdades mais consagradas são tratadas sem cerimônia; o que era indubitável, agora é posto em dúvida. Em conseqüência, formou-se um vento que levanta as batinas brocadas dos príncipes prelados, e põe à mostra pernas gordas e pernas de palito, pernas como as nossas pernas. Mostrou-se que os céus estavam vazios, o que causou uma alegre gargalhada. Mas as águas da terra fazem girar as novas rocas, e nos estaleiros, nas casas de cordame e de velame, quinhentas mãos se movem em conjunto, organizadas de maneira nova. Predigo que a astronomia será comentada nos mercados, ainda em tempos de nossa vida. Mesmo os filhos das peixeiras quererão ir à escola. Pois os habitantes de nossas cidades, sequiosos de tudo que é novo, gostarão de uma astronomia nova, em que também a terra se mova. O que constava é que as estrelas estão presas a uma esfera de cristal para que não caiam. Agora juntamos coragem, e deixamos que flutuem livremente, desancoradas e elas estão em grande viagem, como as nossas caravelas, desancoradas, e em grande viagem. E a terra rola alegremente em volta do Sol, e as mercadoras de peixe, os comerciantes, os príncipes e os cardeais, e mesmo o papa, rolam com ela. Uma noite bastou para que o universo perdesse o seu ponto central; na manhã seguinte, tinha uma infinidade deles. De modo que agora qualquer um pode ser visto como centro, ou nenhum. Subitamente há muito lugar. Nossos navios viajam longe. As nossas estrelas giram no espaço longínquo, e mesmo no jogo de xadrez, agora a torre atravessa o tabuleiro de lado a lado. Como diz o poeta: ‘’Ó amanhã dos inícios!...’’
Sentia no texto de Galilei que toda a busca de minha vida não seria em vão. Como ele diria, hoje é impossível encontrar novas formas de vida na Galáxia. Mas amanhã, amanhã, poderemos estar observando vias intergaláticas repleta de veículos, que viajam na velocidade da luz, para os mais inimagináveis pontos do universo, conduzidos por criaturas que um dia só encontrávamos em nossa mais fértil imaginação.
“A Praia é o lugar ideal para escrever meu tão sonhado livro de ficção científica”, pensava, imaginando que a maresia me reforçaria a inspiração.
Queria escrever sobre algo grandioso. Sonhava com um bester seller, algo que levasse as pessoas correndo as livrarias e que ganhasse a divulgação gratuita dos meios de comunicação.
- Basta colocar num papel, minha concepção das coisas universais, dizia a mim
mesmo, achando que a partir daí seria fácil encontrar alguém que se dispusesse a publica-la.
Tinha noção de que nesta época, sem dinheiro, era praticamente impossível editar um livro. Só se conseguiria com o apoio de uma grande editora ou arrumando um bom patrocinador. Eu não tinha ninguém e também não conhecia nenhuma editora. Assim, no fundo, concluía que escreveria por escrever, porque todas as tentativas que fiz acabaram indo para o lixo.
Mas mesmo assim, nunca entendi porque, não desistia. Para mim começar uma nova idéia era sempre um novo desafio, uma empreitada a qual então passava a me dedicar de corpo e alma. Escrever me ajudava a viver, a ter esperanças e a acreditar num amanhã melhor para mim e meus ente queridos.
Completei 14 anos e em grande parte deste período de minha adolescência tentei escrever alguma coisa e sempre fiz tentativas que se mostraram frustradas e agora, morando no Rincão, achei que havia chegado o momento, só que desta vez não iria escrever romancezinhos ou poeminhas fantásticos como já houvera feito das outra vezes e os quais nunca tive coragem de publicar.
Decidir escrever um conto de ficção cientifica, terrificante e assustador. Era um conto incrível sobre milhões de criaturas fantásticas que habitam o universo. Intitulei-o de “Em Busca de Deus” e meu personagem Breno Saada, era um cosmonauta anglo-soviético que, por sua vez, também era aficionado pelas maravilhas do universo e escrevera um conto fantástico denominado “O Devorador do Cosmo”, sobre um estranho objeto que encontrara no quintal de sua casa, que ficava próxima a cidade de Roswel, cidade norte americana famosa onde se supõe ter havido a queda de uma espaçonave tripulada e cujos condutores haviam sido capturados ou resgatados pela Nasa.
O objeto encontrado por Enzo era uma espécie de meteorito, com o formato de uma esfera metálica e que viria mais tarde a causar um grande pandemônio para toda a humanidade com a destruição da vida em todo o universo.
Queria causar impacto, tornar-me um segundo Isaac Asimov, mas minha imaginação tinha se tornado por demais limitada. Bastava ler o trecho que falava sobre a viagem cosmo-espacial de Breno. Não sei se convenceria alguém com tanto exagero, lembrando que já tinham escrito quase tudo sobre o inimaginável
Do Livro “Em Busca de Deus”: E, Breno, continuou a viagem através de Domeneda, esperando a vez de focalizar o século 29, conforme havia lhe prometido Fasus. Fasus era incompreensível, não haveria nada como referencial na terra ou com o que poderíamos compará-lo. Sua face exibia traços de todas as criaturas vivas que conhecia ou tivesse noticia. Seu semblante tinha a exuberância da aurora boreal e seu corpo mudava continuamente, sempre retomando traços inumanos e de animais que remontava épocas esquecidas pelos homens.
“Naquela imensidão espacial, no escuro da noite cósmica, Breno ainda lembrava de seu conto de ficção e ficava horrorizado, sentindo um medo profundo com a quantidade de corpos celestes que cintilavam em sua volta. Achava que sua imaginação fértil escondia um pouco de profecia ou de verdade e isto lhe causava temor, ao sentir-se só na imensidão das incontáveis galáxias que já havia percorrido com Fasus. Em certo momento, temeu ter buscado em seu personagem um oponente de Deus e arrepiava-se ao pensar nas tolices que escrevera sobre o devorador do Cosmos. Mas sabia Breno que sua intenção era colocar em choque o misticismo da criação. Queria impor ao mundo que o que era cósmico nada tinha de celestial. Não havia Deus, nem Satanás, tudo era obra imutável da natureza e das forças conjugadas do infinito”.
Algumas vezes pensei em parar com a história, achando que havia exagerado, principalmente quando citava o século 29. Admitia que nenhum ser humano poderia prever o grau de evolução da raça humana, no decorrer de um milênio. Mas retornei a lógica, recordando que há 10 mil anos atrás o homem já fazia história lúcida e ela é citada na própria bíblia. Não, não seria uma data ridícula, se levasse em conta que mil anos na terra pode representar apenas alguns minutos na imensidão do Universo.
Do conto de Breno Saada: “A coisa crescia numa proporção incontrolável e já havia tomado quase toda a cidade de Roswell. Ninguém entrava, nem saía. Um plantão permanente, das forças armadas americanas, do FBI e da Nasa, cuidava para que as pessoas não se aproximassem do objeto. Cada vez que crescia ela emanava uma espécie de energia aterradora que desvastava tudo em volta de 100 metros de sua área de expansão. Estava se tornando por demais assustadora, tanto que provocou a convocação de um simpósio mundial para discutir a origem e as propriedades da esfera metálica e instrumentos práticos para combatê-la.
... “A voz sombria que saia da Esfera, puxava Enzo para dentro, como se o hipnotizasse e o magnetizasse de forma que ele se arrastava cada vez mais para o seu interior.
...A Esfera já havia engolido toda a América do Norte e se expandia para o resto do continente, devorando tudo o que surgia a sua frente. Ela crescia assustadoramente e conforme ia crescendo absorvia tudo o que existisse em sua volta, até ela própria se transformar no próprio globo terrestre e continuar crescendo e inchando como uma enorme balão vazio que se estivesse enchendo de ar.
No interior da Coisa, Enzo também crescia de tamanho e tinha se tornado o condutor da Esfera que agora já alcançava a lua e a tragava para seu interior.
Enzo não sabia porque estava vivenciando tudo aquilo, mas parecia convergir para a eliminação cósmica de toda a criação, já que a esfera se expandia agora pelo sistema solar engolindo os planetas locais e indo em direção a outros pontos da Via Láctea. Passaram-se cerca de quatro meses terráqueos, calculou Enzo, sentindo profunda opressão e um medo aterrorizante que lhe fazia tremer as carnes.
...Aos poucos a esfera se aproximou das fronteiras da Via Láctea e continou se expandindo e assimilando tudo que estivesse ao seu alcance, até chegar as Plêiades, Sirus e o grande corredor de Sagitário”.
Do livro “Em Busca de Deus”: “Não são 400 bilhões de estrelas. São 400 bilhões de galáxias, as quais seriam dadas cada uma a cada habitante da terra, em 2.999 para que o universo fosse colonizado e meus filhos, então retornasse a seu berço natal”, disse Fasus, desta vez projetando sua face, em forma de gafanhoto, no planeta Srid, da terceira galáxia, entre a primeira e a Quarta tríade de escorpião. Numa olhada a esquerda, Fasus, fez surgir a cerca de dez milhões de anos luz, a imagem primeira, do nascimento do homem humano e disse furiosamente:
“No princípio era o verbo e do verbo se fez carne e a carne me foi ingrata. Fiz diferentes concepções de raças, formas de vidas das mais diversas e todas me fora ingratas. Terei que destruir tudo para purificar novamente minha criação. O ser humano deteriorou o limpo e contaminou as criaturas com seu lado desgarrador e conflitante. Foi dele que nasceu a Guerra, a discórdia e a ambição, Disse Fasus, mostrando um semblante profundamente amargurado, como se sofresse piedosamente com a extinção das raças que criara.
“Em sua Segunda viagem por Fasus, Breno vislumbrou a Galáxia de Andromeda, fixando-se num enorme planeta, o qual batizou de Tarântula por ter formas distorcidas e exibir rastros tentaculares em sua atmosfera. Depois de duas semanas vagando em volta do Astro resolvera descer, conforme orientação de Fasus. Havia um enorme desfiladeiro em volta da montanha mais alta do local em que Breno iria descer e de repente ouviu-se um estrondo terrível, anunciando a erupção de um vulcão em atividade. Mas não haviam vulcões no planeta, sua superfície árida e fina, deixava claro que sua crosta não mediria mais que 3 quilômetros de extensão, inclusive porque sua forma achatada não vislumbrava nenhuma chance de qualquer atividade vulcânica. Quando Breno chegou a superfície, constatou que a explosão vinha do encontro de correntes de ar com ventos fortíssimos que alcançavam centenas de quilômetros por hora. Ouviu um voz, serena, mas dura e grossa que dizia: “Fasus não é , não foi e nunca será o senhor supremo dos humanos, porque aqui se estabeleceu o império de seu oponente e somente ele aqui reinará. Aquele que pisar este solo sem permissão de seu senhor, implorará, em sua eternidade, a morte mais horrível ao invés de ter que suportar os horrores do castigo de Andanor”. Breno arrepiou-se e sentiu um baque violento na espinha como se estivessem dobrando suas costelas e resolveu ligar o dispositivo succional e sobrevoar o planeta ao invés de descer nele. De repente a escuridão se fez e cobriu toda a face externa de Andanor, deixando apenas a negra e indecifrável noite do lugar, tão aterrorizante que Breno implorou a Fasus que o tirasse dali. A imagem de Fasus, agora refletida na estrela Alchair não parecia real, presente, era como se fosse projetada naquele imensidão sem fim. Só lembro que era enorme, tão grande que encobria todo o céu ao alcance da vista”.
Meu livro era um conto fantástico que reunia em si outro conto ainda mais fantástico, contado pelo meu personagem. Mas nunca consegui terminá-lo porque imaginava que não teria coragem de publicá-lo, achando que tinha exagerado.

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LIÇÕES DE ASTRONOMIA

Foi no Rincão também que conheci meu grande amigo Franz Kopelck, um velho sessentão, aposentado como astrônomo do Centro Espacial de São José dos Campos-SP, pescador artesanal e obstinado pela cosmologia, pelo universo e pela busca de vida inteligente em outros pontos da galáxia e também de todo o universo.
A primeira vez que o vi, estava pescando numa plataforma que adentrava o mar, na zona sul do rincão. Ele puxava irritado sua rede de pesca que havia se emaranhado num cardume de bagres e eu ofereci-me para ajudá-lo a tirar os peixes que estavam enroscados nela.
- Esta foi uma boa pegada hein?, perguntei-lhe.
- Estes bagres são uma praga, quando se enroscam na rede, acabam com ela.
Tenho vontade de jogar tudo fora, disse, parecendo um velho ranzinza.
- Mas, com paciência, podemos tirar estes peixes. Meu pai uma vez também
pegou um cardume de bagres e queria jogar a rede fora. Eu fiquei a manhã toda tirando os peixes e no final constatei que só havia um pequeno rasgo em todo o malhão de mais de 40 metros, disse, tentando incentivá-lo a não jogar a rede no mar.
- Quem é você garoto? Nunca o vi por aqui.
- Eu sou Arthuro, moro atras da duna denga, depois da igrejinha, respondi,
afirmando-lhe ainda que havia me mudado para o rincão fazia apenas algumas semanas.
Duna denga era um duna de areia imensa que parecia ter sido cortada no meio, por isso a chamavam assim.
- Você gosta de pescar?, perguntou, olhando me de cima a baixo com um olhar
meio desconfiado.
- Adoro pescar, mas meu pai mão me deixa usar sua rede, nem sua tarrafa. Diz
me sempre que elas são seu ganha pão e tem medo de que eu deixe o mar levá-la, respondi, já me prontificando a ajudá-lo a desemaranhar a rede.
Inicialmente, ele pareceu meio desconfiado comigo. Parecia temer alguma coisa. Mas por fim cedeu e deixou-me pegar na ponta da corda para ajudar a puxá-la para fora.
Levamos cerca de duas horas para tirar os peixes da rede e naquele curto espaço de
tempo já fizera uma grande amizade com Franz. Conversava com ele como se o conhecesse há muito tempo.
- Sei que o senhor mora sozinho, mas por quê?
- Por favor, não me chame de Senhor. Franz, é meu nome.
- Está bem Franz. Onde estão seus parentes?
- Não tenho nenhum parente aqui. Todos ficaram na Alemanha. Nunca me
casei e vivo a 40 anos no Brasil, falou-me, olhando- me de forma piedosa e gentil.
Assim que iniciamos aquele diálogo, Franz pareceu querer desabafar comigo, parecendo querer contar-me toda a sua vida. Demonstrava-se magoado com alguma coisa. Carregava um enorme ressentimento, mas não conseguia saber de quê. De repente ele ficava completamente imóvel e dirigia apenas o olhar para o céu e balbucionava palavras, para mim ininteligíveis.
Quando a tarde caiu e as primeiras estrelas começaram a aparecer, com o brilho do luar, Franz apontou-me uma e disse:
- Está vendo aquela, é Próxima Centauri, a estrela mais próxima de nós depois do
sol.
Observei atentamente e não conseguia identificar a estrela e Franz, pacientemente, orientava-me a buscá-la entre dezenas de outras que a circundavam, até que pude perceber que havia uma estrela maior e mais brilhante que as outras.
Mas, como você sabe que aquela estrela é Próxima Centauri?
- Conheço uma a uma as estrelas do céu!
- Você é astrônomo?, perguntei radiante ao perceber que havia contatado alguém
que tinha a ver comigo. Eu também admirava as estrelas.
Lembrei-me de Aninha e de meus 9 anos quando com ela tentava contar as estrelas do céu.
- Menino, durante 40 anos de minha vida, vivi vasculhando os céus. Sou
astrônomo profissional. Agora estou aposentado.
- Você também tem admiração pelas estrelas?
- Sim, desde pequeno me deslumbro com elas, confessei-lhe.
Dentro de pouco tempo, Franz já estava fazendo-me um mapa do céu, desenhando-o
na areia. Pareceu-me que ele ficara entusiasmado em me conhecer, parecia muito solitário.
- Tenho um pequena biblioteca sobre astronomia, disse-lhe, procurando mostrar
que eu também era um aficionado pelos céus.
- Puxa! Você é um garoto esperto. Preciso levá-lo um dia a minha casa para
conhecer meus equipamentos de observação. Que tal ir lá amanhã pela manhã, convidou-me, entusiasmado.
- A que horas eu o encontro?
- As nove. Costumo levantar cedo, mas gosto de fazer uma caminhada pela praia.
Franz nasceu na Alemanha e tinha se naturalizado brasileiro e estava no rincão desde que se aposentara. Morava próximo a minha casa, num imenso casarão muito antigo, feito de madeira e com muitos cômodos, onde sozinho dedicava-se ao estudo da astronomia e divertia-se em mostrar aos moradores, com seu telescópio gigantesco a imensidão do céu.
Na manhã seguinte, acordei ansioso para ir a casa de Franz. Imaginava que ele, no mínimo, deveria ter um telescópio e quando cheguei em sua casa, assustei-me com o tamanho do aparelho que ele tinha. Era um telescópio astronômico, composto por lentes ultrapotentes que alcançavam anos luz no espaço e que ela havia herdado de seu avó, um brilhante astrônomo alemão e que já havia descoberto uma série de novas estrelas, supernovas , quasares e pulsares pelo infinito sem fim.
Ele ensinou-me muito sobre o sistema solar, a Via Láctea, o planeta terra e também sobre os corpos celestes que vagam errantes pelo espaço como os cometas, asteróides, meteoros e meteoritos.
- Arthuro, você um dia ainda será um grande astrônomo e irá ajudar a
humanidade a encarar sua existência de outras maneiras, dizia-me.
- As outras formas a que você se refere, é que os homens devem entender que a
existência não é fruto apenas das mesquinharias pregadas pelos homens da religião, retruquei.
Pareceu que Franz deu um pulo de espanto ao ouvir-me dizer aquilo.
- Também sou ateu, menino, mas você precisa aperfeiçoar suas colocações, não se
pode confundir ateísmo com blasfêmia, revidou, Franz, querendo dar-me uma
pequena lição.
- O que quis dizer é que a religião sempre buscou colocar a raça humana como
seres supremos do universo e únicos filhos de Deus. Isto é inconcebível sob qualquer ponto de vista, insisti, com Franz
- Arthuro, feliz é o homem que tem consciência de sua significação em todo o
contexto universal. Este planetinha que habitamos seria uma irrisória pedrinha perdida na Via Láctea, não fosse a constatação, até agora, de que ele é o único a abrigar uma coisa maravilhosa que chamamos vida.
- Não se pode dizer com muita convicção, porque até agora o homem apenas saiu
dos limites da terra no espaço sideral, disse-lhe tentando convencê-lo de que o ser humano ainda não tinha dado o grande primeiro passo na exploração espacial.
- O grande primeiro passo do homem foi dado quando pisou na Lua, replicou
Franz, demonstrando saber muito sobre o sistema solar e ter a confirmação exata de que ele, pelo menos, não teria qualquer planeta, lua, ou corpo celeste capaz de sustentar vida, ou ao menos, vida inteligente.
Ele fez despertar ainda mais meu interesse pela astronomia e com ele aprendi muita coisa sobre o assunto, o espaço sideral, a nossa Galáxia e especialmente sobre nossa pequena e conturbada terra.
- Arthuro, a terra, este esferóide oblato, que pesa 5 quatrilhões e 280 trilhões de
toneladas, é apenas um mísero grãozinho de areia, se a pegarmos como comparação das demais coisas universais.
- Esferóide oblato, o que é isso?
- É a forma do globo terrestre, disse-me, explicando anda que seu diâmetro
equatorial tem 12.756,799 km e o polar 12.713,828 km, apresentando portanto um ligeiro achatamento polar de quase 43 km, o que classifica a Terra como um "esferóide oblato", isto é, ligeiramente achatado nos pólos.
- Franz me deixava confuso com seus conhecimentos precisos sobre o nosso
planeta e deixou-me ainda mais surpreso quando fez suas colocações comparativas da terra com o resto do sistema solar.
- A terra tem cerca de 4,6 bilhões de anos e é o planeta mais interno que possui
um satélite natural, a Lua, cujo tamanho relativo ao planeta mãe (27,25%) é bem maior do que qualquer um dos outros satélites planetários.
- Não entendi o que você quis dizer com isso.
- Veja bem Arthuro, a maioria dos planetas do nosso sistema solar possui
satélites, ou luas, como a terra possui a Lua. Partindo desta comparação Lua/Terra o nosso satélite é proporcionalmente, cerca de 7,15 vezes mais volumoso do que o maior satélite do planeta Júpiter, Ganimedes, considerado um gigante pelas suas proporções, (3,82% do planeta mãe); 5,63 vezes o de Saturno, Titã (4,84%); e 2,23 vezes o de Netuno, Tritão (12,2%).
- Puxa e você sabe isto tudo de cor, falei, dando conta de que entusiasmava-me
por demais com seus ensinamentos e seu interesse pelo meu futuro na astronomia.
Mas , no fundo, sentia um grande vazio em saber que meus pais pobres como eram
não conseguiriam me colocar num curso superior, apesar de ser tudo o que almejavam para mim.
Franz, certa vez, disse-me uma frase que me chamou a atenção: ‘’Quanto menos inteligente um homem é, menos misteriosa lhe parece a existência.’’, ela para mim definia claramente a ignorância do ser humano que se contentava com a luz do sol da manhã seguinte e nunca em saber porque ela vinha todos os dias, após a negritude da noite, mesmo que na terra , as vezes, ficasse encoberta pelas nuvens.
Cada vez mais tinha em Franz um segundo pai, alguém que me cuidava e se interessava verdadeiramente por mim. Ele era uma pessoa muito solitária, não tinha nenhum parente vivo no Brasil e jamais pensara em um dia voltar a Alemanha para rever seus familiares que lá ficaram. Franz era um grande astrônomo e tinha muito orgulho em um dia ter sido chefe do instituto astronômico de São José dos Campos, em São Paulo.
Definitivamente, Franz havia me ensinado quase tudo sobre o nosso planeta. Ele detinha um conhecimento fantástico também de geografia e ciências. Entusiasmava-se em me falar sobre a Terra, colocando detalhes impressionante sobre ela, como ser o terceiro planeta do sistema solar a partir do Sol, o único conhecido a sustentar vida e que não tomou o nome de uma divindade mitológica; o quinto em tamanho, cuja Orbita se encontra entre Vênus e Marte.
- Com sua órbita elíptica em torno do Sol, a Terra dista dele, aproximadamente,
147 milhões de km no periélio e 152 milhões de km no afélio, o que nos dá um valor de 0,01672 de excentricidade orbital. Sua distância média do Sol, equivalente a uma "Unidade Astronômica", é de 149 milhões, 597 mil e 893 km, continuava.
Eu tinha algumas referências sobre o que Franz falava, só que ele usava uma linguagem, parece-me, puramente científica.
- A circunferência equatorial mede 40.076,6 km e a polar 39.941,6 km e a Terra tem, como seu ponto mais elevado, o monte Everest, localizado na cordilheira do Himalaia, entre o Nepal e o Tibete, com 8.848 m. A sua maior depressão, a fossa das Marianas, situa-se ao argo das ilhas do mesmo nome, no Pacifico Sul, com 11.033 m de profundidade.
Explicou-me, com paciência, que a velocidade orbital média da Terra é de 29,79 km/s (107.244 km/h), o que resulta num período de revolução de 365,242199 dias ou 365d 5h 48m 45,9936s que representam um ano trópico, tempo este em que completa a sua órbita de, aproximadamente, 940 milhões de km em torno do Sol.
Sentia-me cansado em ouvir tanta perfeição em suas declarações. Ele, ao contrário, falava incansável, querendo ensinar-me em um dia, tudo o que aprendera durante toda sua vida.
- Arthuro, o tempo necessário para que a Terra complete uma revolução orbital
em relação as estrelas "fixas" é denominado "ano sideral" e eqüivale a 365,25636122 dias solares médios ou 365d 6h 9m 9,61s. O movimento de rotação, relativo as estrelas, se faz em 23h 56m 4,091s (sideral) ou 24h 00m 00s (solar), O que eqüivale a uma velocidade de 1.671,36 km/h no espaço, de qualquer objeto que estivesse localizado no equador terrestre.
- Franz fez um a pausa e perguntou-me: você tem idéia do que representa a terra
diante do resto do cosmo?
- Não, respondi, afirmando que sabia apenas que, além dos movimentos de
rotação e revolução, a Terra sofre outros movimentos principais como o de "precessão dos equinócios" que se pode definir como a oscilação do seu eixo no espaço, formando um cone com raio de 230 27 cujo período é de 25.780 anos e o de "mutacão", causado basicamente pela combinada atração gravitacional do Sol e da Lua, com períodos de 18,6 anos. Devido à estas perturbações o plano do equador terrestre e o seu eixo de rotação giram lentamente no sentido retrogrado em torno do polo da eclíptica e o movimento resultante do eixo da Terra é um cone ondulado.
Franz olhou-me impressionado, ao perceber que eu também era um espécie de “decoreba”, quando se tratava de definições sobre o Planeta Terra. E continuei:
- A constituição da Terra é essencialmente rochosa. O seu núcleo, composto de
ferro e níquel em estado sólido, com uns 1.500 km de diâmetro, está envolvido por estes metais em estado liqüefeito por duas camadas de diferentes densidades, cuja espessura é de uns 2.100 km. Este centro metálico, conhecido também como "magma", corresponde a mais ou menos, 30% do volume terrestre. A seguir temos uma camada rochosa do uns 2.650 km de espessura revestido de uma crosta mais firme de uns 100 km, superposta por um invólucro endurecido de uns 5 km sob os oceanos e uns 20 km sob os continentes.
Com o desenrolar da nossa conversa, percebi o quanto me estava sendo útil as noites
em que ficava grudado nas revistas de astronomia, geografia e história, que comprava com o que sobrava dos 50 cruzeiros que ganhava por mês como almoceiro e depois como lavador de carvão.
- Você sabia que a superfície do nosso planeta tem uma área total de 510.934.000
km², dos quais 362.786.000 km² esta coberta por oceanos (71%) e 148.148.000 km² ocupados por terras (29%). Considerando-se os hemisférios, o norte tem 61% de oceanos e 39% de terras; o sul 81% do oceanos e 19% de terras. Como as superfícies cobertas por terras absorvem mais calor do que as de água quando expostas a radiação solar , por outro lado, perdem mais rapidamente este calor nos períodos noturnos, isto explica a razão por que, no hemisfério norte, o verão e o inverno são mais intensos do que estas estações no hemisfério sul, perguntava-lhe, ironicamente, em tom zombeteiro e Franz, apenas franzia a testa e ria gentilmente.
- Arthuro você só errou numa coisa. Não existe planeta terra, vivemos num planeta
água.
Quando Franz começou a falar sobre o sistema solar, eu me calei e passei a ouvi-lo mais atentamente, porque me interessava demais pelo assunto. Ainda não tinha muitas referências sobre ele, principalmente aquelas vindas de um pesquisador espacial e de um profundo conhecedor de suas verdadeiras dimensões.
Se Franz não me explicasse, nunca saberia que o sistema solar compreende o Sol e todos os corpos celestes que estão sob a sua influência gravitacional, exercida em todas as direções, até uma distância de 2,4 anos-luz.
Sabia que nosso sistema solar, compõe-se de 9 planetas, mas não tinha noção de que dele também faziam parte 33 satélites conhecidos, cerca de 50.000 asteróides, aproximadamente 1.000 cometas e incontáveis meteoritos.
Franz coadunava com as teorias de Kant, astrônomo que em 1755 formulou a mais aceitável teoria da origem do sistema solar chamada "Hipótese Nebular" na qual afirmava que há cerca de uns 5 bilhões de anos atrás, o Sol e os planetas se formaram de uma grande e rotativa nuvem de gás e poeira.
- Esta nuvem, situada num dos braços espiralados de nossa galáxia, começou a
contrair-se no espaço interestelar por efeito da força de gravidade entrando em colapso e girando cada vez mais rapidamente, formou um disco cujo centro tornou-se tão maciço, denso e quente que o seu combustível nuclear entrou em ignição formando uma estrela - o nosso Sol, explicou-me, afirmando ainda que a certa altura as partículas de gás e poeira circunjacentes se incorporaram no mesmo processo rotativo, contraindo-se por efeito da força gravitacional e desprendendo anéis que, em menor escala, formaram corpos mais pequenos como os planetas, orbitando o Sol presos pela força gravitacional dessa grande massa, assim também como os satélites que, por sua vez, entraram em órbita em torno de alguns destes planetas
Deslumbrava-me, com seu conhecimento e com suas revelações. Lembro que ele esbravejava e praguejava muito quando se referia á religião católica, afirmando que foi ela que mais perseguiu aqueles que buscavam desvendar os segredos do universo.
- Arthuro, foi a Igreja que durante séculos, notadamente à época da inquisição,
matou friamente centenas de pessoas que foram, impiedosamente, queimadas vivas, garroteadas ou guilhotinadas, simplesmente por suas idéias avançadas.
- Assassinos, como pode se considerar filho de Deus, o desgraçado que tem
coragem de mandar queimar vivo um ser humano, desabafei, inconsolado por não poder dizer aquilo diretamente ao Papa ou aos representantes da Santa Sé.
- Pois é Arthuro, a ciência sempre contraditou as posições da religião com relação
a Deus, as verdades celestiais e posição dos astros no espaço e por isso era o alvo preferido dos prelados de Roma que, em nome de uma falsa e insana purificação e de um falso Deus, matava pessoas e perseguia aqueles que ousassem somente raciocinar sobre as coisas celestes.
- Mas, foi a partir da Idade Moderna, com as respostas que os cientistas
começaram a encontrar para as "questões fundamentais" contestando as defendidas por Roma, que a Santa Sé, acionava, cada vez mais a famigerada e temida inquisição, completou.
- A maior barbárie humana foi esta tal inquisição, dizia a Franz, afirmando que
em nome de uma falsa concepção religiosas os bastardos que a representavam ceifaram milhares de vida.
- Sim, concordo com você, a Igreja durante muito tempo foi a grande algoz da
evolução e matou, impiedosamente, pessoas esclarecidas e famosas como os astrônomos Giordano Bruno, animalescamente, queimado na cruz e Galileu Galilei, condenado a prisão domiciliar, ressaltou Franz, lembrando que Charles Darwin também tinha sido uma das grande vítimas da inquisição.;
- Como, perguntei-lhe?
- Bem, Darwin não chegou a ser perseguido. Mas, como era profundamente
religioso, a simples idéia de contestar a Bíblia com sua teoria da seleção natural o atormentou por toda a vida, o que fez com que ele levasse mais de 20 anos para tomar coragem e publicar “A origem das espécies”. Mas em 1871 suas diferenças com a Igreja se transformaram em polêmica pública com o lançamento de “A descendência do Homem”, onde aponta o parentesco entre homens e macacos.
Ao ouvir aquilo de Franz, minha revolta aumentava mais ainda. Tinha uma vontade imensa de sair batendo em padres e praguejando em frente as Igrejas. Pois não admitia, de forma alguma, que pudesse existir um Deus que coadunasse com tanta barbaridade e vilania.
Quando me falavam de Deus, pensava seriamente sobre as questões existenciais e conclui que a nossa vida na terra não passa de um simples piscar de luz, se comparada a enormidade de mistérios e formas de vidas que por ventura existam nos cosmos. Também pensava muito sobre as diferenças do ser humano e não conseguia entender porque alguns eram tão perfeitos e tão abençoados por ele, enquanto outros eram tão desgraçados na vida.
Tinham vícios horríveis, padeciam de doenças terríveis e não tinham sequer um
lugar para encostarem suas cabeças durante a noite para descansar o corpo dolorido das caminhadas em busca da sobrevivência. Tudo para mim era por demais extasiante. Não sabia porque tudo era tão incomum para a maioria dos seres humanos e tão deslumbrante para uma pequena minoria que tinha o tal do poder do dinheiro.
Vivia buscando respostas para tanta coisa que nunca ninguém ousou dar-me sequer uma pista do porque acontecia.
Vim ao mundo com um espirito indomável de mudanças e de fazer transformações. Queria vingar minha pobreza tornando-me uma pessoa rica e poderosa e acima de tudo famosa com os escritos que estava me preparando para publicar. Mas não tinha ilusões de que poderia um dia realmente chegar a este ponto, apenas imaginava em sonhos voláteis e que algumas vezes até me faziam gozar dormindo.
Tinha consciência de que existir era uma casualidade, qualquer um poderia ter nascido no meu lugar. Mas depois repensei que alguma coisa deveria ter influído para que eu aqui estivesse, nesta hora a pensar e meditar forçosamente sobre a vida e sobre o universo. Seria eu um existencialista ou um renegado em aceitar a lógica das coisas do ponto de vista religioso, esotérico ou até mesmo de consciência. Voltei novamente as divagações sobre o tamanho do cosmos e sobre porque alguém faria um espaço tão infinito para atender somente a existência terráquea. Tem que ter alguma coisa mais, parar por aqui é aceitar o mínimo na lógica da existência do ser humano. Para onde iriam os mortos, o que é consciência, alma, pensamento. Por um certo tempo li muito sobre os egípcios, o Livro dos Mortos me fascinava e o misticismo daquela civilização me impressionava.
Franz, também pensava assim e como eu, tinha grande paixão pela astronomia. Muitas vezes rotulou-se de caçador de cometas e uma espécie de advogado das espécies extraterrestres. Para ele a arrogância humana era insuportável quando buscava colocar o homem como primazia do universo.
“A mediocridade humana, as vezes, me assusta. Buscam Deus mas desconfiam de sua glória, de seu poder e de sua criação maior, o universo”, resmungava constantemente, quando falava-me sobre as concepções religiosas da criação e a ignorância e sadismo dos torturadores da “sagrada inquisição”.
Sempre caminhava na praia, pela manhã, com Franz, onde muitas vezes conversava sobre meu assunto predileto: vida extraterrestre. Falava-lhe muito de minha indignação com a concepção que a humanidade tinha do universo. Concordava com ele sobre suas posições acerca das concepções religiosas sobre Deus e o universo.
Ainda não me entendia por gente e já não aceitava, também, as versões religiosas para o vazio universal. Não concebia, nem imaginava, um universo tão grande, imensurável, para um punhadinho de humanos idiotas desfrutarem sozinhos de sua magnitude. Para mim estava claro que se existisse um Deus, não seria tão pequeno para dar tanta grandeza a um bando de bípedes supostamente inteligentes que sequer conseguem viver harmoniosamente entre si.
Tinha guardado comigo quase todas as especulações existentes sobre extraterrestres, desde depoimentos de aparições e novas descobertas sobre a vida alienígena, notadamente, as descobertas de novos corpos planetários, novos sistemas solares e galáxias. Guardava tudo com precisão e cuidado. Não podia ouvir um comentários ou notícia sobre aparições de Ovnis que logo buscava catalogar o ocorrido.
Um dia, numa das caminhadas, pela praia, com Franz, sentei-me, na areia e comecei a cavar um pequeno buraco até encontrar um caramujo, analisando-o profundamente, indaguei a Franz de como seria ele se tivesse inteligência, como a usaria? Cometeria as mesmas bestialidades que os humanos cometem contra seus próprios semelhantes? Imaginei que não, porque considerava o homem um predador natural, um dominador inconseqüente e um abutre voraz em disputa pela caça, com seus semelhantes.


