Inundo a casa de flores.
Coloco flores na sala, na cozinha,
na varanda, no banheiro.
Ainda não tenho flores no quarto,
ainda não inundei a casa por inteiro.
Ainda não consegui fazer florir
as partes íntimas da casa.
Nelas perdura ainda um certo não sorrir.
Não vou ser pessimista e dizer que ainda existe um chorar.
Apenas prevalece uma teimosa insistência em não sorrir.
Estou certa que o quarto também será inundado.
Apenas há alguma dúvida sobre a melhor flor.
Aquela que será mais adequada, que dará o melhor resultado.
Aquela que saberá transformar o não sorrir
num sorriso autêntico, original, escrachado....
assim parecido com a dona do lugar.
Não será tarefa fácil,
como fácil não é aquela que ali habita,
mulherzinha teimosa, por vezes arredia,
quando cisma, é o diabo, convicta,
certeira, determinada, decidida.
Acho que o que complica,
que dificulta a tarefa,
é que a dita dona da casa,
anda ausente, tirou férias, licença...
ou sei lá, anda cumprindo promessa
em algum lugar distante ali nos cômodos da casa.
Difícil trazê-la de volta.
É uma praga de teimosa,
só volta se tem vontade
e só o Homem lá em cima
poderá dizer de verdade
o dia em que a madame irá resolver
habitar seu próprio lugar.
Enquanto isso vou cuidando,
colocando flores aqui e ali, na espera,
de que ela tropece em uma delas e,
quem sabe, por acidente,
olhe em volta e, de repente,
se lembre que aquela é sua casa,
que a casa toda é ela,
que faltam flores no quarto,
que a casa tem que sorrir.
Estou apenas cuidando
enquanto ela não está aqui.
|