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Contos-->O MALTÊS -- 13/09/2003 - 23:01 (João Ferreira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos



O MALTÊS

João Ferreira
13 de setembro de 2003



Vou chamar-lhe Maltês. João Maltês. Exatamente por se tratar de um personagem que viu a luz do dia em Malta, mais especificamente em Gozo, uma ilha paradisíaca em pleno Mediterrâneo cheia de história fenícia, grega e cartaginesa, pertencente ao pequeno arquipélago de Malta.
Maltês visitava Brasília. Estava no átrio da catedral de Brasília, frente à estátua de São João Evangelista. Chamou-me a atenção quando o vi olhar e admirar aquele bronze que representava uma das figuras mais emblemáticas do cristianismo. É sabido que João é não apenas autor do quarto evangelho, mas escriba de um dos mais difíceis textos de exegese bíblica, que se chama o Apocalipse, que descreve as profecias que dizem respeito aos últimos tempos da Humanidade.
Sempre passo por ali pelo corredor das estátuas de bronze, quando sigo em direção à catedral, mas raramente me detenho em observação do que já conheço. É um lugar nobre de Brasília bem badalado. Mas desta vez, quando vi aquele turista de volta da estátua de bronze de meu padroeiro S. João, tirando ângulos e ângulos da imagem, me detive para analisar os detalhes pretendidos pelo fotógrafo. Havia algo de novo ali. De minha bagagem cultural mediterrânica sabia que S. João Evangelista se identificava com o solitário da ilha de Patmos. Havia muita mediterraneidade naquela figura. Seu evangelho era diferente dos outros. Há muitos aspectos que o tornam diferente.
João Evangelista me chamou sempre a atenção pelo que escreveu sobre a Palavra: "no princípio era o Verbo e o Verbo estava em Deus e Deus era o Verbo". Quando estudante quase quebrei minha mente procurando entender estas palavras que parecem repetitivas e aparentemente detentoras de um trocadilho. Parecia não adiantarem muito para mim em termos de lógica. Mas hoje entendo à minha maneira, de forma mais livre e talvez menos ortodoxa. Elas são fundamentais pela alusão à principalidade da palavra e pela conexão originária da palavra com o espírito. A palavra é um dom divino e quem tem o dom da palavra está necessariamente ligado ao Divino, ao reino do Logos.
Assim estava eu pensando quando o fotógrafo me enquadrou na sua objetiva juntamente com um ângulo da estátua. Deu um sinal pedindo meu acordo. Mostrava ser educado e um gentil cavalheiro. Estava acompanhado de uma jovem senhora. Sorri e passei a perguntar de que nacionalidade era, afinal. E ao saber que era maltês perguntei se falava italiano. “ Ma certamente”, me devolveu o fotógrafo.
Já que falava italiano, para mim tudo se tornava mais fácil. Podíamos nos comunicar com maior facilidade.
Manifestei a curiosidade de saber porque punha tanto cuidado e fazia tanta fotografia em torno da estátua de bronze de S. João.
-È il mio padrone – é meu padroeiro, rematou..
Também ele era João.
Tinha em casa, segundo me contou slides e filmes de S. João de todos os países que visitou pelo mundo.Estátuas e figuras desde as primitivas basílicas romanas até às góticas, renascentistas, barrocas, modernas e contemporâneas. Esculturas de mármore, de bronze, de madeira. De todas as formas, incluindo o artesanato dos países visitados. Um grande museu era sua casa em La Valetta, na capital maltesa, onde atualmente vivia.
Era fotógrafo de vários periódicos italianos e malteses e filmava iluminuras medievais na Biblioteca do Vaticano, na Biblioteca dei Médici de Florença, na Biblioteca dei Dodgi em Veneza e noutras bibliotecas importantes. Vendia os negativos e os slides dessas iluminuras para editores especializados que ilustram certo tipo de livros com esta arte refinada.
Entramos na catedral. Mostrei-lhe o teste telefônico do som se propagando pela linha polida do mármore. Depois ficou só, extático admirando os Anjos suspensos do teto da abóbada desenhada por Nyemeier. Sentou num banco em reflexão profunda e em seguida levantou-se para deixar o templo.