5
EXPERIÊNCIAS ANGUSTIANTES

Certa vez, ao voltar de uma caminhada na praia, muito cansado, deitei-me na areia e adormeci profundamente e tive pesadelos horríveis com criaturas extraterrestres, naves estelares e monstros espaciais.
Era um sonho, mas claro na orientação, para que eu olhasse profundamente, com a alma, num só grão de areia da praia e nela eu veria Deus. Não entendi o significado daquela mensagem, mas fiquei confuso e desorientado.
Na manhã seguinte, caminhando com Franz, contei-lhe meu sonho e ele ouviu atentamente sem fazer qualquer comentário, apenas resmungou e pareceu-me dizer: hum, hum.
Olhávamos, longamente, o horizonte marítimo tentando vislumbrar além, imaginando que se a terra não fosse redonda ele sequer existiria. Pensava, então, nas grandes viagens de circunavegação em épocas que os barcos ainda eram movidos pela força do vento e mesmo assim iam longe e sempre voltavam ao seu ponto de origem.
Franz então disse-me:
- Arthuro, na época das grandes navegações, empreender uma viagem a mares desconhecidos e nunca dantes navegados era a mesma epopéia de explorar um astro do nosso sistema solar. Aqueles navegadores de épocas remotas empreenderam jornadas que agora se compararia a ida do homem a lua, principalmente quando sabiam que se encontravam isolados na imensidão do mar sem fim, sem qualquer contato com a terra, enquanto as viagens espaciais de hoje são profundamente monitoradas e acompanhadas do solo terrestre.
Ri, do jeito que Franz falou e sentei-me na praia, coloquei um punhado de areia na mão e pus-me a contar os grãos, parando no milésimo, achando ter estabelecido uma idéia da quantidade deles que poderia existir em todos os mares e praias da terra.
- Você acredita que existam mais estrelas no universo, do que grãos de areia nas
praias da terra?
- Não, decididamente não. Primeiro porque jamais se poderia contar os grãos de
areia de todas as praias do mundo e haveria também os que estariam dentro do mar, respondeu-me, rindo de minha ingenuidade.
- Assim como também seria impossível contar todas as estrelas do céu, retruquei.
Ele pôs-se a rir divertidamente, como se achasse uma infantilidade minha as
colocações e as comparações que tentava fazer sobre as estrelas do céu.
Enquanto Franz, banhava-se no mar, pus me a juntar montinhos de areia com os pés, cavando pequenos buracos e imaginando ser cada um deles um planeta e alguns montes galáxias ou sistemas solares a beira de buracos negros que conduziriam a outros cantos do universo e questionava porque um ser superior faria um universo tão grande para povoar apenas um planetinha insignificante diante da grandeza do resto do Cosmo.
Sentei-me na areia tentei separar um grão, um único grão de areia de um punhado
que pus na mão e, apesar da dificuldade, consegui separar um só e levei-o para casa de Franz, espremido entre o polegar e o indicador, colocando-o então sobre um microscópio antigo que ele guardava em sua improvisada biblioteca, que também servia como uma espécie de laboratório.
Em casa, ouvindo, pelo rádio um especial de Orson Weles sobre extraterrestres, prestei atenção, novamente, numa declaração de cientistas que garantiam existir mais estrelas no universo do que grãos de areia em toda as praias da terra.
Pensei, então, no grão de areia que na casa de Franz coloquei na face do pequeno microscópio e resolvi ir até lá com a intenção de observá-lo pelo seu aparelho.
Não esperei Franz chegar, imaginei que se ele deixara uma chave da casa comigo, não iria se importar de eu utilizar o seu microscópio.
Dei uma olhadela rápida no grão de areia pelo aparelho e observei um amontoado de pontinhos brilhantes circulando entre si. Nada com importância e nada que pudesse despertar atenção especial. Achei que iria encontrar alguma coisa interessante ou ter uma surpresa com o grão de areia, mas nada de anormal ocorreu.
Voltei para casa um pouco decepcionado, mas também conformado, concluindo que estava tendo algumas idéias meio idiotas. Afinal, tudo fora apenas um sonho. Minha fixação na vida extraterrestre tinha se tornado tão grande que eu próprio já estava começando a ficar preocupado com o fato.
Lembrava então que, para muitos estudiosos, cientistas e até observadores espaciais
não haviam mais esperanças de se encontrar vida em outros planetas, pelo menos nos mais conhecidos do homem, ou mais próximos a terra, dentro do nosso sistema solar, mas eu não desistia, sempre aparecia uma nova probalidade, uma nova expectativa. Achava que só o que precisamos eram de telescópios mais potentes e que pudessem adentrar um pouco mais os confins do sistema solar. Vasculhava, diariamente, os céus com o telescópio de Franz, mas eu ainda não tinha um conhecimento profundo do céu e muitas vezes me perdia com a enormidade de objetos que conseguia focalizar.
Tinha, nesta época, assistido o filme “2001, Uma Odisséia no Espaço”, baseado numa obra de Arthur Clarke e impressionei-me com a ambientação do filme no Planeta Júpiter e em dois de seus satélites, Ganimedes e Europa. Fiquei profundamente animado com o filme e enchia-me de expectativas, pensando que nunca estaria sozinho na busca de um dia saber que haveria vida, além do planeta azul.
A partir de então comecei a ficar cada vez mais ligado nas notícias de aparições de
Ovnis, apesar de aos poucos ir me rendendo a lógica cientifica sobre o vazio do Sistema Solar e da própria Galáxia.
Continuar procurando o quê. Buscar o que e onde buscar se as expectativas arrefeciam cada vez mais?, dizia a mim mesmo.
Vivia pensando nas declarações da ciência e na possibilidade de aquele minúsculo grão de areia, representar uma das estrelas do Universo, mas acabei, concordando que seria um pensamento muito ridículo ou idiota, fruto de uma mente resignada em não aceitar a lógica já imposta pelos homens da ciências e pelas várias missões fracassadas na investigação das possibilidades de vida em outros pedaços do cosmo, ou mesmo em nossa pequena e congestionada Via Láctea.
Até mesmo Franz Kopelck, que era uma pessoa esclarecida, e que partilhava de minhas opiniões acerca do universo, já não agüentava mais minha insistência em tentar provar ou encontrar, a qualquer custo, qualquer sinal ou evidência, ao menos um rastro de que poderia, pode, ou poderá existir uma outra forma de vida fora do globo terrestre.
Mergulhava numa tristeza profunda sempre que pensava na lógica dos cientistas de que estávamos sozinhos na nossa galáxia. Então porque procurar além se em toda esta imensidão de cerca de 200 bilhões de sóis não encontrávamos um só sopro de vida. Para que continuar procurando mais adiante?. Seria como procurar uma agulha num palheiro durante uma noite escura.
Mesmo assim, o grão de areia que separei na praia não me saída da cabeça e insisti, novamente, numa segunda noite, decidido, a investigá-lo mais profundamente no microscópio de Franz. Peguei o com uma pinça e observei o atentamente contra a luz, buscando perceber melhor sua transparência e imaginando a quantidade de elementos que o formariam, sua consistência e sua quase transparência.
Pensava também se teria a ver aquele minúsculo grão com a essência do resto do infinito e se seria realmente infinito o Universo ou haveriam fronteiras. Mas se houvesse fronteiras o que viria depois delas? O vazio, o nada, o vácuo ou uma conjunção de elementos químicos ainda desconhecidos do homem.
De repente, notei que os pontinhos brilhantes, anteriormente observados, seguiam uma lógica em sua piscagem, como se compusessem um estilo musical.
Fixei-me profundamente no grão e arrepiei-me ao perceber que o brilho que dele emanava tomava uma forma arredondada e se expandia, puxando me para o seu interior e transportando-me para um lugar totalmente desconhecido, onde pude ver criaturas sem qualquer referencial.
Estava num planeta super iluminado, mas no qual não haviam estrelas no céu, aliás, nem céu aberto havia, o céu se afunilava e acabava num pequeno orifício de onde podia ver uma luz por demais intensa. Parecia um sol, mas não, era como se apenas um facho de luz, vindo do espaço, iluminasse uma pequena zona do lugar. Não havia nada conhecido que pudesse comparar com o brilho que vinha do céu. Ventava fortemente, com ventos de velocidade incalculável na terra, mas não sentia seus efeitos, estava protegido por uma espécie de barreira que me permitia ouvir apenas o zumbido ensurdecedor e a poeira que amarelava todo o ambiente em volta. Fechei os olhos, numa tentativa de acordar do que imaginava ser um pesadelo horrível, mas sem resultados. Minhas pálpebras alquebravam-se, mas subitamente contraíam-se, fazendo-me abrir os olhos novamente. Sempre que isso acontecia tinha a sensação de que iria acordar daquele pesadelo. Mas nada acontecia, ao contrário, ouvi murmurinho de vozes, umas clamando, outras rindo e outras ainda discursando, como se estivessem num culto evangélico. Esforcei-me novamente, tentando voltar a realidade, mas não conseguia. Tentei movimentar-me e senti-me tão leve que flutuava e percebi então que fazendo movimentos iria para onde quisesse. Vi então que podia voar e levantei vôo em direção ao orifício para onde convergia também a tormenta que se abatia sobre o lugar. Constatei novamente que estava protegido de tudo, nada me atingia, apesar de sentir um barulho ensurdecedor e uma forte pressão. Então, de repente, como se por milagre o orifício abriu-se de forma instantânea e pude vislumbrar dezenas de astros gigantes e superluminosos que cintilavam em torno de uma enorme estação espacial. Inimaginável o tamanho daquele lugar, coberto de sóis, planetas, com cometas zunindo em passagem pelo lugar. Haviam também milhares de meteoros, asteróides e pequenos meteoritos que seguiam como uma procissão em direção a gigantesca plataforma.
E, eu flutuava em volta de tudo aquilo numa velocidade espantosa sem sentir qualquer desconforto, quando, de repente, senti-me puxado com força para baixo e entrei novamente num outro orifício indo parar no mesmo lugar em que me encontrava anteriormente, e prestes a ser engolido por um descomunal mar de larva que escorria, agora, pela superfície do planeta. Foi quando ouvi uma voz retumbante e aterradora que me repreendia com veemência:
“Eu vos dei o universo, para que o fizesse extensão de sua casa. Levassem tudo que
vos ensinei em seu berço natal para expandir pelo cosmo que vos coloquei a disposição”.
Apavorei-me e fiz uma força tremenda para mover-me para baixo e então as imagens começaram a diminuir de tamanho, ficando cada vez mais pequenas, até transformarem-se novamente no minúsculo grão de areia sob o microscópio e fui expelido para fora e de volta ao local onde havia iniciado a análise do grão.
Fiquei tão assustado que não consegui dormir a noite e resolvi sair para dar uma volta pela praia. Era uma noite escura, fria e com um vento cortante que jogava areia nos olhos e machucava sensivelmente as partes descobertas do corpo.
Peguei um outro punhado de grãos de areia e pus-me a tentar separá-los entre os dedos, na tentativa de levar alguns para casa.
Cheguei, novamente a casa de Franz com um punhadinho de areia ainda molhada na mão e corri ao microscópio e separei, então, um só grão e coloquei-o sob a face do aparelho e olhei fixamente para ele.
Senti novamente aquela sensação esquisita de arrebatamento e estava novamente num lugar ainda mais estranho que o anterior. Era um planeta, numa zona escura do universo, no qual só haviam trevas e no qual eu sentia que haviam construções gigantescas, como edifícios de centenas de andares que tocavam as nuvens também negras com bordas esbranquiçadas. Era um lugar deslumbrante e ao mesmo tempo tétrico, macabro e frio, como se a vida ali demorasse a passar. Tudo era muito lento, muito vagaroso e haviam criaturas aladas que voavam como se tivessem planando, sem qualquer movimentar de asas. Fechei com firmeza os olhos para ver se voltava. Estava com medo da última experiência, mas como da outra vez nada aconteceu, continuava ali, olhando a esquisitice daquele lugar, até que uma forma alada aproximou-se de mim e pegou-me pelos braços levantando vôo comigo. Vi então que era um anjo de corpo branco e asas negras e com um rosto disforme, como se tivesse sido queimado. Elevou-me a alguns metros do chão e largou-me numa cratera, onde cai sob uma substância pegajosa, parecendo borracha líquida. Senti-me totalmente envolvido pelo pegajoso elemento e tentava desesperadamente me desfazer dele. Não conseguia, ao contrário, estava cada vez mais emaranhado pela substância que então começava a me apertar, parecendo querer espremer e quebrar meus ossos.
De repente, ouvi uma voz distante, confusa e sôfrega que dizia: “A casa de meu pai tem muitas moradas. Ussanthia é só uma delas. Sinta a escuridão de Ussanthia e agradeça ao Senhor pela luz que ilumina o teu planeta. E, então a substância soltou-me e voltei, como que magicamente, a sala de Franz.
Senti-me oprimido e desolado. Contei a Franz o que aconteceu e ele limitou-se a dizer-me que tudo aquilo era fruto de minha insistência com a vida extraterrestre.
Agora, as experiências com os grãos de areia começavam a me martirizar e me dar medo e terror. Qual seriam estas moradas? Porque estava tendo aquela experiência angustiante. Seria ela fruto de minha imaginação. De minha teimosia em não aceitar a terra como o único lugar habitado na Galáxia?.
Falei , novamente, a Franz sobre minhas experiências com os grão de areia e, ao contrário do que esperava, ele só fazia um gesto de repreensão com a cabeça, dando a entender que eu estava por demais impressionado com aquelas coisas e que isto estava me perturbando demasiadamente. Aconselhou-me a parar com aquelas experiências e até tentou proibir-me de utilizar seus microscópio. Mas diante de minha insistência, permitiu que eu o utilizasse somente quando ele estivesse em casa.
Assim, diariamente, pegava um grão de areia, esperava Franz chegar e corria ao seu microscópio e sempre era levado a lugares impressionantes e assustadores.
Agora Franz acompanhava minhas observações e estava cada vez mais crente de que tudo não passava de alucinações e afirmava-me que em momento algum saí da sala, mas que aparentava estar em transe ou profundamente hipnotizado.
Numa desta vezes, fui levado a um planeta anão, aparentemente do tamanho da nossa Lua e que ficava, conforme orientação que ouvia, na terceira tríade de Capricórnio. Era um lugar aprazível e de muita paz.
Parecia não haver qualquer forma de vida ali, até que percebi estranhos objetos
luminosos piscando em minha volta com se fossem vaga-lumes, mas de aparência muito esquisita, como se alternassem suas formas e transformassem seguidamente os odores que soltavam. Voavam em formação e parecia formar símbolos como se traduzissem uma mensagem em tom metálico e descompassado.
Por mais que tentasse decifrar tudo aquilo o máximo que conseguia era perceber que nada parecia real. Era como se fosse um sonho conturbado, um pesadelo errante em que me sentia constantemente em sobressaltos e como se despencasse de cima de um despenhadeiro sem fundo. Nada parecia lógico, cada uma das luzes tinha um brilho diferente, desconhecido e altamente perturbador.
Sempre que me sentia arrebatado pelos grãos de areia e encontrava-me nestes lugares esquisitos, pensava muito na Terra, em minha cidade e em minha família. Também percebia traços de Franz, nas criaturas que me recepcionavam ou que me apareciam. Não sei porque, mas pensava, talvez por sentir nestas viagens uma dor profunda, insuportável, de perda irrecuperável. Como se eles estivessem sendo arrancados de dentro de mim.
A solidão era tão grande que até mesmo o mais suave soprar de um vento tornava-se companhia. Era tudo parado. Sem vida, sem movimento, sem rumo. Sabia que existiam em minha volta milhares de coisas, mas nada parecia ser real. É como se fosse um filme passado em um vídeo que se tivesse dado o pause.
No entanto, numa destas viagens, estive num lugar diferente dos outros onde já havia estado. Havia muita paz, muito brilho e muitos sons musicais suaves que acalmavam a alma e traziam uma tranqüilidade e uma paz indescritível. Foi então que ouvi novamente a voz que me informava agora estar em Constância, um mundo com vários sóis, disseminando luzes multicoloridas e iluminando completamente todo o planeta. Dali fui arrebatado para o espaço e iniciei uma viagem fantástica pelo infinito.
Em momento algum fiquei sabendo para onde ia, sabia apenas que estava viajando a uma velocidade inconcebível, se pudesse calcular, imaginaria estar voando a velocidade da luz, mas não poderia estar certo, porque nunca um ser humano conseguiu conceber tal evento. Não compreendia porque, mas entendia que alguma coisa estava me mostrando o infinito e suas criaturas, suas formas de vida inimagináveis e a explosão de vida que se aglomerava naquelas bandas do universo. Tinha uma vontade irresistível de descer em algum daqueles lugares, mas não conseguia sequer fazer qualquer movimento em meu corpo que se sentia comprimido e esmagado por uma força sem par. Mas sempre voltava a sala de Franz, muito exausto como se realmente tivesse vivenciado tudo aquilo.
Assim que voltei desta viagem, peguei novamente um outro grão de areia e coloquei o sobre o microscópio e pus me a observá-lo, tendo ele me puxado para o seu interior e deslocado-me a um planeta totalmente escuro, onde se ouviam gemidos, gritos e berros alucinantes, como se milhões de criaturas ali estivessem penando com um castigo horrível.
Apareceu-me então, uma pequena criatura alada, semelhante a um morcego e disse-me que eu estava num planeta chamado Luzia.
- Luzia é o espaço da sombra eterna. Aqui habitam as criaturas que sempre
foram desprezadas pelos seres humanos, como ratos, morcegos e outros tipos de vermes e animais peçonhentos, falou-me.
Incrível em tudo é que eles agiam normalmente como se fossem seres comuns, trabalhavam em grupo, constituam família e tinham casas, construídas arquitetonicamente, como as que construímos na terra.
Concluí que Luzia era um mundo de trevas e seus habitantes eram as mais perversas e enojadas criaturas das quais tínhamos conhecimento na terra.
Eram seres tenebrosos, nojentos e patéticos, mas tinham hábitos como os humanos. Organizavam-se numa espécie de sociedade que se constituía pelas diversas raças que habitavam o planeta. Cobras, largatos, vermes, morcegos, ratos e haviam também uma raça de sanguessugas gigantes que pareciam ser as mais hostis para com os outros habitantes do lugar. Apesar da ameaça constante das sanguessugas, o planeta parecia viver uma estranha harmonia e na qual todos conviviam aberta e pacificamente. Não tinham governo, nem representações políticas, cada um era responsável pelos seus atos, apenas havia uma pequena disputa entre os seres maiores e os menores, os terrestres e os alados`. Mas eram disputas como que esportivas, onde o perdedor tinha que garantir a alimentação do vencedor. Pude ver também que eles tiravam seus alimentos de um estranho processador que transformava a terra do lugar em alimentos condensados em estranhas capsulas. Continham todas as vitaminas suficientes para garantir a subsistência daqueles seres.
Foi neste lugar que fiquei mais tempo. Parecia que eu não iria mais voltar. Sentia-me preso, como se alguma coisa estivesse me segurando no planeta. Até que, novamente, ouvi a voz, desta vez rouca e retumbante que citava meu nome.
- Arthuro, Arthuro. Repetiu duas vezes e depois completou: Arthuro, a solidão
humana não faz sentido. Continua tua busca e crê na perfeição do teu criador.
- Mas quem é meu criador, perguntei, com voz tremula e fraca.
Não ouvi resposta, apenas senti um vento suave e frio que me envolveu e
transportou-me de volta a sala de Franz.
Agora mesmo que não concebia de forma alguma estarmos sozinhos na
imensidão do cosmo e pensava aficionado como que poderia nossa Galáxia a Via Láctea, com seus mais de 200 bilhões de sóis e bilhões de outros corpos celeste, existir simplesmente para a sustentação da vida de um pequeno e mísero grãozinho de areia, chamado planeta terra e perdido em sua imensidão territorial. Como poderia uma Galáxia de 100 mil anos luz de diâmetro sustentar apenas um pequenino planeta de quinhentos milhões de quilômetros quadrados com vida inteligente. E o resto, para que serviria o resto?.
E quem seria o Criador, a que a voz se referiu. Seria Deus, mas logo para mim que era um ateu confesso e que havia acentuado ainda mais meu ateísmo na convivência com Franz.
Desde a última experiência, passei a olhar com mais freqüência para o céu. Contemplava o sol, nosso astro rei, sua magnitude e pensava nos bilhões de outras estrelas como ele que cintilam pelos céus da Via Láctea, muitas delas milhões de vezes maior que ele.
E, cada vez mais, aumentava o vazio profundo e o sentimento de solidão muito grande quando pensava racionalmente, na hipótese de estarmos sozinhos na Galáxia, ou ainda em todo o universo, também com suas incontáveis outras galáxias, muitas milhões de vezes maior que a nossa.
De repente, perdi o entusiasmo pelos grãos de areia e resolvi aceitar tudo aquilo que acontecera como fruto de minha insistência em não aceitar a inexistência de vida fora do nosso planeta.
Voltei então a mexer em meu livro com a intenção de conclui-lo, mas sempre que o lia, mudava sempre seu formato. Refazia as histórias, repensava o personagem e, enfim, não conseguia de forma alguma acabá-lo.
Passei então a dedicar-me com mais ênfase aos estudos de astronomia com Franz. Passaram-se alguns anos e fui, aos poucos, esquecendo as experiências com os grãos de areia e deixei de lado minha obsessão, apesar de algumas vezes insistir em observá-los pelo microscópio e perceber que nada mais acontecia.



6
A MUDANÇA

Com 16 anos, começou a vir-me a idéia firme de procurar um novo lugar para viver. Concluí o segundo grau e sabia que no lugar onde estava jamais encontraria condições de cursar uma faculdade e então, compreendi que havia chegado a hora de decidi o que fazer da vida.
Havia aprendido, praticamente, tudo sobre astronomia com Franz. Ele agora estava doente. Sofria de um câncer de próstata e os médicos haviam lhe dado poucos meses de vida.
Franz, definitivamente, fechara-se em sua casa e nem sequer para as caminhadas na praia saia mais. Eu o visitava diariamente. Dava-lhe os remédios e ajudava-lhe a fazer a comida. Acompanhei seu sofrimento e via o ficar cada vez mais moribundo como se morresse um pouquinho cada dia que passava.
Certo dia ele chamou-me a beira de sua cama e falou-me:
- Arthuro, você sempre foi o filho que nunca tive. Não tenho muito na minha vida,
mas consegui guardar algum dinheiro. Pensei que um dia poderia voltar para a Alemanha. Mas essa doença consumiu-me.
- Franz, disse-lhe, chorando, ao perceber que ele estava para dar o último suspiro.
- Não Arthuro, já vivi o tempo que me foi concedido, agora vou explorar outras
plagas. Tudo que tenho agora é teu. Meu testamento está no cartório da cidade, procure o tabelião Osmar e ele lhe orientará sobre tudo. Também tenho uma poupança. Mas por favor, não a gaste em vão, use-a para completar sua formação em astronomia.
- Franz, quase não conseguia completar a última palavra e morreu. Olhei seu semblante e percebi-o radiante, como se houvesse, realmente, partido desta para uma melhor.
Haviam passado dois anos, desde as experiências com os grãos de areia, quando sofri um dos maiores baques da minha vida que foi a morte do velho e bom Franz. Fiquei ainda mais desorientado e agora mesmo que nada mais me prendia no lugar.
Herdei de Franz seu velho e potente telescópio e quase uma centena de livros sobre astronomia. Também deixara-me sua casa do Rincão a qual dei a meus pais, pois, agora, mais que nunca, tinha a idéia firme de ir embora dali.
Conclui que tinha amadurecido e minha mente fértil e imaginativa da adolescência tinha se resignado. Só pensava agora em concluir o livro que iniciei aos quatorze anos, mas não encontrava inspiração naquele lugar e também precisava cuidar da minha vida, arranjar um emprego e continuar meus estudos.
Aos 18 anos decidi que iria fazer um curso de astronomia e então, até hoje, não compreendi porquê, deu-me uma vontade imensa de ir para Brasília,, a capital federal, onde esperava uma vida completamente diferente da que até então levara.
Com a maioridade, busquei pela primeira vez, inteirar-me da quantia que Franz havia-me deixado em sua poupança. Por um bom tempo até esquecera do dinheiro, mas agora com minha decisão de ir embora, precisava do dinheiro, o mínimo que fosse.
Fui a Caixa Econômica Federal da cidade vizinha, onde Franz tinha sua conta e dirigi-me ao gerente que prontamente me atendeu.
Não entendia porque, mas ele me tratava de uma forma muito cordial que até estranhei. Depois descobri porque. A grana que Franz me deixou era uma pequena fortuna.
Senti o amadurecimento chegando aos poucos, mas a idéia da vida além terra não me abandonara.
Aumentava cada vez mais minha fascinação pela astronomia e pelos mistérios do universo, notadamente, a vida em outros planetas do sistema solar ou em galáxias de além via-láctea.
Não aceitava de forma alguma que o infinito fosse apenas um vazio preenchido por bilhões de corpos celestes que estavam ali simplesmente por estarem ou para ilustrar o vazio existente. Insistia comigo: “Não estamos sós. Os cientistas não acreditam em discos voadores, mas esperam em breve detectar evidências de vida inteligente em outros planetas. Eles estão cada vez mais convencidos de que o contato com outras civilizações é um acontecimento natural na história da humanidade e eu preciso continuar acreditando que isto será em breve uma feliz realidade”.
Quando mudei para Brasília, levei comigo apenas o velho telescópio herdado de Franz, algumas roupas e uma mala cheia de livros sobre astronomia e contos de ficção cientifica e os velhos e amassados originais do meu livro inacabado.
Na Capital Federal, fascinado pelo traço uniforme da arquitetura de Oscar Niemeyer e do Paisagista Lúcio Costa, decidi fixar-me e recomeçar uma vida totalmente diferente daquela que até então estava acostumado.
Além da astronomia, sempre tive um certo fascínio pela literatura e entendia que
somente através dela um pessoa se realizaria completamente. Tal como dizia o ditado de que o homem para ser feliz, tem que casar, ter filhos e escrever um livro. Não havia cumprido ainda nenhum destes itens e achei que havia chegado a hora de recomeçar e acabar o meu tão sofrido conto de ficção científica.
Com a recomendação de um deputado fui de cara trabalhar na Câmara dos Deputados, com um salário sofrível, mas num ótimo ambiente.
Logo, decidi que tinha que me tornar funcionário público e fiz um concurso para a Câmara, já que meu cargo no gabinete do deputado era de confiança e duraria no máximo quatro anos, o tempo de um mandato parlamentar. Precisava também aprofundar meus conhecimentos de astronomia, porque tinha apostado meu futuro nesta área. Queria viajar para o exterior, ter contatos com outros estudiosos do assunto e tornar-me um astrônomo conhecido nacionalmente. Haviam poucos deles no Brasil, nesta época, apenas um ou dois se sobressaiam nesta área. Sabia que o que tinha aprendido com Franz poderia ajudar-me no vestibular da Universidade Nacional de Brasília.
Mas sabia também que a capital federal, apesar de muito bonita e planejada, tinha seu lado selvagem, sua pobreza e sua miséria, o que me fazia lembrar constantemente de minha infância, de meus país e de minha cidade.
Era uma cidade mística e cheia de encantos, envolta em profecias que a sinalizavam como a capital do terceiro milênio, o lugar que seres extraterrestres escolheriam para a revelação aos humanos das verdades do universo.
Adquiri um paixão muito grande pela cidade e passei a inspirar-me em seus contornos, em sua gente e em seu povo impar, que me inspiravam e me impulsionavam cada vez mais ao estudo da astronomia.
Sentia que a cidade era um oásis econômico perdido na solidão do Planalto Central e também uma eldorado para aqueles que já tinham perdido toda a esperança de emprego ou até mesmo de sobrevivência nos pequenos lugarejos deste grande país.
Vi em Brasília a redenção da humanidade, um sonho do Presidente Juscelino Kubstchek, o popular JK que trazia esperança para milhões de pessoas que para cá correram em busca de melhores dias.
Até me lembro que nessa época haviam apelidado a cidade de capital da esperança ou não sei se era o slogan de um governador do Distrito Federal. Só sei que ele tinha alguma coisa a ver com a grandiosidade da cidade. Conheci milhares de pessoas diferentes, de quase todos os estados do país e também de outras nações, já que Brasília como capital abrigava toda as embaixadas do exterior e por conseqüência pessoas das mais variadas partes do mundo.
Enquanto procurava um apartamento para comprar com o dinheiro que herdei de Franz, fui morar numa pensão para rapazes na W-3 Sul, nome que jamais se imaginaria para uma Avenida. W, de West, 3 por ser a terceira de baixo para cima e sul por estar situada na Asa Sul do Plano Piloto de Brasília. Eram nomes que me confundiam completamente e me deixavam desorientado dentro da cidade.
No trabalho, ainda ganhava pouco, mal dava para pagar a pensão e tomar algumas biritas no final da tarde no “Frango Assado”, boteco que servia também de ponto para garotas em busca de sobrevivência na Capital.
No início achava Brasília uma cidade fria, inconstante, vazia de sentimentos e atormentada pela distribuição qualitativa e super planejada dos espaços urbanos e com um clima seco que castigava impiedosamente as artérias respiratórias, mas com o passar do tempo fui me adaptando ao modo de vida da cidade e conhecendo pessoas interessantes e que compartilhavam de minhas opiniões, especialmente sobre astronomia, ufologia e outros temas que sempre marcaram a minha adolescência.
Vivia bem , apesar de profundamente magoado com as sacanagens dos políticos e dos tecnocratas que para mim eram raças que deveriam ser extintas, pois não tinham sensibilidade humana, uma vez que tratam o ser humano como número ou referencial. Passei a gostar muito da cidade, principalmente porque foi nela que aprendi muito da minha vida e foi nela também que despertei ainda mais meu interesse pela astronomia e pela vida extraterrestre, tendo inclusive participado de grupos esotéricos que existem em abundância por ser a região do Planalto um lugar rico em aparições de OVNIS e outros fenômenos, razão pela qual bruxos, ufólogos, visionários e pseudoprofetas para lá emigraram em busca de fundamento para suas teorias.
Diziam que Brasília seria um paraíso do terceiro milênio e isto era até profético, conforme as previsões de Dom Bosco. Assim, muita gente vinha para o Distrito Federal em busca dos portais da felicidade perene do terceiro milênio.
Certa vez fiquei três meses no Rio de Janeiro a trabalho, achei legal porque no fundo também precisava do mar e sonhava com a areia, as ondas brancas espumosas e o por do sol na praia, as caminhadas pela manhã e ao entardecer e sabia que a maresia me reforçaria a inspiração. Mas tudo isso durou apenas três meses.
Uma saudade profunda apossou-se de mim e fazia-me sonhar com Brasília, suas noites intensas e mornas e seus dias secos e radiantes de sol sem fim. A cidade, para mim, era um lugar abençoado, para quem realmente queira viver com intensidade.
Vivi, aqueles três meses no Rio, como se vivesse num exílio, porque sonhava com o Distrito Federal, recordava seus lugares pitorescos, suas paisagens e o misticismo que o circundavam, onde pequenas cidades da região chamada entorno, acolhiam os mais típicos magos, videntes, curandeiros, e poderia dizer até “extraterrestres” que preparavam a revelação do resto do universo aos humanos.
Brasília tinha se tornado meu porto seguro, minha verdadeira praia com suas noites brancas e claras, seu horizonte infindável e com o seu canto das cigarras no outono que ficava ensurdecedor em alguns pontos da cidade, especialmente no entardecer ensolarado e límpido do planalto central.
Tinha ali Alto Paraíso, a Cidade Eclética, o Vale do Amanhecer, e dezenas de seitas que objetivavam preparar o homem para a chegada do terceiro milênio.
Apesar da pobreza flagrante, eram lugares mágicos, prodigiosos em que pessoas superdotadas realizavam estranhos rituais de magias, de cura e de viagens de regressão e cósmicas.
Diziam que em alguns destes lugares vinham seres de outros planetas trazer mensagens divinas de esperança, de fé e de reforço para a crença dos seres humanos num espírito santo e universal, chamado Deus. Por mais estranhas que fossem sempre chegavam a um só líder espiritual maior, o Senhor de Abraão, de Jacó, de Isaías e o pai supremo de toda a humanidade e que tivera um único filho, Jesus Cristo, o homem da Galiléia.
Até então vivera uma vida desregrada, marcada pelo álcool e pelas noitadas festivas em companhia de outros bebuns e mulheres prostitutas e desamparadas.
Lembro ainda de alguns locais onde passava a noite bebendo e de onde saía fedendo a álcool e cigarro direto para o trabalho, onde passava um dia de cão e com uma ressaca interminável. Foi depois de muitos tombos e cacetadas na vida de cão que levava que busquei ajuda, procurando sair daquela vida miserável e na qual o dinheiro que ganhava só dava para a bebida e as mulheres. Conheci uma irmandade de auto ajuda e nela ingressei e a qual me ajudou a sair do fosso em que o alcoolismo havia me colocado.
Comecei uma vida realmente nova e diferente em Brasília. Apesar de deprimido pela distância que me separava de minha família, tinha um grande consolo em saber que, diferente de meus irmãos, teria no final do mês um salário um pouco mais digno e sem fazer muita força. As vezes pensava comigo que se o velho Franz estivesse vivo o chamaria para vir para Brasília comigo. Ele me fazia muita falta. Era a única pessoa com quem conseguia estabelecer contato em minhas conversas e em minha resignação de que haveria algo mais além de aviões de carreira no ar.
Voltei a escrever com ênfase meu livro. Tudo isso porque tive o maior incentivo de um amigo que fiz no trabalho, que já publicara mais de uma dezena de livros. Seu nome era Paulão, um cara grandão, extrovertido e céptico sobre extraterrestres. Ele escrevera muitos contos e novelas que falavam de sofrimentos e amarguras. Como eu, tivera ele uma infância e uma adolescência sofrida, marcada pela pobreza e pela opressão dos ricos. Paulão tivera um decepção amorosa e durante muito tempo partilhou comigo a companhia do álcool, dos bares e das noites cosmopolitas de Brasília. Só que um dia eu parei e Paulão continuou se afundando cada vez mais no álcool, mas nunca deixara de ser meu melhor amigo na cidade.


7
UM ASTRÔNOMO DE CARREIRA

Mesmo assim, com todas as dificuldades no trabalho, a insuficiência de recursos financeiros permanente, consegui ingressar na Universidade de Brasília e concluir meu curso de astronomia e logo após, também por insuficiência de quadros acabei me tornando professor de astronomia da Universidade.
A partir de então, além dos estudos e pesquisas sobre o sistema solar, com os velho telescópio de Franz e dois outros que consegui comprar em Brasília, meu hobby tornou-se investigar tudo sobre astronomia. Vivia nos “Sebos” espalhados pela cidade, vasculhando livros, revistas antigas e qualquer outro tipo de documento sobre ciências espaciais, astrologia, ufologia e contos fantásticos de ficção científica. Passei a colecionar fatos e fotos sobre o sistema solar e a Via Láctea.
Sempre achei que a Astronomia era a o único caminho para desvendar o mistério que envolve o Cosmos, tanto que tornei-me um astrônomo respeitado pelos artigos que escrevi acerca de minhas teorias sobre a possibilidade de vida em outros planetas, notadamente, dentro do nosso sistema solar.
Tinha convicção de que poderia utilizá-las para me tornar ainda mais brilhante junto a comunidade cientifica brasileira e, porque não, mundial.
Haviam tantos astrônomos e astrofísicos famosos e respeitados e que acreditavam, profundamente, na possibilidade de vida extraterrestre, como Carl Seagam, Stephen Hawking e outros menos conhecidos que dedicavam-se a desvendação do cosmos, sempre entrando em especulações sobre vidas em outros pontos do Universo ou mesmo no Sistema Solar. Eu também comungava com estas idéias e achavam muita petulância dos humanos em se acharem os bons do pedaço, os donos de todo o infinito.
“Que Deus faria um espaço tão grande, tão inatingível apenas para um mísero punhado de seres terem ao seu dispor coisas que jamais iriam alcançar”, pensava comigo, sempre lembrando de uma citação de Freud: "As idéias religiosas surgiram da mesma necessidade de que se originaram todas as outras realizações da civilização, ou seja, da necessidade de defesa contra a força esmagadoramente superior da natureza."
Durante muito tempo mergulhei num estudo profundo das teorias de astrônomos como Nicolau Copérnico, que em seu livro “Sobre as Revoluções do Corpos Celestes”, demoliu a teoria de que a terra era o centro do universo e por isso fora denunciado como louco e visionário por Martinho Lutero.
Tycho Brahe com suas teorias, embora contrárias a Copérnico, também dera incontestável contribuição ao estudo da astronomia, juntamente com seu assistente Johannes Kepler.
E Galileu Galilei, considerado herege, por sua concepção clara e razoável do universo e da situação dos corpos celestes. Isaac Newton com as leis da gravitação. Albert Einstein com sua teoria geral da relatividade, que mais tarde serviria de verdadeiro trampolim para que se pudesse especificar uma versão mais realista da posição dos astros e da situação geográfica de galáxias e planetas em todo o universo.
Em minhas aulas na universidade procurava envolver meus alunos com a questão
extraterrestre. Queria transformá-los em aliados de minhas teorias.
Aprofundava sempre minhas aulas com debates e estudos apurados sobre o universo.
Debatia com eles a existência de planetas com atmosferas semelhantes a da terra e com enormes condições de sustentação de vida.
Falava muito sobre o Universo, seus mistérios e sua grandiosidade.
“Ele abriga, de acordo com estimativas recentes, cerca de 100 bilhões de galáxias, também chamadas "ilhas do Universo", cada uma contendo de 1 bilhão a 1 trilhão de estrelas, poeira e gás e que, por gravitação , se reúnem em agrupamentos, girando em torno de um eixo central. As estrelas e todos os demais elementos juntos representam apenas 1 % da matéria total, os outros 99% constituídos de dois elementos básicos: hidrogênio e hélio, este na ordem de 25% e que, em síntese, compõem a matéria-prima das próprias estrelas. As temperaturas cósmicas variam desde 20 milhões de graus Celsius no interior das estrelas até o quase zero absoluto no espaço livre, isto é, 2,70K (Kelvin), que corresponde a -270,40C.
A separação média entre galáxias individuais é de 500 "parsecs" ou 1.630 anos-luz, mas existem numerosos exemplos de aglomerados de galáxias com distribuição muito mais densa. A “via-láctea” é urna manifestação visível de uma galáxia que abriga, quase ou cerca de 400 bilhões de estrelas e que faz parte de um agrupamento de 17 membros principais, aos quais chamamos de "Grupo Local". As duas "Nuvens de Magalhães" (maior e menor) fazem parte deste sistema e são as mais próximas respectivamente a 156.480 e 182.560 anos-luz sendo, por isto, consideradas "satélites" da via-láctea. As mais distantes são a galáxia de Andromeda (M31) a 2.217.000 anos-luz, com o maior diâmetro (130.400 anos-luz), composta de uns 300 bilhões de estrelas e com magnitude aparente de 4,8; e a M33 da constelação de Triangulum, a 2.347.200 anos-luz de distância e 55.420 anos-luz de diâmetro. Estas 4 galáxias são as únicas visíveis a olho nu. Perscrutando o firmamento com telescópios mais possantes, podemos observar galáxias cuja luz levou bilhões de anos para chegar até nos. O homem comum vê o Sol como se apresentava há pouco mais de 8 minutos e a estrela mais vizinha, Próxima Centauri emitindo luz irradiada há pouco mais de 4 anos passados. Nossos olhos, portanto, podem registrar a luminosidade de estrelas que, há muito, deixaram de existir. Assim podemos concluir que o Universo compreende uma quarta dimensão: o tempo.
Sempre tive comigo que a sabedoria é a grande meta do homem e a desvendação dos mistérios do Universo estaria dentro desta meta, especialmente quando se procura fazer a interação harmônica do ser humano com o que é terrestre e o que é cósmico ou celestial.
Também me interessava muito pelo físico Stephen Hawking e sua teoria sobre o BIG BANG, Meditava profundamente do porque da existência do Universo se até então se mostrava apenas um enorme vazio, uma solidão imensurável de astros brilhando no infinito sem vida, sem oxigênio e muitos sem calor.
Outro campo onde já se descobriu muito, mas ainda se sabe bem pouco é o que estuda a formação do Universo. A começar pelo princípio de tudo, da própria razão de ele existir. Há outros universos ou apenas este em que vivemos? E se for um só, o que há além dele? São questões até agora sem respostas plausíveis. Mas é incrível que após cinco séculos de pesquisas ainda não se tenha a menor idéia das respostas. O único que realmente tem uma resposta mais lúcida é Stephen Hawking que sugere que a resposta não está nos céus, mas na física teórica. Isto é, a solução estaria na imaginação auxiliada pela matemática feita na ponta do lápis. Nesse sentido, existem várias concepções, algumas até inimagináveis aos simples mortais como nós. Por exemplo, a de que pode haver túneis semelhantes aos que as minhocas fazem na terra ligando partes extremamente distantes do Universo, atalhos, tanto no espaço como no tempo e as descobertas, pelo Telescópio Espacial Hubble, de protoplanetas na nebulosa de Orion, e o contínuo aparecimento de moléculas orgânicas altamente complexas no meio interestelar reforçam essa idéia.
Hawking, um anti religioso confesso, escreveu que a criação do universo "pode revelar a mente de Deus"
A comunidade científica diz que há "bilhões" de lugares fora do nosso sistema solar que podem conter "civilizações tecnológicas" e por isso continuo cada vez mais crente sobre o assunto e acreditando piamente que em algum lugar, em algum ponto, há vida em abundância e penso: “que porra de tecnologia é esta que estes avançados cosmonautas ainda não puderam nos visitar ou mandar um pequeno sinal de sua existência, já que nós terráqueos vivemos infestando os céus com tralhas enviando nossa posição na galáxia”.
Já desenvolvemos uma teoria da "evolução cósmica", que prediz que a vida é um fenômeno natural capaz de surgir em planetas com condições ambientais adequadas e as evidências científicas mostram que a vida na Terra apareceu rapidamente, sugerindo que o mesmo poderia acontecer em planetas similares. O vasto número de estrelas no universo observável abrigaria muitos planetas habitáveis onde provavelmente civilizações avançadas estariam tentando se comunicar conosco. O problema é que até agora ninguém, ou coisa alguma, conseguiu fazer isso - e talvez esta seja a maior prova que existe vida inteligente em algum lugar lá fora, talvez tão inteligentes que ignoram completamente nossa sublime e simplória existência.
No Distrito Federal também me envolvi profundamente com o modo de viver de algumas comunidades alternativas que existiam ao redor, notadamente na cidade de Alto Paraíso, já no estado de Goiás e para lá ia seguidamente, principalmente quanto buscava refúgio espiritual, apesar de todo o meu ateísmo. A cidade é um lugar místico, onde pessoas de todas as categorias sociais, buscam amparo espiritual e acreditam ser um lugar escolhido pelos extraterrestres para estabelecer contato com os humanos.
Ali, políticos de todas as matizes, diplomatas de quase todos os países, cientistas, sacerdotes e leigos em geral, buscam respostas as suas vicissitudes.
Fui várias vezes ao local, sempre acompanhado de meu amigo Pauläo – tinha este apelido por ser um daqueles Paulos altos e encorpados – que foi quem me mostrou pela primeira vez a cidade e os lugarejos místicos que faziam parte de um aglomerado de pequenas montanhas, circundando um vale fértil em pleno cerrado goiano.
Num desses passeios a cidade, ficamos longas horas conversando com moradores do lugar que afirmavam ser a região um lugar abençoado por Deus e escolhidos pelos extraterrestres para fazerem sua apresentação ao povo da terra.
Disseram-nos também que além de Alto Paraíso, haveria apenas três outros lugares escolhidos pelos alienígenas para contatar nossa civilização: um no Butão, na Cordilheira do Himalaia, um na União Soviética, na região da Sibéria e outro na Ilha da Páscoa, Oceano Pacífico, onde seres de outros planetas fariam suas bases e preparavam terreno para um contato com os humanos. Houve um caso relatado por um dos moradores que garantia alimentar um ser inumano que vivia na região e que fazia contato apenas mentalmente, orientando-o sobre as coisas que o alimentaria, tendo, em certa oportunidade, servido-lhe chumbo derretido com isótopos da luz elétrica.
Para mim era absurdamente ilógica tais revelações.
Contavam histórias arrepiantes sobre aparições, contatos e abduções alienígenas, dando nomes a Ets e aos Planetas ou Constelações de onde vinham, apesar de nunca haver um único caso comprovado cientificamente, sobre os fatos que fizeram de Alto Paraíso um verdadeiro oásis para os aficionados pelo desconhecido, pelos ETs e pelo sobrenatural.
Houve um caso de um lavrador que, após constatar que sua plantação de milho estava secando, percebeu um estranho facho de luz sobre a mesma e em poucas semanas o milho refloresceu numa velocidade e numa capacidade espantosa. Acreditava ele, ser uma dádiva dos habitantes de um planeta situado na constelação de Vegas e que já haviam estabelecido um contato com moradores da região. Estes seres, conforme descreviam, não eram de carne e osso, mas sim uma espécie de luminosidade gasosa e tinham odores indescritíveis e altamente adormecedores.
Foi em Brasília também que, depois de muitos anos resolvi dar continuidade ao livro que começara a escrever há 17 anos atras. Mudei toda a sua história e seu contexto. Queria, agora, transformar “Em Busca de Deus”, em uma espécie de tratado literário de ficção científica, ao qual resolvi dedicar-me de corpo e alma. Deixei para trás grande parte do que já escrevera sobre ele, mudei os personagens, desisti de colocar um livro dentro do outro com a narração do conto escrito pelo meu antigo personagem que se chamava Breno Saada.
Em Busca de Deus não era nada religioso e nem tinha a ver com o Deus das catequeses ou dos templos frios e que pregavam um Deus, a meu ver, muito ríspido e rígido com sua criação. Quis buscar um Deus Cósmico e que tivesse uma interação efetiva com sua criação. Imaginei um conto fantástico com alienígenas e também seres extraterrenos, mas que um dia já passaram ou foram conhecidos dos terráqueos. Criaturas que habitavam os cosmos e que agora se revelariam aos humanos e falariam sobre a criação e sobre o infinito, traçando destinos e relatando a história do cosmos, da nossa galáxia e de outros bilhões de mundos e estrelas que também formava imensas e inalcançáveis galáxias. Era algo bíblico, mas também cósmico e celestial.
Queria conceber, no livro, um Universo com formas de vidas diferentes, mas habitado e dirigido por seres celestiais sob o comando supremo de um Deus universal. Um espaço infinito, habitado por criaturas inimagináveis e também por seres humanos que um dia já haviam vivido na terra. Busquei inspiração até em textos bíblicos para poder continuar minha obra. Eu não tinha muita convicçäo religiosa e isto dificultava muito minha capacidade de escrever sobre o assunto, porque no fundo eu temia contradizer-me em minhas convicções ateias e agnósticas. Mas mesmo assim escrevia desenfreadamente, tentando encontrar um desfecho para o meu romance, e por mais que tentava, sempre surgia um nova brecha para continuar escrevendo sobre os mistérios do cosmos, sobre Deus e sobre o destino da humanidade.
Buscava impor um ritmo de narrativa diferenciado dos habituais escritores, mas sempre entrava em contradição e voltava a rabiscar novamente as páginas já concluídas. Pensei em dar continuidade ao conto do meu personagem Breno Saada, mas desisti também e resolvi remodelar toda a história de “Em busca de Deus”, mesmo que isso me maltratasse muito pelo fato de estar jogando no lixo quase toda a minha adolescência de escritor.
Lembro de ter mostrado alguns trechos do meu livro para alguns amigos, sendo alguns deles escritores, que no fundo, deram uma risadinha sinistra, ao dizerem “está ótimo continue”. Tinha muito receio de cair no ridículo, porque afinal tinha que preservar uma boa fama como astrônomo e não poderia contradizer minhas próprias teorias, escrevendo sobre coisas idiotas ou típicas dos contos dos “Perry Rodhans” da vida.
Fazia de tudo para ver meu livro publicado, mas também muito cuidado, até
porque, nesta época, já havia escrito alguns artigos interessantes sobre astronomia e que foram publicados em revistas famosas sobre o assunto. Lembro de um artigo que escrevi sobre a reserva de recursos orçamentários para a exploração espacial que fora publicado até no exterior.
Dizia nele que o Brasil, a exemplo de alguns países desenvolvidos, precisava tratar a questão espacial com prioridade e muita seriedade, até mesmo pela sua enormidade territorial. Eu sabia da importância para o futuro da humanidade da exploração espacial e da formações de entrepostos ou colônias até mesmo além de nosso sistema solar.
Nesta época voltei a lembrar muito de Franz, o velho e bom Franz que tinha me ensinado os primeiros passos para a entrada no ramo da astronomia e ainda guardava com muito carinho o velho telescópio que ele me dera e sempre que via o aparelho voltava a sentir uma saudade enorme de minha terra e do mar.
Queria por em prática os ensinamentos de Franz, mas não encontrava espaço nem motivação suficiente para continuar depois que ele morreu. Além do telescópio, Franz me deixara muitas coisas antigas e a maioria delas relacionadas com seus estudos sobre os céus e o universo.
Certo dia, vasculhando as coisas que me deixara, descobri um mapa do universo, desenhado pelo pai de Franz, que exibia uma outra concepção de via láctea colocando planetas, até então inexistentes na rota que ele, misteriosamente, traçara até os confins do sistema solar. Não conseguia entender aquilo, até que ouvi falar nas elucubrações de descobertas de um misterioso planeta que existiria entre Júpiter e Saturno e que poderia ser o décimo do sistema solar.
Via então no mapa do pai de Franz alguma coisa lógica e comecei a entender que sua inteligência e conhecimentos de astronomia estavam muito além das que atualmente conhecíamos e passei a respeitá-lo de uma maneira cada vez mais carinhosa e compreensiva. Utilizei-me dele e de seus escritos muitas vezes para sobressair-me em conferencias e encontros sobre astronomia, tentando convencer a comunidade científica de que o sistema solar era algo muito mais grandioso do que até então se concebera.
Pensando na odisséia espacial do homem até então e os mistérios que a rodeiam, recordei aquele memorável dia 4 de outubro de 1957, quando os soviéticos lançaram o 1o satélite artificial ao espaço, o Sputnik 1 e parei no dia 16 de julho de 1969, quando o homem em sua maior jornada humana, pisava, pela primeira vez o solo lunar, pelos pés de Neill Armstrong e Edwuin E. Aldrin, onde chegaram com a arrojada Apollo 11.
Foi ai que lembrei-me de Josef Shklovsky, um cientista russo que acredita na existência de vida em planetas situados numa distância de quase 10 mil anos luz da terra. Tal distância seria inalcançavel com o atual estágio tecnológico do homem, asseverei, recordando ainda suas declarações de que em dois séculos e meio o homem obteria condições para estabelecer colônias espaciais com capacidade para abrigar cerca de 10 bilhões de pessoas. “Visionário, louco, esquizofrênico”, disse a mim mesmo sobre ele, principalmente, quando ouvi sua tese de que em 2.500 anos o homem já terá colonizado todo o universo.
Meditava muito sobre os terrores da humanidade. Quantos assassinos em potenciais e quantos loucos desajustados comprometeram o equilíbrio do planeta terra: Atila, o rei dos Hunos, Napoleão, a escravidão, as correntes que imolavam assassinos em nome de uma justiça porca e surrealista, sempre a serviço dos senhores do Poder. A escravidão, aberração que uma raça que se julgou superior cometeu contra irmãos. Enfim, acho o ser humano desajustado, incivilizado e capaz de atrocidades que sempre tememos um dia vir de nossos vizinhos do espaço sideral.
Impressionava-me a miséria humana, a maldade e a ignorância do ser humano diante de seus semelhantes. Abominava as classes sociais e procurava, incansável, respostas objetivas aos questionamentos que acumulava desde a infância.
Tentava estabelecer uma idéia do porque tamanha obsessão pela vida
extraterrestre. Não compreendia porque desde pequeno não fui normal como todos os outros garotos que jogavam bola e brincavam de pega pega, enquanto eu me abraçava aos objetos de observação e ficava a vasculhar os céus.
Quando criança fui muito parecido com o Alan Hale – aquele do cometa Hale-Bop – que aos seis anos de idade se apaixonara pelas luzes cintilantes do céu noturno e que aos 11 anos, convenceu o pai a lhe dar seu primeiro telescópio.
Poucos meses depois, ele viu o primeiro cometa. Ele levava o nome de seus descobridores. "Seria fantástico se eu pudesse algum dia descobrir algum e ter meu nome dado a ele também.
Tinha agora um outro objetivo, Queria fundar em Brasília um Instituto de Pesquisas Espaciais, nada profissional, mas algo que pudesse incitar as pessoas, especialmente as crianças ao interesse pela astronomia. Comecei pedindo apoio a Universidade que me cedeu uma pequena sala, para onde levei todas as minhas coisas, inclusive o telescópio herdado de Franz. Consegui também algumas lunetas e alguns velhos telescópios os quais instalei em minha saleta na UnB. Estava por demais entusiasmado, já que o cerrado no planalto goiano era o melhor lugar do Brasil para se observar os céus.
Lembrava sempre de Franz Kopelck e sua paciência em explicar-me o círculo da vida no universo, Dizia-me com profunda retidão que eu nunca deveria aceitar a lógica da maioria a não ser que ela tivesse baseada em conhecimentos extra-humanos. Ele tinha convicçäo de que a inteligência humana seria muito limitada para tentar explicar a existência universal. Os homens eram mesquinhos em suas concepções e sempre iriam se acharem donos da verdade.
Eu tinha profunda admiração por Franz e pela sua abnegação em desvendar a origem da vida e o nosso papel diante da extravagancia do universo e da grandeza de nossa própria via láctea. Ele era um homem sofrido, mas maduro, a ponto de envolver 18 horas por dia de sua vida, na pesquisa de novos corpos celestes e na busca solitária de algum ponto no céu que pudesse dar a esperança de se encontrar novas raças, novas formas de vida e novas esperanças para o já tão combalido planeta terra.


