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Cartas-->A pena do pavão -- 04/03/2003 - 16:15 (BRUNO CALIL FONSECA) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Olhei-me no espelho e não vi mais meus encantos. Tratei logo de descobrir o que poderia ter me levado àquele estado não deplorável, e que não vinha servindo de atrativo para ninguém. Me compunha como algo que não ia além do rotineiro. Seria a roupa que visto?

Na primeira passada pela loja comprei camisas de cores da moda, calças e, no dia seguinte, vesti. Nada além do primeiro impacto das cores vibrantes e da velha chacota: “que linda camisa, Fernandinho”. Voltei ao marasmo. Não achava modos de me sustentar.

No final de semana, mudei as cores da minha página na Internet, troquei as fotos de lugar e nada... não obtive nenhuma reação. Lavei o carro, fiz a barba, que há muito não fazia e nada... nenhuma atração. Até que, no segundo dia, tive o meu dia de Duda Mendonça. Conto por que!

No domingo passado, depois do almoço, meio sonolento, no sítio da Cleuza, com má vontade, mas sem que ele notasse, atendi o convite do Lage para ver as criações. Passávamos pela parte antiga do cercado dos galináceos para chegar à parte nova que ele — tanto e todo empolgado — queria me mostrar. Ele falava e falava, eu apenas o ouvia. Não estava muito interessado nas suas histórias de roça. Ainda na parte antiga do cercado, vi no chão, meio escondido, na palha de arroz, um pedaço de pena de pavão. Era a ponta da pena. Fiz menção de catá-la. Ah! Cato na volta, decidi. Chegando à parte nova do cercado, o Lage me explicou o que fizera e, rapidamente, retornei-me para a sede a fim de voltar para cidade. E a pena. Oh! Que pena!

Os dias de domingo, no geral, são bons. Neste dia, as famílias embrenham-se no esforço do conviver, confraternizar e aliviar arranhões. Umas até conseguem, outras, às vezes, não. Talvez a minha convivência desastrada fosse a causa de não querer acompanhar o Lage e por ter esquecido a pena do pavão.

Bateu a segunda-feira. Pela manhã, entrei no carro. Organizava as coisas desarrumadas, catava papéis de propaganda para jogar no lixo e eis que me deparei com a pena do pavão. E foi a pena que olhou primeiro, com o seu ocelar único, de cor azul-verdejante. Isso mesmo! A pena me olhou!

Peguei-a pela extremidade mais rala e coloquei-a do meu lado, no banco dianteiro do carro. Já sabia o que fazer com a pena: escrever sobre ela, mas escrever o quê? Dizer que media pouco mais de palmo e meio, que é linda? Dizer da combinação dos tons verdes e azuis escuros, das cores matizadas, metalizadas e do brilho purpurina? Dizer que elas são adereços de fantasias de carnaval ou do seu fim primeiro, que é servir de atrativo sexual para fêmea? Isso todos já sabem...

Pena! Pena! Não me convém ter pena de ninguém, nem de mim! Até hoje eu não sei por que me disseram isso e também nunca corri atrás para saber. Talvez porque, ou melhor... só pode ser, ter pena, e somente pena de alguém é humilhante para esse alguém — pouco ajuda o penado, ou talvez quisessem me dizer que não bastava ter pena, mas sim, fazer alguma coisa para aliviar as penas, enfim, talvez este parágrafo que escrevo ficasse melhor na sequência do que fala da família nos dias de domingo. Intencionalmente, o deixo aqui.

Mas o fato é que às duras penas resolvi levar a pena comigo aonde eu fosse, por horas, por dias se necessário. Já na portaria do serviço, fui interceptado:

— Mas que linda pena! —exclamou o porteiro todo em sorriso, sem o bom dia forçado, obrigatório.

— Ah! Sim — timidamente, concordei — é do pavão de minha sogra.

No corredor, com a pena na mão, notei que ela chamava a atenção daqueles com quem cruzava, mas ninguém arriscava um palpite, estavam todos preocupados em ocupar seus postos a tempo. Fui direto para a cantina. Lá, criei coragem e coloquei a pena no bolso da camisa como se fosse um adereço. A reação dos presentes foi instantânea e de admiração. Uma colega falou por todas:

— Mas que chique você ficou com essa pena de pavão no bolso!?

Foi o bastante para todos sorrirem. Chique eu não sei, mas que me passou pela cabeça ser um bicheiro, boêmio ou um dançarino de pagode, passou. Verdade, verdade mesmo, eu me sentia um cafajeste.

Ao chegar à sala de serviço a reação de todos foi a mesma:

— Nossa! Que pena linda, onde você arrumou?

— É do pavão de minha sogra. Estou com ela porque também a achei bonita. Querem pegar pra ver?

No fim do dia, na volta para casa, trouxe-a comigo. À noite, levei-a para a faculdade. Não com o intuito de disseca-la, explicar a sua finalidade biológica, seu simbolismo, a sua alegoria e muito menos saber por que em cada ponta de pena do rabo do pavão tem um olho.

Claro! Na sala de aula não me expus ao ridículo de colocá-la na lapela, atrás da orelha ou enfiada nos meus parcos cabelos. Encontrei, por acaso, uma forma elegante de deixá-la à vista dos curiosos. Fiz dela um marcador de leituras.

— Que linda pena! Adoro pena de pavão! Tenho uma na parede de meu quarto e todos que lá entram admiram e logo perguntam por que eu tenho aquela pena ali. Adoro pena de pavão! — Disse Mirela.

Que chique, que lindo, que chique, que lindo, era o que mais eu ouvia sobre a pena. Houve até quem dissesse que aquilo era coisa de veado... entendendo veado como fresco, fresco como o pequeno burguês, pequeno burguês emplumado como um pavão que chocou em Uber-land.

Não houve quem quisesse se aprofundar na discussão das penas do pavão, na beleza, no feitiço e na simetria de seus ocelares.

Mas o fato é que a pena cumpriu o seu papel. Os três dias em que a carreguei discretamente, salvo a segunda vez que a coloquei na algibeira da camisa, ela despertou a atenção de muita gente e os cumprimentos e sorrisos passaram a ser espontâneos. Penso que todos nós temos a necessidade de carregar uma pena. Alguns empertigados, fumam grossos charutos que mal cabem na boca; outros usam mil anéis; argolam o corpo todo e há aqueles que preferem a estrela na testa. Eu ainda não sei se existe quem não goste de usar uma pena de pavão. Até quem não gosta, por não gostar, acaba tendo a sua pena de pavão. Eu, no íntimo, busco a minha pena, com uma pena... sem pena.





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