Não é só jogo de cena
O que vim fazer aqui:
Vou mostrar não ser pequena
Toda a dor que eu mereci.
Passei uns tempos no Umbral,
Penando feito cachorro.
Foi porque eu fiz o mal
E jamais prestei socorro.
Dia e noite, perseguido,
Nas mãos dos meus inimigos,
Reconheci ter vivido,
Abusando dos perigos.
Entretanto, veio alguém
Que ficou fiel a mim.
Perseguido foi também,
Mas a luta teve fim.
Eu fiquei lá nos escuros,
Sem jamais compreender
Que foi por causa de uns furos
Que dei no meu bem-querer.
Meu companheiro, no entanto,
Pôs-se a trabalhar por mim.
Eu penava, no meu canto,
Num sofrimento sem fim.
Para dizer a verdade,
Julgava o sujeito à-toa:
Ares de grandiosidade
Não produzem coisa boa.
Uma luz então se fez,
No meu cérebro comum:
Era forte a embriaguez,
Mas o bem eu fiz algum.
Foi aí que me lembrei
De minha primeira prece.
Como é bela aquela lei
Que a salvação oferece!
Cria que o mundo não tinha
Nada que não fosse em vão:
Era longa a ladainha
Das dores do coração.
Uma coisa, todavia,
Chamou a minha atenção:
A suave melodia
Da palavrinha “perdão”.
Foi soprada ao meu ouvido,
Em hora de desespero.;
Ganhava agora sentido:
Injustiça era exagero.
Sempre fui eu que pedi
Que os outros me perdoassem:
— “Por isso é que estou aqui:
Eu queria que me amassem.
“Mas eu mesmo jamais dei
A ninguém o meu perdão:
Se existe forte uma lei,
É a da compensação.”
Refletindo dessa forma,
Compreendi ser a tal norma
Dar p ra receber de volta.;
A barba ficou de molho,
Já não mais olho por olho:
Por bem noss’alma se solta.
O meu amigo voltou.
Sinal de que perdoou
Toda minha aleivosia.
Regenerou a carcaça,
Recebeu e deu de graça.
Minha cabeça fervia.
Foi só aí que a memória
Teve seu papel na história
Desta recuperação:
Relembrei o meu momento
De tristeza e encantamento:
Chorei no meu coração.
Já não mais tinha inimigo.;
Ninguém brigava comigo.;
O mundo rodopiava.
Senti que havia sugado
Algum fluido bom, danado:
Meu vulcão não tinha lava.
Termina aqui minha história.
Foi um minuto de glória
A bênção do mediunato.
Os estudos são dever
Que cumpro com bem-querer:
Este trabalho é um fato.
Talvez alguém se interrogue
Como é que, estando eu tão grogue,
Consegui esclarecer-me.
Foi depois de muita luta
(Deu-me o amigo mão batuta)
Que perdi feição de verme.
As idéias são gerais.
Não poderia jamais
Reproduzir toda dor.
Já basta de sofrimento:
É grande o contentamento
De me expandir em amor!
Eis o que me representa
Esta poesia que intenta
Dar exemplo de carinho.
Quem prestou muita atenção
Já guardou no coração
Que o bem se faz de mansinho.
Se aceitar um bom conselho,
Corra p ra diante do espelho
E analise o seu semblante.
Quem estará do outro lado
É alguém apessoado,
Ou tem cara de farsante?
Respondida essa pergunta,
Veja só se ainda assunta
A respeito de quimeras.;
Ou procurará fazer
Todo bem como um dever,
P ra crescer nestas esferas.
Pense, na hora do adeus,
Em dispor, nas mãos de Deus,
Sua alma evoluída.
Serão sublimes os cantos:
Todos os anjos e santos
Exaltarão sua vida
Porém, não morra egoísta,
Querendo que só exista
Felicidade p ra um.
Pense na grande alegria
Que vai dar à confraria,
Com um bem muito incomum.
Sendo assim, você terá
Que resolver, desde já,
Ser fiel a Jesus Cristo,
Estudando a sua lei,
Ajudando a sua grei,
Dizendo: — “Que bom que existo!”.;
Também rezando em secreto,
P ra demonstrar ser discreto
Aos olhos do Criador,
Que, ao ler em seu coração,
Conhecerá a razão
Do esforço de tal amor.
Voltaremos, em seguida,
Para terminar na vida
A conquista da virtude:
Sofrer ainda sofremos,
Porém, mais leves os remos,
Teremos outra atitude.
Queremos deixar escrito
Que o progresso é infinito,
Mas depende só de nós.
Estes amigos do etéreo
Julgam ser problema sério
Não ouvir de Deus a voz.
Fala ela na consciência,
Se não houver resistência
Que se oponha muito louca.
Foi, por isso, que eu fiquei
Lá no Umbral, cumprindo a lei:
Na Terra, eu dormi de touca.
Que mais deverei dizer
Que não seja agradecer
Aos irmãos que me ajudaram:
Um, escrevendo solerte,
Impedindo que me aperte.;
Os demais me sustentaram.
Volto agora ao Criador
Um pensamento de amor
Pelo bem que recebi,
Desejando ao grupo amigo
Que cresça junto comigo,
Nas bênçãos que caem aqui.
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