8
ANGELA

Nesta época, na faculdade, havia um alvoroço muito grande no curso de astronomia. Os jornais e as revistas especializadas informavam que a Sonda Espacial Voyager 2, lançada ao espaço em 1974, para um turnê pelo Sistema Solar e a exploração dos astros mais próximos, havia voltado a terra misteriosamente, depois de ter desaparecido além do Planeta Plutão.
Com a abertura da caixa preta da nave, descobriu se centenas de fotos fantásticas do Planeta Júpiter e de Europa, uma das luas do Planeta, que mostravam claramente a existência de oxigênio em abundância para sustentar qualquer tipo de vida.
Fiquei arrepiado com a notícia, porque lembrei-me de “2001 uma Odisséia no Espaço” e sua continuação “2010, o Ano em que Faremos Contato”, filmes cujas histórias revelaram a existência de uma estranha forma de vida nesta lua jupiteriana.
Houve muita especulação em torno do destino da Voyager 2 que tinha adentrado os limites do nosso sistema solar e passado para além de Plutão e seus frios vizinhos desconhecidos. A Voyager 2 havia explorado também Urano e Netuno e se perdera nos confins do sistema solar, rumo a outras regiões da Galáxia, penetrando num imenso buraco negro e vindo a cair, no Monte Ararat, na Turquia.
Durante um bom tempo, a silhueta da Voyager 2, na montanha, induziu pesquisadores e até cientistas a acreditarem que ela seria a Arca de Noé, o que levou a sua descoberta por um grupo de pesquisadores norte-americanos, que esperavam, no fundo, encontrarem vestígios da Arca do Dilúvio.
Que espécie de viagem fizera a Voyager. Onde esteve, o que fotografara e por quais regiões inóspitas do cosmo havia passado? Era um mistério tão grande que só agora com seu reaparecimento se poderia desvendar.
Era o fim do ano de 1998 e um período de muita agitação. Os jornais e telejornais de todo o mundo só falavam da Sonda Voyager 2 e mostravam, continuamente, fotos que ela tirara durante sua estada na região jupiteriana e dos confins do Sistema Solar.
Eu me regozijava com tudo aquilo e pensava “estou certo, há algo mais no céu, não é só a Terra a oxigenada do sistema solar”.
Ainda lembrei nitidamente da primeira vez que assisti 2001, uma Odisséia no Espaço, em 1972, quando tinha apenas 12 anos de idade e tinha me fixado na idéia do filme de que existia uma sofistica forma de vida no satélite jupiteriano.
Passado dois meses de sua volta, os Estados Unidos, em parceria com dez outros países, entre eles o Brasil, iniciou um projeto arrojado, chamado Europa para estudar, promover e achar as possibilidades de enviar uma missão espacial tripulada á Região cósmica de Júpiter , para pesquisas mais apuradas em Europa, inclusive com uma descida em sua superfície.
Aquilo havia despertado em mim uma vontade ainda maior de continuar acreditando que a vida não era uma prerrogativa terráquea.
Coincidentemente ou não, achei que a descoberta de microorganismo em Europa se encaixava perfeitamente no ponto do universo onde haveriam mais probabilidades de se encontrar vida extraterrestre, até porque alguns visionários, como Arthur Clarke, já a tinham escolhido para tal eventualidade, nos filmes de ficção científica, “2001, Uma Odisséia no Espaço” e “2010, O Ano em que Faremos Contato”.
Algumas semanas depois do alarde sobre a Voyager, realizou-se, em Brasília, o I Fórum Mundial de Ufologia, do qual participaram representantes dos mais diversos países do mundo, inclusive dos Estados Unidos, que por conta das descobertas em Europa, mandara uma Astrônoma brasileira, chamada Angela e que trabalhava para a Nasa, mas precisamente para o Programa Europa e para o SETI-Busca por Inteligência Extraterrestre, que também assumira o controle do programa destinado a patrocinar a primeira viagem cosmo espacial ao satélite jupiteriano.
Nesse encontro, pelo número de participantes, estimou-se que existam, atualmente, cerca de cinco mil pesquisadores, espalhados pelo mundo inteiro, ávidos para desvendar os mistérios das supostas aparições de Ovnis. Muitos deles estavam no fórum e defendiam o reconhecimento da Ufologia como ciência e esperavam tirar do encontro um documento a ser encaminhado a Organização das Nações Unidas-ONU, sobre o assunto.
No Fundo, não me considerava um ufólogo, nem um místico ou um aficionado por Ets, mas um astrônomo que buscava reconhecer a lógica universal e conceber um espaço sideral que poderá ficar congestionado por naves, astronaves e outros veículos espaciais transitando em aerovias intergaláticas, num futuro que acreditava não estar muito distante.
No fórum conheci pessoas que encaram o estudo da ufologia como coisa séria, apesar de haver uma maioria expressiva de lunáticos que concebiam as mais espantosas aparições e os mais extravagantes contatos.
Logo, no início dos trabalhos do Fórum, aproximei-me de Angela e travei um contato mais profundo com ela e fiquei sabendo que ela era uma astrônoma gaúcha que trabalhava na Nasa há mais de 10 anos. Foi com ela que mantive o maior número de conversas sobre Ets e também para quem contei meus sonhos na adolescência e as experiências com os grão de areia na Praia do Rincão, em Santa Catarina, ao ponto de me envolver amorosamente com ela.
Em sua palestra, Angela anunciou que uma semana depois do festejado anúncio de que uma forma microscópica e primitiva de bactéria pode ter existido em Marte, a agência espacial americana revelou novas evidências da possibilidade de vida extraterrestre. Fotos fantásticas de Europa, uma das luas de Júpiter, tiradas pela Voyager 2, levaram os cientistas a desconfiar que há um oceano debaixo da calota de gelo que cobre quase todo o satélite. A inexistência de crateras, as rachaduras e sinais de movimento na crosta gelada de Europa indicam a possibilidade de água corrente, o que confirmaria as especulações de que este satélite de Júpiter é o único outro lugar no sistema solar, além da Terra, onde deve existir um oceano.
- Estamos cada vez mais próximos de comprovar a existência de água em estado
líquido, o que aumenta as chances de que Europa seja um ambiente propício à vida. Os closes feitos pela Voyager na capa de gelo de Europa mostram uma aparência quebradiça, muito semelhante a certas partes da calota polar ártica da Terra. Para existir vida, é preciso três coisas: água líquida; calor, que Europa pode ter se houver gelo derretido; e química orgânica, que geralmente é carregada por cometas ou meteoritos que atingem os planetas”, disse Angela, afirmando também que as novas descobertas sobre vida extraterrestre voltaram a dar um norte ao programa espacial americano, sem rumo desde o Projeto Apollo, que levou o homem à Lua em 1969.
Angela falou também sobre o trabalho de marketing que o governo dos Estados Unidos tem feito em relação a estas últimas descobertas espaciais e que já vem servindo ate como plataforma eleitoral de alguns candidatos a presidência no país, como o próprio Bill Clinton que assim como John Kennedy no início dos anos 60 prometeu que um americano pisaria na Lua até o final daquela década. Clinton já se comprometeu pessoalmente com os esforços da Nasa na busca de evidências de vida alienígena e por isso está dando total apoio ao Projeto Europa.
- A Voyager 2 trouxe consigo informações valiosíssimas sobre o Planeta Júpiter e seus satélites o que tem levado a uma determinação global de uma espaçonave tripulada a Europa, um dos satélites de Júpiter, o qual, segundo informações da Voyager, apresentava indícios da existência de oxigênio em grande quantidade para a sustentação de vida, reafirmava Angela, sempre que era questionada sobre a V-2.
- A Sonda era um verdadeiro oásis para os estudiosos do assunto, tanto que
tornou-se possível formar um grupo eclético de cientistas, que reunia desde renomeados astrônomos a visionários esquizofrênicos para desvendar os estranhos sinais de rádios vindos de Júpiter, provavelmente de Europa, Io, Ganimedes ou Calisto , luas do Planeta, ou ainda de seu 17o recém descoberto satélite, Talman, aquilo que sempre pensou tratar-se do 10o planeta do sistema solar.
Durante a noite, num jantar com Angela, fui informado por ela que o Projeto Europa tornou-se um mega empreendimento destinado a buscar alternativas para a construção de um veículo espacial capaz de alcançar a região cósmica de Júpiter e preparar o recrutamento da tripulação da nave que já tinha recebido o nome de Pioneer B-3, e que ela era a encarregada do recrutamento dos latinos americanos que iriam participar da viagem exploratória. Angela contou-me que havia um consórcio de 12 mega-empresas, de 11 países sob a orientação da Nasa, para a construção de um Foguete espacial com capacidade para 400 pessoas, para a exploração das redondezas de Júpiter.
Meu Deus, pensei novamente em Galileu Galilei, lembrando que desde que ele apontou em 1610 sua luneta em direção a Júpiter e descobriu quatro de seus 16 satélites, este planeta tem sido a maior fonte de fascínio para os cientistas.
- Além da Voyager, também há outra nave da Nasa, que leva o nome de Galileu e que já entrou na órbita de Júpiter, recentemente e tem feito descobertas fascinantes sobre o imenso planeta - 1,4 mil vezes maior que a Terra - e suas luas. Como a de que a grande mancha vermelha, a marca registrada de Júpiter, é um gigantesco furacão (tem duas vezes o tamanho de nosso planeta) que inexplicavelmente não pára de girar há mais de 300 anos. Ou então que Europa, assim como a Terra, tem campo magnético e oxigênio em sua atmosfera - possibilidade antevista pelo escritor de ficção científica Arthur Clark, que escolheu justamente Europa para ambientar em 2010 o primeiro encontro de humanos com extraterrestres.
Ao ouvir Angela sobre as novas da Nasa, parecia-me estar ouvindo um conto de ficção cientifica. Mas como alcançariam planeta há mais de 600 milhões de quilômetros da terra?
Havia outra dúvida, que tipo de combustível poderia impulsionar uma espaçonave até as proximidades de Júpiter, apesar de saber que os americanos já haviam desenvolvido uma espécie de combustível a partir da nuclearizaçäo de partículas de hidrogênio líquido associado com átomos de oxigênio, cujos teste haviam sido feitos num supersônico da Nasa que conseguiu dentro da atmosfera terrestre desenvolver a fantástica velocidade de 90 mil quilômetros por hora. Mas mesmo assim ainda era insuficiente para propulsionar uma espaçonave de milhares de toneladas. Fiz até um calculo e cheguei a conclusão que mesmo com o tal combustível uma nave levaria mais de dez meses para chegar até o planeta. Mas quem era eu para duvidar da Nasa e por isso rendi-me as explicações de Angela.
“Querem envolver todos os povos da terra no projeto. A Pioneer B-3, com capacidade para 400 pessoas, abrigará de um a cinco representantes de cada país e uma tripulação composta por americanos, russos, ingleses, franceses, japoneses e chineses”, disse ainda, completando que o Brasil teria cinco vagas na viagem, o que já vinham mobilizando euforicamente a comunidade cientifica nacional, as Forças armadas e grupos religiosos interessados na viagem ao espaço sideral, disse-me ainda, lembrando ser este o motivo principal de sua presença no Fórum.
Angela contou-me também sobre um projeto da Nasa chamado Mars Direct que visa a exploração do Planeta Marte, o qual é apoiado pelo presidente da Câmara dos Representantes americana que diz querer criar uma legislação para suportar o projeto. E que agora estava dirigindo seus propósitos para o projeto Europa. Fiquei um pouco mais crédulo nas possibilidades de se ir a Júpiter quando ouvi Angela contar a história do Mars Direct. Segundo, me adiantou, o Presidente da Câmara propõe que o Congresso institua US$ 50 bilhões em prêmios - custo estimado da missão - para cativar a iniciativa privada a solucionar os diversos desafios tecnológicos do projeto.
- Para colonizar Marte, seriam precisos cerca de US$ 50 bilhões em cima da mesa o que fará com que a iniciativa privada se interesse pelo projeto, contava Angela, afirmando ainda que já está sendo deslanchada uma corrida espacial privada que obrigará os concorrentes a manter seus custos dentro do orçamento. Caso a missão falhe, não acarretará nenhum custo ao contribuinte americano. Não é preciso atrair muitos investidores. Na verdade, basta um Bill Gates", dono da Microsoft e de US$ 18 bilhões. Caso aprovado pelo Congresso, o concurso Mars Direct terá 12 desafios:
1º - Enviar uma sonda para fotografar 10% da superfície marciana, além de 200 locais preferenciais para o pouso da missão tripulada. Premiação: US$ 500 milhões.
2º - Coletar rochas marcianas e trazê-las à Terra usando combustível produzido a partir da atmosfera do planeta. US$ 1 bilhão.
3º - Demonstrar o funcionamento de uma nave com três astronautas no espaço por dois anos sem envio de suprimentos. US$ 1 bilhão.
4º - Colocar um jipe robô com cabine pressurizada para duas pessoas em Marte. O jipe deve percorrer no mínimo 100 quilômetros. US$ 1 bilhão.
5º - Construir um módulo de ascensão que decole cinco toneladas de carga da superfície até a órbita de Marte usando combustível de origem marciana. US$ 1 bilhão.
6º - Funcionar uma usina que produza 20 toneladas de combustível no Planeta Vermelho ao longo de 500 dias. US$ 1 bilhão.
7º - Fabricar um gerador que produza em Marte 15 quilowatts diários de energia durante 500 dias. US$ 1 bilhão.
8º - Pousar 20 toneladas de carga em Marte com desaceleração de oito gravidades - máximo suportado por humanos US$ 2 bilhões.
9º - Disparar um foguete que coloque 120 toneladas de carga na órbita terrestre. US$ 2 bilhões.
10º - Enviar a Marte um módulo espacial com 50 toneladas de carga. US$ 3 bilhões.
11º - Assentar 30 toneladas de carga na superfície marciana. US$ 5 bilhões.
12º - Ser o primeiro a enviar uma missão tripulada a Marte e trazê-la de volta em segurança. Prêmio: 20 bilhões. Condições: o foguete deve ser lançado de território americano, a maioria dos tripulantes ser americana e três deles devem permanecer 100 dias na superfície. Cada tripulante receberá um prêmio de US$ 1 milhão por cada dia no espaço. Se ficarem 100 dias em Marte, recebem US$ 460 milhões cada um (somando-se aos 360 dias viagem de ida e de volta). Caso permaneçam 26 meses no planeta aguardando a próxima janela espacial, cada tripulante volta à Terra bilionário. Embolsa US$ 1,14 bilhão.
Estava cada vez mais entusiasmado com Angela. Afinal, encontrei alguém a altura para conversar e discutir sobre os meus assuntos prediletos: Astronomia e Vida extraterrestre.
- Mas, se já há dificuldades, quase intransponíveis para se colonizar Marte, como,
então chegar e descer em Europa, questionei-lhe, lembrando que a lua jupiteriana está a 625 milhões de quilômetros da Terra.
- Alguns cientistas norte americanos descobriram, efetivamente, uma forma de
animação suspensa, pela qual o corpo humano pode ficar em estado vegetativo durante mais de 10 meses, sem qualquer complicação para o corpo humano.
- Mas isto já foi testado?
- Sim, em macacos, que conseguiram ficar 11 meses em estado de animação suspensa.
- Mas, macacos, são macacos, não tem a mesma estrutura molecular do ser humano.
- Isto é segredo, Arthuro, mas um casal de humanos já se submeteu a esta
experiência. Estavam com uma doença incurável e se proporam a testar a vida suspensa. Sobreviveram 10 meses, sem que o câncer que tinham tivesse progredido e ao saírem do estado de latência, estavam perfeitamente bem de saúde.
Percebi que Angela acabara de me revelar um segredo da Nasa. Não sei se ela fizera certo. Afinal, porque o excesso de confiança numa pessoa que ela conheceu fizera apenas alguns dias?
- Não sei porque, mas o tenho como pessoa de minha mais alta confiança, disse-me
ela, fazendo-me ficar impressionado com sua posição.
Angela, pôs-me, também, a par das novas descobertas em astronomia e que ainda não haviam sido liberadas para divulgação externa, como a descoberta um novo sistema solar na Via Láctea, o que aumentam as chances de serem encontrados sinais de vida em outros planetas.
- Pelo que sei, até então, só se conhece mesmo, o nosso próprio sistema, com
nove planetas orbitando em torno do Sol, respondi, querendo provocar a continuidade da conversa em torno do assunto.
- Conforme constataram os astrônomos que a descobriram, a nova família celeste
está há 44 anos-luz da Terra (cerca de 400 trilhões de quilômetros) e é formada por três planetas que orbitam a estrela Upsilon Andromeda, um astro semelhante ao Sol e que existe há três bilhões de anos. Os planetas têm massa 300 vezes maior que a Terra, são gasosos e com temperaturas elevadíssimas.
- Mas com essas características eles são inabitáveis, retruquei.
- Sim, mas os cientistas não descartam, no entanto, a hipótese de que existam
planetas menores e mais parecidos com a Terra nesse novo sistema solar.
- De qualquer forma são inalcançáveis, assim com deve ser o nosso sistema solar para eles, disse.
Que ironia, estávamos falando de um sistema solar que estaria a 400 trilhões de
quilômetros da terra e, no entanto, estava eu preocupado com a possibilidade de se viajar míseros 620 milhões quilômetros até Júpiter.
- A chance de que outros planetas do Universo podem ou puderam sustentar algum tipo de vida vem sendo cada vez mais ampliada pelas novas descobertas, inclusive a de dois cientistas da Universidade de San Francisco, nos Estados Unidos, que localizaram dois planetas de outro sistema solar muito distante do nosso, onde há indícios de presença de água, matéria-prima da vida em qualquer lugar. Um desses planetas, com duas vezes o tamanho de Júpiter, orbita a estrela 47 Ursa Maior, distante cerca de 300 trilhões de quilômetros da Terra. O outro, seis vezes maior que Júpiter, está na órbita da estrela 70 Virginis, na constelação de Virgem. Pelo que as pesquisas dos dois cientistas revelaram, a vida como a que existe na Terra seria totalmente impossível nestes dois planetas, dadas as condições atmosféricas hostis. Mas a descoberta daqueles dois planetas gigantes foi um prenúncio do que o meteorito de Marte acabaria por revelar: a vida não é uma exclusividade terráquea. A matemática astronômica ajuda ainda mais a acreditar nisso, comentou, Angela, tornando-se cada vez mais ébria em suas conversas sobre as astronomia.
- Nós, astrônomos, também somos cientistas, disse a Angela, garantindo-lhe que a probabilidade da existência de vida extraterrestre é quase 100% dado a infinidade das galáxias, mas a probabilidade de que essa vida tem qualquer semelhança com os seres humanos é quase zero, devido as adversidades espaciais.
- Alguns pensadores apostam mais no acaso do que em um propósito, pelo menos
para a vida inteligente, respondeu-me, afirmando que se um asteróide não tivesse atingido a Terra há 65 milhões de anos, os dinossauros não teriam desaparecido.
- Se esse evento puramente acidental não tivesse ocorrido, certamente não haveria
condições para a evolução dos mamíferos e o homem não teria aparecido, concordei.
A partir daquele assunto, passei a tarde e grande parte da noite conversando com Angela sobre astronomia e ela demonstrava ser profundamente interessada no assunto. Após tomar quatro copos de vinho, Angela pôs-se a falar sobre o universo de forma contundente.
- Arthuro, como ignorar a vida no universo se da terra já conseguimos visualizar
com telescópios, de 75 a 100 milhões de galáxias, observou, demonstrando já estar um pouco afetada pelo álcool.
Enquanto Angela, tomava seu quinto copo de vinho, eu só bebia Coca Cola Light e cerveja Kronebier sem álcool, o que me colocava em vantagem a ela.
Mostrei-lhe que também detinha um conhecimento muito grande sobre astronomia e disse-lhe que ao longo do "equador galáctico" muito poucas galáxias podem ser observadas, fora desta área, elas se apresentam bastante numerosas, chegando até 1.800 por grau quadrado em algumas áreas do céu. Elas possuem formas diversas e são, de um modo geral, classificadas - sistema introduzido por Hubble em 1925 - como "espirais abertas" (26,3%), "espirais normais" (24,4%), "elípticas" (23,4%) "lenticulares" (21 ,0%), "irregulares" (3,4%) e "peculiares" (1,5%).
- Eu sei tudo isso Arthuro. Há 20 anos, dedico-me as astronomia. Desde criança
busco nos céus respostas para tanta coisa.
- Desde criança? Minha nossa, Angela, você foi como eu na infância. Também
lembro que aos nove anos vivia contando as estrelas do céu.
Iniciamos um animado papo sobre nossa infância e sobre o nosso gosto pela astronomia quando ainda criança e de repente, senti, que Angela aparecia ter nascido para mim e ela disse a mesmo coisa sobre mim.
Seus argumentos eram incontestáveis e tal como Franz, Angela era muito detalhista ao mostrar que entendia de astronomia e que conhecia a fundo todos os programas e as especulações que existiam em torno da busca de vida extraterrestre.
- Arthuro, - falou me desdenhosamente, demonstrando já estar altamente
Alcoolizada- a idéia original de que as principais características das galáxias evoluíram de um tipo esférico que, progressivamente, ia se tornando mais alongado e formando braços espiralados, cedeu a atual teoria de que sua estrutura é determinada na sua formação inicial, resultando do colapso gravitacional de uma protogaláxia, uma imensa nuvem do gás do hidrogênio. Uma protogaláxia com rotação lenta tende a colapsar numa forma quase esférica e com alta compressão gasosa, resultando numa rápida formação de estrelas, hoje velhas, e criando uma galáxia elíptica. No colapso das protogaláxias de rápida rotação, a condensação central se processa com parte do gás somente, gerando imediatamente estrelas e o resto, na forma de um disco rotativo , se condensa mais lentamente, convertendo-se em estrelas mais novas. Este disco, sendo instável, abre-se em braços que dão a galáxia uma aparência espiralada. As galáxias irregulares provavelmente devem se originar, também, de uma nuvem gasosa com alta rotação.
- Comecei a ver tudo embaralhado e parecia que eu é quem havia bebido duas
garrafas de vinho. O linguajar técnico e específico de Angela me cativava, já que gostaria muito de poder falar como ela.
Quando Angela retomou a conversa sobre a viagem a Júpiter e insistiu comigo para que me inscrevesse no Projeto Europa, imaginei, novamente, estar ouvindo um diálogo exagerado de um filme de ficção cientifica, mas quem me falava parecia de uma lucidez cativante, apesar de estar visivelmente embriagada. Fiquei por demais eufórico com as colocações de Angela sobre o Projeto de colonização de Marte e o Projeto de exploração de Europa.
Pensei logo, que com meus conhecimentos de astronomia, bem que poderia pleitear a viagem, mas sei que não teria muita chance por ser agnóstico, uma vez que Angela tinha dito-me que a Nasa estava dando preferência para pessoas com bastante fé religiosa e que acreditassem piamente em Deus.
. Querem pessoas que tenham fé para o total sucesso da missão, balbuciou Angela, já quase adormecendo com o rosto prostrado sobre a mesa.
- Mas o que tem a ver a fé com esta viagem. Russos e Chineses também não acreditam em Deus, e estarão participando. Ou acreditam”, indaguei a mim mesmo, recordando as pregações de meu pai contra os comunistas que eram tão maus que, durante a guerra, jogavam as criancinhas para cima e as aparavam nas pontas das baionetas.
De qualquer forma, peguei com ela um formulário e acabei me inscrevendo para a tal viagem cósmica, mesmo sem acreditar que ela efetivamente se realizasse ou que eu tivesse qualquer chance de dela participar.
Tinha, recentemente, assistido “Contato”, filme baseado no livro “Cosmos” de Carl Seagan, e presumi que poderiam ter interpretado erroneamente as fotos de Europa e por isso comecei a fazer questão de entrar para o grupo, já que tinha pego alguns referenciais nos sonhos que tivera durante minha adolescência e as experiências com os grãos de areia naqueles poucos anos que vivi no Rincão.
Passei a noite com Angela. Dormimos em minha casa e ela acordou com uma ressaca interminável e saiu as pressas para o Fórum de Ufologia, pois naquele dia iria participar de uma mesa redonda sobre a viagem a Europa.
Fui com ela, em silêncio, pensando seriamente sobre a viagem a Júpiter e com todas as evidências trazidas por Angela, agora mesmo que não aceitava a tese da solidão humana no espaço.
Não compreendia porque nossa galáxia, a Via Láctea, uma entre as presumíveis 400 bilhões que existem no Universo, apresentava-se vazia, sem vida e sem qualquer esperança de um dia compartilhar aos humanos uma companhia inteligente ou mesmo um só sopro de vida ainda que microscópica. Se as vizinhanças de cada estrela são regiões com alguma chance de existir vida (pela luz e calor disponíveis), então podemos cada vez mais apostar não apenas na vida extraterrestre, mas em formas mais sofisticadas do que simples bactérias.
O Congresso de Ufologia acabou no dia 5 de junho e Angela foi para o Rio de Janeiro, onde tinha uma reunião marcada com alguns cientistas brasileiros e representantes da Força Aérea Brasileira. Antes de viajar Angela jantou comigo e, novamente, passando a noite juntos.
Até então não tinha tido nenhuma paixão amorosa, mas ela havia se tornado uma saudade imensa em minha vida. Disse-me que do Rio, iria para o Centro Espacial de Huston, no Texas. Com sua partida, Angela deixou-me muita tristeza, porque pela primeira vez tinha conhecido uma mulher que partilhava de minhas opiniões e tinha a mesma profissão que eu. Pensei estar feito amorosamente, mas ela nunca mais me contatou e eu tampouco consegui falar com ela pelo telefone que me deixara.
Retornei as minhas atividades de rotina e passei a acelerar meu livro com a intenção de esquecê-la, mas Angela havia me deixado algo muito forte e que estava comprometendo até mesmo meu desempenho na universidade.
9
VIAGEM INTERROMPIDA

Estava terminado o mês de julho e a secura se tornava insuportável na cidade e para complicar ainda mais o clima sufocante de Brasília, nesta época, haviam espalhado um grande medo por toda o planeta, por causa do eclipse previsto para as primeiras hora do dia 11 de agosto de 1999 e no qual a ofuscação do Sol pela Lua será absoluta, em várias regiões do globo.
Para mim era um fenômeno por demais normal, mas haviam aqueles que buscavam incutir na população o medo e o desespero diante do fenômeno, creditando-lhe causador de catástrofes imensas e até mesmo o fim do mundo.
O que pegava naquele dia 11 é que ela era uma crença apocalíptica e por isto traria ao mundo uma inversão da ordem global.
Tudo cabia no momento. O mundo atual, corrompido e injusto, teria que ser destruído para dar lugar a um outro mais justo e equilibrado e como esta transformação precisa, sempre, vir acompanhada de uma esperança, de um paladino salvador, um novo messias, parecia que as previsões de Nostradamus estavam se encaixando para os menos esclarecidos.
Sei que o fim não chegará no dia 11 de agosto, mas está trazendo muito medo e apreensão. Em Brasília, li nos jornais que crianças choram. Compram velas para esperar a escuridão que veriam com o fim. Foram ao padre confessar a última briga com o irmão. Querem pedir perdão antes de o pior acontecer e terem menos pecados para o ajuste final.
Como eu, os astrônomos tentam provar, matematicamente, que não há chances de as profecias de Miguel de Nostradamus, sobre o fim do mundo, se concretizarem no dia 11. Mas a mídia sensacionalista e irresponsável tripudia em cima delas e deixa inquieta a população, notadamente, a menos esclarecida e apegada a dogmas religiosos.
Segundo algumas interpretações sobre o que o bruxo escreveu, o último eclipse solar total do milênio marcaria o início do fim do mundo, ao trazer dos céus o ‘‘Rei do Terror’’ com guerra e destruição. Mesmo assim, milhares de pessoas esqueceram a ciência e aderiram ao frenesi do apocalipse.
Lembrei de ter lido alguma coisa sobre as desvendações das Profecias de Nostradamu. Sei que o livro de Nostradamus foi escrito em forma de profecias enigmáticas como forma de garantir a sua sobrevivência, pois que teria sido destruído se o texto fosse mais claro. Ele revelaria personagens e segredos de bastidores dos cenários políticos, segredos de Estado e segredos que envolveriam a segurança das nações, e também os "cenáculos ocultos que tiveram, têm e terão papel fundamental no desenrolar dos fatos políticos".
Sei também que a maioria dos intérpretes de Nostradamus estão perdendo tempo já que o texto das Centúrias teria sido todo embaralhado, confundindo datas, lugares e personagens e lançando pistas falsas por todo lado. Sua criptografia é capaz de resistir à análise de qualquer agência de espionagem da atualidade. Alem disso, a maior parte das quadras não poderia ser entendida fora de um contexto ou de uma realidade mais ampla, a qual a maioria esmagadora dos intérpretes desconhece e possivelmente até rejeitaria, se lhes fosse explicada. As referências históricas fariam alusão principalmente à política francesa, e apenas de modo secundário ao continente europeu. As alusões a eventos a ocorrerem fora do continente europeu serviriam como marcos capazes de balizar a seqüência histórica.
Na França, cinco milhões de curiosos são esperados para ver o eclipse nas encostas próximas ao Oceano Atlântico. O fenômeno atraiu desde os seguidores de religiões milenares até os adeptos das seitas New Age (Nova Era). E, claro, os adoradores que fazem culto ao Sol. No Irã, os muçulmanos rezam com um fervor especial. Acreditam que o eclipse é um sinal de Alá, pedindo mais orações de seus fiéis. Enquanto isso, centenas de milhares de hindus se banhavam nos rios e lagos sagrados da Índia para purificar a alma.
Jean Dixon, vidente que previu os assassinatos dos líderes pacifistas Martin Luther King e Mahatma Ghandi, dizia que a cruz cósmica que será desenhada no céu, no dia 11, significará o início da ‘‘prestação de contas’’ da Humanidade. De fato, a Terra está no centro da cruz. No eixo horizontal se alinharão Marte e Saturno, e no vertical o Sol, a Lua e Urano.
À medida em que a Lua entrar na frente do Sol — trajetória que levará duas horas e 22 minutos —, ela vai projetar sobre a Terra um feixe de sombra de 110 km de largura. A penumbra começa no nordeste da América do Norte às 5h28 da manhã de Brasília, segundo a agência aeroespacial norte-americana (Nasa), numa velocidade de 2,5 mil quilômetros por hora.
Aos poucos, a sombra passará por regiões altamente povoadas: França, Bélgica, Luxemburgo, Alemanha, Áustria, Eslovênia, Hungria, Sérvia, Romênia, Bulgária, Turquia, Iraque, Irã, Paquistão e Índia.
O ponto cruciante deste eclipse é que o Sol, estrela 400 vezes maior que a Lua, será encoberto por esse pequeno satélite da Terra. Como ele está 400 vezes mais longe de nós do que a Lua, em determinado momento os europeus terão a nítida impressão de que os dois corpos celestes são do mesmo tamanho.
Anotei também alguns fatos marcantes que estavam acontecendo ás “vésperas do fim do mundo”: as bolsas de valores de Tóquio a Nova Iorque mostraram que o mundo financeiro internacional não aposta na profecia de Nostradamus. Pelo contrário, o clima é de exploração comercial, com a venda de óculos especiais, mapas siderais com esquemas explicando o eclipse e telescópios. Nas áreas onde o eclipse poderá ser acompanhado vivem dois bilhões de pessoas.
Em nenhum ponto do Brasil o eclipse será visto ou ao menos pressentido.
No mundo inteiro, porém, todos recordam de profecia apócrifa – que não consta da Bíblia, mas sempre foi difundida oralmente – de que Cristo teria dito aos seus discípulos: “A dois mil não chegarás”. Foi Nostradamus quem associou a profecia apócrifa ao eclipse de amanhã.
E, agora, vinham novamente a tona as desvendaçöes das profecias de Nostradamus, acumulada com uma série de outras previsões que davam como certo o dia 11 de agosto o último dia do planeta terra.
Será o fim do mundo, diziam fanáticos de todas as matizes, inclusive um estilista francês famoso que advertira que a estação espacial soviética MIR iria cair sobre Paris, com dezenas de bombas atômicas em seu interior e iniciar uma grande catástrofe mundial.
Ninguém tinha realmente certeza do que iria acontecer para que o mundo acabasse. Uns apregoavam que com o Eclipse do dia 11 a terra sairia de sua rota e colidiria com um outro astro ou se perderia no espaço sideral, retornando a era glacial ou explodindo em milhares de pedaços. Outros afirmavam que a terceira guerra mundial se desencadearia naquele dia com a intromissão dos Estados Unidos contra o bombardeio que a Rússia realizava em ex-repúblicas soviéticas em busca de independência. Também havia os que diziam que seria o apocalipse, tudo conforme estava descrito na bíblia, com a vinda de Jesus Cristo para julgar os vivos e os mortos.
Nesta hora de aflição e desespero, todo buscavam Deus, na tentativa de escapar de um fim trágico, conforme estava previsto pelas profecias.
Estava, boquiaberto com o alarde que a mídia estava fazendo sobre o eclipse, dando crédito a fanáticos religiosos e profetas apocalípticos que pregavam o caos para o dia 11 de agosto.
Numa tarde seca e fria do dia 31 de julho, ao chegar em casa vi o carteiro saindo da minha caixa de correspondência. Com certeza havia deixado uma carta para mim, já que morava sozinho. Acelerei o passo ansioso para ver o que tinha chegado. Era uma carta expressa, em forma de Sedex, e com registro pago pela Nasa. Fiquei emocionado e uma expectativa enorme tomou conta de mim. Relutei em abrir o envelope, porque temia também ser alguma mensagem que frustrasse minhas expectativas. Mas esperava uma resposta sobre minha pretensão de participar da viagem a Europa.
Fiquei pasmo quando constatei ser uma resposta positiva. Eu havia sido escolhido como um dos tripulantes da Pioner B-3 e naquele momento o Sistema Solar parecia passar todo a minha frente e tremia de emoção.
Estava engasgado de tanta felicidade. Imagine, ser escolhido entre quase 4 mil concorrentes e todas pessoas da mesma formação que eu. Tomei cinco copos de água de uma só vez. Fazia isso sempre que voltava das caminhadas e além do mais, já havia me habituado a tomar cerca de cinco litros de água por dia. Seguia uma receita do meu avô que ainda vivo, com 105 anos possui a energia de um homem de meia idade. Ele me aconselhara a tomar muita água, se possível, uns cinco litros por dia, garantiam que a água é a energia da vida e o purificador natural do organismo. Evitava doenças, regenerava com mais rapidez as células e mantinha o organismo em seu habitat natural.
Nesta época Angela já havia voltado ao Brasil. Estava morando no Rio de Janeiro, mas sequer me procurara. Nem uma ligação, nem um cartão. Nada. Era como que se definitivamente nada tivesse ocorrido entre nós. Imaginei que ela, com seu espirito aventureiro, deveria fazer isso com dezenas de homens que encontrava pelo seu caminho. Não tivera mais nenhum envolvimento emocional com ela, mas continuava impressionado com sua posição e com sua condição de astrônoma. No fundo nutria uma certa fascinação por ela e por isso achei que deveria contatá-la para lhe contar a boa nova.
Depois de me recuperar da euforia com a carta, liguei para o Observatório Nacional, no Rio de Janeiro e consegui conversar com Angela. Atendeu-me friamente e sem qualquer reação de surpresa em saber que era eu, apesar de ter ficado quase uma hora manifestando-lhe toda minha emoção. Ela me pareceu triste e eu não entendia o porque, até que fiquei sabendo que ela não participaria da viagem a pedido de seus dois filhos pré-adolescentes que imploraram lhe que não fossem. Disse-me que temiam que ela não voltasse nunca mais a terra.
Angela havia mudado para o Brasil, porque ficara encarregada do acompanhamento dos escolhidos para a viagem. Continuei ligando várias vezes para ela no Rio de Janeiro e algumas vezes até fui a cidade para vê-la. Mas não havia mais nenhum envolvimento sério, apesar de estar perdidamente apaixonado por ela, apenas conversávamos profundamente sobre astronomia e outros assuntos ligados a exploração espacial.
Com o tempo descobri que nutria uma grande paixão por ela. Sentia uma profunda tesão quando me aproximava dela. Meu coração batia rapidamente e minhas pernas pareciam tremer e claro ficava logo excitado, até porque ela era uma tesão inigualável. E Angela me colocava, agora, um medo profundo, o de sofrer uma nova decepção amorosa. Já tivera uma e fora a coisa mais terrível de minha vida. Sabia que não resistiria muito tempo abstêmio do álcool se voltasse a me apaixonar, porque minhas paixões eram eletrizantes e devastadoras.
Ficava, normalmente, tão apaixonado que logo buscava impor um relacionamento mais sério e tenho certeza que Angela não era disso. Não me parecia uma mulher nascida para o casamento ou para uma companhia amável, já que estava intensamente envolvida, também na viagem dos terráqueos a região cósmica de Júpiter. Tinha que convencê-la a ir na viagem, já que a própria Nasa tinha interesse em sua participação.
Fiquei muito triste pois esperava ter sua companhia nesta viagem de 620 milhões de quilômetros e de meses a fio, vagando pelo espaço. Enfim, depois de algum tempo acostumei e aceitei.
A partir de então, minha vida virou um furacão. Vivia assediado pela imprensa, mencionado nos telejornais e no jornais de grande circulação, com repercussões até no exterior. Cheguei a imaginar se teria sido assim com Amstrong, Aldrin e Collins, depois que voltaram de sua viagem a lua.
Espero que não, porque, afinal, ir a lua é moleza, nós iremos adentrar o espaço desconhecido do homem, indo para uma região onde nenhum homem jamais esteve, tal qual a saga de Jornada na Estrelas”, pensava.
Tinha muitas dúvidas sobre o que levaria para a viagem, já que nunca imaginei como seria a solidão do espaço sideral. De repente minha paixão pela ficção cientifica começou a ficar mais intensa e comecei a rever alguns filmes cults que tinha em minha coleção. As vezes me sentia impávido, colossal e em outras um pouco atemorizado, porque afinal a ficção estava começando a se tornar realidade e eu era um dos personagens principais da trama.
Os preparativos para a viagem a Europa estavam marcados para iniciar no dia 17 de dezembro de 1999 e no início deste mês, teremos que nos deslocar para o Centro Espacial de Huston, no Texas, para os treinamentos que durarão cerca de dois meses.
Passaram-se vinte dias desde o recebimento da carta da Nasa e por duas vezes estive
no Centro Espacial de São José dos Campos para saber dos preparativos da viagem e de como iria me deslocar para a América.
Fui procurado uma dezena de vezes pela imprensa. Todas as emissoras brasileiras de televisão me procuraram para entrevistas e programas especiais sobre a odisséia humana a região cósmica de Júpiter. Comecei a ficar famoso no Brasil, por onde andava era assediado por pessoas que diziam ter se tornado admiradoras pela minha coragem de participar de uma viagem ao desconhecido, sem saber o que iria enfrentar e sem saber também se sequer voltaria a terra um dia. As pessoas já me reconheciam na rua e tratavam-me com muito respeito e admiração. Era uma coisa fantástica aquela situação.
Eu, de repente dera um passo grandioso em minha vida. De escritor iniciante, professor de astronomia, pesquisador meio maluco das efemérides universais e um comum humano aficionado por seres extraterrestre, de repente, num piscar de luz, passara a ser uma pessoa altamente respeitada e procurada para falar sobre a viagem mais importante da epopéia humana.
Conhecia a fundo todas as glórias da grande jornada humana, das barreiras que o homem ultrapassara do século XIX par o XX, como ter ido a Lua, estabelecer estações espaciais no espaço, enviar objetos para pontos inalcançáveis da Galáxia, como as sondas Pioner e Voyager, mas nunca se imaginou que um dia ele iria tão longe, num viagem que até pouco tempo era uma coisa alem da imaginação e só possível nos contos de ficção cientifica.
Uma sensação gostosa tomava conta de mim. Sentia-me grande, poderoso, o máximo, pois estava me tornando uma das pessoas mais importantes do século, porque seria um dos poucos escolhidos para desvendar um mistério de milênios e talvez a desvendação da própria origem do ser humano.
Sempre tive comigo que a humildade era a chave de todas as portas e sempre me considerei um ser humilde até demais e agora precisava recuperar o tempo perdido e expor também um pouco do meu orgulho e da minha pompa, afinal eu estava me tornando uma celebridade nacional. Meu nome aparecia em Quiz de programas de televisão e em propagandas de instrumentos ópticos, telescópios e outros equipamento do gênero.
Também comecei a ganhar muito dinheiro com a publicidade em cima da viagem a Europa e começava, então, a me preocupar com que fazer com a enxurrada de cachês que recebia para participar de programas, propagandas e até conferências sobre a maior viagem espacial de todos os tempos.
Não era mais o tímido e sisudo Arthuro, era agora um astrônomo brasileiro que irá, muito em breve, se transformar num dos astronautas audaciosos que irão desvendar os confins do sistema solar, com apenas quatrocentas outras pessoas. Era um entre outros cinco do Brasil.
Pensava comigo, num frenesi maluco de conquistador, que seria um ser humano impar na história universal, pois poderia ser também um dos poucos que iriam em breve fazer contato com uma outra civilização de seres tão desconhecidos quanto a própria dimensão universal.
Mas uma coisa me intrigava profundamente, ainda não sabia que critérios haviam sido utilizados para a seleção dos astronautas, mas sabia que nem todos eram astrônomos. Haviam também militares, escritores e até jornalistas.
Com o tempo fui conhecendo meus colegas de viagem do Brasil, um oficial da aeronáutica, Sérgio Canhedo, residente em Brasília, um escritor de ficção científica de Alagoas, Sálvio Gouveia, um jornalista carioca, Marco Almeida e um outro astrônomo paulista, Pedro Solavar, que trabalha no Centro Espacial de São José dos Campos.
Sempre me lembrava de Franz Kopelck. Tenho certeza que se estivesse vivo, ele seria um dos escolhidos para a viagem, já que dedicara toda a sua vida na exploração dos mistérios da galáxia.
Depois de um contato, resolvemos agendar com a CNN uma entrevista em conjunto com os demais futuros astronautas.
Marcamos o programa para o dia 11 de agosto na Casa do Coronel Sérgio Canhedo, no Lago Sul, em Brasília.
Voltei a lembrar de Galileu Galilei e perceber que seu “Amanhã dos inícios” parecia ter chegado.
Na ante véspera do encontro já havia sido assediado por uma enorme quantidade de jornalistas, autoridades e representantes de entidades ligadas ao esoterismo, á religião e aos programas governamentais ligados ao programa espacial do governo brasileiro e pela minha condição de professor de astronomia era sempre o mais procurado para falar sobre a viagem. Lembro que, por conta das especulações sobre o fim do mundo no dia 11, perguntavam, me ironicamente, se eu não preferia que a viagem se realizasse no dia 10, porque assim poderia escapar da destruição da terra.







