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Contos-->A volta -- 05/07/2003 - 16:02 (Clodoaldo Turcato) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Fazem dez anos que ela partiu. Hoje a vi chegar na casa de sua tia, vinda de Nápoles. Aquele dia voltou-me com todas as minúcias.
_ Vou para o convento na Itália - falou sem meias palavras – já comprei as passagens, é primeira classe sabe!
Olhei para ela incrédulo, com a certeza de estar sendo vítima de uma pilhéria.
_ Sério? E a que horas vais embarcar, madre - ironizei, voltando para o conserto de minha cadeira de rodas.
_ Logo cedo; minhas malas estão prontas.
O tom de sua voz me gelou por completo. Será?
No outro dia ela se foi. Acordei com o alvoroço das despedidas embaixo de minha janela. A mãe não conseguia conter as lagrimas; a avó não foi além do primeiro degrau; os demais desejaram boa sorte, etc e tal. Todos lá estavam, exceto eu, que presenciei tudo pela fresta da veneziana, descrente da cena fatídica ante meus olhos.
Ela embarcou no Opala de seu Odorico e sumiu de repente na esquina da Miguel Rufino. Desapareceu assim de minha vida, num simples dobrar de esquinas.
Sua mãe veio mais tarde me entregar uma carta, onde dentre outras explicava os motivos de sua decisão. Ela tentou em vão burlar a verdadeira razão da fuga. Em suas linhas melosas e falsas, escreveu que o chamado para a igreja fora mais forte. Que seu amor por mim, e mesmo que dissessem o contrário, nada tinha a ver com o fato de eu ser deficiente. O tempo em que vivemos juntos fora o mais feliz de sua vida.
Não tive ação alguma. Apenas olhei para minha ex sogra com vontade de descarregar nela minha raiva. E não seria injusto, afinal com toda certeza ela contribui para a “descoberta vocacional” da filha.
O nó trancou a minha garganta e nada saiu, mesmo com a provocação implícita do “até logo e seja feliz” da megera.
Passei alguns dias trancado, sem ver ninguém. Mamãe foi a única a tentar me consolar.
_ Calma filho, ela não prestava mesmo. Todo mundo sabia que ela estava contigo por pena. Eu sei que é duro ouvir isso, assim, mas é a verdade clara e límpida. As mulheres gostam de homens normais, e você assim... sem movimento algum da cintura pra baixo. Uma mulher como aquela não vive sem sexo.
Ela foi cruel. Porém só disse o lógico, aquilo que eu sabia mas me enganava. Conhecia seus anseios, suas vontades e a forma como ela saciava o extremo desejo. Nunca reclamei, nunca exigi que ela me fosse fiel e concordei que se fartasse longe de meus olhos.
Depois da conversa com mamãe entrei em depressão profunda, angariando a pena de todos os meus conhecidos. Alguns meses de isolamento me voltaram à vida, e o trabalho apagou um pouco a imagem desastrosa dela. Quando o ódio tomou conta de mim, busquei na bebida a alegria. Quando o álcool já não deu conta, parti para a cocaína. Ambos não tiraram minha dor, mas me iludiram. Alguns meses mais tarde fui internado num centro de desintoxicação. Foram muitas idas e voltas. Odiei, odiei, odiei tudo. O amor soava com nojo ( ainda hoje o detesto), flores e borboletas... que idiotices. É meu quadro resumido da vida, do amor e tudo contido nele.
O tempo cicatrizou parcialmente a ferida incurável.
Hoje o mesmo alvoroço de uma década retorna, no mesmo lugar. Gritos histéricos da família toda: a freira! a freira! Voltei para a mesma fresta e ela desceu com seu habito branco, angelical. A primeira coisa que vez, antes mesmo dos abraços dos seus, foi olhar para minha janela, procurando-me. Seu rosto é outro, sua silhueta aumentou, juntamente com os cabelos brancos.
Ao ver seus olhos todo meu ódio fora embora. Me veio uma vontade incontrolável de chorar. Odiei todos aqueles anos de autodestruição. Agora lá estava ela, freira. Era verdade.
A tarde ela veio me visitar e ao cruzar o umbral de minha porta jogou-se aos meus pés. Seu rosto estava todo molhado.
_ Me perdoe! Pelo amor de Deus me perdoe!
Nessa hora eu já estava morto.
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