Cá fora me disse que estava visitando a capital brasileira. Que estava encantado com as primeiras impressões. Via em Brasília uma cidade de luz, um espaço amplo e livre, um céu límpido, um esquema original de cidade.
Perguntou-me o que é que eu lhe indicava como melhor programa para uma estadia de oito dias. Fiquei com certa dificuldade em atender o que me pedia. Por duas razões. A primeira porque sempre é difícil fazer do que você gosta um roteiro para outra pessoa. Segundo, porque para entreter um turista por oito dias em Brasília tem de haver muita imaginação e muita inspiração...
Mas para atender o gentil visitante e sua senhora, me aventurei a dar um primeiro palpite Antes de mais nada, pensei que para restaurantes, shows, cinemas, vida noturna e divertimentos em geral, melhor do que eu, os hotéis poderiam dar informações específicas. Depois pensei no que Brasília me diz e no que as cidade significa para mim. Poderia haver coincidências.Vivo nesta capital há trinta e cinco anos e conheço muita história sobre o cresciumento desta cidade. Por isso, não haveria muito como fugir do esquema habitual de visita desde que fosse proveitoso e válido para eles. Rapidamente me lembrei que é sempre bom aconselhar a fazer uma visita ao Departamento de Turismo local. Habitualmente há uns mapinhas que são oferecidos, umas plantas da cidade, umas indicações para locais de consumo. Não era necessariamente este tipo de turismo que eles certamente buscavam. Mas Brasília é uma cidade geométrica e o que há de mais desagradável é aprisionar o visitante numa torre de hotel de onde ele olha o horizonte sem ver gente e sem sentir as emoções do local onde se encontra.
Fomos conversando sobre gostos. Sempre é possível montar um mapa a partir da imprensa e de algumas publicações da secretaria de cultura. Tudo para manter um turista dentro de um gosto e de escolhas que reflitam a qualidade de vida da cidade. Ainda pensei no roteiro publicado pela revista Veja intitulado “Viver melhor em Brasília”. Poderia ser um tipo de resposta aproximado para sentir melhor a realidade de Brasília. Mas eu não sabia nada sobre os gostos do casal que era bastante jovem ainda. Depois eram pessoas muito treinadas em visitas turísticas pelo mundo. Vinham de Manaus e adoraram a largueza e profundidade dos rios e das florestas amazônicas. Rapidamente percebi que sua mente girava simpaticamente em torno da preservação do Planeta Azul. Eram ecologistas. Aí facilitou. Estavam bem para eles, entre outras coisas prioritárias, uma visita e estadia de uma manhã em plena parque Nacional, na Água mineral, onde poderiam caminhar e nadar na piscina de água corrente. Por sua vez, o parque da Cidade onde há matas de pinheiros mansos, churrasqueiras, ciclovias e piscina de ondas, e o lago onde poderiam alugar um jetski ou serem simplesmente passageiros de um barco turístico, davam um outro bom programa. Depois, em outro dia poderiam tentar uma entrada no Clube de golfe ou alugar um táxi e atravessarem a nova ponte sobre o lago, de Norte para Sul e visitar a ermidinha de Dom Bosco. Noutra oportunidade, poderiam alugar um carro e visitarem o parque de Águas Emendadas acompanhados de um guia turístico. Quanto à cidade monumental, é sempre necessário olhar com olhos de gente grande a Esplanada dos Ministérios, a Praça dos Três Poderes. Aqui é importante descer do carro, usufruir a beleza arquitetônica e paisagística de Nyemeier e Lúcio Costa e aplicar-se à leitura dos textos gravados no mármore no museu de Juscelino. Embeber-se na grandiosidade e profecia dessas palavras poéticas do grande desbravador do Planalto.
Para curtir programas culturais, mostrei que era bom folhear as páginas especiais do Correio Braziliense e do Jornal de Brasília. Não esquecer a Praça do Buriti, o Museu do Índio. No que toca a monumentos, sempre é bom subir na torre de TV, visitar as ermidinhas de Fátima e de Dom Bosco.
Foi tudo o que me lembrei.
Quando nos despedimos, éramos amigos. Eu percebi que passara por Brasília um casal que fazia um turismo de qualidade e eles encontraram um cidadão candango que lhes deu informações que irão lembrar pela vida.

João Ferreira
13 de setembro de 2003
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