P a r t e 2


A V i a g e m






10
O FIM DO MUNDO

No dia anterior a entrevista, procurei meu amigo Paulão e convidei-o para ir comigo a Alto Paraíso. Não sei porque, mas pressentia que alguma coisa me empurrava para aquela cidade.
Ás vésperas da entrevista coletiva deu-me uma vontade muito grande de ir até lá. Não sei se tinha a ver com o zunzum que havia sobre o fim do mundo no dia 11 de agosto e que colocavam Alto Paraíso como a cidade da salvação, ou se simplesmente, senti saudades do povo místico da cidade.
Lembro muito bem de grandes amigos que fiz no lugar, especialmente Goti Rem e Ra-Muhá, adeptos de uma seita que tinha como ente máximo um tal de Aren-Kha que seria um extraterrestre que vinha mantendo contato com os terráqueos para prepará-los para a transição planetária.
Eles me falaram que o tal Aren-Kha era de um planeta seis vezes maior que Júpiter
e que orbita uma estrela do próximo sistema solar há cerca de 0,3 anos luz de Plutão e que esta mesma estrela viajava, há uma velocidade incrível em direção ao nosso espaço solar.
Então, lembrei que alguns cientistas norte-americanos haviam especulado sobre este
corpo celeste, apesar de ainda não terem nenhuma imagem nítida destes mundos. Também entendia minha ansiedade em ir a Alto Paraíso como uma preparo e também uma esperança de receber uma orientação mística antes de viajar.
Tinha uma certa fixação pelo lugar, tanto que não me saia da cabeça as paisagens
que ao longo do tempo se tornaram por demais familiar para mim.
Sempre ansiei um dia voltar a cidade e rever toda uma gama de figuras místicas e religiosas que influenciaram-me profundamente, inclusive, na decisão de rescrever meu livro.
Embora fosse um lugar seco e pobre com cerrados típicos do Planalto, Alto Paraíso era uma cidade pacata e aconchegante, rodeado por pequenas montanhas que o tornavam um lugar pitoresco, encravado no meio da Chapada dos Veadeiros, em Goiás.
Localizada a apenas 260 quilômetros de Brasília, a cidade é o lugar ideal para quem pensa em fazer contatos extraterrestres. Na cidade é comum ouvir falar de disco voadores, naves espaciais e de contatos com extraterrestres.
Em Alto Paraíso não é preciso pertencer a nenhum outro planeta para observar os hábitos de uma sociedade totalmente diferente e de vida voltada para a cultuação da paz e do amor.
Saímos de Brasília, de carro, perto das 8 horas da manhã, do dia 10 de agosto, véspera do tão esperado eclipse, que para alguns era o sinal do início do fim do mundo, conforme pregavam pelo mundo afora. Logo iniciei conversa com Paulão acerca do assunto, perguntando-lhe o que achava de tudo aquilo.
- Para mim a culpa de toda esta loucura é da mídia sensacionalista e irresponsável que não mede a conseqüência dos incautos, dos crédulos e dos fracos de espirito que temem terrivelmente o dia do mundo acabar, respondeu-me, demonstrando estar totalmente indiferente ao zum zum sobre o fim do mundo.
Era a quarta vez que vinha a Alto Paraíso e desta vez era uma visita relâmpago, apenas para matar a saudade do lugar. Precisava voltar logo para Brasília pois tinha o encontro na casa do Coronel Sérgio no dia seguinte
Paulão levava consigo uma caixa de cerveja skol em lata e já havia tomado quase a metade, durante a viagem. Deu-me uma vontade incontrolável de também tomar uma, mas lembrei do meu passado e das tristezas que o álcool me causara e consegui me controlar, apesar de babar com a geladinha que ele tomava diante do imenso calor que fazia naquele dia.
Cerca de 80 quilômetros da cidade, ainda em São João da Aliança, cidade limítrofe
com Alto Paraíso, pegamos um engarrafamento enorme que, conforme dizia alguns, iria
até além dos limites da cidade.
Questionei alguns viajantes do porque toda aquela gente dirigindo-se a Alto Paraíso e responderam-me que estavam fugindo do fim do mundo e que o lugar seria o único do planeta a escapar da devastação total que aconteceria na terra no dia 11 de agosto.
Novamente, perguntei a Paulão se ele acreditava nas profecias de Nostradamus.
- Este bafafá não são só por conta das profecias de Nostradamus. Este povo
acredita em dezenas de profecias trágicas que vão desde o velho Nostra até interpretações bíblicas e nas pregações de fanáticos religiosos que há muito preparam o fim do mundo, comentou.
- Mas, e os místicos e os astrólogos que também fazem as mais negras previsões
sobre o eclipse?
- Não posso dizer nada, afinal também sou um místico, disse-me,
zombeteiramente, alegando ser eu também um desajustado, já que também estava indo para Alto Paraíso.
Parei de conversar com Paulão, porque percebi que não conseguiria estabelecer um papo sério com ele sobre o assunto. Ele era mais agnóstico que eu e tinha opinião própria muito forte sobre o destino da humanidade.
Paulão acredita que todos nós somos filhos de uma única entidade universal que ao separar-se de sua outra metade espalhou seus filhos pelo universo afora e agora espera, um dia, reuni-los todos em um único lugar no espaço.
Ria dele, quando me fazia estas colocações. Para mim Paulão era um místico, inconsciente de suas elucubrações.
Durante a viagem, pensava comigo do porque a Igreja católica não ter ainda se manifestado sobre aquela situação. Nada dissera sobre o as especulações do fim do mundo. Nem mesmo o Papa fizeram qualquer manifestação. Repetia, apenas, o velho chavão bíblico que dizia: “Ninguém saberá o dia do apocalipse, nem mesmo o filho de Deus saberia”, e isto confortava alguns crentes e temerosos de que a catástrofe realmente seria iminente.
Durante toda a semana, por todo o mundo reinava o caos, a anarquia e a busca de salvação. Pessoas de toda parte do planeta entravam em desespero, suicídios coletivos em comunidades fechadas, rituais de perdão aos céus em busca de salvação.
Poderia não ser o fim do mundo, mas o mundo havia virado um caos. Na Cornualia, Inglaterra, setecentas pessoas prometiam um suicídio coletivo na hora exata do eclipse. Na França, uma multidão desesperada, esperavam, ansiosamente, a chegada de uma enorme nave espacial que os levariam da terra e os salvariam do apocalipse. Até um astrônomo inglês meio maluco garantia que já haviam 30 mil espaçonaves em volta da terra para um ataque fulminante aos humanos durante as cinco horas do eclipse. A histeria tomava conta dos cinco continentes, os jornais, os telejornais e os pregadores religiosos, enfatizavam o apocalipse. Muitas escolas fecharam as portas e houve até diretores de presídios que determinaram a soltura de todos os presos, já que seria seu último dia na terra.
E tudo isto parecia seguir uma lógica na direção de Alto Paraíso, uma vez que a rodovia principal estava totalmente congestionada por milhares de automóveis e outros veículos que se dirigiam a cidade. Também centenas de ônibus lotados e das mais variadas partes do país, trafegavam em direção a cidade.
Sabia que às vésperas do ano 1000, a Europa medieval também viveu uma histeria coletiva, crente na iminência do Juízo Final e agora há apenas alguns meses do próximo milênio esta histeria toma, novamente, conta da população, especialmente com a proximidade do dia 11 de agosto, quando as 08:08 horas de Brasília, ocorrerá um eclipse total do Sol, de grande relevância, tanto do ponto de vista astronômico quanto astrológico. A importância astronômica deve-se à extensão de sua sombra, que vai da Índia ao oceano Atlântico, passando em seu trajeto pelo Paquistão, Irã, Turquia, Romênia, Hungria, Áustria, Alemanha, França, Inglaterra e, ao cruzar o Oceano Atlântico, termina a 600 Km dos Estados Unidos, nas proximidades de Washington e Nova Iorque.
Astrologicamente, este eclipse vem sendo motivo de estudo há vários anos, porque ele apresentará uma configuração celeste muito especial, a formação de um grande quadrado ligando o centro dos signos fixos conhecidos como pontos poderosos do Zodíaco Tropical (o Sol e a Lua estarão em 18º do signo de Leão, Marte em 16º de Escorpião, Urano em 14º de Aquário e Saturno em 16 º de Touro). Este quadrado é indicativo de tensões marcantes sob circunstâncias difíceis.
Nostradamus já previu alguns desses acontecimentos que antecedem a destruição do homem, e até a própria Bíblia sagrada coloca a nossa disposição, a luta do bem contra o mal no dia do Juízo Final.
Um outro fator que trouxe fama a este eclipse foi sua relação com a Centúria X, quadra 72 de Nostradamus, que diz o seguinte: "No sétimo mês do ano de mil novecentos e noventa e nove, virá do céu um grande Rei que abalará, ressuscitará o grande Rei de Angolmois: antes e depois Marte reinará na hora favorável ao ataque".
Como se ouvisse meus pensamentos, Paulão perguntou-me se eu sabia alguma coisa sobre as profecias de Nostradamus.
Disse-lhe que conhecia a fundo todas as suas centúrias, até porque as estudei profundamente, durante um bom período de minha vida.
- Arthuro, esta história de que no sétimo mês de 1999, virá do céu um grande rei
do terror já era, pois, pelo que sei, estamos em agosto e agosto em qualquer calendário do mundo é o oitavo mês.
- Ai é que você se engana Paulão. Esta, como as demais centúrias de Nostradamus,
são do ano 1553, quando ainda vigorava o calendário Juliano. Apenas em 1583 começou a ser introduzido o atual calendário, Gregoriano, que ao entrar em vigor, acrescentou 11 dias à data anterior, para corrigir o dia da entrada do Sol no Ponto Equinocial Vernal, 20 de março. Se atualizássemos esta diferença para os dias de hoje, ela seria de 14 dias; se a descontarmos da data do eclipse, 11 de agosto, encontramos 28 de julho, o 7º mês a que se refere Nostradamus.
- Mas, então, as profecias se encaixam, ainda bem que estamos indo para Alto
Paraíso que ficará para semente, observou, com extrema ironia e uma sentida gozação sobre minhas colocações.
- Embora você não acredite e eu também, esta previsão já foi interpretada como a
Terceira Guerra Mundial, porque Marte na Mitologia Grega é o deus da guerra e Angolmois é o antigo nome de uma vila francesa, que teria sido conquistada por Atila, Rei dos Hunos. Então, algumas interpretações da centúria indicam o ressurgimento e o ataque de um rei bárbaro.
- Isto tudo é coisa de quem não tem o que fazer na vida, retrucou.
- As últimas pesquisas astrológicas não consideram para o eclipse a hipótese de
uma terceira guerra mundial, entretanto durante os seis meses de sua atuação, há indicação de mais perturbações políticas, golpes de estado e atentados aos poderes constituídos, agitações e revoltas, acidentes, problemas com explosivos, inquietações e quedas bruscas nas bolsas, principalmente em seu período mais crítico, compreendendo entre os meses de julho e agosto, disse-lhe.
- Mas se já estamos vivendo tudo isto, o que este eclipse traz de novo. Haverá
mesmo possibilidades da ocorrência de uma situação de choque, que levará à mudanças na estrutura política mundial, dando origem a um sistema novo ou a um modo diferente de lidar com as situações originadas pela crise?, indagou-me.
- Não sei nada de astrologia, sou astrônomo, falei-lhe com fúria, ao perceber que
ele estava querendo me desfazer.
- Uma coisa te digo, Arthuro, este eclipse trará, realmente, algo de novo para a
humanidade, ele deve representar o início da luta do velho e ultrapassado contra o novo e você, uma pessoa esclarecida, deveria se interpor, até mesmo com sua fama de futuro astronauta e viajante da galáxia, contra estas idiotices que estão dizendo por ai afora sobre o mundo acabar, desafiou-me, fazendo referencias a minha viagem a Europa.
Em resposta, contei-lhe uma fábula de Platão, a qual faz uma alegoria sobre o fim e o novo começo. “Algumas pessoas estão numa caverna e atrás delas há uma fogueira que projeta suas sombras sobre a parede da caverna. Porque não podem ver a si mesmos, tão fascinados estão pelas imagens projetadas por alguma coisa que está atrás de sua consciência, quase todas aquelas pessoas vêem essas projeções bruxuleantes e imaginam que essa é a vida real e que a ação está ali, onde se encontram aquelas figuras de sombras sempre em movimento. Um homem porém, consegue virar-se, vê a fogueira e, reconhecendo que as sombras são uma ilusão, afastou-se aos tropeções da fascinação do fogo e vai para a entrada da caverna onde descobre a luz do dia. Ao sair da caverna ele fica cego durante algum tempo, por causa da intensidade do Sol, depois sua visão clareia e então ele percebe uma magnífica paisagem estendendo-se à sua frente. Ela é absolutamente diferente do mundo limitado da caverna, com sua realidade feita de apalpadelas e de sombras. É tão obvio que este é o mundo real que ele decide voltar e contar a seus companheiros o que viu. Retornando à caverna escura se dirige para o grupo que permanece hipnotizado, observando a movimentação das sombras vacilantes. Contudo, a despeito da sua história sobre o mundo superior, os outros não lhe dão ouvidos, rejeitando sua descrição como sendo uma fantasia e julgando-o louco. Esta é a situação do homem sobrenatural em relação ao homem natural."
- Esta é a situação do ser humano que ainda permanece na obscuridão da fé religiosa ou de dogmas estabelecidos há séculos, falou.
- Exatamente, por isso, hoje, o Apocalipse é interpretado de diversas formas. Para
alguns estudiosos isso não representa o fim dos tempos, e sim uma profunda mudança em todo o planeta.
- O ser humano está em constante evolução e será que o mundo é capaz de
acompanhar essa evolução?, perguntou-me.
- As vezes acho que sim, outras não. O homem está tão preocupado em se desenvolver e esquece que existe alguém ao seu lado. Passa por cima de tudo e de todos para buscar seus interesses. Como podemos explicar a destruição de florestas inteiras, que são fontes de oxigênio e alimento, para a construção de industrias e fábricas que intoxicam nosso ar, nossa água e nossa terra?
- Não sei explicar, respondeu-me, mas uma coisa é certa, as guerras, principalmente as guerras santas, são indícios muito fortes de que o homem tende a maltratar os seus, a si próprio e a seus semelhantes e as aparições de Ovnis nos mostram que não estamos sozinhos no universo. Talvez sejam os espectadores dessa sangrenta profecia, observou, demonstrando, novamente, uma pontinha de ironia em suas colocações.
Eu sabia que em Alto Paraíso estava sendo organizada uma grande festa para a espera do eclipse e o alinhamento dos planetas, embora muitos fanáticos esperassem o contrário, como o fim do mundo.
- Tudo isso me aterroriza, Paulão. Não o medo do fim do mundo, mas o medo da histeria, da insensatez e do desespero das criaturas, diante do fenômeno que ocorrerá amanhã.
- Arthuro, porque você não pediu um espaço na mídia e explicou aquela história
do Kepller?
- Que história do Kepller?
- Aquela sobre o verdadeiro ano do nascimento de Jesus Cristo.
- Ah, sim, agora entendi. Paulão se referia a Joannes Kepller e suas teorias
astronômicas, inclusive de suas pesquisas em torno do nascimento de Jesus Cristo, o que daria para acalmar os desesperados, porque segundo seus estudos já estaríamos no ano 2005, o que faz cair por terra qualquer previsão do mundo acabar no fim do milênio.
- Bem, em 1613, ele publicou o primeiro trabalho sobre a cronologia e o ano do nascimento de Jesus, em alemão e, ampliado, em Latim em 1614: De vero Anno, quo aeternus Dei Filius humanam naturam in Utero benedictae Virginis Mariae assumpsit (Sobre o Verdadeiro Ano em que o Filho de Deus assumiu a Natureza Humana no Útero da Sagrada Virgem Maria). Neste trabalho Kepller demonstrou que o calendário Cristão estava em erro por cinco anos, pois Jesus tinha nascido em 4 a.C., uma conclusão atualmente aceita. O argumento é que em 532 d.C., o abade Dionysius Exigus assumiu que Cristo nascera no ano 754 da cidade de Roma, correspondente ao ano 46 do calendário Juliano, definindo-o como o ano um da era cristã. Entretanto vários historiadores afirmavam que o rei Herodes, que faleceu depois do nascimento de Cristo, morreu no ano 42 do calendário Juliano. Deste modo, o nascimento ocorrera em 41 do calendário Juliano.
Agora, lembrando de Kepller veio-me a mente outras de suas façanhas como
observar, em 17 de outubro de 1604 a nova estrela (supernova) na constelação de
Ophiucus, junto a Saturno, Júpiter e Marte, que estavam próximos, em conjunção. A estrela competia com Júpiter em brilho. Kepller imediatamente publicou um pequeno trabalho sobre ela, mas dois anos depois publicou um tratado, descrevendo o decaimento gradual de luminosidade, a cor, e considerações sobre a distância que a colocava junto com as outras estrelas.
Em 1610 Kepller leu o livro com as descobertas de Galileu usando o telescópio, e escreveu um longa carta em suporte publicada como Dissertatio cum Nuncio Sidereo (Conversa com o Mensageiro Sideral). Em agosto de 1610 ele usou um telescópio dado por Galileo ao duque da Bavária, Ernst de Cologne, para observar os satélites de Júpiter, publicando Narratio de Observatis Quatuor Jovis Satellitibus (Narração das Observações dos Quatro Satélites de Júpiter). Estes tratados deram grande suporte a Galileu, cujas descobertas eram negadas por muitos.
Os dois trabalhos foram republicados em Florença.
Kepller também estudou as leis que governam a passagem da luz por lentes e sistemas de lentes, inclusive a magnificação e a redução da imagem, e como duas lentes convexas podem tornar objetos maiores e distintos, embora invertidos, que é o princípio do telescópio astronômico. Estudou também o telescópio de Galileu, com uma lente convergente como objetiva e uma lente divergente como ocular.
- Porque não existem mais sábios lúcidos como Galileo Galilei, Johannes Kepller, Albert Einstein, da Vinci e tantos outros que sempre encararam a criação como algo muito maior do que imagina a vã filosofia terráquea, comentou Paulão.
- Hoje tudo é mais terrível, o homem vive por demais aterrorizado pelos
inconseqüentes e pelos profetas apocalípticos que pintam Deus como um ser terrível, destruidor e vingativo, capaz de cometer atrocidades infames contra suas próprias criaturas, acentuei.
- Por isso não acredito em Deus, respondeu-me, afirmando ainda que se somando
tudo isso a desesperança humana, o mundo parece realmente caminhar para sua própria destruição.
Exatamente, por isso, aquelas que tinha um pouco de noção do que aconteceria no dia 11 e que acreditavam em coisas boas para a nova era do ser humano, buscavam refúgio espiritual em Alto Paraíso, cidade que já havia sido propagada mundialmente como o único lugar da terra que sobreviveria a hecatombe que estava por vir. Mas ninguém sabia, nem diziam como seria o fim do mundo. De que forma ele se daria.
- Se o mundo realmente fosse acabar, como você acha que isto aconteceria, questionou Paulão.
- Cientificamente, com a aproximação de um astro gigante, com o super aquecimento do sol ou a aceleração ou desaceleração do movimento da terra. Isso seria possível, mas nenhum destas hipóteses foram em momento algum ventilada pelos pregadores do apocalipse, respondi.
Tanta coisa me passava pela cabeça durante aquela pequena viagem que me impressionava o fato de que em breve estaria viajando para um ponto longínquo de nosso sistema solar. Falei a Paulão que estava ficando preocupado com a lentidão do trânsito, o que faria com que chegássemos a cidade somente a noite.
- Falando nisso, você sabe por que o céu é escuro a noite?
- Claro, isto se explica através do “Paradoxo de Olbers”.
- Para o que?
- Paradoxo de Olber, uma teoria do médico e astrônomo alemão Heinrich
Wilhelm Mathaus Olbers que tentava por ele explicar a escuridão que tomava conta da terra e trazia a noite. Sei que a interrogação pela escuridão da noite, na verdade, é a interrogação pela escuridão do espaço quando considerado globalmente.
Pus-me a explicar, detalhadamente, a Paulão o porque a escuridão sempre vinha a noite: Uma primeira resposta é exatamente a de que o material presente entre os astros é tão difuso que é incapaz de difundir a luz oriunda das estrelas. Entretanto, poderíamos pensar que se o espaço é infinito e as estrelas estão uniformemente ( ou mesmo aleatoriamente) distribuídas, o céu deveria se apresentar com a mesma luminosidade e temperatura da superfície solar. A resposta atual ao paradoxo de Olbers é também um argumento em discussões cosmológicas. Um pressuposto em sua formulação é o de que o universo tenha uma existência passada infinita. Somente neste caso já teriam existido estrelas o suficiente para que cada ponto do céu para o qual olhamos já tivesse sido preenchido pela existência de uma idade finita para o nosso presente universo.
Se de fato o universo possui uma idade finita, toda informação que nos chega se restringe a uma esfera de raio igual à idade do universo multiplicada pela velocidade da luz. A idade do universo limita o seu tamanho efetivo para nós ao que nos é observável.
Outro fenômeno físico atualmente mencionado em discussões em torno do Paradoxo de Olbers é a expansão do universo. Se o universo está em expansão segundo a regra de Hubble, devem existir astros situados de nós a uma distancia tal que sua velocidade de recessão seja igual a da luz e, portanto, sua luminosidade jamais nos alcançará. Assim a escuridão dos céus pode ser considerada a prova mais imediatamente acessível à teoria que une idade finita para nosso universo com recessão das galáxias: A Teoria do "Big-Bang".
Paulão já tinha tomado uma caixa de cerveja em lata e pediu-me para parar em algum lugar para comprar mais. Não havia nada por perto que sinalizasse haver cerveja a venda nas redondezas. Mas eu o conhecia e sabia de sua ferocidade com a falta do álcool. Tinha percebido ao longo do caminho que alguns trailles se dirigiam a Alto Paraíso. Percebi que também haviam aqueles que se aproveitavam do eclipse para abocanhar alguns trocados a mais. Parei e fiquei esperando Paulão que voltava para trás em busca de um desses veículos para comprar cerveja. Na verdade já estávamos parados há muito tempo. O trânsito simplesmente não andava.
Ao ficar sozinho, pensei em Angela. Onde estaria agora? Uma saudade e também um bem estar muito grande tomava conta de mim. Lembrava muito de nossa última noite juntos, de nossa conversa sobre astronomia, da descoberta dos três planetas que giram em torno da estrela Úpsilon de Andromeda, e que estavam mexendo com a possibilidade de se encontrar vida na Via Láctea, de sua ingenuidade com a bebida e de seu sorriso franco, apesar de um pouco sisudo.
De repente, vi Paulão voltando radiante com uma caixa de Skol em lata e no tempo que demorou para voltar meu carro não andara mais que alguns poucos metros.
- Arthuro, você vai encontrar o pessoal da “Novo Mundo Cósmico”?
- Espero, ao menos, rever Rá Muhá e Goti Rem. Disse-lhe, perguntando porque
queria saber.
- Tudo bem, só não vou ficar com você, ouvindo aquelas baboseiras que dizem.
- Que baboseiras?
- Sobre o tal de Hercólobus, o planeta que viaja em direção a terra.
- Hercólobus? Agora lembrei. É um planeta super gigante que conforme profecias
dos seguidores de Aren-Kha se aproxima da terra e é seis vezes maior que Júpiter e vem de um outro sistema solar. Ele tem uma órbita de translação de tal forma que cada cem milhões de anos passa por nosso sistema solar, comentei.
- Mas não o conheço apenas através do pessoal da “Novo Mundo Cósmico”,
também já li alguma coisa sobre Hercólobus, continuei.
De repente, senti um arrepio. Poderia ser verdade sua passagem por nosso sistema solar, conforme anunciavam alguns místicos que buscaram, inclusive nas escrituras sagradas e em livros de culturas antigas sua denominação. Soube que até Nostradamus o considerava o Grande Rei do Terror que se abateria sobre a terra em 11 de agosto de 1999. Até mesmo os cientistas tinham conhecimento de Hercolobus e o batizaram com o nome de Barnard, sendo esta, na verdade uma estrela e levou o nome de seu descobridor e já posicionavam sua presença nas imediações do nosso sistema solar.
- Paulão, pelo que sei, este planeta na verdade é uma estrela e ainda está
muito longe do nosso sistema solar.
- Sei, mas a turma do Aren Khá, calculou que em 1999 ele passaria muito perto
da Terra, aproximadamente no mês de Julho - Agosto e entre 200.000 e 500.000 km de distância da Terra.
- Como você sabe disso?, indaguei.
- Isto é o que vivem dizendo os teus amigos daquela seita “Novo Mundo
Cósmico”.
- Espere, com é que nunca ouvi falarem disto?
- Eles o respeitam como astrônomo, por isso não falam. Mas vivem assustando
todo mundo com esta história de que no dia 11 de agosto o planeta gigante vai se chocar com a terra.
- Quando falaram isto?
- Da última vez que estivemos em Alto Paraíso, Goti Rem, fez-me até um mapa de
sua trajetória. Só que até agora não aconteceu nada do que ele previu.
- Como assim?
- Goti Rem disse-me que com a aproximação da terra, ele fará refletir a luz do
sol, fazendo-o ser visto como outro sol por sete dias em diversas partes do mundo, ainda em pleno meio-dia.
- Mas, porque você está preocupado. Isto não aconteceu!
- Não poderia ser ele o grande deus do terror de Nostradamus?
A pergunta de Paulão me surpreendeu. Sim, poderia ser ele o Grande Deus do
Terror, de Nostradamus. Mas como astrônomo e um pouco de conhecimento de astrofísica comecei a fazer um levantamento das conseqüências de sua aproximação com a terra.
- Não sei nada de Hercólobus, mas se ele for a Estrela de Barnard, conforme já
ouvi falar muito e até já a vislumbrei algumas vezes com o telescópio, é, realmente, uma séria ameaça.
- Então, você acredita que isto é possível?
- Não é questão de acreditar ou não, mas existe uma possibilidade desta estrela
passar por nosso sistema solar. E se ela, realmente, se aproximar 200 mil quilômetros do planeta terra, isto será simplesmente trágico, o fim.
- O fim do mundo?
- Pode não ser o fim do mundo, mas ao passar próxima a terra, seus eixos se
acelerarão violentamente e haverá até mesmo a inversão dos pólos e seu magnetismo, fazendo que os vulcões entrem em erupção e provocando desta forma os terremotos em cadeia. Muitas supermetrópoles inteiras desaparecerão, analisei.
De repente, olhei para Paulão e ele parecia assustado e encolhido, como se um medo aterrador tomasse conta dele. Parecia temer que isto realmente fosse acontecer e tentei tranquilizá-lo.
- Não há o que temer. Tudo isto são apenas hipóteses, disse, percebendo que Paulão parecia desmaiado. Não sei se de susto ou se o álcool já lhe tinha dominado.
Fiquei sobressaltado com o fato de ele ter mencionado Hercólobus.
“Meus Deus, é possível, Hercolobus pode ser realmente o grande Rei do Terror, e foi Nostradamus quem previu sua chegada exatamente no dia 11 de agosto de 1999”.
Lembrei ipis litere umas das centúrias de Nostradamus: "No ano de 1999, no sétimo mês, virá do Céu um Grande Rei de Terror. A um eclipse do Sol sucederá o mais escuro e tenebroso verão que jamais existiu desde a criação até a paixão e morte de Jesus Cristo, e desde aí até este dia, e isto será no mês de agosto, quando se produzirá uma grande translação, de tal modo que crerão que a terra foi tirada fora de sua órbita e jogada nas trevas eternas". Quando o Sol fique completamente eclipsado, passará no nosso céu, um novo e colossal corpo celeste que será visto em pleno dia, porém os astrólogos (astrônomos), interpretarão os efeitos deste corpo de outro modo, por esta má interpretação, ninguém terá previsões para as penúrias. Os homens, cada vez mais esquecerão suas almas para ocupar-se somente de seus corpos. A maior corrupção reinará sobre a terra. Os homens se assemelharão às bestas ferozes, sedentas do sangue de seus irmãos. A Meia Lua se apagará caindo seus adeptos na guerra perpétua. Cairão sobre eles as maiores desgraças e acabarão lutando entre si. As Coroas dos Reis, grandes e pequenos, cairão. Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, estalará uma terrível guerra entre todos os povos. Os oceanos rugirão, a terra e o fundo dos mares se cobrirão de ossadas, desaparecerão reinos, morrerão povos inteiros, a fome, a enfermidade, crimes não previstos nas leis, não vistos nem sonhados ainda pelos homens. Virão, então, os inimigos de Deus e do Espírito Divino, os quais estão nos próprios homens (o ego Animal). Aqueles que levantem a mão sobre outro perecerão também. Os esquecidos, os perseguidos, se erguerão depois e atrairão a atenção do mundo inteiro. Haverá espessas trevas, tempestades horríveis. Montanhas, até então sem vegetação, se cobrirão de florestas. A terra toda estremecerá. Milhões de homens mudarão as cadeias da escravidão e das humilhações pela fome, a peste e a morte. As ruas se encherão de multidão de pessoas caminhando ao acaso de um lado para o outro”.
O pior, é que tudo isto se encaixa na história da estrela Barnard, que realmente está se deslocando de seu centro e viajando em direção ao nosso sistema solar.
Mas não eram só as profecias de Nostradamus que me inquietavam, havia também uma série de outras previsões, de livros e de estórias que davam conta do fim do mundo em 1999. Uma delas, semelhante a de Hercolobus, dizia que até o ano de 2013, um outro sol penetrará no nosso sistema planetário e fará com que a terra tenha um invejável sistema de sóis duplos.
Segundo algumas matérias que li sobre ele, é um monstro gigantesco e ao se integrar ao nosso sistema solar criará problemas difíceis. Todos os planetas terão suas órbitas modificadas e causará um desarranjo total na posição dos astros em nosso sistema.
Lembro de ter lido alguma coisa que falava sobre a bagunça que aconteceria se esta estrela, definitivamente ingressasse em nosso sistema solar. “Mercúrio cairá na zona hoje compreendida entre Vênus e a Terra. Vênus irá para o lugar que medeia entre a Terra e Marte. A Terra sentirá o efeito, antes que o novo sol se coloque no seu lugar definitivo. À medida que esse corpo começar a brilhar, a pressão da luz fará com que a Lua se desloque da sua órbita e vá situar-se num ponto que passe à categoria de planeta. Com esse deslocamento conduzirá uma quantidade da massa etérea da Terra, que lhe garantirá uma estabilização de movimento. A Terra, por sua vez, sob a pressão combinada de dois sóis, irá se situar na zona hoje ocupada pelos planetóides. Em suma, haverá um deslocamento geral de todos os corpos que povoam o nosso sistema. Plutão será lançado fora, e vagará errante pelo espaço sideral. Um dos satélites de Marte será arrancado da sua atual posição e projetado no espaço. De massa bastante densa, em vez de repelido será atraído para o interior. Sua trajetória será de tal forma que viria a constituir-se satélite da Terra. Depende do sentido em que ele tomar contato com este planeta. Se isso se der contra o sentido de rotação da Terra, o choque provocado pelo encontro da sua massa com o éter fá-lo-á em pedaços; se for a favor, ficará ligado ao planeta. A Terra não sofrerá com um choque contra, pois a sua camada etérea oferece proteção. Pelos cálculos feitos por seguidores de algumas seitas cósmicas, apenas cairá uma chuva de pedras sobre a superfície deste globo, principalmente na zona compreendida pelo sul europeu, norte da África, Ásia Menor, o norte da América do Sul e o sul da América do Norte. O impacto transformará o atual esplêndido satélite marciano em pedacinhos de uns 20 kg cada um, que devastará as zonas acima descritas.
“Tudo muito aterrorizante e devastador, sem deixar qualquer esperança para nós pobres e oprimidos humanos que insistimos em não acreditar na destruição de nosso querido e azul planeta”, concluía.
Paulão acordou sobressaltado e olhou-me com os olhos esbugalhados e falou:
- Arthuro, sonhei que estávamos embaixo de um sol em fogo. Tudo queimava e
era aterrador e você só fazia rir de tudo.
- Calma, está tudo bem. Foi apenas um sonho.
- Sei, mas parecia algo profético. Apareceu-me um índio Inca muito velho que me
fez advertências e ameaças.
- Que tipo de advertência?
- Uma delas começava assim: “Durante os últimos cinco mil anos a águia do norte
e o condor do sul estiveram voando separadamente, e quando eles voarem juntos, como está começando a acontecer agora, o mundo irá ajustas contas com os seus depravadores.
- Calma, meu amigo, conheço as tradições Incas e pelo que sei, elas nunca previram males para a humanidade. Eles adotam os ideais de Atlântida, a cultura antiga sobre a Terra que foi destruída por um grande cataclismo há milhares de anos. Os sobreviventes desta era mundial iluminada criaram o núcleo de sua civilização na América do Sul, entre outros lugares. Mas sua religião foi corrompida pela chegada dos espanhóis, que eram inimigos do Sol, e a humanidade tem degenerado desde então.
- Mas, foi, exatamente, sobre isto que o índio falou-me no sonho!
- Falou sobre o que?
- Vi um Inca, que se chamava Shora Atahuallpa, falando com os soldados
espanhóis. Dizia-lhe que humanidade quebrará sua conexão com as forças naturais, perderá seu caminho e os povos se tornarão perdidos na escuridão.
Como Paulão se impressionava tão facilmente pelas coisas. Fora apenas um sonho, disse-lhe, tentando convencê-lo que nossa conversa sobre Hercólobus, fim do mundo e Nostradamus, tinha lhe impressionado.
- Não Arthuro, não é só um sonho ou pesadelo. Deve ser alguém querendo passar
me uma mensagem ou um alerta. Ele disse-me que grandes cataclismos atingirão a terra neste momento de transição, ela tremerá, o ar será preenchido com furacões e tornados, o oceano terá ondas imensas e o Sol terá grande calor.
- Deus do céu, não me faltava mais nada. Agora você entrou em parafuso,
tentando interpretar sonhos bestas que teve alcoolizado.
- Ele ficou bravo comigo e continuou a contar seu sonho: Segundo Atahuallpa, o
cataclismo virá no ano de 1999, quando um grande asteróide magnético, três vezes maior do que Júpiter, se aproximará da Terra e sua força ativará a purificação da Terra. Quando o cataclismo tiver passado, o povo-semente retomará e começará uma nova civilização. A quinta geração desaparecerá com o cataclismo.
- Que quinta geração, perguntei-lhe.
- Não sei, só lembro que ele disse que nós podemos ser a semente da sexta geração,
se nós apenas pudermos contatar e trazer a vida a luz dentro de nós. E os povos da terra então buscarão unir-se na busca da que existe dentro de cada um.
No fundo, foi arrepiante ouvir aquilo de Paulão. Não compreendo porque, mas também senti um certo temor. Mas voltei a lógica cientifica e tentei ignorá-las, fingindo estar descrente destas previsões e fixei-me novamente na idéia de que em breve estaria embarcando para Júpiter e quem sabe não encontraria Hercolobus pelo caminho.
Enfim, começamos a entrar na cidade de Alto Paraíso. Haviam milhares de pessoas, desde brasileiros de todas as partes do país, até chineses, hindus, americanos e europeus das mais variadas origens que para cá vieram, com o objetivo de escapar da destruição total. Estavam todos lá porque acreditavam em parte no perigo que a terra poderia correr a qualquer hora, qualquer dia ou instante, seja por um ataque extraterrestre ou a colisão de um corpo celeste qualquer, desde um meteoro gigante, um asteróide ou até mesmo o fragmento de algum planeta ou luminosa em expansão pelo Universo. Sei que isso seria possível um dia, mas era coisa que se poderia detectar com um considerável espaço de tempo.
Paulão pareceu acalmar-se mas de repente gritou-me: se houver um apocalipse você é a besta dele.
- Como disse?
- Você, Arthuro, é a verdadeira besta do apocalipse. Porque, simplesmente, não
tem um pingo de virtude, para acreditar numa única coisa que saía da sua tal lógica cientifica, desabafou-me.
Ao ouvi-lo usar esta expressão, também pensei nas profecias bíblicas sobre a besta do apocalipse, representada pela expressão numérica 666.
- Quem, além de mim, você acha ser a besta do apocalipse?
- Bill Gates, respondeu-me.
- Por quê, questionei.
- Ele é uma besta quadrada, porque não sabe o que fazer com tanto dinheiro que
ganhou com a introdução de tantas novas tecnologias de computador no mundo.
- Que coisa ridícula, porque você pensou em Bill Gates agora?
- Sei lá, falam tanto dele. Que é o homem mais poderoso do mundo, Que é o bom
do pedaço, etcetera e coisas assim.
- Pelo que sei, Bill Gates é um grande filantropo do mundo atual. Lí que em
1999, ele doou US$ 6 bilhões para o desenvolvimento de vacinas e a criação de um fundo para beneficiar os pobres. Poderia este homem ser uma das bestas do apocalipse?, questionei, sem ouvir resposta de Paulão que se espreguiçou no banco do carro, com se fosse novamente dormir.
E eu continuei a falar-lhe. “Mesmo sendo dono da maior fortuna do planeta, Bill Gates não se furta em ajudar a melhorar o mundo, tendo inclusive criado uma fundação de caridade destinada a ajudar a financiar uma iniciativa ambiciosa que visa o tratamento de cancerosos e aidéticos. Se você não sabe, uma das doações feitas por Gates, a maior realizada por um doador vivo, rendeu US$ 17 bilhões a Fundação William H. Gates e a Fundação de Aprendizado Gates, administradas em conjunto e que buscam desenvolver e distribuir vacinas para alguns dos problemas mais graves no mundo.
Paulão, então, reagiu e disse-me pausadamente: “Para você seria muita intolerância com o capitalismo não entender a boa vontade do empresário que continua sendo rotulado como um homem insensível, quando, ao contrário, é um dos grandes filantropos do mundo atual”. É isto que você quer dizer:
- Sim, é isto.
- Então, é isto e pronto.
Calou- se e adormeceu novamente.




11
ESPANTO E MEDO EM ALTO PARAÍSO

Havia ao longo do caminho para Alto Paraíso uma procissão gigantesca de pessoas a pé em direção a cidade. Havia gente de todo os tipos, empresários, religiosos, trabalhadores comuns e até artistas que tinham vindo do Rio de janeiro e de São Paulo em busca da salvação em Alto Paraíso.
Levamos mais de 10 horas para chegar até a cidade onde também não havia mais alojamento. Estava completamente tomada por milhares de pessoas que transformaram uma extensão de pouco mais de 80 quilômetros num imenso acampamento de barracas, casas pré-moldadas e muitas delas ficavam mesmo ao ar livre. Tudo parecia um caos, não haveria alimentação para tanta gente em Alto Paraíso e para ali já haviam ido também alguns aproveitadores que estavam vendendo sacos de arroz por R$ 15,00 e carne a quase R$ 20,00 o quilo.
Mas, graças aos conhecimentos meu e de Paulão conseguimos uma vaga na pensão do seu Dias, para dormir em colchões colocados no chão de um quarto onde já estavam hospedados quatro outras pessoas.
Vimos também que o exército estava se deslocando para a região. O Governo Federal havia determinado o destacamento de 4 batalhões do Exército, sediados eno Distrito federal, mais algumas guarnições de Goiás e Minas Gerais.
Tinha levado comigo um Leptop (computador Portátil) com Internet, pelo celular, para qualquer emergência.
Ao anoitecer, andando pela cidade, busquei olhar para o céu, fitar as estrelas e tentar compreender porque tanta gente se desesperava e acreditava em profecias que sempre foram feitas sem determinações de datas.
Questionei Nostradamus, perguntando porque o mundo acabaria em 1999, se ele havia feito previsões até o ano 7000.
Rindo disse a Pauläo que aquilo era tudo uma besteira, mas eu sabia ao certo quando o mundo iria acabar. No ano 45001999 000 (quatro bilhões quinhentos milhões e dois mil anos) período em que nossa estrela, o sol, envelheceria, se expandiria e engoliria grande parte do sistema solar para depois explodir em bilhões de pedaços que se transformariam em poeira cósmica. Mas até lá, os humanos usariam a terra apenas como um pequeno entreposto comercial, ninguém mais moraria aqui e nosso sistema solar e toda a Via Láctea já teria se transformado numa grande zona metropolitana dos grandes planetas e das milhões de estrelas e supernovas que haveriam de nascer.
Mas, Apesar de toda minha descrença, misteriosamente Hercolobus, ou Barnard não me saía da cabeça.
Assim que chegamos a Alto Paraíso fui visitar Goti Rem, meu amigo místico, que se mudara para a cidade, depois de abandonar sua carreira de psiquiatra em Brasília e aderir a “Sociedade do Novo Mundo Cósmico”, seita que pregava a transição planetária e o nascimento de uma nova civilização na terra.
Goti Rem era um cara alegre, mas temeroso e parecia, realmente, viver em um outro plano astral. Fora ele que me falara sobre as transformações que em breve ocorreriam no planeta e também de sua missão de alertar a humanidade sobre os acontecimentos que em breve virão e que poderiam serem iniciados no dia 11 de agosto de 1999.
Não sei se é porque estava num lugar cercado de místicos e uma centenas de outras figuras folclóricas, ou realmente estava começando a dar crédito a algumas previsões.
Goti Rem não demonstrara, como das outras vezes, euforia ao me ver, pelo contrário demonstrava tristeza pela minha presença em Alto Paraíso e parecia impassível como se esperasse uma tragédia neste dia. Disse-me com muita convicção e um ar triste e abalado que os habitantes da Terra em sua maioria estão com suas consciências imersas em um sono profundo. E apesar de se avizinharem acontecimentos que abalarão cada palmo de terra desde o mundo astral ate o mundo físico, mesmo assim eles não estão querendo despertar para a evolução espiritual. “A cada instante apegam-se mais e mais ao materialismo e ao animalismo, que os impedem de ver o seu Criador. E com a ânsia do egoísmo planejam destruir a todos, pela loucura do domínio do seu próximo”, completou.
Fiquei meio pasmo com sua colocações, já que via em Goti Rem um, seguidor da seita menos eufórico e de repente percebi que ele havia mudado.
Continuou falando-me de um novo mundo cósmico que estaria por vir para substituir as iniquidades do homem na terra, acusando-me de ser um dos humanos que não permitiam a evolução espiritual da humanidade. Seria por meu ateísmo, não conseguia entender Goti Rem naquele momento, principalmente quando insistia em dizer que era um dos enviados do criador, um mensageiro do novo mundo, para avisar os povos sobre o fim das trevas que serão banidas da humanidade. Senti-me ameaçado com suas declarações, pois parecia acusar-me. Não conseguia entender o comportamento de Goti Rem, notadamente ele que era uma criatura dócil, simpática e sempre alegre.
“Uma nova Humanidade será trazida de mundos mais evoluídos para viver no planeta Terra, mas para isso essa civilização deixará de existir, para que de suas cinzas nasça uma nova que será obediente à lei do criador, disse-me ainda, levando-me a afastar-me dele e procurar Paulão para uma volta pela cidade.
Lembrei de um outro amigo, também seguidor da Novo Mundo Cósmico e fui procurá-lo. Chamava-se Rá-Muhá e recebeu me ele calorosamente, ao contrário de Goti Rem, mas também falando grotescamente dos acontecimentos que estariam por vir naquele dia.
“Arthuro, os extraterrestres estão à nossa volta e em breve se farão visíveis no físico. Ainda não chegou a hora de sua aparição em massa, mas isto irá acontecer, eles estarão aqui na época da transição e esta época finalmente chegou”, disse afirmando-me que muitas legiões de seres extraterrestres, sob o comando de um ser supremo, estão atuando na transição do nosso mundo, na transição dos universos e na reconstrução da nova Terra e entre eles estarão pessoa de renome mundial como enviados.
Não entendia ainda porque havia me metido no meio de todos aqueles lunáticos, mas começava a temer pelo caos que poderia sobrevir sobre Alto Paraíso, na virada da noite para o dia 11 de agosto.
Incrivelmente, como se lesse meus pensamentos Rá-Muhá começou a falar sobre a verticalização do eixo da terra e a chegada de um planeta intruso que invadirá o sistema solar e imporá transformações na geografia planetária, alterando os continentes e destruindo milhões de seres humanos.
Quando perguntei a ele detalhes sobre a aproximação do planeta, disse-me que tudo o que sabia vieram do contato que tivera com os extraterrestres do comando intergalático, presidido por um ser supremo, e que lhe mostrara pela janela da espaçonave a aproximação do planeta, cujo volume físico era bem maior que o da terra e capaz de exterminar com ela.
Afastei-me de Rá-Muhá e percebi que já estava começando a anoitecer e o céu estava límpido, sem uma nuvem sequer, com um azulado deslumbrante.
Sentia-me leve, feliz e confortado, mas não conseguia esquecer as palavras de Goti Rem e Rá-Muhá. Elas martelavam dentro de minha cabeça e eu não conseguia tirá-las do pensamento. Voltei a pensão, peguei Paulão e durante a noite, fomos dar uma volta pela cidade.
De repente, olhei para o céu e encabulei , pois não conseguia vislumbrar uma estrela
sequer no firmamento, apesar de também não haver uma nuvem sequer. O infinito parecia um grande vazio. Não havia um só brilho, um só corpo celeste que se pudesse distinguir. Pensei, naquele momento numa idéia do poeta Willian Blake, Sobre as estrelas: “São tantas sobre nossas cabeças como grãos de areia sob nossos pés.” Achei engraçado ter lembrado daquilo naquela hora.
Mas, voltando ao céu percebi que aquilo me intrigou, me preocupou e por fim me assustou de verdade, O que estaria acontecendo. Porque o céu de Alto Paraíso insistia em ser vazio e lúgubre, sem a presença das estrelas que do outro lado, antes de adentramos a divisa da cidade, se mostravam brilhantes e inquietas no firmamento?
“Já são sete horas da noite, o céu está límpido e não há uma estrela sequer. Nem a lua deu as caras, Seria porque era véspera do fim do mundo.”, pensava. Não me importei muito com o fato, mas fiquei profundamente intrigado e um temor esquisito começou a tomar conta de mim.
Dirigi-me a Pauläo e perguntei-lhe se também estava com algum pressentimento esquisito e ele me dissera que também havia notado o vazio do céu e também um silencio perturbador e disse-me que aquilo era o preparo para o fim do mundo, a ante sala da catástrofe que se abateria sobre a humanidade no dia seguinte, 11 de agosto.
Não dei bola para suas elucubrações, mas, na verdade, parecia que o mundo havia
parado, mas era só impressão, as pessoas se movimentavam normalmente, apenas o ar parecia inerte, sem uma brisa qualquer, sem um sopro e sem qualquer movimento nas árvores. Nem os animais se movimentavam. Pareciam adormecidos. Não se ouvia em toda a região um só gorjeio de aves ou uivar costumeiro dos animais que habitavam a região.
Paulão, confessou-me que sua preocupação não era com a ausência de estrelas no céu, mas com a bebida alcóolica que praticamente havia sumido da cidade.
Alguns histéricos resolveram proibir a entrada de álcool na cidade, afirmando que ele minaria as energias que estavam prestes a invadir Alto Paraíso. Para mim tanto fazia, já que deixara de beber a algum tempo.
Mas no fundo me preocupava com o Paulão que já havia entrado no esquema da cervejinha e eu sabia que para ele parar iriam muitas caixas ainda do enebriante líquido. “Ninguém pensou neste tipo de abastecimento”, disse-me inconformado e colérico, blasfemando e chutando as touceiras de grama com incontida violência.
Depois de muito bate papo, inconformismo e sermão, ele persuadiu-me a ir a São João da Aliança, comprar algumas cervejas para passar a noite e saímos circundando um pequeno morro para não enfrentar o congestionamento e o caos que havia se estabelecido. Fomos beirando a estrada, por dentro do mato, quase rente a estrada, mas num caminho acidentado e sem segurança, até chegarmos a divisa com São João da Aliança, quando então dei-me conta de olhar novamente para o céu e vi que ele estava completamente estrelado e com um luar das noites típicas do sertão. Que besteira a minha, devia ser muito cedo para se perceber as estrelas.
Estacionamos em frente a um boteco copo sujo e Pauläo tomou umas quatro cervejas e dois conhaques Domecq antes de iniciarmos a volta a Alto Paraíso. Senti, inexplicavelmente, uma sede terrível, mas não de água, tinha vontade de tomar cerveja com ele, mas sabia do mal que a danada me causava e lembrava também, euforicamente, que teria uma reunião no dia seguinte em Brasília, sobre a viagem a uma das luas de Júpiter.
Se soubesse beber 20 garrafas e parar até beberia, mas eu era um doente alcoólatra e um primeiro gole, com certeza despertaria o monstro terrível que dorme dentro de mim chamado alcoolismo. Resisti, mas com desesperada agonia queria que ele acabasse logo para voltarmos para Alto Paraíso.
Olhava com compaixão para Paulão sentindo em mim a dor que era o alcoolismo e a miséria e a infâmia que ele havia me causado, como a quase perda de meu emprego na Câmara dos Deputados.
Vivia agora uma vida regrada, comportada e saudável em que meu único e verdadeiro vicio era apenas o cigarro Malboro Light, do qual fumava um maço por dia, sendo que nos dias em que me exercitava limitava a apenas dez cigarros.
Para mim aquela espera era terrível, pois não usava mais bebida alcóolica e não havia refrigerantes Light na região e nem café novo. Pedi um cafezinho no boteco e me deram uma água rala que tive que ir para rua vomitar tudo o que havia tomado.
Depois que Paulão tomou quase uma dúzia de Skol, resolvemos esconder quatro
caixas de latas de cerveja no banco traseiro e iniciamos a volta para a cidade, fazendo o mesmo percurso por fora da estrada.
Quando chegamos a divisa, assim que entramos nos limites de Alto Paraíso, tornei a olhar para o céu e tive um baque, as estrelas e a lua haviam sumido, de repente, como se houvesse clareado o dia. O céu continuava límpido e com a abóbada azulada mas sem nenhum corpo celeste em distinção.
Procurava desesperadamente fitar um só brilho, um só cintilar de estrelas, mas frustrava-me com o negrume inerte da noite e o azulado do céu do lugar. Nada se movia, na noite morna e escura, a não ser o uivar sonolento e triste de alguns vira latas que estranhamente choravam ao uivarem para o vazio. Senti um arrepio, aquilo era impressionante e Pauläo já bêbado começou a encher o saco que havia esquecido de comprar cigarros. Ofereci-lhe um maço de Malboro Light e ele recusou, afirmando que voltaria, nem que fosse a pé a São João da Aliança para comprar cigarro de homem. Tentei impedi-lo e ele empurrou-me violentamente, totalmente bêbado e desconcertado. Fiquei colérico com ele, quis agredi-lo, mas ele se defendia de forma monumental, apesar da embriagues e xingava-me com palavrões ofensivos.
Estava tão desorientado, discutindo bravamente com Paulão que observava, em alguns momentos, com inveja, ele virar uma lata inteira de cerveja. Não conseguia mais agüentar aquela disparidade, ele loucão e eu sóbrio e desconcertado e foi então que, sem pensar no que estava fazendo, abri uma lata de cerveja e pus-me a beber desesperadamente, sugando-a toda de uma só vez. Ela desceu arranhando, mas logo em seguida amaciando minha garganta e dando me um novo ânimo.
Faziam três anos que não bebia nada alcoólico e senti uma sensação esquisita mas aprazível, como se de repente tudo tivesse se tornado tão normal que nem percebia mais que estava num lugar cercado por fanáticos e loucos de todas as extirpes.
Então altamente alcoolizado, já virava a quinta lata de cerveja, abracei-me a Pauläo e disse-lhe então que iríamos voltar a São João da Aliança, porque agora quem precisava comprar cerveja era eu, porque ele havia despertado o monstro que dormia dentro de mim que era o alcoolismo.
Decidimos voltar a São João da Aliança. Mas não tinha mais ânimo para dirigir e já estava muito bêbado para ir com o carro de novo pelo caminho secundário. Tinha consciência de que perdia totalmente o controle quando ficava alcoolizado e então combinamos que por estarmos tão bêbados iríamos pegando carona, até a cidade, tomando umas pelo caminho, o que seria fácil, já que havia um grande vai e vem entre São João da Aliança e Alto Paraíso, tendo em vista a cerveja e qualquer bebida alcóolica ter acabado na cidade.
Paulão pegou algumas latas e colocou numa bolsa velha e surrada, pendurando-a ao pescoço e saímos cantarolando de volta para o lugar o qual até ainda a pouco eu estava doido para deixar porque estava sentido aquela vontade incrível de beber uma e acabei fazendo isto depois de resistir a tentação no bar.
Saímos cambaleando, abraçados e cantando em tom uníssono, musicas que não tinham nem pé e nem cabeça. Seriam alguns quilômetros da divisa até o centro da cidade, mas tínhamos perdido a lucidez completamente e o caminho estava todo iluminado pelos acampamentos e os carros com faróis acesos a beira do caminho.
Nossa sorte sorriu no primeiro quilômetro andado, quando um jeep com duas garotas parou e nos deu carona. Fomos cantarolando canções como o Ébrio, Chão de estrelas e canções que me lembravam os meus tempos de boêmia.
As três caixas de cerveja que compramos da primeira vez que fomos a São João da Aliança, simplesmente evaporaram com minha sede alcóolica de mais de três anos.
Faltavam cerca de sete quilômetros para a divisa com São João da Aliança e pedimos as garotas que nos deixasse ali, já que queríamos fazer uma caminhada e observar melhor o céu do lugar, que insistia em não mostrar seu brilho celestial.
Depois de caminhar uns sete quilômetros chegamos a divisa de Alto Paraíso com São João da Aliança. Havia uma placa escrita a mão que de um lado dizia: “você está entrando em São João da Aliança” e do outro “Você está entrando em Alto Paraíso”.
Olhei novamente para o céu e só vi o azul claro e vazio, mas quando atravessamos a placa virei-me para olhar o outro lado e instintivamente olhei de novo para cima e as estrelas e o luar haviam voltado.
Oh! Meu Deus!, suspirei profundamente. O que é isso?. Não pode estar acontecendo!
Voltei correndo para o outro lado da placa e olhei o céu. Não havia mais estrelas, nem luar, retornei correndo para onde estava Pauläo e as estrelas voltavam como que magicamente. Pensei ser efeito da bebida, mas lembrei que antes de beber havia percebido a mesma coisa. Tentei convencer Pauläo do que estava acontecendo, mas ele estava numa outra dimensão, já não dizia coisa com coisa e começava a ficar agressivo, culpando-me por estar naquele lugar que ele mesmo começou a chamar de nojento e sem vida.
Comecei a ficar assustado com aquilo e sentei-me no degrau de um jipe parado entre um ônibus e uma carreta cheia de pessoas com vestimentas alegóricas ao fim do mundo e pus-me a meditar.
Esqueci Pauläo e o perdi de vista. Tentava raciocinar logicamente mas não conseguia. Esforçava-me para ver se passava um pouco o efeito da bebida, mas ao contrário, de repente, com o nervosismo comecei a sentir fisgadas no braço e lembrei que precisava continuar bebendo se não quisesse ter um troço ali mesmo.
Dirigi-me aos carros na beira da estrada implorando que me dessem qualquer coisa de álcool para beber, até que uma trupe de adolescentes, também embriagados, convidaram-me para beber com eles. Tinham uísque, conhaque e drink de vinho a vontade, além de um estoque invejável de caixas de cerveja em lata. Foi um porre e tanto até as 4 da madrugada.
Definitivamente havia me perdido de Pauläo e aquelas alturas já nem me lembrava mais porque tinha ido a Alto Paraíso. Só sabia que tinha uma missão importante, ir pertinho de Júpiter e pousar em uma de suas luas, ria e ironizava tudo naquele momento.
Passei a noite enchendo o saco das pessoas que ficavam a beira da estrada, aguardando um espaço para poderem entrar na cidade e conheci muitos bebuns que como eu tinham tomado seu primeiro gole de álcool ali naquele lugar. Pude manter conversa com um velho coronel reformado do exército que disse que eu era uma ótima pessoa para beber e que queria ter o prazer da minha companhia enquanto estivesse ali em alto paraíso. Também achei ele um cara legal mas não tinha outro papo senão contar histórias da caserna e de seus atos de heroísmos no combate a guerrilha no Araguaia, foi quando então me dei conta que estava fazendo amizade com um torturador de muitos amigos meus, guerrilheiros que um dia pegaram em armas em defesa da Pátria contra o selvagem regime militar instalado no país com o golpe militar de 1964.
Foi uma noite alucinante, cheia de bravatas, de festas e de cantorias ao lado de um punhado de amigos que fiz no lugar. Cheguei a esquecer que trouxera Paulão comigo. Lembro apenas que o vi se misturando a multidão que se espremia na estreita estrada de acesso a Alto Paraíso.
Deitei-me a beira da estrada entre os carros e dormi por ali mesmo. Na verdade não dormi desmaiei de tão bêbado que estava e apaguei completamente.
Tive pesadelos horríveis naquela noite e sentia arrepio mesmo adormecido como se algo muito estranho estivesse para acontecer. Não sei se era minha consciência que me atormentava por ter bebido ou se era o medo que me dominava sobre todas aquelas elucubrações acerca do fim do mundo.



12
A CONSTATAÇÃO DO FIM

Eram 9 horas da manhã do dia 11 de agosto, quando acordei fedendo a álcool, com uma náusea e a boca sedenta e ressecada. Percebi que muita gente ainda dormia a beira da estrada e pus me a caminhar os cinco quilômetros que me separava do centro da cidade rindo e cantarolando.
Cheguei finalmente ao meu carro, no centro da cidade. Havia muito barulho, pessoas rezando, outras fazendo meditação e entonando cantigas nas mais diversas entonações. Peguei meu LepTop e o Celular e sentei-me num boteco, onde pedi uma água de coco e uma pasta de dente. Tentei ligar para o celular de um amigo, em Brasília, mas ele estava mudo. Fui a um orelhão, um dos poucos da cidade e já havia uma fila de gente reclamando que ele não estava funcionado. Parecia que tudo estava mudo em Alto Paraíso. Lembrei então do LepTop com Internet e tentei mandar um E-mail para o Coronel Sérgio em Brasília, mas não conseguia nada. Um silencio sepulcral envolvia toda a cidade. Vi, então, alguns membros da “Novo Mundo Cósmico”, que desciam do Morro da Baleia, uma elevação situada a uns dois quilômetros do centro da cidade e sob a qual, no topo, havia uma construção esotérica, construída pelos membros da seita e que tinha o dom de confortar espiritualmente a quem nela adentrasse e também de onde foram esperar a vinda de uma mensagem muito especial que viria do espaço sideral.
Já conhecia bem a “Novo Mundo Cósmico” e sabia que seus seguidores tinham todos os motivos para acreditarem ser 11 de agosto um dia muito especial para eles. Porque acreditavam em transformações surpreendentes, embora assustadoras, naquele dia.
Dirigi-me a um deles e perguntei se sabiam porque os telefones não estavam funcionando na cidade e ele me respondeu negativamente com a cabeça.
Entendi que queria dizer que não sabia e percebi uma certa frustração nas pessoas que desciam do morro da baleia naquela hora.
De repente, percebi alguém cambaleando em minha direção. Era Pauläo, estava todo sujo, roupa rasgada e babando como um cachorro louco, descontrolado e ainda embriagado abraçou-me e disse.
- O Mundo não acabou, vamos a São João comprar birita.
Disse-lhe que não, que eu precisava voltar para Brasília ainda pela manhã.
Não conseguia entender porque aquela ânsia alcóolica em Paulão. Principalmente ele, que sempre me pareceu um cara comedido e que só costumava tomar sua cervejinha na sexta-feira.
Convidei Pauläo e voltamos a pousada do seu Dias, para tomar um banho e
retornar para Brasília.
Estava com uma ressaca tão grande que não suportava ficar em pé. Comecei a sentir a ansiedade que durante anos atormentou minha vida e me levou a tomar seis miligramas por dia de um calmante antisiolítico chamado lorax. Estava sentindo de novo um pânico, uma agonia, como se fosse morrer de repente naquele lugar.
Não tinha sequer um comprimido comigo, sabia que enquanto não bebesse não precisaria mais fazer uso do calmante. Mas agora, por causa do álcool, voltei novamente a minha velha e maltratável ansiedade. Era uma doença terrível que quase me matara diversas vezes. Já estava começando a ficar apavorado, meus nervos tremiam e minha cabeça rodava e formigava como seu eu estivesse tendo um derrame, minhas mãos e pés começaram a gelar e a sensação horrível de que iria ter um troço novamente se apossara de mim.
Como estava arrependido. Porque fui beber. Já tinha até esquecido que trazia comigo esta maldita praga chamada ansiedade e agora precisava voltar o mais rápido possível e conseguir uma receita para comprar o lorax.
Passei rapidamente na pousada do seu Dias, não encontrei ninguém no lugar, peguei minhas coisas e a de Pauläo. Passei no boteco e empurrei-o com força para dentro do carro, gritando que eu precisava ir embora se não quisesse morrer. Estava começando sentir a sindrome da abstinência do Lorax. Precisava tomar, com urgência, nem que fosse meia miligrama, se não quisesse ter uma crise séria naquele lugar sem qualquer estrutura médica para um atendimento psiquiátrico.
Com muito esforço consegui persuadir Pauläo a ir comigo numa boa no carro, não sem antes abastecer a traseira com cervejas e um garrafão de vinho Sangue de Boi, porque ele, pelo que vi, também não conseguia parar de beber. Já estava desde as 9 da manhã do dia 10 bebendo sem parar. Eu pelo menos dormi um pouco e já havia me alimentado enquanto ele insistia em beber destemperadamente.
Arranquei o carro em disparada em direção a São João da Aliança. Pensava que se acelerasse poderia chegar a Brasília, em, no máximo três horas de viagem. Tive que fazer a volta pelo morro novamente, porque tudo estava congestionado na entrada da cidade.
Pisei fundo, mesmo no trecho de estrada acidentada, por fora do asfalto que
conduzia a São João da Aliança, esperando chegar na fronteira e retornar ao caminho normal.
Estava cada vez pior. Meus olhos começavam a inchar. Sempre tinha isso em minhas crises de ansiedade e minha mão também inchava e latejavam com se fosse pular fora do braço. Estava inconsoladamente arrependido por ter bebido naquela noite, minha vida parecia escoar-se de novo pelo ralo do alcoolismo. Entrei novamente em pânico, tanto que tive que parar o carro, porque já não conseguia controlá-lo mais. Estava suando frio, agoniado, meu coração batia aceleradamente.
Comecei a ficar preocupado com minha pressão sangüínea. Ela subia assustadoramente quando tinha as crises de ansiedade. Percorri os quilômetros até a fronteira, numa agonia sem precedentes e quando cheguei não avistei a placa que marcava a divisa e pensei ter errado o caminho. Engraçado que não avistei a cidade de São João da Aliança, o que era comum vê-la assim que se chegasse a divisa dos dois municípios.
Fiz um esforço tremendo na tentativa de acordar Paulão que dormia e babava. Estava todo sujo e fedia puramente a alcool.. Ele precisava tomar um banho urgente, senão eu é quem iria ficar contaminado com aquele fedor horrível que exalava de Paulão. Sua roupa estava toda suja de barro que, misturada com a urina e a cerveja esparramada por suas calças tornavam o fedor ainda mais insuportável. Tentei acordá-lo de todas as formas mas não conseguia. Ele estava completamente apagado.
Continuei dirigindo bem devagar e cantando baixinho para espantar a ansiedade. Lembrei que Angela fazia isso comigo quando estava em crise. Ela falava suavemente, tentando me acalmar até que acabava conseguindo.
Procurava, desesperadamente, a saída da cidade, mas não a encontrava.
Olhei para o céu e percebi que ele estava sem uma nuvem sequer, alvo e ao mesmo tempo azulado, mas sem qualquer claridade solar. Fiquei encucado com a situação e comecei a pensar se não estaria sonhando.
Dirigi mais alguns quilômetros e vi que não iria chegar a lugar nenhum, já que fazia mais de uma hora que tinha saído de Alto Paraíso e ainda não tinha conseguido chegar, sequer, a São João da Aliança. Foi então que parei o carro e caminhei em direção ao horizonte, até me aproximar e vi que tudo acabava ali, o céu se alongava para baixo como se fosse uma cúpula e encobria toda a cidade, além dali não havia mais nada. Aproximei-me ainda e pude tocar o horizonte. Era uma espécie de plástico, mas um pouco pegajoso e frio. Enfiava minha mão e ela adentrava o material e logo em seguida voltava como que se fosse empurrada por alguma coisa do outro lado. Tentei circundar o local, andando com o carro rente a cobertura e vi que depois de umas duas horas tinha circundado por trás o morro da baleia e voltado ao mesmo lugar onde estava inicialmente, ou seja, na divisa com São João da Aliança.
Recusava-me a acreditar naquilo, mas conscientizei-me de que realmente não haviam mais saídas de Alto Paraíso, a cidade estava cercada por uma estranha redoma de um plástico bem diferente daquele que conhecíamos. Fiquei perplexo tentando entender o porque de tudo aquilo.
Tudo era estranho, muito estranho e estava me amedrontando a idéia de não poder voltar a Brasília, especialmente porque precisava ir urgente ao meu psiquiatra pegar uma receita para comprar o lorax e ir a casa do Coronel Sérgio para a entrevista a CNN.
Lembrei então que o exército e a polícia militar também estavam no local, só não sabia onde estavam baseados na cidade. Peguei novamente o celular e tentei discar o número 190, da polícia, mas nada, só ouvia o sinal do meu telefone. Parecia que a ligação não se completava. Disquei para Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo e para o Paraná e nada. Todos os telefones estavam mudos. Também não consegui mais entrar na Internet pelo meu Leptop e pela linha do meu celular, apesar de ele continuar funcionando normalmente. Pensei então em fazer uma ligação internacional, para uma amiga nos Estados Unidos e quase consegui que ela se completasse, não fosse de repente um zumbido ensurdecedor, desligar definitivamente o aparelho que de repente, simplesmente, emudeceu e ficou completamente sem qualquer som.
Alguma coisa muito séria estava acontecendo naquele lugar e eu começava a ficar
completamente desorientado, Não conseguia pensar em nada. Sempre que lembrava
da história do fim do mundo, dizia revoltado para mim mesmo “Que coisa mais idiota, que
idéia mais ridícula. É claro que o mundo não acabou, senão como estaria aqui ainda.
Resolvi então voltar ao centro da cidade e procurar o exército, pois sabia que haviam alguns batalhões ali, conforme pude ver quando cheguei no dia anterior.
Antes porém de retornar ao centro, resolvi caminhar um pedaço da estrada onde havia uma concentração muito grande de veículos e centenas de barracas armadas a beira do caminho. Aproximei-me de uma Topic amarela, toda pintada com argumentos psicodélicos e percebi que haviam três pessoas em seu interior, mas que dormiam profundamente.
Tentei acordá-las mas não conseguia. Tive a idéia de ligar o rádio e tentar sintonizar alguma estação. Mas nada só ouvia-se o ruído tradicional de quando o aparelho não consegue sintonizar. Pensei ter ouvido uma voz fraca no rádio, mas logo depois percebi que era um dos passageiros que acordava lentamente. Espreguiçando-se e assustando-se com a minha presença. Assim que despertou de vez, começou a apertar insistentemente a buzina do carro na tentativa de despertar os companheiros, mas eles pareciam completamente apagados.
Só então dei me conta de que havia uma multidão caminhando em minha direção. Ainda estava muito obscuro e não consegui distinguir quem eram. Logo em seguida, pude observar mais claramente que eram soldados do exército que vinham em marcha em direção a saída da cidade.
Eram comandados por um major e dois sargentos que vinham a frente gritando ordens militares. Aproximei-me e perguntei ao Major se sabia o que estava acontecendo e ele disse-me que tudo estava normal e que estava preparando a retirada da tropa de Alto Paraíso para o retorno a Brasília. Acenou-me, positivamente, querendo dizer que tudo tinha sido muito tranqüilo e que não havia mais necessidade de permanecer ali com a tropa.
Disse-lhe então que era impossível sair da cidade e ele riu demoradamente, talvez, achando que eu fosse mais um dos malucos que se misturavam a multidão de fanáticos que estavam na cidade. Insisti com ele para que fosse comigo até a fronteira, apenas cinco quilômetros dali. Ele disse que não haveria tempo e que o comboio já estava esperando em São João da Aliança para o retorno ao Distrito Federal. Resolvi então acompanhá-los, já que vi que não conseguiria convencê-lo de nada.
Marchamos por cerca de meia hora e aproximamos da fronteira novamente, apesar de não se ver mais nada dali para frente a não ser aquela coisa azulada que parecia uma espécie de lona plastificada encobrindo toda cidade e parecendo um céu azul claro, sem sol e sem estrelas. Nunca vira nada parecido com aquele material, apenas me lembrava gelatina, mas era muito mais denso e também pegajoso e eletrificado.
“Seria coisa dos místicos do lugar que fizeram aquela alegoria como proteção para a cidade no dia do esperado apocalipse”, questionei comigo mesmo. “Poderia ser”, tranqüilizei-me, mas sem conseguir assentar o semblante cada vez mais irrequieto.
Perguntei o nome ao Major e ele disse que se chamava Ribamar e tinha vindo do Maranhão para Brasília a apenas quatro meses. Indiquei-lhe a direção em que tinha ido quando toquei o invólucro da cidade e ele fez o mesmo, colocando e retirando a mão rapidamente. E, sobressaltado, virou-se para mim e disse com uma ar de espanto e admiração.
Meu Deus, o que aconteceu, parece coisa de Alem da Imaginação, não há mais
horizonte, onde estão as montanhas, o céu, a saída da cidade, perguntou-me o major quando percebeu que a fronteira da cidade não chegava mais e as tropas estavam andando em círculos.
Mandou então um dos soldados pegar uma faca e rasgar o plástico que encobria a saída. Ele foi, violentamente, de encontro ao estranho material e apunhalou-o com violência tentando forçar uma abertura, rasgando o mesmo, quando então, ouviu-se um estranho relâmpago, acompanhado de um violento trovão que estremeceu toda as redondezas. Parecia que havia perfurado algum tipo de condutor de energia elétrica, porque de repente do material começou a sair faiscas enormes, com se estivesse dando um curto circuito.
A tropa saiu em disparada de volta a cidade, apesar dos gritos do Major para que mantessem a compostura. Realmente era assustador o barulho e as partículas elétricas que desprendiam do material. Ficamos todos imóveis, pasmos com a situação e sem saber que atitude tomar, quando então o major Ribamar, puxou uma espécie de rádio de seu bolso e começou a falar. Só que o aparelho também estava mudo e ouvia–se apenas ruídos secos e um forte zumbido.
Perguntei-lhe para onde estava ligando e ele me disse que para o quartel general do exército em Brasília. Mas não se conseguia ouvir nem entender nada, apenas um barulho ensurdecedor que vinha do aparelho como se ele tivesse captado um ruído de pipocar de centenas de bombas e tiros de canhão.
Ajoelhou-se, prostrado ao chão e disse-me com voz insegura. Meus Deus, acho que aconteceu aquilo que todo mundo esperava.
- O que aconteceu, perguntei-lhe
- O mundo acabou.
- Como acabou se estamos aqui, contestei.
Não sei, algo estranho aconteceu e me parece que somente Alto Paraíso escapou.
Ri, zombeteiramente, perguntando. Escapou de que?
- Não sei, disse-me. Mas tenho um terrível pressentimento. Precisamos voltar ao centro da cidade e procurar algumas pessoas que talvez possam explicar-nos o que está acontecendo aqui.
Fomos caminhando até um jipe parado em meio ao caminho, sem motorista ou passageiro, embarcamos nele, eu o major e os dois sargentos que também tinham permanecido no local.
Só que ao tentarmos ligar o carro, ele simplesmente não deu nenhum sinal. Apenas um barulho de um rádio sem sintonia. Tudo era tão esquisito.
Queria tentar compreender o que estava acontecendo, mas não sabia por onde começar, e nem imaginar como tudo aquilo iria fazer sentido.
De repente, vimos uma multidão correndo furiosa em direção a nós, vinham em disparada, abanando as mãos e gritando por socorro. Pensei que agora iríamos esclarecer tudo aquilo, mas as pessoas chegaram e correram para o Major, avisando que os soldados de seu batalhão estavam saqueando a cidade e ferindo pessoas.
Ainda impressionado com o alvoroço, notei que a multidão tinha pisoteado alguém. Aproximei-me do corpo e, boquiaberto, pude identificar Paulão ainda agonizando. Pedi ajuda ao major para levantá-lo do chão. Ele parecia todo mole, como se não tivesse ossos.
“Meu Deus, não pode ser verdade, Paulão está morrendo”.
Vi-o fechando os olhos devagarinho e dando um último suspiro. Fiquei inerte sem esboçar qualquer reação. Parecia agora que o mundo estava acabando para mim. Meu melhor amigo tinha sido massacrado por uma multidão de fanáticos que debandavam correndo não se sabe, exatamente, do quê.
Colérico, dirigi-me a o major Ribamar e pedi-lhe que detivesse aqueles loucos, e ele respondeu-me que não podia fazer nada, porque também estava sozinho. Sua tropa tinha debandado e as pessoas começaram a falar que estavam fugindo dos soldados que pareciam loucos, desequilibrados e atirando a esmo no centro da cidade.
Tentei acalmar a turbe, mas o alvoroço era muito grande, quase todos falavam ao mesmo tempo, uns em prantos e outros em desespero e outros ainda muito nervosos, dizendo que precisávamos sair dali e chamar a polícia ou o exército.
Mas, por ironia, o exército estava ali e eram os soldados do exército que estavam causando todo aquele pânico. Por um instante até esqueci de que estávamos ilhados em Alto Paraíso e sugeri ao Major que chamasse reforços. Quando então dei-me conta de que era impossível sair da cidade. Perguntei ao major se havia mais alguma guarnição militar na cidade e ele respondeu-me que só tinha conhecimento da dele e de mais cerca de 30 policiais militares que vieram de outras cidades de Goiás para ajudar na guarda da cidade. Disse-lhe então que precisávamos procurar este policias, pois somente eles teriam armas na cidade para poder conter os soldados que estavam saqueando e chacinando pessoas em todo o município.
Colocamos o corpo de Paulão no meu carro e voltamos ao centro da cidade,
acompanhados da multidão amedrontada.
Até aquele momento ninguém, com exceção do major e os dois sargentos, tinham se dado conta do que realmente estava acontecendo. Tanto que muitas pessoas se preparavam para ir embora. No caminho vi alguns desarmando barracas, outros, levantando acampamento e alguns dando a volta no carro para ir em direção da saída da cidade. Ninguém, tinha consciência de nada do que estava ocorrendo. Somente eu, mesmo apavorado também, tentava encontrar uma explicação.
Tinha comigo outra preocupação, precisava ir a reunião na casa do Coronel Sérgio Canhedo em Brasília, porque lá também estariam os outros quatro escolhidos para a viagem até Europa, uma das luas de Júpiter. Não poderia perder a reunião, já que seria uma das poucas oportunidades que teríamos para nos encontrar antes de embarcamos para os Estados Unidos e para o estágio na Nasa.
Agora, em Alto Paraíso, tudo parecia em êxtase, sem sol, e meu desespero contribuía ainda mais para minha ansiedade, apesar de agora, as coisas já terem melhorado porque tinha encontrado três outras pessoas que também imaginavam o que poderia ter acontecido.
Lembrei quando o Major falou que o mundo realmente havia acabado, mas levei tudo na brincadeira. Sabia apenas que alguma coisa muito grave tinha acontecido naquela cidade, mas não imaginava exatamente o quê.
Nos cerca de 5 quilômetros que percorremos vimos milhares de pessoas se aprontando para irem embora, Uns decepcionado, porque não acontecera nada de anormal e outros felizes e saltitando porque sabiam que o mundo não tinha acabado. Só eu pensava comigo mesmo, será que realmente não acabou e tudo aquilo na saída da cidade, porque Alto Paraíso estava ilhada, isolada sem qualquer saída para qualquer outro lugar e porque também os telefones, os rádios, nada pegava. Não se conseguia emitir nem receber qualquer sinal de fora da cidade.
Quando chegamos ao centro, já havia outra multidão em pânico, gritando por socorro, avisando que os soldados do exército haviam enlouquecidos. Desviamos então o caminho e subimos o morro da baleia na tentativa de encontrar a polícia militar conforme indicação de um dos membros da “Novo Mundo Cósmico”, que disse haver notado alguns deles subindo o morro.
- Vamos, procurar pelos dois lados, sugeri ao Major que acenou positivamente,
destacando os dois sargentos para irem na direção da Chapada dos Veadeiros e chamando-me para acompanhá-lo a té o morro da baleia.
Depois de acalmarmos as pessoas e garantir que nada de grave lhes aconteceria,
conseguimos amealhar mais uns dez homens para nos acompanhar. Eles se armaram de paus, porretes e até garrafas vazias de cerveja e refrigerante com o objetivo de enfrentar os soldados que agora tinha corrido em direção ao norte da cidade.
Disseram-me que alguns gritavam que queriam sair do inferno. Não entendíamos o porque da revolta deles e porque estavam atirando a esmo e sem qualquer motivo, já que, com exceção da revolta militar, tudo estava calmo na cidade.
Foi então que percebi alguém caminhando solenemente em nossa direção. Era Goti Rem que, dirigindo-se a nós, calmamente falou.
- Sei o que aconteceu. Esta cidade não está mais na terra, disse com
muita credulidade.
- como, indaguei, Não está mais onde?
- Na terra, repetiu, chamando outros seguidores de sua seita, para em conjunto explicar o que havia ocorrido.
- Alto Paraíso é a nova arca de Noé. Só nós escapamos da destruição total da terra. Estamos vagando pelo espaço, a caminho de um novo destino e de uma nova morada para todos nós.
- Fomos escolhidos por seres extraterrestres para dar continuidade a raça humana, mas em um outro ponto do universo. A terra espatifou-se em milhões de pedacinhos e dela nada sobrou, a não ser esta cidade, Alto Paraíso, que agora chamamos de arca da esperança.
- Fingi não entender e questionei-o novamente.
- Que história fantástica é esta se aqui há gente de todas as espécies, boas, ruins e até militares. (tinha comigo que militares seriam sempre seres perversos e sem compaixão).
Teria o mundo acabado novamente com uma grande enchente ou se não fosse isso onde estaríamos então. Como a cidade sobreviveu se todo o resto tinha acabado.
Se Alto Paraíso tinha sido escolhida para uma revelação, então porque foi permitida a entrada de tanta gente na cidade no dia interior perguntei aos membros da seita e eles me disseram que ninguém sabia ao certo o que iria acontecer. Tinham convicção apenas de que uma revelação seria feita e o homem não seria mais o mesmo a partir daí.
Pensei no óbvio, o homem simplesmente havia desaparecido da face de todo o universo, não fossemos nós, a raça humana seria apenas uma vaga lembrança na cabeça de seres extraterrestres que um dia por acaso visitassem esta região do Cosmos e questionassem seus mapas sobre um planeta azul que por ventura devia existir entre marte e Vênus.
Agora, já acalmado e recobrando o fôlego com tudo o que estava acontecendo, percebi um brilho muito intenso vindo de trás das montanhas e chamei o Major Ribamar e mais alguns militares para investigarmos.
Chegando próximo a luminosidade, vimos que se tratava de um imenso painel luminoso, uma espécie de televisão gigante que mostrava uma rota no espaço e a cidade de Alto Paraíso seguindo-a.
Não tinha a menor idéia de onde surgira aquele aparelho, mas, por incrível que pareça, ele simplesmente se materializou no local e também, mais incrivelmente ainda, passou a ser o nosso guia, mostrando nossa rota no espaço sideral.




13
A ODISSÉIA ESPACIAL

Vagamos vários dias pelo espaço, até nos aproximarmos do grande cinturão de asteróides, que separavam o Planeta Marte de Júpiter e um temor muito grande tomava conta de todos nós. Haviam grandes pedras vagando pelo espaço, de dimensões incalculáveis que viajavam em todas as direções.
Quando passamos o cinturão de asteróides, alguns meteoritos atingiram a cidade, causando um pânico generalizado que só foi contido com a intervenção do Major e seus homens.
Embora muitos soldados ainda estivessem escondidos nas montanhas vizinhas, o Major conseguira refazer um pelotão com cerca de 100 homens, embora armados apenas com apetrechos pontiagudos como facas, estacas de madeira e pedaços de ferro e pau.
Eram milhares de asteróides, talvez, uns quarenta mil. Passamos bem próximo do famoso asteróide Ceres, o terror dos humanos, cujas profecias davam conta de que um dia ele poderia chocar-se com a terra e seus 1,26 quilômetros de diâmetro esmagar toda a vida do planeta. Também vimos Palas, Juno e Vesta, com suas superfícies áridas e desprovidas de qualquer material que não fosse ferroso.
Para onde estávamos indo? A água a e alimentação já estava ficando escassa e resolvemos então confiscar todos os suprimentos e armazená-los no prédio da prefeitura municipal, deixando-os sob a guarda do Major Ribamar e seus oficiais.
Sabia que havia muita gente na cidade, principalmente milhares que chegaram durante a madrugada e haviam transformado Alto Paraíso num caos. A cidade não teria condições de comportar tanta gente por mais de uma semana.
Também formamos um equipe agrícola que seria responsável pela semeadura e o cultivo de novas culturas na cidade. Felizmente, a secretaria de agricultura do município tinha um estoque de sementes e mudas, notadamente de ramas de mandioca e hortaliças que dariam para alimentar as pessoas por algum tempo.
Todo o rebanho bovino, suíno, caprino e ovino do município foram confiscados e colocado sobre o controle do Major Ribamar e sua equipe. Selecionamos as pessoas pelas profissões, distribuindo grupos responsáveis por cada setor. Desde a agricultura, medicina, farmacologia, veterinária, até geólogos, bombeiros e uma guarda precariamente armada para cuidar da segurança.
Descobrimos, entre os membros da Seita Novo Mundo Cósmico, um astrofísico russo chamado Sergei e o encarregamos do cálculo de nossa posição e de construir um mapa do caminho que estávamos fazendo no espaço. Ele prostrou-se a frente do painel luminoso de onde monitorava nossa rota, informando-nos de eventuais contratempos.
Apesar de haver muita colaboração, havia ainda uma desordem geral na cidade. Um desespero muito grande começava a tomar conta dos mais incautos e a desorganização das pessoas em querer sair da cidade para voltar para casa contribuía ainda mais para o caos.
Passamos seis dias como que parados no espaço, já que as figuras no painel não mais se movimentavam, quando então percebemos uma sombra que parecia encobrir toda a região de Júpiter, e vimos que não era um fenômeno cósmico, mas um gigantesco e descomunal planeta vagando pelo universo em direção ainda desconhecida. Pudemos observá-lo a uma distância de, aproximadamente, 800 mil quilômetros e já tinha então o tamanho de Júpiter, naquela distância. Percebi também que não viajávamos mais a velocidade constante de nossa arrancada da terra. Tínhamos acelerado um pouco a velocidade e viajamos agora a um tempo inconcebível e impossível de se medir com os atuais instrumentos conhecidos.
Conversando com Sergei, fiquei sabendo que ele tinha sido um astrofísico da ex-Uniäo Soviética e me tranqüilizou dizendo que tudo não passava de alegorias pela movimentação do cosmos. Garantiu que tudo aquilo era por demais normal e então quis saber de onde surgira aquele imenso planeta e porque ele estava se locomovendo em direção ao nosso sistema solar e ele pegou um pedaço de papel e uma caneta e começou a traçar um mapa da Via Láctea, onde colocava Júpiter como a fronteira final do nosso Sistema Solar e desenhou uma barreira formada por milhões de fragmentos de rochas, parecendo meteoritos, que se agrupavam de forma rápida e violenta formando um planeta.
- Nesta região não poderia existir um planeta deste tamanho, pois já o teríamos observado da terra, disse-me, apontado no mapa um outro corpo celeste muito brilhante, afirmando-nos tratar-se de uma estrela, só que já estava a alguns milhares de quilômetros a frente do planeta gigante, indo em direção ao sol.
- Foi a estrela, ela incinerou a terra, e o planeta que agora está passando por nós
é o que alguns astrônomos chamam de companheiro escuro da estrela. Ele esta preso a sua força gravitacional e a acompanha em sua rota pelo espaço, há uma distância considerável para não ser incinerado por ela.
- Meus Deus, então foi mesmo Hercolobus ou a Estrela de Barnard que dizimou a terra. Mas é nós, porque escapamos, como a cidade pode ser arrancada da terra antes da aproximação da estrela. Parece-me ser alguma coisa divina. Não há explicação científica para isso, questionei a mim mesmo.
Notei, então que Sergei falava de uma forma inquietante e triste, como se tivesse certeza do que estava acontecendo. Lembrei a conversa com Goti Rem e alguns seguidores da “Novo Mundo Cósmico” que nos disseram que um ser superior do espaço havia transformado a Alto Paraíso numa nova arca de Noé, mas as coisas não se encaixavam. Não havia lógica para acreditar que eles soubessem o que estava realmente acontecendo, até que Sergei disse-nos com credulidade e espanto: Deus soube o que fez!.
- Como, Deus, perguntei-lhe?
- Deus, Deus me disse, que isso iria acontecer.
- Que Deus, perguntei-lhe, incrédulo?
- Só há um Deus. O Senhor supremo de todas as criaturas e de todas as criações.
- Não me faltava mais nada. Só isso. Estar no espaço com um fanático religioso, desequilibrado e metido a profeta, apesar de achá-lo um cara lógico nas observações cientificas que fazia durante a nossa viagem.
Não dei qualquer crédito as palavras de Goti Rem e de Sergei. Para mim não
passavam de um bando de fanáticos. Mas me preocupava com o que poderia ter acontecido e esforçava-me para manter a lucidez e encontrar uma explicação lógica para o que ocorrera na cidade durante a madrugada do dia 11 de agosto.
Deitamos naquela noite com um revezamento na guarda, já que imaginávamos estar em algum lugar tenebroso e assustador. Com ruídos esquisitos e inimagináveis e tinha ainda a ameaça do planeta gigante passando sobre nós.
Na manhã seguinte, o Major Ribamar convocou todos para mais uma tentativa de encontrar os soldados que haviam sumido e também falou-nos que, segundo informara Sergei, estávamos agora passando por Ganimedes, um dos satélites de Júpiter, ao que ri ironicamente, pensando na viagem que faria a Europa.
Dirigi-me ao Major Ribamar e relatei a conversa com Sergei, detalhando até mesmo os gestos e expressões que usara para me falar sobre o fim da terra e ele me tranqüilizou, dizendo que ele deveria estar delirando devido a febre alta que lhe entorpecia o corpo. Disse-me que Sergei fora um brilhante e renomeado astrofísico russo que trabalhara como conselheiro especial de vários presidentes russos, desde Leonid Brejnev até o atual Bóris Yeltsin. Havia também dado consultoria a Andrei Tscharkoviski nos vários filmes de ficção que ele realizara, desde Solaris até Stalker. Era uma pessoa preparadissima e que não dizia bobagens. Razão pela qual o comandante acreditava ser um delírio pelo alta febre que lhe atingia. Também contou-me que ele perdera sua esposa e seus três filhos num acidente aéreo na Sibéria e desde então abandonou tudo e passou a viver em meditação, tendo passado alguns meses no Tibete até vir parar em Alto Paraíso.
Assim que passamos Ganimedes, o satélite de Júpiter, que tinha atmosfera semelhante a da terra, pudemos ver a exuberância e o festival de cores que encobriam Talman, a lua nova de Júpiter. Uma espécie de rocha gigantesca e disforme com repercussões pontiagudas em suas extremidades mas de um beleza sobrenatural. Talmann parecia-nos uma lua de Ganimedes, mas mesmo assim ainda era enorme e seu brilho ficava cada vez mais intenso durante a noite que naquela região já durava mais de 15 dias.
Conseguimos, mesmo com uma visibilidade precária, vislumbrar Europa e sua visão me emocionava. Ela era enorme, mas parecia escura e sem brilho. As vezes ficava completamente apagada com a ofuscação do brilho que vinha de Talmann.
Não compreendia porque estávamos parados na região de Júpiter e também não entendia porque tínhamos oxigênio em Alto Paraíso se estávamos nos deslocando no espaço sem qualquer equipamento artificial.
Novamente, em frente ao painel eletrônico gigante, surgiu a figura, agora mais nítida do planeta gigante. Calculei que ele tivesse duas ou mais vezes o tamanho de Júpiter e estava acompanhando a estrela gigantesca que agora já emitia apenas um leve e distante brilho no espaço.
Sua crosta lembrava a terra, mas tinha um brilho amarelado escuro que lembrava levemente a cor do bronze e confirmei então que ele era realmente um dos companheiros escuro da estrela, conforme se falava tanto nos estudos de astronomia.
Ainda me lembro de uma estágio que fiz na Universidade de Havard, quando um dos professores, numa das aulas, falou sobre Edmundo Halley e suas teorias sobre os companheiros escuros, explicando-nos que eram corpos planetários que acompanhavam algumas estrelas na Via Láctea e sobre os quais não se tinha muitas informações.
Recordei seus ensinamentos sobre as grandes estrelas do firmamento e suas localizações e ainda as que poderia deter alguma chance de possuírem planetas em sua órbita com possibilidades de conter vida. Falava-nos da estrela Siriús e de sua companheira escura, Siriús B, na constelação de Cão Maior, de Betelgeuse, em Orion, ou de Aldebaran na constelação de Touro. Mas nunca, jamais imaginei um dia estar tão próximo de tudo isso. Lembrava-me de suas pregações sobre os aglomerados de estrelas que poderia constituir verdadeiros sistemas solares idênticos ao nosso.
Fui conversar com o Major Ribamar e soube que as provisões estavam acabando e então sugeri-lhe que recrutasse mais voluntários para tentar recuperar o estoque de alimentos que ele havia trazido para a cidade e que estavam em poder dos soldados enlouquecidos e ele sugeriu-me que formássemos um grupo, com as armas rudes que estavam a disposição e fossemos tentar capturar a tropa. Achei a idéia um pouco descabida e estúpida. Afinal, como iríamos lutar, sem armas de fogo, contra soldados com metralhadoras fuzis e granadas, além de uma grande quantidade de gás lacrimogêneo. Durante quase toda a manhã, ficamos percorrendo todas a região de Alto Paraíso e sempre que chegávamos a fronteira com qualquer outro lugar a estranha cobertura de plástico novamente aparecia e não nos permitia passar além dali.
Num levantamento que fizemos da população da cidade, constatamos que muitos morreram no instante do deslocamento da cidade da terra, muitos outros sucumbiram aterrorizados e também houve muitos suicídios entre a população.
De volta ao painel observamos que estávamos, agora, viajando a uma velocidade ainda maior, incalculável com qualquer instrumento terrestre. Não havia barulho de motores, nem zumbido de qualquer tipo de engenhoca mecânica, mas sentíamos que nos deslocávamos a velocidades surrealistas e jamais imaginadas pelo homem.
Uma grande ironia do destino. Eu que até a pouco sonhava numa viagezinha interplanetária as proximidades do planeta Júpiter, me vejo agora deixando-o para trás e já avistando a frente Saturno com seus anéis de luzes multicoloridas e brilhantes, iluminando o escuro da noite cósmica.
Algum tempo depois, percebemos que havia ficado muito frio, tanto que alguns reservatórios de água da cidade transformaram-se em enormes blocos de gelo. Centenas de pessoas morreram de frio, alguns ficaram tão enrijecidos que pareciam ter sido colocados numa câmara frigorífica.
Estamos, agora, passando por Netuno e podemos observar a frente uma estranha névoa que ao chegar até cidade corta a pele como se fosse uma navalha. Recrutamos todos as pessoas ainda vivas e que pudessem fazer algum esforço e escavamos um túnel na montanha baleia para nos protegermos do vento cortante que agora castigava Alto Paraíso.
Goti Rem, Rá-Muhá e Sergei isolam-se num canto escuro do buraco sobre a montanha e passam a rezar fervorosamente. Sergei abandonara seu posto e agora estávamos sem qualquer orientação, porque ele era o único que conseguia decifrar o itinerário traçado no mapa estelar que aparecia no painel e então eu mesmo tive que assumir o posto, apesar de não ter os conhecimentos e as qualificações que ele tinha. Notei que a rota traçada seguia uma linha reta e levava aos confins do sistema solar.
O frio se intensificou ainda mais quando nos aproximamos de Plutão e pudemos observá-lo como uma descomunal bola de gelo flutuando no espaço e concluí que tudo era loucura. Não poderíamos ter viajado 6 bilhões de quilômetros em tão pouco tempo.
Cálculo que tenhamos deixado a terra a apenas duas ou, no máximo, três semanas, porque percebi que a primeira leva de ramas de mandioca que plantamos começaram a germinar.
Assim que passamos pelo gelado Plutão e adentramos as fronteiras do Sistema Solar, nos aproximamos de Próxima Centauri, tão rapidamente que tivemos um choque térmico pela brusca mudança de temperatura. Agora já começava a esquentar novamente e já podíamos distinguir o brilho da estrela, algumas vezes maior que o nosso sol. Próxima Centauri é a estrela mais próxima e mesmo assim, fica a alguns bilhões de quilômetros da terra. Mas em poucas semanas já tínhamos passado por ela. Pensava comigo, como se sentiriam os cientistas se soubesse ou pudessem imaginar o que estamos vendo e os locais por quais passamos.
O homem ainda estava se preparando para a colonização de Marte e a exploração da região jupiteriana, enquanto nós já havíamos empreendido uma viagem 200 vezes mais longa e impossível de se realizada com a tecnologia humana.
Na solidão espacial, lembrei intensamente dos sonhos e das experiências que tive com os grãos de areia na Praia do Rincão e parecia estar agora revivendo toda aquela situação.
Até que estaria gostando da viagem, não fosse o fedor da putrefação dos milhares de corpos que começava a se decompor na cidade, apesar de termos improvisado algumas sepulturas de emergência. Percebemos também que a grande maioria dos soldados revoltados tinham morrido, muitos deles sucumbiram com a nossa passagem por Plutão, devido o frio intenso que assolou a cidade.
As coisas agora parecia terem ficado mais calmas, já que não precisaríamos nos preocupar tanto com os rebeldes e também porque agora já tínhamos armas de fogo para combatê-los.
Depois de algumas horas, apareceu um ponto determinado no mapa, destacando a estrela Próxima Centauri. Era para lá que íamos.
“Próxima Centauri? Será ali a revelação da existência de vida extraterrestre. Claro que jamais alcançaríamos aquela estrela pela sua distancia de alguns anos luz da terra, pensei, logo depois voltando atrás e analisando que se já tínhamos chegado onde estávamos, nada dali em diante seria impossível.
Mas, estranhamente, desviamos da rota de Próxima Centauri e adentramos, conforme indicação do painel, na rota de Beteguelse. Não era ali o nosso destino e continuávamos afastando-nos cada vez mais das fronteiras da Via-Láctea.
A cada aceleração de velocidade, dezenas de pessoas morriam em Alto Paraíso. Não conseguia entender se era por causas físicas e a ver com a brusca mudança de velocidade ou se era algo já planejado pelo nosso desconhecido condutor.
Decidimos fazer um censo da população da cidade e constatamos que ela era agora de cerca de 2700 pessoas, menos de um sexto de quando tudo começou a acontecer.
As ramas de mandioca deram sua primeira colheita e a alimentação se tornou abundante em Alto Paraíso. Também houveram muitas crias.
Com a aproximação de Próxima Centauri, um estranho fenômeno aconteceu na cidade, os animais parecem ter acelerado seu período de gestação, porque centenas deles tiveram crias ao mesmo tempo. Para nós foi a melhor coisa que poderia ter acontecido, já que agora teríamos uma preocuparão a menos, ou seja, com a alimentação.
Começamos a ter problemas no painel que nos dava a indicação de nossa viagem. Eu, propriamente, já não conseguia mais ler nem entender suas indicações. Precisaria de um Astrofísico para poder decifrar as mensagens agora permanentes no painel luminoso, que surgira no início de nossa viagem.
Fui conversar com Sergei e tentar convencê-lo a reassumir o seu posto. Sabia que ele era um astrofísico altamente capacitado, mas que tiveram alguns devaneios em decorrência da morte de sua esposa e de seus filhos.
Contei-lhe parte da minha vida, falei-lhe de minha tristeza, do meu passado pobre e miserável, das necessidades de minha família e do sacrifício que tive que passar até mesmo para me formar na Universidade de Brasília e ele pareceu reagir as minhas súplicas e resolveu ir dar uma olhada no painel e ver se decifrava sua leitura.
- Pela indicação estamos além de Alfa Centauro , mas precisamente no espaço
onde deveria estar a Estrela de Barnard, mas não a consigo visualiza-la, disse Sergei.
- Claro, ela se deslocou daqui, foi ela quem destruiu a terra, disse-lhe, mesmo
sabendo que ele tinha conhecimento de tudo.
- Os astrônomos e astrofísicos sabiam que a estrela se deslocava a uma velocidade de 108 km por segundo e nesta velocidade ela só adentraria o sistema solar em mais de mil anos, comentou Sergei, mostrando-se cada vez mais incrédulo com a situação.
Sergei, olhou-me com um ar assustado e disse: é inconcebível, o mapa esta indicando que nos dirigimos a Galáxia de Andrômeda. Não creio que seja possível a qualquer ser humano um dia alcança-la. Está a 2.200.000 (dois milhões e duzentos mil) anos luz da terra e o mapa indica ela como nossa meta.
- Também encabulei, não pode o ser humano empreender tal viagem. Deve ser um erro, não poderemos jamais viajar mais de dois milhões de anos luz.
Quando Sergei falou que estávamos no espaço onde deveria estar a estrela Barnard, calculei que já havíamos nos deslocado 8,6 anos luz no espaço em menos de 30 dias, ou seja percorremos cerca de 86 trilhões de quilômetros.
Tudo parecia loucura. A partir de agora só restava deixar a lógica de lado e acompanhar as coisas fantásticas que seguidamente surgiam a nossa frente.
Em pouco tempo, as imagens mudaram de aparência, mostrando ao fundo do painel uma figura cósmica meia espiralada e que nos dava a idéia de que havíamos deixado a via-láctea.
O painel aponta agora que viajamos a uma velocidade de 0,3 parsecs por hora. Inacreditável tal velocidade, que calculada, resultou na fantástica soma de 10 trilhões de km/h. Não há como contestar o que está acontecendo, nem como desmenti-los porque o painel mostra claramente tudo o que acontece em nossa volta.
Eu que temia uma viajezinha a Europa, a lua jupiteriana, a pouco mais de 600 milhões de quilômetros da terra, vejo-me num espaço maluco, viajando acima da velocidade da luz e explorando os lugares mais fantásticos que, por ventura, poderiam existir na concepção humana sobre o universo.
Vejo coisas que nossa vã inteligência ou sabedoria jamais poderia conceber ou sequer imaginar. São luzes de cores, formas e concepções extravagantes e insones, sem qualquer referencial terráqueo. Vejo pelo visor incontáveis constelações agrupadas em outros milhões de planetas que parecem formar uma metrópole intergalática, ligadas por aerovias expressas, comandada por gigantescos guardas de aparências esquisitas e estranhas. Passei por um deles tão gigante quanto a nossa própria arca e com a aparência de uma libélula batendo asas no espaço.
Parecia-me estar tendo a idéia de como o universo começou, mas ainda não conseguia estabelecer nossa localização, já que a partir dali, nosso referencial galáctico havia se esgotado. Parecia que tínhamos adentada a Grande Nuvem de Magalhães, porque percebia a enormidade de Estrelas superbrilhantes que se aglomeravam com algumas anãs brancas e outras estrelas de menor grandeza.
Lembrei muito dos debates acerca de como o universo havia começado, pensei nas escolas e nas tradições antigas que promoviam o debate sobre o infinito. Sei que muitas tradições antigas, bem como as religiões judaica, cristã e islâmica, sustentaram que o universo foi criado num passado bastante recente. Um fato usado em apoio à idéia de uma origem recente foi o reconhecimento de que a raça humana está obviamente evoluindo em cultura e tecnologia. Assim, segundo esse argumento, não podemos estar por aqui há tanto tempo assim; se estivéssemos, já teríamos progredido mais do que o fizemos. Na verdade , a data bíblica da criação não está muito distante da data do fim da última época glacial, quando, ao que parece, o homem atual apareceu. Mas, então porque estávamos, agora, num espaço sem qualquer referência espacial, adentrado lugares jamais imaginados pela mente humana.
Comecei, então a falar com o Major sobre as idéias de Aristóteles acerca do Universo e ele pareceu desconversar comigo. Compreendi, também, que ele também estava com um medo muito grande. Notei até que balbucionava as palavras tremulamente quando falava-me. Mas não era só o major, eu também, apesar de deslumbrado com as coisas que despontavam a nossa frente, sentia um medo profundo, algo que pouco a pouco começava a me aterrorizar. Não sei se era a idéia de estar indo de encontro ao desconhecido, ou se o medo simples de não poder voltar mais para casa.
Resistia em acreditar que a terra tivesse sido destruída. Sempre acreditei que o universo existiria e iria existir para sempre, sem novas trágicas acomodações como ocorreu com a criação do nosso sistema solar.
Comecei a especular sobre algumas idéias e lembrei que ainda no século XIX, muitos pensadores de renome já acumulavam indícios de que a terra e o restante do universo estavam de fato mudando ao longo do tempo. Mas nunca esperei uma mudança tão trágica a ponto dela, simplesmente, desaparecer do mapa celeste.
Em nossa rota haviam, agora, percursos retos e curvos e Alto paraíso ziguezagueava no espaço e em algumas manobras que fazia, parecíamos estar dobrando uma esquina e de repente saíamos num lugar totalmente diferente, ou até diria, avesso aquele em que estávamos anteriormente. Tive a impressão de que, nessa viagem, a densidade do universo e a curvatura do espaço-tempo, simplesmente deixaram de existir. Parecíamos flutuando num lugar etéreo e incolor, sem qualquer resquício de matéria. Era algo como se estivéssemos sempre no mesmo lugar e o universo estivesse se expandido e nos levando junto, mas sem deixarmos nossa posição inicial.
Via claramente o vazio multicolorido que desmentia a idéia de que o universo é um lugar frio e escuro. Há muita vida em nossa volta, mas vida em estado latente, desprovida de matéria, parece que só pensamentos flutuam em nossa volta. De qualquer forma é por demais deslumbrante acompanhar tudo isso, apesar do medo tornar-se cada vez maior e cada vez mais presente em todos os passageiros e, agora, também tripulantes da Nave Alto Paraíso.
Era tudo tão incrível, lindo e maravilhoso, mas começava a temer profundamente o nosso destino final. O que nos esperaria no final daquela fantástica viagem, quem seria nosso protetor ou salvador e porque levava uma turpe de humanos, das mais diversas categorias, marcas e atitudes, salvos do cataclismo final de um planetinha perdido num pontinho qualquer de um outro pontinho chamado via láctea.
Parecia que não chegaríamos nunca a lugar nenhum. Mas tudo era tão esplendido, maravilhoso e deslumbrante que o tempo parecia ter parado para que pudéssemos contemplar toda aquela maravilha.
Um pouco mais a frente, fui novamente observar o visor de velocidade e quilometragem e pude notar que havíamos percorrido a fantástica distancia de 33 milhões de anos luz, algo jamais concebido ou imaginado pelo homem. Fiquei ainda mais perplexo, porque pela indicação atual já deixamos Andrômeda para trás há muitos anos luz. Compreendi então que ela teria sido apenas um referencial no painel, de forma a dar uma idéia da direção em que iríamos.
Verifique meu relógio de pulso e vi que o calendário marcava o dia 27 de setembro. No entanto não quis dar crédito, pois sabia que no espaço um relógio comum não funcionaria corretamente. Mesmo assim o usava com referencial.
Tínhamos, segundo ele, viajado 46 dias pelo espaço, sem qualquer parada, sem qualquer contato e sem qualquer referencia lógica de onde poderíamos estar.
No próximo dia, passamos por uma região nebulosa e branca como a neve, era um lugar lindo, cujo material parecia algodão do mais claro e do mais suave existente.
Passamos também por imensas montanhas suspensas no infinito, cujo topos eram inatingíveis e inalcancaveis ao olho humano. Pareciam ilhas no espaço, e com assombrosa luminosidade que tornava claro o nosso percurso.
Apesar de meu ateísmo, comecei um dia a folhear uma pequena bíblia, que o
Major Ribamar trouxera consigo em suas coisas quando viera para Alto Paraíso e passei a me interessar por seu conteúdo e passei a ler o Gênesis, embora muito raramente. Nunca havia pego uma bíblia na mão em toda minha vida. Mas de repente, como se alguma coisa me induzisse a isso, comecei a sentir necessidade de continuar lendo-a. Não a lia normalmente, mas a folheava sempre que me vinha a idéia de estarmos indo de encontro a algo celestial. Comecei a ler desde o gênesis para ver se compreendia alguma coisa da existência divina. Nada me parecia ter lógica com o que estamos vislumbrando, nem sequer uma citação qualquer para dar esperança naquele momento tão angustiante embora, divinamente maravilhoso.
Passaram-se muitos dias, não tinha uma seqüência lógica dos dias, só sabia que
tinha passado muito tempo desde que deixamos a terra e fomos lançados ao espaço.
Pensava ironicamente comigo que tinha que fazer uma viagezinha a Europa, a lua de Júpiter, num percurso de cerca de 600 milhões de quilômetros e de repente, sem mais nem menos, estava no infinito, viajando quinquilhöes de quilômetros em tão pouco tempo.
Chegamos a intolerável distância de 25 bilhões de anos luz, agora a paisagem mudara e nos defrontávamos com dezenas de Quasares, Buracos Negros em formas de redemoinhos e ao longe uma inusitada barreira de fogo, como ser servisse de fronteira para alguma coisa.
Minha ansiedade tinha virado crônica. Eu estava completamente exausto. Não pelo fato de Ter desprendido muito esforço, mas me senti cansado pelo que vi. Eram tantas coisas incompreensíveis que eu havia me esgotado de tanto admirá-las.
Pensei estar a beira da loucura, o que muitos habitantes de Alto Paraíso já tinham experimentado. Agora, mais da metade da população, ainda viva, perambulava desconcertadamente pelas ruas da cidades, como se fossem zumbis. Estavam esgotados pelos efeitos psicodélicos da fantástica viagem, que tinha enlouquecido muitos deles.






P a r t e 3


O Encontro


14
PRIMEIRO CONTATO COM GOD

Esforçava-me muito para tentar compreender como poderíamos ter viajado a uma velocidade tão inconcebível e muito além da velocidade da luz , porque sabia ser impossível tal façanha. A não ser que estivéssemos sendo conduzidos por uma inteligência suprema.
Pensei então em Deus. Será que Deus estaria nos conduzindo. Mas que bobagem nunca acreditei em Deus. Mas seria hora de começar a acreditar porque depois de tudo o que vi e o que passei não poderia continuar agnóstico. Tinha que acreditar numa força superior, numa ser superior, porque não poderia estar naquele lugar fantástico pela simples vontade humana.
E continuamos vagando anda durante muitos dias pela imensidão do universo e vislumbrando ao longe a barreira de fogo, cujas chamas se tornavam cada vez mais atemorizantes.
E, eu, durante aquela viagem misteriosa, pensava na viagem da arca de Noé que também segundo relatos bíblicos dá conta de que ela teria vagado pela terra pelo período de mais de um ano e agora nós na nova arca, embora no espaço, também já havíamos viajando quinquilhões de quilômetros, uma coisa inconcebível até então para a simples e vã sabedoria humana.
Novamente a comida começou a escassear, os animais, de repente, não deram mais leite e nenhuma fêmea pariu. As hortas que cultivamos, pareciam fracas e suas plantações não germinavam mais com a mesma força anterior. Começamos a nos preocupar profundamente e a população entrava em desespero com o racionamento da alimentação.
Com as situação se agravando, demasiadamente, passamos a controlar novamente a distribuição de comida. Agora, tocaria apenas uma refeição diária para cada pessoa.
Finalmente, chegamos bem próximo a barreira de fogo, já podíamos distinguí-la com enormes labaredas que formavam um vasto paredão, dando a idéia de que dali para frente nada mais existiria a não ser o fogo que há muito já havíamos vislumbrado.
O lugar demonstrava ser uma fronteira e tinha uma barreira de luz, ofuscante e ao mesmo tempo de uma luminosidade inacreditável. Apesar de transparecer ser fogo em sua mais vibrante temperatura, não sentíamos calor, ao contrário, o clima era ameno e até refrescante, mas víamos que lá fora a coisa parecia arder impiedosamente.
Ali estava eu a quinquilhões de quilômetros da minha velha e amada terra que nem sequer tinha certeza se existia ainda.
Tentaram de tudo para me convencer de que ela havia sido destruída, mas eu tinha uma esperança muito grande de que a velha terra estaria e ainda sobre seu mesmo plano e na mesma localização de sempre. Só que sabia que estava muito longe de mim, porque eu estava indo em direção oposta a seu centro.
De repente ouvi um barulho como se fosse um aparelho de telefone sendo colocado no gancho e dei-me conta de que meu celular parecia dar novamente linha e pus-me desesperadamente a discar todos o números que me viessem a cabeça. Liguei para todos o números que pudesse lembrar, mas do mesmo jeito nenhum deles respondia, só então, ouvi-o tocar.
Nitidamente, ouvi o celular tocar e corri para atender e quando peguei o aparelho ele parecia quente como um ferro elétrico ligado e pronto para passar roupa. Não consegui segurá-lo e joguei-o ao chão e deitei me próximo a ele gritando alo. Até que uma voz suave, calma e benevolente disse-me em tom quase inaudível. Arthuro, Arthuro, tua terra se foi, teus filhos e os meus filhos também se foram.
- Que, quem é? Alo, pus me a gritar em desespero, mas não havia mais ninguém
do outro lado da linha.
Saí correndo pela praça a procura do major Ribamar e de Got Rem, mas nenhum deles estava a vista. Agora mesmo que fiquei encucado, como poderia o celular ter chamado naquela distância inconcebível no espaço. Era uma coisa um pouco tétrica e macabra.
Pela posição indicada no painel, dava a entender que já tínhamos passado por inúmeras constelações e eu quase desmaiava quando olhava o indicador de distância que mostrava estamos a 25 bilhões de anos luz do sistema solar.
Tínhamos passado por lugares esplendidos, constelações grandiosas e estrelas superbrilhantes como Siriús, Achemar e Altair.
O determinador de velocidade dava conta de que nas últimas horas viajamos a uma velocidade de 3 parsec por hora.
Incrível, pensei comigo, um persec, eqüivale a 3, 26 anos luz, ou seja, mais de trinta trilhões de quilômetros por hora. Não aquilo não poderia ser verdade. Não há possibilidade de locomoção acima da velocidade da luz, a não ser a do próprio pensamento. Mas era impossível, Resignava-me a aceitar aquela lógica.
Lembrei de H.G.Wells, quando disse, “Dia Virá um dia, na sucessão sem fim dos dias, quando seres agora latentes em nossos pensamentos, ocultos em nós, se levantarão...e rirão e colocarão suas mãos em meios as estrelas”.
Parecia assustador, mas então comecei a entender sua colocação e o contexto em que se inseriam os seres citados. Seriam seres gigantesco, descomunais para os parâmetros de tamanho que tínhamos na terra. Poderia ser, já que quando se pensa no tamanho do universo toda lógica terráquea se dissipa.
Para onde iríamos, quem estava nos levando e porque a cidade de Alto Paraíso inteira viajava também ao encontro de um destino desconhecido.
Lembrei, nossa passagem por Júpiter e por Europa, o satélite jupiteriano para o qual tinha uma viagem marcada em dezembro.
Ficava observando o infinito e via milhões de pontos cintilantes a nossa volta e arrepiava-me lembrando do monólito de “2001, uma Odisséia no Espaço”. Parecia que eu estava vivendo a realidade do filme que mais apreciara em toda minha vida.
Fitei o vazio melancólico do espaço aberto a nossa frente e notei alguns pontos luminosos que convergiam todos para uma só região, onde, como se num balé compassado e regido por uma orquestra espacial, formavam círculos com a intensidade de brilho de um sol em pleno meio dia. Eram cores diferentes e confundíveis, as vezes parecia amarelo, mas de repente tomava um tom azulado, transparecendo serem cores que ainda não tínhamos visto na terra.
Nossa viagem parecia ser totalmente controlada, sabíamos disso porque nossa rota sempre se mostrou fixa e em sentido vertical.
Passamos ainda por galáxias inteiras mergulhadas ainda em fogo e terríveis descargas elétricas, pareciam que estavam nascendo ou então morrendo.
Certa vez, olhei-me num espelho e vi que havia envelhecido rapidamente, meus
cabelos embranqueceram e minha pele se tornara flácida e eu aparentava, então, ter cerca de sessenta anos de idade e alguns de meus companheiros pareciam já estar chegando ao fim, andando alquebrados e uns com uma estranha formação amarelada em seus corpos.
Quando passamos por uma estranha nuvem multicolorida e densa como a neve, dentro da qual ficamos por cerca de 1 hora, notamos que ao dela sair recuperamos nossa vitalidade e a nossa aparência normal.
Parecia que estávamos chegando perto de alguma coisa especial, porque de repente,
um azul incomum tomou conta do espaço a nossa frente e inúmeros planetas começaram a surgir rapidamente como se tivessem sendo criados naquele instante.
Não sei porque, mas tinha a impressão de que estávamos indo de encontro a um poder muito grande, porque ele nos manipulava desde nossa arrancada da terra. Saída forçada, pensei ironicamente, porque fomos tudo o que havia sobrado do planeta terra.
Corri ao visor e percebi que agora estávamos ilhados e parados no meio da enorme
barreira de fogo que parecia nos circundar propositadamente até percebemos que estávamos presos no meio de uma imensa muralha de fogo.
Pus me a mexer descontroladamente no gigantesco painel, até que uma luz roxa se acendeu e uma imagem distorcida de uma espiral em foram de galáxia apareceu, cercada por gigantescas nuvens brancas como se fosse algodão e um céu indescritível e de um azul celeste jamais visto.
Então, como que magicamente, uma figura apareceu e pude ver um semblante humano se refazendo na tela. Era um homem com estatura de cerca de 1,90 metros, barbas longas e brancas e cabelos também brancos e longos, vestindo uma túnica branca e cercada por uma auréola amarelada da cor do ouro. Apontou o dedo em minha direção e falou-me com voz suave e bem inteligível novamente, Arthuro, Arthuro, benditos foram os teus dias terrestres e agora estas a caminho de um destino pior do que aqueles que ceifou teus semelhantes.
Não entendi, mas fiquei pasmo e arrepiado com as colocações do ser e perguntei-lhe quem era.
Ele não me respondeu apenas continuou fazendo-me recomendações e ameaças sobre minha vida terrestre, dizendo-me também que os humanos haviam recebido o castigo que mereciam.
Subitamente o ser, falou-me sobre estarmos em Alganor, a fronteira dos domínios infernais e eu corri para segurar sua imagem apertando ainda mais o botão, mas ele misteriosamente, como surgira, sumiu e apenas um negrume e um cheiro forte de enxofre começou a sair do visor.
Então, no dia seguinte, pela manhã, ainda não tinha noção das horas já que todos os relógios também haviam parado, apenas me orientava por meu organismo que indicava-me a hora conforme sentia fome, ou sono, fui novamente para a frente do painel a espera de um novo contato com a criatura que me aparecera no dia anterior.
Disse dia anterior, não sei porque, mas ali não tínhamos dia nem noite, era sempre o mesmo espaço e tempo. Nada mudava e as coisas pareciam como que paralisadas ou inertes. Era com se tivesse acabado a corda de um relógio que orientava o tempo das pessoas.
Agora, estávamos parados no meio da barreira de fogo. O painel não dava mais nenhuma indicação, tudo nele ficara nebuloso e incolor.
De repente, sem qualquer barulho ou movimentação, eu, o major, Sergei, Goti Rem e Ra-Muhá fomos transportados para um planeta estranho onde os habitantes eram seres gigantescos, duas ou duas vez e meia a altura de um humano.
Sentimo-nos perdido e não sabíamos como voltar a Alto Paraíso, já que o painel que nos transportou havia sumido do lugar onde estava.
Ficamos desorientados até que um desses seres nos encontrou e levou-nos para sua casa, uma enorme fortaleza cercada por grossas barreiras de vidro. Não entendia a formação familiar daqueles seres, mas sei que haviam três pessoas em comum. Só que não era pai, mãe e filho, tinham uma outra designação para a relação familiar deles.
Quando chegou a noite no planeta, na casa do ser, percebemos que na hora de
deitar eles se uniam, ou melhor, se mesclavam e transformavam-se em um só, que então deitava sobre uma enorme cama com uma espécie de colchão gelatinoso e durante o sono recebia estranho líquidos que pareciam causar lhes um prazer incomum e muito profundo.
Durante algum tempo, mais ou menos 24 horas, não dava para calcular exatamente, porque não havia mais referencial de tempo ou espaço no lugar em que estávamos, acompanhamos aquele estranho ritual até que depois desse período, quando o ser solitário desmanchou-se novamente apareceram, então quatro seres, dois com aparência que lembrava a mulher humana e dois que lembravam o homem.
Pelo que consegui entender parece que durante este período houve uma nova gestação e nascera mais um filho. Só não entendi porque teve no ato sexual de ter a participação dos três. Começamos a entender levemente a comunicação deles e vimos que falavam através de ondas sonoras expelidas por uma estranha cavidade acima do nariz, perto da fonte central entre os dois olhos.
Passamos algum tempo no planeta tentando aprender os hábitos daqueles estranhas criaturas, mas cada vez mais nos convencíamos de que eles eram uma espécie de raça hermafrodita, mas que não tinha sexos distintos, mas uma espécie de prazer cerebral, alimentando por esquisitas ondas eletromagnéticas e de conjunção extra corporal. Eram um pouco etéreos, mas nada angelicais, porque sempre que as criaturas completava um determinado circulo de vida viravam alimentos para os demais. Eram decompostos em um estranho caldeirão que transformava os corpos em uma estranha massa que depois era embalada num recipiente que lembrava um frasco de perfume. Então os demais seres carregavam aquele recipiente e de vez em quando exalavam em si uma parte do conteúdo que nada mais era que essência dos corpos de seus próprio semelhantes.
Ficava cada vez mais complicado entender a lógica da existência e da vida daquelas criaturas.
Vi que também havia uma espécie de câmara mortuária para onde eram levados os frascos depois de vazios e pude entender que o que sobrava nos frascos era uma espécie de alma da criatura sacrificada para a alimentação dos demais.
Não haviam arvores, ou qualquer vegetação no planeta, apenas grandes elevações fortificadas com um estranho material que lembrava um pouco o vidro terrestre, mas era formado por uma estranha substancia gelatinosa, retirada de profundas escavações numa determinada região.
Ficamos cerca de dois dias terrestres no lugar e depois então fomos enviados de volta a Alto Paraíso, nossa nave suspensa no espaço. Parece que quem tinha nos mandado para aquele lugar queria ensinar-nos ou mostrar-nos algumas coisa que nos servisse de exemplo.
Sei que nada de novo peguei ali apenas senti que não haviam ligações familiares, amorosas e nenhum conceito de afeição. Eram seres desprovidos de qualquer emoção e pareciam ter sido criados para uma determinada missão naquele ponto do universo.
Algum tempo depois fomos transportados a um lugar com uma estranha formação de planetas que começavam por gigantescos astros, e depois, numa sucessão sem fim, acabava num pequenino e arredondado planetinha.
Paramos no primeiro e fomos transportados para o seu interior,. O planeta não sustentava nada em seu exterior, parecia oco e sem vida, e então, depois de cairmos vertiginosamente algumas dezenas de quilômetros , adentramos sua superfície.
Era um lugar etéreo e extasiante, no qual uma névoa perfumada compunha a atmosfera do lugar, transparecendo um gostoso e lúdico prazer aos seus moradores. Ali vimos, alguns seres de compleição carinhosa e infantil, diria até angelical que seguiam um estranha rotina de diariamente escavar um buraco e nele depositar alguns pedaços de uma estranha matéria parecida com chumbo derretido.
Ficamos apenas o passar de uma lua no planeta e voltamos a nave. Desta vez havíamos sido informados pelo estranho visor de que aquele era um lugar etéreo onde as criaturas boas completavam o circulo final de sua existência, a morte eterna.
Estranhamente renasciam para uma outra vida que desta vez era em forma de
árvores e arbustos que de repente encheu o lugar retornando o a condição de uma impenetrável floresta, coberta por estranhas nuvens cinzentas e que derramava uma espécie de liquido parecido com álcool.
Diziam que era para continuar purificando as almas para que as arvores desses frutos bons como novas criaturas que iriam então ocupar as vidas, ali, transformadas em vegetação.
Estranhamente, minha ansiedade diminuíra e eu parecia estar consciente do que iria encontrar.
Sentia, agora, uma outra espécie de ansiedade, como se fosse uma esperança de encontrar alguma coisa nova que lembrasse a terra no vazio do infinito.
Sentia uma saudade imensa da minha velha e boa terra. Sonhava sempre em poder rever uma praia, uma gota de orvalho e uma chuva de verão. Arrepiava-me quando pensava no mar, no céu estrelado, nas noites vazias e longas do Planalto Central. Sentia prazer quando prostrava-me a pensar sobre isso.
Quando iniciamos a viagem pelo espaço, procurei ver se encontrava alguns resíduos do planeta terra mas não conseguia encontrar nada que desse qualquer indicação de haver um pedaço sequer da terra vagando pelo espaço.
Estava agora convicto de que a poderosa Estrela de Barnard, simplesmente havia evaporado toda a terra e a vida nela contida.
Imaginei que teria sido uma cremação instantânea e que o forte calor da estrela simplesmente havia diluído toda espécie de vida ou qualquer indicio de existência num grande perímetro do espaço sideral. Mas agora ali, a bilhões de anos luz de distancia, a terra já era apenas um pequena e vaga lembrança em minha mente. Muito pouco me lembrava das coisas terrestres. Sentia apenas, de vez em quando, uma estranha saudade de Angela, como se ainda tivesse esperança de um dia voltar a reencontrá-la, só não imaginava como, onde, quando e também porque.
No meio da interminável muralha de fogo, pus-me a meditar profundamente e lembrei alguns trechos bíblicos que até então para mim pareciam pura bobagens, os quais havia lido na bíblia que o Major Ribamar trazia consigo.
Comecei a fazer um seqüência por livros das escrituras sagradas e parecia que me faziam entender coisas novas naquele imensidão do espaço.
Recordei o livro de Gênesis e sua pregação sobre a criação da vida na terra e do universo em si, seguindo passos conforme relatava a bíblia. Pus, então a meditar sobre o livro de gênesis e recordar toda a história da criação do mundo: No princípio criou Deus os céus e a terra.
A terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo, mas o Espírito de Deus pairava sobre a face das águas.
Disse Deus: haja luz. E houve luz.
Viu Deus que a luz era boa; e fez separação entre a luz e as trevas.
E Deus chamou à luz dia, e às trevas noite. E foi a tarde e a manhã, o dia primeiro.
E disse Deus: haja um firmamento no meio das águas, e haja separação entre águas e águas.
Fez, pois, Deus o firmamento, e separou as águas que estavam debaixo do firmamento das que estavam por cima do firmamento. E assim foi.
Chamou Deus ao firmamento céu. E foi a tarde e a manhã, o dia segundo.
E disse Deus: Ajuntem-se num só lugar as águas que estão debaixo do céu, e apareça o elemento seco. E assim foi.
Chamou Deus ao elemento seco terra, e ao ajuntamento das águas mares. E viu Deus que isso era bom.
E disse Deus: Produza a terra relva, ervas que dêem semente, e árvores frutíferas que, segundo as suas espécies, dêem fruto que tenha em si a sua semente, sobre a terra. E assim foi.
A terra, pois, produziu relva, ervas que davam semente segundo as suas espécies, e árvores que davam fruto que tinha em si a sua semente, segundo as suas espécies. E viu Deus que isso era bom.
E foi a tarde e a manhã, o dia terceiro.
E disse Deus: haja luminares no firmamento do céu, para fazerem separação entre o dia e a noite; sejam eles para sinais e para estações, e para dias e anos; e sirvam de luminares no firmamento do céu, para alumiar a terra. E assim foi.
Deus, pois, fez os dois grandes luminares: o luminar maior para governar o dia, e o luminar menor para governar a noite; fez também as estrelas.
E Deus os pôs no firmamento do céu para alumiar a terra,
para governar o dia e a noite, e para fazer separação entre a luz e as trevas. E viu Deus que isso era bom.
E foi a tarde e a manhã, o dia quarto.
E disse Deus: Produzam as águas cardumes de seres viventes; e voem as aves acima da terra no firmamento do céu.
Criou, pois, Deus os monstros marinhos, e todos os seres viventes que se arrastavam, os quais as águas produziram abundantemente segundo as suas espécies; e toda ave que voa, segundo a sua espécie. E viu Deus que isso era bom.
Então Deus os abençoou, dizendo: Frutificai e multiplicai-vos, e enchei as águas dos mares; e multipliquem-se as aves sobre a terra.
E foi a tarde e a manhã, o dia quinto.
E disse Deus: Produza a terra seres viventes segundo as suas espécies: animais domésticos, répteis, e animais selvagens segundo as suas espécies. E assim foi.
Deus, pois, fez os animais selvagens segundo as suas espécies, e os animais domésticos segundo as suas espécies, e todos os répteis da terra segundo as suas espécies. E viu Deus que isso era bom.
E disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; domine ele sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre os animais domésticos, e sobre toda a terra, e sobre todo réptil que se arrasta sobre a terra.
Criou, pois, Deus o homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou.
Então Deus os abençoou e lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos; enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os animais que se arrastam sobre a terra.
Disse-lhes mais: Eis que vos tenho dado todas as ervas que produzem semente, as quais se acham sobre a face de toda a terra, bem como todas as árvores em que há fruto que dê semente; ser-vos-ão para mantimento.
E a todos os animais da terra, a todas as aves do céu e a todo ser vivente que se arrasta sobre a terra, tenho dado todas as ervas verdes como mantimento. E assim foi.
E viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom. E foi a tarde e a manhã, o dia sexto”.
Quando lia o Gênesis, sentia-me aliviado e ao mesmo tempo traindo meu ateísmo e minha condição de cientista.
Pensava agora se Deus realmente criara a terra porque não havia dado conhecimentos aos humanos do resto da grandiosidade que era o universo e porque tinha então destruído o seu planeta preferido.
Quanto mais tempo estávamos na longa barreira de fogo, uma estranha sensação
tomava conta de todos em Alto Paraíso.
Parecia algo incomum, uma sensação de bem estar indescritível. Uma paz e uma harmonia sem precedentes se apoderava de todos e eu particularmente sentia-me com se estivesse renascendo.
Num rápido piscar de olhos vi toda minha vida repassando. Desde o nascimento ate o momento atual. Fora como se uma fita de vídeo cassete tivesse sido passada em alta rotação e assim mesmo eu podia captar nitidamente todas as imagens.
Deitei-me no chão e me sentia tão leve que parecia flutuar. Nunca, em toda minha vida, havia sentido um sensação tão gostosa, tão aprazível. Parecia-me que estava envolto numa nuvem branca cheia de tons musicais suaves e uma canção adormecedora que infestava o ambiente.






15
OH, MY GOD!

Então, de repente, a nossa frente surgiu, em carne e osso, a figura do homem de barba branca, túnicas azuis e um olhar sublime, tão sublime quanto as milhões de estrelas que nos circundavam.

Em tom paternal dirigiu-se a nós e disse carinhosamente.
- Meus filhos, por quanto tempo vos esperei. Penso também que estais ansiosos
para comigo falarem. Eu sou God, o seu criador, o pai de todas as criaturas e de todos os universos. Sou o ser supremo por quem sempre procurastes. Eu vos trouxe até aqui e vos poupei a vida, porque precisava dar um conserto na minha criação preferida que se corrompeu pelo prazer da carne , do ócio e da pecúnia.
God Olhava-nos com profunda admiração e aquiescência como se chorasse nossa presença. Parecia triste e melancólico diante de nós, mas com uma estranho comportamento paternal. Afagava-nos com uma mãe afaga seus filhos. Não ouvíamos nenhum som, nenhum ruído, apenas uma espécie de respiração ofegante que vinha da criatura, até que ela movimentou os lábios grossos e abanando sua longa cabeleireira branca, em tom triste e melancólico desabafou: “Meus filhos, quanto tempo vos esperei”. Sua voz de trovão retumbou pelo espaço, ecoando em vários pontos, fazendo romper a barreira luminosa a nossa frente e deixar aparecer novamente um cortejo de anjos celestiais conduzindo um reluzente carro de fogo, onde sentava-se um outro ser, com tamanho aparentemente menor que o que nos afagava e estendendo sua mão para o espaço, fazendo aparecer a nossa frente um visão do paraíso terrestre, com Adão, Eva, e seres serpentuosos, além de um vasto pomar de maçãs.
E God repetiu novamente: eu sou o senhor, vosso Deus e vos trouxe até mim para que conhecessem a verdade sobre o fim de minha criação preferida, sou o senhor supremo dos Domínios angelicais.
Numa reação de espanto, esbocei uma resposta ao ser, mas ele nos imobilizou e continuou a falar desenfreadamente, sem nos dar qualquer chance de revidar.
- Desde o primórdios de vossa existência, sempre achei que tinha conseguido a
perfeição nas criaturas que escolhi como divinas, mas fui tremendamente decepcionado com os humanos que tanto pecaram e tantas depravações fizeram na terra indo sempre contra a minha vontade.
- Por milênios tentei aperfeiçôa-los, dá lhes cada vez mais inteligência e capacidade, mas vi que meu erro foi muito grande. Toda a sabedoria que vos dei utilizaram para fins ilícitos e contra a minha vontade. Por isso resolvi destruí-los apesar da dor profunda que me acometeu.
Sempre foram minhas criaturas preferidas. Serviram de modelo para todo o resto de meus domínios. Mas muitos de vocês resolveram engrossar as fileiras de Alganor, onde agora estais, e se debandaram para o lado do mal, viraram mensageiros de Lúcifer.
Tentei evitar vossa destruição, mas não encontrei razão maior que me convencesse a dar uma nova chance aos seres humanos. Se eu tivesse a metade e mais um de vocês seguindo a minha vontade eu teria poupado a terra e seus filhos. Mas a iniquidade, a depravação, a dor, e a cobiça foi tudo o que restou em meus filhos angelicais.
- Passei séculos após séculos, milênios por milênios tentando consertá-los, mas não
consegui. Saíram de meu controle e, por isso as forças de Alganor foram mais producentes que a minha e mais da metade de vocês se aliou aos exércitos da trevas. O mundo virou uma só iniquidade. Tristeza e dor foi o consolo dos puros e apenas os ímpios se impuseram e com as forças de Lúcifer conseguiram transformar o meu mundo perfeito num lugar de barbaridades e vilipendias.
Nenhum dos mandamentos que vos dei estava sendo cumprido. Filhos se revoltaram contra país, irmãos contra irmãos e povos contra povos, gritando por uma falsa libertação em nome de uma falsa prosperidade. Invadiram meus domínios, vasculharam segredos do infinito e alcançaram lugares que lhes eram proibidos. Até a luz da noite que vos dei foi vilipendiada com o pés daqueles que jamais poderiam pisá-lo. Macularam minha fé e rasgaram meus testamentos de verdade. Minha aliança com os homens feitas com profetas e sábios antigos que vos enviei foi simplesmente arrebatada para a mais complexa escuridão. A ignorância tomou o lugar da virtude. Transformaram pérolas em combustíveis malignos e destruidores. Usaram o conhecimento para construir barbáries e exterminar irmãos.
- Ouvia tudo com estupefação, medo e pavor. Tremia como vara verde. Sentia fisgadas na carne e minhas voz parecia engasgada.
Sempre que tentava falar ou retrucar as palavras de God, minha voz sumia, minha garganta tornava-se seca e fechada a ponto de me faltar o ar.
Eu estava falando com um ser que se dizia Deus, o criador, aquele que mais da metade dos humanos reverenciava e seguia em centenas de seitas e religiões espalhadas pela terra.
E God continuou:
- Queria tanto que isto não tivesse acontecido. Se vocês não tivessem desafiado meus princípios.
Santa Madalena, eu sou um cientista. Não posso aceitar impassível estas acusações. Não são verdadeiras as iniquidades que God nos imputou. Sou um ser humano esclarecido, preciso contestar isso em nome da evolução da humanidade. Pensei comigo, tentando erguer a mão para God e pedir sua licença para falar, mas ele não nos concedia espaço, afirmando que não teríamos nenhum direito de discordar de suas acusações.
Disse que primeiro iríamos ouvir tudo atentamente e que então chegaria nossa vez. Disse-nos também que fomos os juizes do apocalipse terrestre e que de nós
dependeria o ressurgimento da vida e do planeta terra.
Falou–nos, ininterruptamente, durante cerca de meia hora e depois simplesmente sumiu, tão misteriosamente, como aparecera.
A população toda se prostrou diante do ser, que afirmava ser God, e muitos agora rezavam em voz alta, entonando cânticos de louvor, enquanto eu ficava cada vez mais desconfiado da entrada triunfal da criatura, imaginando ser ela um ET qualquer querendo nos assustar.
Mais adiante God apareceu-nos novamente e pediu para sentarmos e ouvir atentamente o que tinha a dizer.
Estava tão nervoso e ansioso com toda aquela história de só God poder falar que me antepus aos meus companheiros e fiquei de frente com ele, como se fosse desáfiá-lo, e ele, desta vez, pacientemente, falou-me.
- Senta-te meu filho e ouça a voz de teu pai. Não desafie o teu criador, ou conhecerás a minha ira e terás então te arrependido pelos restos de teus dias, na vida terráquea e na vida que haverás de levar após a tua eterização.
- Eterização? Nunca ouvi essa palavra. O que ele quis dizer com isso. Retruquei, chamando-o de Senhor, mas ele num simples movimento com a mão pôs-me de joelhos diante dele e continuou a falar.
- Vi barbáries inumanas por parte de meus filhos humanos.
Sempre me intrigava quando falava de seus filhos humanos. Será que haveriam outros filhos que não fossem humanos?.
- Estou cada vez mais triste com as iniquidades que vossos semelhantes
cometeram contra si próprios e assustei-me com a barbaridade que eu mesmo criei.
Nunca pensei que a mente do homem fosse capaz de atrocidades tão deléveis e típicas dos animais mais selvagens que lhes dei como companhia.
- A vergonha, a infâmia e o sadismo imperam entre os homens. Especialmente entre aqueles mais sádicos de todos os que pregam defendem e aplicam penas de morte contra seu semelhantes.
Aterrorizei-me com aqueles que em meu nome imolaram seres humanos, queimando-os em fogueiras. Estes são agora súditos de Alganor.
Só eu tenho a primazia de castigar meus filhos e nunca, em momento, algum tirei a vida de qualquer um deles por agirem contra minha vontade.
Como não tirou a vida de ninguém. E toda a raça humana que foi dizimada por
ele? Questionei, rindo, maldosamente comigo mesmo.
É animalesca e petrupefata a sanha assassina de alguns homens que fizeram da justiça, objeto de vingança contra seus próprios semelhantes.
- Todo aquele que condenou e aquele que matou um semelhante como castigo
para qualquer crime cometeu um crime maior que ele. E este está agora a penar pela eternidade nas fornalhas de Alganor.. Não dei a nenhum homem humano, a nenhuma criatura que fosse pensante o direito de julgar seu outro e castigá-lo com crueldade como fazem e fizeram durante centenas e milhares de anos, uns matando outros para castigar seus erros. Este é o maior pecado que contra mim cometem teus irmãos. Mas a estes lhes está reservado o destino dos ímpios, dos cruéis e dos inumanos. Padecerão para sempre e viverão somente para o arrependimento da cruel pena que impuseram aos seus irmãos.
Assim será para aqueles que fizeram a cruel lei, para os juizes, os promotores, os advogados e os carrascos. Também aqueles que assistiram impavidamente estas barbáries e nada fizeram para evitá-la estarão bem próximos a Alganor. Ficarão num primeiro momento em Alsenar, lugar que na terra lhes foi ensinado como purgatório e se conseguirem redimir sua impassividade poderão um dia adentrar aos reinos celestiais. Estes são aqueles que poderiam ter evitado a cruel pena. Aqueles que detinham o poder do perdão e se negaram a fazê-lo em defesa de uma justiça que não foi a que eu vos deixei. Também aqueles que defenderam tal instituto ou que pregaram sua eficácia foram ou serão castigados, embora com um castigo mais leve que os acusadores, os julgadores e os executores.
God também condenou severamente a inquisição, afirmando que a Igreja
Católica cometeu atrocidades maiores que qualquer dos piores criminosos da humanidade.
Lembrei então de Giordano Bruno, queimado impiedosamente por uma
cambada de sádicos e em nome de Deus, por expressar suas idéias avançadas sobre o universo. Também pensei em Kepller que teve sua mãe também condenada a morrer na fogueira, mas que foi salva por intervenção sua. Galileu Galilei, condenado a prisão domiciliar e tantos outros que tornaram possível a desmitificação do cosmo.
Arrepiei-me ao ouvir God falar aquilo, principalmente para mim que sempre fui um dos maiores críticos da pena capital, pois também considerava coisa de bárbaro tirar a vida de uma pessoa para compensar um crime que muitas vezes era cometido nas circunstâncias mais adversas.
Eu também, sempre considerei assassinos de sangue frio aqueles que condenavam pessoas a morte e agora o poder supremo estava ali me revelando que também condenava esta atitude.
Também lembrei nitidamente de quando God se referiu a escravidão e a condenou
como uma aberração da humanidade, mas nunca havia pensado que ele reprimia a pena de morte.
Entendi agora mais claramente a colocação das escrituras sagradas quando se referia as leis e aos mandamentos de Deus.
Realmente, percebi que em momento algum nenhum deles fez qualquer referência ao direito de o homem julgar e matar seu semelhante ou ainda tomá-lo para serviços escravos como se fez durante o maior tempo dos tempos.
Para mim estava ficando cada vez mais interessante ouvir God, apesar de ainda não acreditar definitivamente que ele era verdadeiramente Deus, o Senhor de Abraão, de Moisés, o Deus que sempre ignorei e contra o qual muitas vezes blasfemei e até praguejei.
Pensei, agora comigo se teria sua misericórdia. Esperava ter pois afinal sempre soube que God seria incapaz de maltratar seus filhos, só que eu não entendia então porque havia destruído a terra. Porque não desviou ele a rota de Barnard e poupou seus filhos da destruição total. Ainda quis questioná-lo sobre os horrores que teria sido as destruição da terra e God, então, lançou-nos um desafio: Se nós lhe provasse 51% de bondade mais que a maldade humana, ele voltaria a perdoar os humanos. Mas como poderia perdoá-los se já tinha matado a todos. Até cheguei a inquiri-los se não teria ele próprio cometido uma chacina ao destruir a terra. Se aquilo não era contra seus princípios, suas leis e sua arrogante pregação de bondade. Por mais que me esforçasse para tentar perguntar lhe qualquer coisa, ele não me permitira falar a não ser na hora em que fazia o sinal com o mão, ai parecia que minha boca destrava e minhas cordas vocais voltavam a funcionar.
Numa das oportunidades que tinha para falar perguntei a God sobre Jesus Cristo e ele me disse que aquele também fora um de seus enviados para convencer os homens de que não eram donos de sua existência. Disse-me God que nunca havia mandado qualquer emissário a terra, a não ser Jesus Cristo, o qual chamou de Javeh Son e os próprios filhos que nela já viviam como Elias, Moisés, Abraão, Jacó , Esaú e todos os profetas citados na bíblia.
Durante aquela noite em que God mandou-nos sentar para ouvi-lo notamos que o céu sobre nós tinha um cor azulada e refletia como ouro e que também haviam centenas de anjos sobrevoando o lugar, com longas asas douradas e olhares ternos de bondade e compreensão. Eram criaturas realmente divinas porque God disse–nos que aquelas criaturas não tinha sido humanas, foram por ele forjadas para servi-lo e guardarem todas as terras que God povoara. Ainda estava muito curioso para saber sobre as demais formas de vida que existiriam no universo, já que God nos tratava claramente como únicos filhos.
Então, realmente, estávamos sozinhos em todo o cosmo. Não podia conceber aquilo. Não acreditava de forma algumas que ele tivesse criado a imensidão, que tivemos a oportunidade de ver uma pequena parte para dar apenas aos humanos o sopro da vida. Queira saber o que acontecia nos bilhões de outros planetas que ainda não tinham sido tomados pelas almas humanas, conforme ele próprio relatara e ele ficou calado, sem esboçar qualquer reação a minha pergunta. Mas senti que o toquei um pouco e o deixei em reflexão.
Insisti novamente com God se homem algum na terra tinha alguma informação sobre a destruição da terra e o fim da vida no planeta e ele simplesmente deu-me a entender que havia mandado uma mensagem a todos os humanos através da aparição de sua imagem a alguns humanos privilegiados por ele.
Vi então que tinha alguma coisa a ver com o terceiro segredo de Fátima, apesar do Papa ter desmentido publicamente e diante de milhares de câmaras de televisão que o terceiro segredo não seria a destruição cósmica do universo ou o fim da vida na terra. Seria sim a revelação para a humanidade da existência de outras formas de vida fora do nosso Planeta e a desvendação de que Deus não teria tornado os humanos senhores absolutos do cosmos.
Ainda não conseguia compreender se éramos os únicos habitantes do cosmo conforme declarara God, porque tantas aparições e tanta elucubrações sobre vida em outros planetas que nos visitava então em opulentas naves espaciais e bolas de fogos flamejantes nas noites inesquecíveis do planeta terra.
Foi então que God, pela primeira, vez, concordou em falar sobre o assunto e disse que todas as aparições que víamos na terra eram anjos celestiais patrulhando e protegendo-nos de corpos celestes sem rotas e sobre os quais somente Lúcifer tinha controle, já que eram coisas de sua criação.
Naquele momento lembrei então que a viagem que faria a Europa, estava começando a ficar sem sentido. Porque se God nos garantiu que não haveriam outras formas de vida no universo, naturalmente que em Europa não haveria qualquer tipo de vida. Ou teria, refleti depois, lembrando que God dissera também que muitos planetas eram habitados por criaturas geradas a partir da alma de cada humano que morria e que tivesse sido bom na terra. Apesar de ele mesmo reconhecer que estes seres não teriam a nossa forma e nem a nossa inteligência ou capacidade. Seriam totalmente diferentes e seriam parecidos com a almas de cada um dos geradores. Poderiam ser bons, inteligentes, pacatos ou guerreiros e até cruéis , conforme teria sido seu gerador no planeta terra.
God ficou durante horas falando-nos e enumerando todos os vandalismo que havíamos cometido contra seu mandamentos. Disse-nos que se sentia triste e magoado com os seres humanos e que ao mesmo tempo tinha um paixão muito grande e muito profunda por tido que fazer o que fez.
Tudo ouvíamos no mais profundo silêncio e sem qualquer contestação. Até que em determinado momento God fez surgir a nossa frente um imagem nítida do planeta terra com seu povo, suas várias línguas, suas nações e suas raças e repetiu várias vezes que o crime mais nojento do ser humano era o racismo, o julgamento do homem pelo homem, a pena de morte sentenciada por um só homem e a mais imunda de todas, a escravidão. Falou-nos dos Faraós como criaturas malévolas e guiadas por Lúcifer. Também apontou telas que mostravam os piores inimigos da humanidade e da sabedoria, também todos a serviço de Alganor. Lembrou nos o esquecimento de seu livro sagrado que chamávamos bíblia e que ele havia revelado a alguns humanos que então o escreveram como guia mestre de nossa existência e líder espiritual para a nossa sabedoria e nós o havíamos colocado na vala comum da literatura terráquea. Fez também menção as barbáries e as atrocidades que alguns fizeram em seu nome, citando a Igreja católica como o maior desvio de seus caminhos e de seus ensinamentos. Condenou a perseguição religiosa e disse que todos os homens eram livres para pensarem e seguirem suas consciências. Elogiou grande figuras humanas como Ghandi e excomungou figuras como Cleópatra, afirmando que eles, os egípcios tinham maculado o que de mais puro havia dado ao planeta terra, todo o seu povo e toda a sua gente, mas alguns povos se interporam a ele e enveredaram pelo caminho da dominação de seus semelhantes. Disse-nos também que os povos opressores estavam agora a engrossar as fileiras dos súditos de Alganor.
Ouvia falar tanto em Alganor e comecei a imaginar que tal nome seria uma referencia ao inferno e as forças do mal, em nossa consciência comandadas por satanás.
Novamente pensei que eu, um cientista, não poderia dar crédito aquilo tudo, porque já tinha comigo uma lógica estabelecida para a existência humana, sua criação , seus desígnios e seu destino. Mas agora estava ali, com mais de uma centena de outras pessoas em frente a um ser que dizia ser nosso Deus, o criador, o pai eterno e acima de tudo senhor de todas as criaturas. Ficava com medo de pensar e temer que God lesse meus pensamentos e ele realmente o leu e falou-me com ar caridoso.
- Meu filho, eu não poderia acompanhar o pensamento de cada uma das minhas criaturas, mas fui eu quem vos dei a capacidade de pensar, de raciocinar e também para se distinguir das minhas outras criaturas.
E God continuou: Dei vos todos os elementos químicos que puros significavam paz e evolução e vos em sua bestial revolta contra meu domínio, misturaram-nos transformando-os em armas letais e corrosivas contra vossa própria espécie. Dei vos a terra límpida e adubada e vos as transformaram em longos campos de escravidão, tornando criaturas de minha criação, cordeiros de uma mantilha de lobos famintos e ensandecidos.
Dei vos as estrelas para ilustrarem a noite de vossa existência e vós lançastes objetos feitos com a deterioração dos metais que também vos deis para alcançá-las e também corrompê-las com vossa ganância e violência. Macularam criaturas perfeitas dos cosmos, com o argumento fútil e pecaminoso de buscar a evolução que com o tempo eu mesmo vos daria.
Novamente quis retrucar, mas desta vez fui empurrado bruscamente por
uma estranha força que pôs me de joelhos diante dele. Ainda assim, prostrado, pensei. Não posso ouvir calado preciso falar, tenho que defender meus semelhantes, não acho que o ser humano tenha sido tão bárbaro com diz God. Tenho que contestar, mas como se ele não me deixa falar.
E, prosseguiu, tornando-se cada vez mais irritado e embravecido conosco. Parecia que queria descarregar toda sua ira e sua fúria com os homens em cima de nós. Não bastou a destruição de todos os nossos semelhantes. Porque God estava tão desgostoso com seus filhos terráqueos. Porque não nos falou de suas outras criaturas. Será que éramos realmente os únicos em todo o universos, mas e aquelas criaturas todas que vimos em nossa viagem com destino ao seu encontro. Porque tantas luzes nos guiaram e nos iluminaram o caminho. Porque viajamos tanto, se God simplesmente poderia ter vindo até onde quer que estivéssemos. Tudo parecia confuso demais, mas temia profundamente deixar ele cada vez mais irritado conosco.
De repente, God, fez nos uma revelação, tão estupenda, que nenhum ser humano, iria jamais imaginar. Disse que para cada um de nós, haveria no universo um planeta inteiro com nossas angustias, prazeres e satisfações e que ali vivem seres que são o reflexo do que fomos em nossa vida terráquea. Falou que cada um de nós ao morrer, tornava-se um novo planeta na imensidão do infinito e ali gerava novas vidas e um nova tribo de humanos que dependendo dos pensamentos que tivera na terra assim seriam conduzidos seus descendentes cósmicos.
Imaginei então que deveriam existir bilhões de planetas totalmente diferentes
porque nunca soube que seres humanos pudessem pensar igual. Sempre haveria divergências em seus pensamentos. Também disse God que cada animal que havia na terra era o habitante inteligente de cada um dos planetas que lhes deram origens. Disse ainda que em cada constelação do infinito haveriam sóis que seriam representação dos grandes defensores das palavras celestiais na terra. Os grandes homens da humanidade tornavam-se sóis brilhantes a iluminar milhões de outros corpos celestes com as mais variadas criaturas. Explicou-nos que não haveriam outras criaturas diferentes em todo o universo não fosse a imperfeição dos seres humanos que por sua rebeldia modelaram bilhões de outras raças em todos os cosmos.
Fiquei perplexo com o que ouvia e senti que toda a busca do homem por
vida extraterrestre tinha sido em vão. Estavam o tempo todo procurando no lugar errado. Porque tanta gente tinha aberto tantos caminhos para a grandiosidade que agora se deslumbrava a nossa frente e não tinha a oportunidade de poder ver de perto o que estava vendo naquele momento.
Passei a compreender e a respeitar profundamente os homens que haviam
construído este futuro. Aqueles que fizeram o passado da astronomia e que se dedicaram de corpo e alma ao estudo e a compreensão do universo.
Lembrava ainda de cor de alguns ilustres astrônomos, físicos, matemáticos e puramente cientistas que se enfurnaram daí e noite em observatórios e cálculos cansativos para poderem propiciar ao homem uma melhor compreensão do lugar onde estava em toda a vastidão do universo. Desde o matemático e astrônomo grego Hiparco no ano 120 antes de cristo, passando por Tales em 6 Ac. até Cláudio Ptolomeu no século 2 que já tivera a capacidade de elaborar um catálogo contendo metade das constelações até hoje conhecidas, apesar de quase todos eles acreditarem que a terra era o centro do universo, quando se sabe que ela esta a milhares de anos luz do centro de nossa pequena galáxia. Recordei os sumerianos, habitantes da região compreendida entre os rios Tigres e Eufrates, onde se situa o atual Iraque, que já faziam concepções sobre o espaço sideral e buscavam colocar a terra em seu lugar diante da grandiosidade do universo.
Aquilo tudo ainda não tinha me convencido de nada. Para mim estávamos vivendo um horrendo pesadelo apenas e que de repente iríamos acordar e ver que tudo não passou de um sonho causado pelo porre que havia tomado na noite anterior em Alto Paraíso.
Mas não era um sonho, parecia um terrível e horroroso pesadelo do qual queria a toda força acordar. Sentia-me tão deprimido que cheguei a pensar em morrer. Minha ansiedade havia aumentado por demais e meus pés estavam completamente gelados e minha cabeça pulsava com o bater forte de meu coração que desregulado pela alta ansiedade faziam mirabolantes evoluções em meu peito deixando-me cada vez mais desesperado. Não sabia como enfrentar aquela situação e tornava-me cada vez mais consciente de que não teria acesso ao remédio na condição e no lugar onde estávamos.
Enfim, chegou a vez que poderíamos falar e God escolheu-me para defender os seres humanos diante de si.
Primeiro, quis saber como a terra havia sido destruída e disse-me que a estrela de Barnard, aproximara-se a apenas 100 mil quilômetros do Planeta e havia incinerado a Terra, Marte, Vênus, mercúrio e uma parte do Planeta Júpiter.
Meus Deus, eu tinha razão. Nostradamus tinha razão, foi um grande Deus do Terror. Foi Hercolobus, o Planeta gigante do qual falavam seguidores da “Novo Mundo Cósmico”. Como astrônomo também já tinha ouvido falar muito dele e sabia que não era um planeta, mas sim, uma estrela de segunda grandeza e sabia também que ela era um vasto e incompreensível corpo celeste vagando pelos cosmos com um destino errante mas que apontava a direção do nosso sistema solar. Sabia que a estrela tinha um tamanho bem maior que o nosso sol, apesar de ser considerada uma anã branca e que viajava em direção ao nosso sistema solar a uma velocidade de 108 km por segundo. Sabia também, por cálculos aritméticos quase precisos que pela velocidade que desenvolvia e pela distância que a separava de nós levaria, no mínimo, mil anos para chegar ao nosso sistema solar, mas God acelerou sua velocidade.
God orientou-me a falar pausadamente e que eu não poderia frustrá-lo, porque senão sua ira também recairiam sobre nós, que éramos o ultimo resquício de sua criação. Pensei rapidamente que não poderíamos ser o resquício de sua criação se haviam almas que haviam originado outros planetas, conforme ele próprio nos dissera. Se o homem não tem nada a ver com a carne e se o que importa é apenas o espirito então God estava de contradizendo em algum ponto de sua ira. Parecia me estar viajando alucinadamente num universo inconcebível. Sentia com se estivesse profundamente drogado e entorpecido por éteres celestiais tanto que meu corpo enrijecia-se a ponto de estalar. Somente meu lábios podiam se mover naquele momento em que God estava me inquirindo. Não parecia mais o defensor, o advogado da raça humana mais uma testemunha sendo inquirida forçosamente por aquele ser que dizia ser o senhor supremo do universo o nosso deus, aquele que durante milênios tantos homens veneraram e para o qual sempre contestei a sua existência. Então não entendia porque eu um ateu confesso tinha sido um dos escolhidos para contemplar o semblante de Deus, se sempre soube, pela bíblia e pelas pregações religiosas que somente os puros veriam o semblante de Deus. Eu era e tinha certeza o mais justo dos ímpios. Mas era ímpio, porque nunca acreditara em Deus. Mesmo assim, estava eu ali agora, com o criador e pseudo salvador da humanidade. Queria perguntar a God sobre Jesus Cristo e ele não me permitia falar quando tinha esse pensamento. Parecia que queria estabelecer uma espécie de cronologia em minha inquisição. E para tanto começou mostrando-me novamente como fizera a criação da terra e porque escolhera um pontinho qualquer no centro de uma galaxiazinha qualquer para mostrar toda a força de sua criação. Os seus seres preferidos e iluminados.
Alguns dos homens que estavam conosco, estavam agora ajoelhados diante daquele ser e as mulheres tinha sido separadas de nós e conduzidas a um outro estágio da região e adentrado um lugar especial que lhes havia sido reservado.
God disse que nenhuma mulher era pecadora, estranhei e fiquei atônito, porque conforme sabia, pela bíblia, foi a mulher que conduziu o homem ao pecado, com a história da maça no jardim do éden.
Estava ficando cada vez mais confuso e não parecia entender mais nada naquela história. Até que God disse-nos que deveríamos esquecer todo e qualquer referencial que havíamos tido sobre ele e ouvir atentamente suas colocações. Disse também que de nossa serenidade e paciência dependeria a redenção dos seres humanos.





























16
ALGANOR, O INFERNO DE GOD

Foi então que fomos informados de que estávamos nas fronteiras de Alganor, o lado
ruim da criação e o exílio de Lúcifer: o anjo negro que Deus expulsou do domínios celestiais para a região tórrida e infernal chamada Alganor e que tinha virado então a morada dos anjos negros e seus fiéis. Era o império do mal. Ironicamente, ri, sobre aquilo, e pensei, descobri de onde vieram as trevas de Babylon 5. Ria muito comigo mesmo naquele momento, mas a coisa no fundo não parecia ter graça nenhuma, pois estava diante de uma força desconhecida e que acima de tudo se achava o senhor de todas as criaturas. Pensei, ironicamente, que estaria novamente blasfemando mesmo na presença do onipotente. Numa recaída de coragem, dirigi-me ao ser e pedi lhe uma prova de seu poder. Queria que me mostrasse que realmente era Deus, o Pai de todas as criaturas e ele, num piscar de olhos, conduziu-me a um lugar inóspito do Universo onde mostrou-me que de um monte de cinzas fumegantes nasceria o primeiro sinal de vida no universo, uma espécie de verme longo e afunilado na extremidade traseira e que movia-se com mais de uma centena de pernas. Dizia-me God que aquele era o primeiro ser vivente a surgir no universo. Mas que bobagem disse-lhe, porque não fez logo criaturas belas como os seres humanos porque teve que passar por tantos estágios até descobrir que os humanos eram as criaturas mais lindas dos cosmos.
God, pareceu rir, mas sempre tive a impressão que ele jamais riria, pois tinha um semblante sério demais para poder contrair qualquer músculo de sua face e sorrir, mas juro que me pareceu rir e disse-me com incontida fúria.
- Quanto vocês humanos são idiotas. Quem lhes disse que são os seres mais belos do universo. Podem ser belos para vossa vã e pobre visão de beleza. Irei mostrar-lhe verdadeiramente o que é uma beleza universal e levou-me dali para um outro canto ainda mais distante do universo, onde num pequeno e espremido planeta entre centenas de asteróides gigantescos, chamou por uma criatura chamada Eurária e de repente surge a nossa frente uma mulher esplendorosa, linda, que o simples olhar direto em seus olhos ofuscava qualquer ser humano. Seus cabelos eram radiantes e emitiam raios de sol e seus lábios carnudos e afinados traduziam um padrão de beleza descomunal e jamais visto por um ser humano. Entoou alguns cânticos e sua voz parecia rachar-me o coração. Eu parecia desfazer-me enquanto ela cantava. Parecia derreter-me internamente ao ouvir sua voz e fitar seu olhar. De repente uma sensação estranha apoderou-se de mim e senti-me profundamente apaixonado pela criatura, mas God disse–me que eu não poderia tocá-la senão cometeria o mesmo pecado que Adão cometeu na terra ao depravar Eva.
Logo, em seguida, voltamos a Alto paraíso e então percebi que para ali também se dirigia um cortejo angelical em carruagens de fogo e então God começou a diminuir de tamanho, até ficar na estatura de um humano e entrou na cidade de Alto Paraíso e sentou-se num trono branco, revestido de peles brancas e sedosas e dirigiu-se a nós novamente, agora já com aparência mais humana e um tom mais brando.
Desta vez falava mais calmamente e parecia ter aprofundado seu entrosamento conosco, já nos tratava em tom mais coloquial e também já permitira que alguns de nós falasse-lhe diretamente. Mas não eram todas, o major Raimundo, tentou dirigir a palavra a God e este travou seus lábios de forma que sua boca ficou completamente grudada sem poder emitir qualquer som. Por estranho que parecesse God só se dirigia a mim e então perguntei-lhe porque que dentre tanto fiéis a sua palavra, tantos crentes que ali estavam ele estava falando diretamente com um agnóstico e ele respondeu-me que os agnósticos é que precisava ver primeiro o poder de Deus, porque seus fiéis já o conhecem e muitos deles já experimentaram sua força e sua glória. Fomos informados por ele que tiveram passado dois anos de nossa saída da terra, embora acreditávamos que fosse apenas dias, mas na verdade tinham sido alguns anos, só que se retornássemos a terra naquele momento teriam se passado apenas alguns minutos desde nossa arrancada do planeta terra. Apresentou-nos God ao anjo Gabriel a quem classificou de guardião das primeira portas, o que significava em linguagem celestial, a entrada dos primeiros domínios que seriam, no caso, o purgatório terrestre que chamávamos. Ali qualquer criatura teria que ficar algum tempo, até se completar espiritualmente, para depois adentrar, definitivamente, o reino celestial e então ser designado para gerar a vida em um novo planeta no universo. Ficava completamente extasiado com a idéia que God havia nos passado de que toda e qualquer criatura humana, ao morrer, transformava-se num planeta novo no universo e gerava uma nova linhagem de seres. Concluí que qualquer outro tipo de vida no universo tinha origem no ser humano e God afirmou-me que era assim que realmente ocorria, só que haviam criaturas monstruosas que eram os descendentes dos maus, dos pagãos e dos extirpadores. Conforme disse, haveriam também criaturas gigantescas e pegajosas que mal podiam se movimentar, as quais God chamava de prospectais por serem o resultado da soma dos pecados que seus descendentes teriam cometido na terra. Geralmente essas criaturas povoavam planetas descomunais e que não tinham rota nem ponto determinado no universo, e viviam vagando por plagas abismais em busca de redenção. Fui então informado por God que Átila, o rei dos Hunos, e Adolf Hitler o presidente alemão tinham sido os humanos que mais geraram monstros em todo o universo.
Que sapiência é esta chamada Deus e que se diz pai de todas as criaturas e no entanto muitos de seus filhos morriam de fome, de doenças e de solidão. Porque um pai deixaria seus filhos morrerem a mingua e porque também ele próprio destruiria toda a sua criação, como se estivesse executando uma sangrenta e brutal vingança. Poderia o ser supremo do universo ser vingativo, como God está agora sendo com seus filhos humanos, ao destruir o planeta terra. Não estaria ele castigando inocentes, ou melhor diria matando inocentes. Tudo isso estava me deixando revoltado. Tinha uma vontade enorme de encarar God de frente e dizer lhe umas verdades. Mas não sei porque não tinha coragem. Minha face enrubescia sempre que tentava colocar-me de frente a ele. Ironicamente até pensei num dito popular religioso da terra de que o homem que ver a face de Deus morrerá. Então já deveria ter morrido por diversas vezes. Porque nos últimos dias o que mais vejo é a face de God, que todo dia me aparece como que se quisesse fazer-me a costumar com seu semblante, apesar de eu continuar reafirmando meu ateísmo. Para mim aquela forma de vida deveria ser uma dos Ets que tantos esperávamos um dia na terra. Poderia ser um Ser de elevada evolução e que estava querendo nos pregar uma peça. E como poderia me dizer ateu se estava defronte do próprio Deus. Com poderia negar suas existência se ele estava ali a minha frente.
Na verdade, fiquei desconcertado, porque até então nunca meu ateísmo tinha sido tão contestado. Mas agora como fazê-lo, se o criador em carne e osso se colocava em minha frente e dizia me, impavidamente, que eu seria o único com condições, além dele é claro, para salvar toda a humanidade do cruel destino que lhe impusera.
Eu tinha dúvidas profundas sobre a existência de Deus. Mas agora me dava conta de que se eu não estava diante dele, havia realmente, ou de qualquer forma, feita uma incrível descoberta, a de que existe vida além do planeta terra e aquela figura celestial era a prova inconteste de tudo isso.
Dirigi-me a ao Major Ribamar e perguntei-lhe se ele acreditava em Deus, o qual respondeu-me ser um católico fervoroso e praticante e acima de tudo devoto de Nossa Senhora de Lurdes.
Ai veio-me a cabeça de porque não perguntar a God sobre tantas coisas que nós humanos sempre quisemos saber sobre divindades, deuses e outros entes celestiais e questionei-lhe do porque o homem não ter direito as revelações sobre o seu destino. Porque o ser humano tinha que viver em permanente inquietude sobre o seu dia seguinte. Não teria ele direito de saber verdadeiramente de onde veio, onde está e para onde vai..
Sempre que dormia, ou melhor que pudesse pegar um pequeno cochilo, já que dormir era impossível naquele lugar, principalmente, porque a esta altura, Alto Paraíso, já tinha se tornado um imenso cemitério de corpos putrefatos e em decomposição, já que mais de seis quintos da população e dos visitantes que estavam na cidade morreram. Uns esmagados pela forte pressão e pela entrada na estratosfera e outros, mais tarde por falta de comida e remédios. Já que haviam muitos que beberam tudo o que fosse possível haver na cidade. Fizemos também um cálculo de que aproximadamente umas 500 pessoas teriam se suicidado diante do desespero e do horror que imaginavam lhes aguardar no espaço sideral. Mesmo assim, embora houvesse ainda bastante gente, muitos poucos tinham mantido a lucidez, a maioria havia enlouquecido, sendo que muitos deles haviam se prostrado a rezar de forma que se tornaram intocáveis diante do temor que tinham pela criatura que a nós dizia confiante ser Deus.
Alguns soldados rebeldes ainda viviam e tinham armas e viviam atirando por detrás da montanha Baleia e resolvi então pedir a God, que nos protegesse contra nossos próprios semelhantes ao que ele ironicamente me questionou. Ainda preciso defende-lo de seu próprio semelhante. Não sois todos irmãos. Então porque temei-vos uns aos outros?
Havia muita ironia nas colocações de God, e eu agora parecia sentir-me mais a vontade e ao invés do medo e do terror que sentia em sua presença, comecei a experimentar uma espécie de paz sempre que ele aparecia. Sentia-me profundamente protegido, apesar de ouvir os relatos dele sobre com exterminou toda a raça humana. Imaginei que todo aquele monumento celestial teria que ter compaixão, ou teriam mentido a mim sobre Deus na Terra. Porque me lembro muito bem que durante o catecismo o Padre nos dizia que Deus era onipotente, misericordioso, bondoso e a primeira vista, com certeza, God não pareceu ser nada disso, principalmente quando exercitava comigo seu desejo de vingança contra suas criaturas preferidas. Seu desejo incontrolável de destruir a obra prima de sua criação conforme ele mesmo dissera e que seria o planeta terra e o ser humano.
Em resposta ao desafio de God, de que lhe provasse 51% de coisas boas no ser humano, procurei mostrar-lhe algumas coisas boas que o homem havia feito na terra. Iniciei pelas grandes descobertas, principalmente na medicina, com as vacinas e remédios que impediram grandes epidemias e catástrofes mundiais. Falei também das grandes invenções, citei Eisntein, Galielu Galieli, Da Vinci, Benjamim Franklin e até mesmo santos Dumont e percebia pelo semblante de God que não o estava convencendo. Até que de repente, ele furiosamente, reagiu indignado, e gritou-me que a evolução do homem tinha que ser espiritual e não material. Disse-me que os homens deveriam ser iguais, que ninguém deveria ser escravo do outro, que o alimento teria que ser para todos e mesmo as coisas “ruins” que o ser humano inventou deveria ser compartilhada com todos, porque éramos todos irmãos, filhos do mesmo pai. Não adiantariam nada as grandes invenções se muitas delas serviram para infernizar ainda mais a vida do ser humano. Depois daquela fúria toda fiquei sem argumento. Não conseguia agora lembrar de mais nada de bom que o homem fizera. Só me vinha a lembrança as guerras mundiais, o holocausto, as bombas de Hiroshima e Nagazaki e a selvageria de Átila o rei dos Hunos a opulência dos faraós e também das barbaridades cometidas pelo romanos contra os cristãos. Mas no fundo eu sabia que o homem em seu conjunto havia sido bom. Mas como provar isso a God. Não tinham mais argumentos conviventes e sei que sua fúria já estava chegando ao limite. Fiquei com medo dele desencadear tudo sobre nós e a terra não ter mais retorno.
Voltei então a lembrar novamente de minha chegada a Alto paraíso naquele fatídico dia 11 de agosto de 1999. Jamais poderia imaginar que um simples visita de rotina a uma lugar que eu adorava se tornaria o maior pesadelo de toda a humanidade. Mas mesmo assim eu ainda não acreditava que God realmente tivesse destruído a terra e pedi-lhe uma prova. Então ele levou-me novamente a frente do imenso painel televisivo e mostrou-me uma espécie de mapa vivo do nosso sistema solar e perguntou-me se eu conseguia vislumbrar o planeta terra. Realmente olhei as posições a partir do sol e percebi que havia apenas um pequeno corpo parecido com um planeta entre marte e mercúrio e God, então disse-me que aquele era apenas um pequeno pedaço do que sobrara de Vênus que teve que ser parcialmente destruído junto com a terra pelo aproximação da Estrela de Barnard. Também o planeta marte parecia reduzido de tamanho e então soube que ele também tivera uma parte arrancada pela estrela. Notei então que havia um grande vazio entre o sol e o planeta Júpiter. Realmente uma parte do sistema solar havia sido literalmente destruída, conforme God havia me dito. Depois de olhar e sentir a ausência do planeta terra comecei a sentir revolta com God. Achei que ele havia exagerado. Porque destruir toda a raça humana e não apenas os ímpios conforme viviam pregando na terra seus seguidores e os fanáticos que sempre diziam, em nome da bíblia, que os justos seriam poupados e habitariam o reino dos céus. Perguntei a God o que era para ele o reino dos céus e ele mostrou-me novamente os bilhões de planetas os quais cada um era habitado por um ser humano já morto e no qual o espirito construiu uma nova raça de seres que povoaram os mais remotos planetas do universo. Ainda quis saber sobre o verdadeiro tamanho do universo e God, surpreendentemente, apanhou um grão de areia no chão sujo de alto paraíso e mostrou-me dando idéia de que cada grãozinho de areia daquele representaria uma galáxia inteira. Perguntei se ele sabia ao certo quantos grãos de areia existiriam em todas as praias do planeta terra e ele disse-me que mil bilhões por quilômetros quadrados de praia e de profundidade ainda seriam poucos. Assustei-me com aquilo porque estava começando a ter uma idéia do tamanho do universo. Era realmente uma coisa inimaginável. Suas fronteiras por certo seriam inalcançáveis, ao que God retrucou-me e disse que nada era inalcançavel em sua glória e decidiu mostrar algumas partes de sua mais sublime criação , o universo.
Então iniciamos uma vertiginosa viagem pelo espaço e paramos, inicialmente, num lugar que God dizia ser a fronteira leste de seus domínios. Ali começara tudo, fora onde o éden fora idealizado e os primeiros humanos concebidos e enviados para povoarem o planeta terra.
Realmente, eram um homem e uma mulher, mas em momento algum God os chamou de Adão e Eva. Dizia apenas que eles eram a representação mais sublime de sua devoção para com os humanos, seus filhos prediletos, e agora dizimados pela sua fúria e sua ira incontrolável.
Logo, em seguida, descemos num gigantesco planeta, um lugar um pouco inusitado, cheio de minúsculas bolinhas de isopor, as quais God explicou-me serem seres em condições de evolução para a espécie humana. Disse-me que para cada humana que engravidasse uma bolinha daquele era arremessada para a terra e um novo ser humano começaria a ser gerado. Quis perguntar-lhe o que aconteceria se as bolinhas de isopor acabassem e God, instintivamente, virou a face e pôs todas as bolinhas a flutuarem no espaço e a se desfazerem, justificando que, até aquele momento, não haveriam mais humanos naturais. Então o planeta tornou-se um imenso deserto, sem qualquer vegetação ou forma de vida e as bolinhas de isopor subiam para o espaço e colocavam-se em posição, tomando um inimaginável espaço na região. God disse, então, que elas estavam preparadas para a restauração da vida no planeta terra se eu conseguisse convencê-lo.
Precisava continuar minha contestação, mas nada me vinha a mente. Esforçava-me para lembrar as grandes coisas boas que o homem fez, mas só conseguia imaginar tudo que de ruim o homem havia cometido contra seus semelhantes. Lembrei as guerras, as perseguições, as maldades contra seres inferiores. A dominação da minoria sobre a maioria e a transgressão das mais prefeitas leis da natureza, como a violação de quase todos os mandamentos da lei divina, conforme ele me falara delas.
Tentava a todo tempo, estabelecer uma relação de bondade dos homens com Deus, mas não conseguia. Sempre que vinha a memória alguma coisa boa, rapidamente ela sumia dando lugar a uma atrocidade que eliminava aquele momento de bondade que o homem pudesse ter realizado. Mas mesmo assim, não desistiria precisava mostrar a God que o homem não eram imperfeito e que suas criaturas preferidos também fizeram muitas coisas boas. Talvez até mais que 51%, mas agora eu mesmo tinha dúvidas, porque tudo que me pesavam eram coisas terríveis que o homem cometeram contra si próprio, humilhando e pisando seus semelhantes.
Numa dessas noites, deitei-me sobre a rede que havia estendido entre as duas arvores fora da pracinha da luz e pus-me a pensar em meu livro e em quantas coisas ainda precisava fazer na terra. Inclusive uma viagem aos confins do sistema solar, perto de Júpiter e agora estava eu ali viajando a bilhões de anos luz de distância que já teria dado para ir algumas trilhões de vezes da terra a Júpiter.
Sempre que me sentia só e na melancolia do espaço, escrevia ainda trechos do meu livro. Absurdo, estava escrevendo um livro para quem, se ninguém mais existia a não ser uma pouca centena de humanos que agora perambulavam por Alto Paraíso. Pus-me a ler o trecho que falava sobre a viagem cosmo-espacial de Breno Saada, sequer consciente de quem é que na realidade estava fazendo uma viagem fantástica. Comecei a então a contar no livro a história do grão de areia que eu havia pego um dia na praia do Rincão. Que saudades do Rincão. Será que nunca mais a verei. Por onde andará as areais brancas e suas águas verdes e seu ar rubro do calor envolvente do verão de janeiro.
Comecei a lembrar com intensidade e uma saudade muito grande de Angela. Via seu rostinho angelical e suas formas esculturais bailando a minha frente, seu corpo moreno e teso me excitando e me chamando ao amor.
Parecia ainda sentir sua mão leve e macia descendo por meu corpo, envolvendo-o numa carícia louca que me fazia gozar e gemer de paixão.
Sua imagem lúcida e carinhosa, quase angelical me entorpecia a ponto de sonhar
acordado que estava caído em seus braços e ela suavemente beijava meus lábios escorregando suas mãos leves e macias sobre meu peito em direção ao meu pênis. Via o enrijecido e Angela apertando o com sua mão suave e quente e de repente descia com sua boca de mel e passava a língua sobre a cabeça do pênis, dando me uma sensação inigualável de prazer.
Sentia tanto sua falta e de sua afeição, embora tivesse me dado o fora. Mas eu não a abandonara, convivia com ela em meus pensamentos em quase todos os momentos de minha vida.
Porque não a convidei para ir a Alto Paraíso comigo? Com certeza ela estaria aqui agora.
Ainda lembro da primeira vez em que a vi em Brasília, falando sobre as descobertas da Voyager e da viagem exploratória a Europa, a lua de Júpiter. Quando iniciei conversa e falei sobre minha duvidas acerca da origens do universo e também da minha certeza sobre a existência de outras formas de vida no cosmo. Ela parecia concordar comigo, mas nunca, em momento algum, me dissera que eu estava certo e nem sequer declinara sua posição sobre o assunto, Mas agora, ali, naquela imensidão sem fim, num espaço louco e sem lógica, viajando num meio de transporte o mais louco que poderia existir, uma cidade inteira, eu pensava seriamente sobre tantas coisa de minha vida que em alguns momentos me faziam sofrer. Porque fui deixá-la na terra, agora morta, soterrada ou talvez ainda levada por um pedaço qualquer da terra. Porque não lutei mais intensamente para mantê-la comigo; porque não declarei-lhe, definitivamente, o meu amor.




17
O ARREPENDIMENTO

Sentia-me agora definitivamente só e também na mais completa solidão humana, com apenas alguns militares e uma cambada de fanáticos religiperambulado pelo espaço sem rumo e sem qualquer direção e também sem qualquer propósito e ao léu de um louco desalmado que dizia ser Deus.
- E, se realmente ele for Deus, o que será de mim com tanta blasfêmia, pensei um
pouco amedrontado e depois recobrando a lógica de que eu tinha que assumir definitivamente meu ateísmo e acreditar que tudo aquilo não passara de uma visão alucinada e de que não haveria nenhum Deus e nenhuma destruição do planeta terra.
- Isto me animava, o simples desejo de rever Angela e sentir novamente seus
lábios e suas mãos me acariciando davam-me todo o animo que precisava para continuar insistindo que o homem tinha dignidade o suficiente para continuar vivendo e mantendo o seu planeta natal, a terra.
Minhas saudades de Angela aumentaram muito, pensava nos nossos encontros no Rio de Janeiro e de nossas caminhadas descalços sobre a areia da praia e de vez em quando molhando os pés na água fria e salgada do mar. Quantas vezes pegara Angela, nas noites acaloradas e deitei-a sobre a areia e gentilmente fazia amor com ela, que saia depois deslumbrante, com os cabelos molhados e os olhos brilhantes de desejo e de satisfação. Porque agora estava eu passando por aquele cruel destino e porque também todo os meus descendentes, meus compatriotas e meus irmãos humanos foram dizimados por God.
Estava começando a ficar irado com God, estava sendo tomado por um ódio inconcebível por ele, já não tinha mais medo, ao contrário estava revoltado e pensava em como desfazer o que ele fizera.
Então, numa certa noite, quando dormia sobre a arvore dos pássaros quereles de Alto Paraíso, tive um sonho conturbado em que vi uma estranha figura muito alta, com um semblante de anjo, mas com estranhos chifres pontiagudos da cauda as duas extremidades das asas.
Dizia chamar se Ceres, enviado do Senhor de Alganor. Fiquei meio surpreso com aquilo e perguntei ao ser por que me procurava, qual o interesse do senhores de Alganor por um pobre e abandonado humano perdido na vastidão do universo e sem rumo defnido.
Percebi que era um ser brilhantemente inteligente e astuto que sentou-se a minha frente e fez algumas reverenciais que eu não conseguia entender. Ele apontou-me uma direção dando a entender que precisava me levar a algum lugar e eu acenei negativamente com a cabeça. Então ele tirou uma pequena bola de gude cristalizada e colocou sobre o chão e ela começou a brilhar intensamente até que transformou-se numa enorme televisão, por onde eu assistia ao vivo enormes chamas consumidos vastidões planetárias e devorando galáxias inteiras e então a criatura disse-me que aquele era Lucífer, o senhor das trevas, o oponente de God e o único que poderia salvar a terra e restituir sua população a vida.
Fingi, inicialmente que não estava entendendo, mas no fundo, já havia percebido que estava recebendo um mensageiro de Lucífer que queria usar-me contra God, fazendo-me as mais mirabolantes promessas e eu irrequieto pensei comigo porque não aceitar o que mais de bom eu poderia esperar de God, já que ele havia me tirado tudo o que tinha, meus irmãos e meu planeta natal. Pensei que seria um boa idéia e uma ótima afronta a God ir conversar ou ao menos conhecer de perto Lúcifer e seus Domínios e então, acenei positivamente com a cabeça ao anjo negro, dizendo que aceitava ir aos domínios infernais. Colocou-me então sobre sua asa esquerda e levantou vôo em direção ao alto, sempre em parafuso como se fosse adentrar a um estranho orifício nos céus. Percebi então que aquilo era um atalho para o inferno, um atalho para Alganor. Parecia uma viagem interminável e na qual passamos por lugares inimagináveis. Vi semblantes horrendos de sofrimento e seres que imploravam misericórdia, enquanto labaredas enormes consumiam seus ossos já putrefatos mas ainda com vida. Vi seres que a mitologia grega um dia insinuou em suas epopéias e odisséias, mas eram rotundos, tristes e sacrificados. Tinham semblantes horrorizados pelos infortúnios que lhes impunha Lucífer. Agora uma curiosidade maior tomava conta de mim, como seria Lúcifer, o anjo da morte, o pai da escuridão, o senhor das trevas e o único oponente de God. Comecei a aumentar instintivamente minha curiosidade e quase estremecia sempre que me imaginava de frente com ele. Estarei eu preste a fazer um pacto com o diabo, pensei, relutando sobre minha decisão de ir até ele. Mas sabia que com God não haveria mas esperança para salvar a terra. Porque vi que no inicio de meu relato, ele começou a ficar cada vez mais embravecido comigo. Poderia então Lúcifer ajudar-me a restituir a terra ao seus eixo normal e a sua posição no sistema solar da galáxia Via Láctea. Não tinha mais noção de onde estava, em que ponto do universo me encontrava e nem qual distância que havíamos percorrido, já que tive a confirmação de God de que havíamos viajado a velocidade do seu pensamento, uma coisa que não se pode estabelecer uma quilometragem, nem tempo, para tal consistência espaço temporal.
Levamos algumas horas até chegar finalmente ao lugar em que parecia ser a morada de Lúcifer. Era um lugar aprazível, quente mas nem tanto, que não fosse possível suportar. Era também cercado por imensos jardins de rosas negras e margaridas azuis, adornadas por estranhas flores roxas com um brilho que lembrava o diamante. Adentramos o imenso jardim do palácio, que se vislumbrava a frente, com gigantescas torres que chegavam ao céu do lugar e adornada por milhões de anjos negros com suas asas de pétalas brancas a zonzear em volta delas. Era um zumbido meio ensurdecedor, mas, no entanto, bastante agradável que causava um espécie de torpor em, mim. Sentia-me de repente, entorpecido e suavemente extasiado como se estivesse voando suavemente por sobre as plantas negras do lugar. Comecei a arrepiar-me e assustar-me com a idéia de que iria estar frente a frente com o senhor das sombras. O todo segundo poderoso ser do universo, segundo o próprio God havia me colocado.
Sentou-me primeiro em um grande trono branco, adornado por pedras preciosas, desde jade a diamantes, com enormes safiras e rubis brilhantes nas cabeceiras da poltrona. Era uma espécie de trono, mas notei que eu estava sentado num dos pequenos a direita e que no centro havia um muito grande e milhares de vezes mais vistoso e brilhante que aquele em que estava sentado. Aguardava ansiosamente pela presença de Lúcifer e de repente foi como se milhares de trombetas começassem - pude perceber que Lúcifer fazia de tudo para imitar God, tudo mesmo até o ponto de querer deixar transparecer que era uma criatura boa - tocar a grosseiramente vi uma figura espectral , nojenta e peçonhenta se arrastando em direção ao grande trono. Parecia uma espécie de víbora, muito pequena, que movia-se em minha direção e só então vi que logo atras de si vinha um cortejo imenso de anjos, gárgulas, centauros, minotauros e uma centenas de outras criaturas esquisitas e repugnantes, como se formassem um séquito. Sim aquele serzinho insignificante era Lúcifer em sua foram natural, em sua foram de serpente, aquela que God um dia amaldiçoara por ter ela tentado sua criação preferida, o homem e a mulher. Era um ser pequeno, nojento e gosmento em suas extremidades, mas aparecia dotado de uma inteligência sem par. Tinha um estranho brilho nas extremidades, de um lado a cauda e de outro uma pequena cabeça serpentuosa e fina que se alongava cada vez que ele bufava. Alguns de seu servos pegaram o nas mãos e sentaram-no em seu trono e de repente então uma explosão enorme fez o lugar tornar-se branco e cheio de vapores infernais e então a pequena serpente transformava-se em um ser descomunal, enorme, com altura de mais de cem metros esticando seu longo e fino pescoço pelo orifício apertado do palácio em que nos encontrávamos. Estava eu ali vendo ao vivo e em cores o senhor das trevas, o poderoso Lúcifer o grande oponente de God e o rei do mal. Fiquei impávido, com muito medo esperando que ele me dirigisse a palavra. Contorcia seu pescoço sobre mim, olhando e estudando-me minuciosamente sem dizer qualquer palavra e fazendo gestos para seus seguidores.
Quando então o ouvi abrir uma enorme bocarra, com uma garganta profunda e consumida em fogo e enxofre, acordei.
- Oh! My! God!, eu sonhei com o diabo. Minha revolta era tão grande que me fez
buscar o maior aliado do bem para vencer God, através de um sonho.
E, então, de repente levantei-me, sobressaltado e muito arrependido, como se realmente eu houvesse feito qualquer pacto com o diabo. Não sei por que tive aquele sonho, seria meu inconsciente arquitetando uma revanche contra GOD e buscando aliados para vencê-lo?.
Quando retornei ao visor notei que estávamos nos aproximando cada vez mais das fronteiras de Alganor, conforme indicava o painel e por um bom tempo não recebemos mais qualquer sinal de God. Parecia que ele havia nos abandonado em pleno espaço, deixando-nos entregue a nossa própria sorte ou, então, as fogueiras infernais de Alganor. Lembrava sempre do desafio que God havia nos lançado e o prêmio se vencesse seria o retorno da vida ao planeta terra.
Queira que o convencêssemos de que o homem humano teria praticado 51% de coisas boas em prol de seus semelhantes contra apenas 49% de coisas ruins. Ainda não sabia por onde começar para tentar convencer God. Mas eu próprio tinha convicção de que o homem não era de todo mau. Haveriam, claro, algumas imperfeições, mas o ser humano em sua essência era bom. Tirava isso por mim, porque não tinha capacidade de pensar ou fazer mal a qualquer criatura. Mas lembrei também de algumas palavras de God que faziam referência ao egoísmo, a ganância e a avareza e refleti se eu mesmo não seria um destes. Só tinha preocupação com o meu futuro, com o meu amanhã. Nunca dei esmola, nunca levantei um ferido do chão e nunca fui a um hospital visitar um enfermo. Será que isto não era uma indicação de que haveria em mim um pouquinho da essência da maldade. Questionei, começando a ficar preocupado de onde arranjaria os 51% de coisas boas do homem par mostrar a God e também como iria convecê-lo em toda sua esplendido de que eu um mísero humano, fruto de sua própria criação imperfeita poderia convencer meu criador de que nós éramos realmente bons e que mereceríamos uma nova chance.
God reapareceu e desta vez, falando severamente, disse-me que criou o ser humano para servir de modelo ao resto do universo. Mas decepcionou-se profundamente com tantas coisas más que fizeram.
- “Foram piores que os que mandei para Alganor”.
- Mas senhor, disse-lhe com respeito. O homem não foi tão mal de todo. Houve tantas coisas boas que fizeram por si mesmo e pelos semelhantes. Sempre houve tantos que lhe seguiram, cumpriram sua palavra e pregaram o seu evangelho pela terra.
“Mostre-me uma só coisa boa contra duas más do ser humano que repensarei o destino dos terrestres, falou-me, novamente, desta vez, embravecido e colérico, levando-me a duvidas sobre a bondade humana. Percebi, então, que God já havia aumentado nossas chances. Agora teria que mostrar apenas um feito bom do homem contra dois feitos ruins para poder restituir a vida na terra. Mas, mesmo assim, ainda não sabia por onde começar.
Passaram- se dois anos terráqueos desde que adentramos a região de Alganor e sentia saudades imensas da terra. Lembrava de seu azul, seus mares límpidos, o vento suave, a terra firme e s areias reluzentes das praias e do odor sem par do oceano e sua atmosfera saudável. Senti um horror profundo e uma vontade inimaginável de voltar, de estar de novo na terra, em minha casa, junto com minha família, sentado em minha poltrona e lendo o livro que estava escrevendo.
Sentia muita tristeza e uma dor incontrolável. Não era uma dor física, mas me machucava e me doía até as entranhas. Queria poder relaxar para dissipar aquele terror de minha mente, mas meu cérebro trabalhava tão rápido que não deixava minha carcaça descansar. Vi criaturas horrendas e malignas que dissecavam cadáveres para comer sua entranhas, torrando logo em seguida suas carcaças nas fornalhas abertas que elevavam enormes labaredas em todas as direções.
Olhei novamente para o infinito e vi de novo a barreira de fogo que separava os domínios de Lúcifer do resto do universo. Havia uma enorme cortina de fogo vivo e cintilante que emitia labaredas em todas as direções, sendo que algumas delas alcançavam milhares de quilômetros e torravam até mesmo o ar que se formava em sua contração de volta as fronteiras dos domínios infernais.
Via milhares de bestas se dissolvendo e adentrando a região com exércitos de seres tenebrosos e inumanos. Um destes, parecendo o líder, de repente, transformou-se numa terrificante e indecifrável forma verminosa e serpentual que enrolava sem em dezenas de planetas próximos as muralhas inquebráveis de Alganor. Havia além dessas fronteiras outros estágios de vida e planetas com espécimes de vida totalmente desconcentrados onde morrer era a vida e viver a morte. O horror se perpetuava nas lamentações de milhares de seres, que lembravam humanos, e imploravam por misericórdia como se estivessem sendo severamente torturados.
Esforçava-me para entender o balbucionar daquelas criaturas, mas tudo era tão indecifrável, tão estranho que não havia referencial que me fizesse distinguir de qualquer coisa que já houvesse visto ou ouvido falar. Implorei diversas vezes, lamentando o sofrimento que me infligia God, argumentando eu que não poderia sozinho pagar pelos erros da humanidade e ele respondia-me que um dia eu seria recompensado. Bastava deixar meu ateísmo esdrúxulo e lembrar de seu livro sagrado. Mas antes tinha que convencê-lo que o ser humano merecia uma nova oportunidade de continuar vivendo.
Não imaginava que espécie de recompensa poderia receber dele e agora já sabia também que God queria destruir todo o Universo, para também atingir Lúcifer.
Vagamos ainda muito tempo pela região próxima a Alganor e aproximavámos-nos cada vez mais da fronteira de fogo a nossa frente.





18
O PERDÃO DE GOD

Uma vez God levou-me ao ano de 1895 e mostrou-me as atrocidades que os ingleses cometiam cindianos e os franceses contra os nativos de Camarões. Fez questão de destacar Ghandi, afirmando que ele era um exemplo da espécie de homem que gostaria de ter florescido na terra, criaturas de corpo pequeno e de alma grande e amplamente oferecida. Ele mostrou-me também a África despedaçada pela guerra, onde a fome já havia matado mais da metade da população, em decorrência das guerras civis e das lutas insanas por pedaços de terras insalubres e inóspitos. Mostrou-me também grande parte da ex-união soviética, onde ex-repúblicas se desintegravam e onde pequenas republiquetas penavam os bombardeios Russos e disse-me:
“Veja Arthuro, estes são aqueles que sempre negaram meu nome e minha existência. Dali fomos para os países nórdicos, onde God parecia rir satisfatoriamente e dizia: “Estes acreditam em mim, para eles meu nome é Odin e por isso conhecem o progresso e o desenvolvimento cada vez maior de sua civilização. E God, ainda levou-me a outras regiões do planeta terra, sempre querendo mostrar-me exemplos e referendar suas verdades com relação aos homens. Mostrou-me a região do Tibete, o Nepal, o Butão e partes da Índia e do Paquistão, lembrando-me que ali ele tinha vários nomes: Buda, Brahma, Alá e considerou-os povos de sua guarda. Fomos também ao Oriente Médio, Israel, Jordânia, Arabaia Saudita e toda a região da Palestina e God disse, mais uma vez, estes também são meu povo, embora lutem pela verdade de meu nome. Apenas um destes povos da terra, sabe ao todo o meu verdadeiro nome. Mas não pecam e sim me agradam aqueles que me deram novos nomes.
Vi, também que nesta época, alguns planetas pelas quais já havia passado tinha-se deslocado de lugar e aproximavam-se cada vez mais da região de Alganor. Pude ver e identificar Saturno, Netuno e Urano, agora ajuntando-se como se fosse formar um novo corpo celeste e o espaço onde estava a terra afastando-se cada vez mais do Sol, mergulhando nas profundezas negras dos domínios infernais.
Pensei então que God pretendia jogar todo o sistema solar diretamente no inferno. Perguntei também se ele sabia como o homem concebia a origem do universo, se sabia da história do BIG BANG, teoria que alguns cientistas terrestres utilizam para definir como o Universo foi criado e God Respondeu: o universo sou eu e somente de mim nasceram todas as outras coisas vivas e inertes, sombrias ou luminosas, boas e más. Até Alganor veio de mim, todas as formas foram geradas de cada célula de meu corpo e a inteligência de cada um nasceu e cresceu de acordo com a partícula de qual fora gerada.
Quis perguntar-lhe como ele nasceu, de onde viera, mas senti medo, fiquei como se fosse desvendar o maior segredo de toda a humanidade. Mas, não precisei perguntar, God, mesmo disse que ele era o Supremo, o Senhor de todas as criaturas e nascera da grande explosão cósmica que gerara o universo e suas bilhões de galáxias. Desde então, sua existência dedicava-se ao controle das criaturas e a fecundação de novos mundos e a geração de novas espécies pelos cosmos, com exceção do lado tórrido que era Alganor, que nascera da outra metade da energia que havia gerado sua existência e para onde mandou o anjo negro que desafiara seus princípios e que agora era conhecido por Lúcifer.
Preparei-me, fazendo algumas anotações, para poder enfrentar God e provar-lhe que o ser humano tinha virtudes, que talvez ele próprio desconhecesse, apesar de sentir que não iria conseguir provar nada.
Reúnimos-nos a noite no espaço do grande painel e invoquei God, que demorou ainda cerca de meia hora para aparecer. Parecia um pouco revoltado e mostrava um semblante sofrido e amargurado. Sua imagem humana agora parecia mais velha e já não mostrava o ar de grandiosidade que sempre buscava ostentar.
Fitei-o profundamente nos olhos e, com ar de piedade, implorei-lhe sua misericórdia para a raça humana. Não agüentava mais tanta ansiedade. Sabia que jamais poderia mostrar-lhe bondade suficiente no ser humano e então de repente cai em prantos.
Pus-me a chorar desconsoladamente, com saudades da minha velha e boa terra. Pensava que nunca mais iria ver um outro ser humano, não fossem aqueles que já estavam comigo em Alto Paraíso. As lágrimas escorriam pelo meu rosto como se fosse uma criança que chorasse. Não sei porque, mas sentia que chorava de dor, de saudades e pela perda de meus semelhantes. Comecei a lembrar de Franz Kopelck e via na imagem envelhecida de God, a face de Franz, paciente, amável e bom. Ai é que meus prantos aumentaram e uma dor cada vez mais profunda se apossava de mim. Sentia estar carregando nas costas todos os pecados da humanidade. Porque não conseguiria, de forma, alguma, provar a God que o homem tivesse pelo menos um terço de coisas boas.
Era a primeira vez que chorara com tanta intensidade em toda a minha vida. Mesmo com todas as auguras de minha infância, a vida dura de minha adolescência e a vivência conturbada de minha juventude, nunca derramara uma lágrima sequer. Mas agora desfazia-me em prantos desconsoladamente, talvez por não ser capaz de ter argumentos para salvar toda minha geração, todo o meu povo. E, então, de repente, ví-me novamente na praia do rincão, com os meus doze anos de idade, caminhando pela praia e esburacando a areia com o dedão do pé direito. Comecei a reviver toda a minha infância, a pobreza, a incerteza e minha obsessão pela vida extraterrestre. Vivi, detalhadamente, as experiência que fizera com os grãos de areia no microscópio de Franz, só que desta vez não me sentia transportado para outros lugares, apenas via a imagem severa de Deus, apontando-me o caminho de casa, com o dedo em riste dizendo que eu devia-me contentar com o planeta que tinha e esquecer o resto do universo. Revivi, com sofrimento, todas as fases da minha vida, a exploração dos mineiros de minha terra natal, a prepotência dos ricos da minha cidade e então comecei a ficar cada vez mais ciente de que seria incapaz de mostrar a God qualquer coisa boa da humanidade.
E, então, de repente, God olhou-me com ar caridoso e disse-me: Arthuro, compreendo tuas lágrimas, por não teres como provar bondade em teus semelhantes. Não pode ser de todo ruim o povo que tem alguém que chora por sua ausência. Eu estou arrependido e darei aos meus filhos prediletos uma nova chance de recomeçarem. Diga-me apenas qual é o meu primeiro nome e eu vos restaurarei a glória.
- Seu primeiro nome, como seu primeiro nome. Nunca soube que Deus tivesse dois nomes.
- Diga-me Arthuro, qual é o o primeiro nome que muitos de meus seguidores colocaram em um dos livros sagrados que existem sobre mim na terra.
- Talvez, agora sintas a dor de teu ateísmo. Diga-me qual é o meu primeiro nome Arthuro e terás a oportunidade de salvar toda tua descendência, toda tua geração, toda a tua irmandade.
Eu já ouvi alguma coisa sobre o primeiro nome de Deus, mas sempre achei que tudo era lenda ou mecanismo de algum conto fantástico que já houvera lido.
Disse-me que está na bíblia, mas onde, em que livro dela. Com certeza, agora mesmo é que acabei de condenar todos meus semelhantes, porque jamais poderei responder esta pergunta. Agora mesmo que meu ateísmo começava a me machucar s
- Será Davi Deus, Noé Deus, Jesus Deus...
- De repente, pareceu-me ler os pensamentos do Major Ribamar que dizia: está no Genesis, é Javeh Deus..
- Javeh Deus, chamei em voz alta e emocionado, querendo mostrar a God que
decifrara o seu nome todo.
- Também percebi que a possibilidade de ler o pensamento do Major me foi dada
por God. Ele queria apenas acabar com o meu atéismo e conseguiu.
Não houve resposta, apenas um estrondo, seguido de um brilho fantástico que iluminou toda a região de Alganor.
Então, uma sonolência foi tomando conta de todos em Alto Paraíso e de repente tudo começou a escurecer e o espaço novamente tomava a forma de funil ao contrário e nós fomos adentrado aquele orifício até todos desacordarem completamente.
Acordei sentindo uma queimação forte em meu rosto e quando abri os olhos vi o sol brilhando e o céu ostentando sua limpidez típica dos dias secos do planalto central.
Vi, então, que havíamos voltado a terra. Corri a procurar o Major Ribamar e notei que todos se levantavam em Alto paraíso, os mortos ressuscitavam e até os cadáveres já petrupefatos se recompunham e voltavam a vida. A cidade, de repente, retomou sua rotina, como se nada tivesse acontecido e eu estupefato ainda não acreditava no que havia acontecido.
Disse a mim mesmo que tudo não poderia ter passado de um pesadelo alucinante, até que encontrei o Major Ribamar e vi ele correndo para me abraçar e dizer: Arthuro, estamos de volta. A terra se recompôs.
Voltei para Brasília, ainda era o dia 11 de agosto e fui a reunião na Casa do Coronel Sérgio e lá encontrei Angela que havia resolvido participar da viagem a Europa. Achei ótimo sua decisão porque eu desistira da viagem. Sabia que não haveria nada de novo ou que não pudesse imaginar na lua jupiteriana.
Requeri minha aposentadoria proporcional na UNB, publiquei meu livro “Em Busca de Deus”, desta vez com dados bem concretos sobre a profundidade e a imensidão do cosmo e voltei para Alto Paraíso onde ingressei na seita Novo Mundo Cósmico e ali fiquei morando e tentando compreender porque tudo aquilo acontecera.
Passei a difundir a bondade e a virtude pelo mundo afora e também a certeza de que não existe um pai que não seja benevolente com seus filhos e tampouco poderia acreditar num ser superior que fizesse uma morada tão grande quanto o Universo, para deixar ocupar apenas um pequenino quarto de fundos, como a terra.
Também nunca mais na vida dirigi um telescópio em direção aos céus, porque sabia
que tudo o que a vida toda busquei já havia encontrado. Agora, por mais que me esforçasse em negar a providência divina, Deus passara a ser um templo seguro em minha vida.
Continuei sonhando com a imensidão do universo, mas não o tinha mais como um imenso vazio sem vida, mas sim como o complemento da maior obra do Criador, o planeta terra e seus habitantes.

FIM






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