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Artigos-->LEMBRANÇAS DE UM CONTEMPORÂNEO. KLAUS-DIETHER WOLFF -- 23/01/2024 - 12:14 (LUIZ CARLOS LESSA VINHOLES) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

LEMBRANÇAS DE UM CONTEMPORÂNEO

KLAUS-DIETER WOLFF

 

L. C. Vinholes

11.02.2023

 

Falar de um contemporâneo da Escola Livre de Música da Pró-Arte, em São Paulo, depois de décadas de distanciamento em termos de tempo e espaço, não é exercício fácil, mas tampouco impossível. Convivi com Klaus-Dieter Wolff, de fevereiro de 1953 a julho de 1957, datas da minha chegada a São Paulo e estudos com H. J. Koellreuter e de partida para o Japão para usufruir dos benefícios da bolsa oferecida pelo Ministério da Educação japonês, para estudar a música antiga da corte daquele país. Basicamente, Klaus estudava regência com Koellreutter e eu dedicava-me à composição.

 

Klaus tinha 27 anos de idade e eu completaria 20. Foram nossos contemporâneos e discípulos de Koellreutter, entre outros, Roberto Schnorrenberg, compositor e professor de matérias teóricas, Carlos Alberto Pinto Fonseca, Carlos Eduardo Prates, Henrique Gregori, Sandino Hohagen, Munir Bussamra e Isaac Karabtchevsky, todos alunos de regência, tendo como denominador comum a dedicação ao estudo de matérias teóricas e à divulgação da música medieval, renascentista e barroca europeia e a do período colonial brasileiro. Klaus, com privilegiada voz de baixo, estudou com sua genitora Lilly Wolff e Ula Wolff e, como tal, atuou no Collegium Musicum de São Paulo, em 1964.

 

Quando cheguei a São Paulo, Klaus já tinha em seu curriculum, desde novembro de 1951, a vitoriosa e gratificante criação do Conjunto Coral de Câmara de São Paulo e, na minha ausência, enriqueceu seu curriculum como primeiro professor de regência coral do Departamento de Música da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo e como criador do coral de alunos desta instituição; do Coral do Colégio Musical da Faculdade Armando Alvares Penteado; e,  com Gilberto Mendes e Willy Correa de Oliveira, cofundador do Madrigal Ars Viva de Santos. Também na minha ausência obteve prêmios da Comissão Estadual de Música de São Paulo (1959) e da Associação Paulista de Críticos Teatrais (1961, 1966 e 1967). Em 1968, Klaus, como “regente preparador”, teve oportunidade de colaborar com Schnorrenberg na primeira apresentação de Vespro della Beata Vergine, de Claudio Monteverdi, pelo Collegium Musicum de São Paulo.

 

De 24 de outubro a 7 de novembro de 1954, durante o período da nossa convivência, no âmbito das comemorações do IV Centenário de São Paulo, proposto por Koellreutter, diretor da Escola Livre de Música, realizou-se o Festival de Missas, inaugurado no dia 23 daquele mês, com a conferência do diretor, focalizando o conteúdo e a forma das obras a serem executadas. No dia da apresentação de cada missa, foi entregue ao público texto com a biografia do compositor e uma breve análise da obra, texto assinado por Damiano Cozzella, compositor e arranjador, professor da Escola. No Festival, o Madrigal da Escola, sob a regência de Koellreutter, apresentou a Missa de Notre Dame, de Guillaume de Machault; a Missa da Coroação, em dó maior K-115, a cappella, de Wolfgang Amadeus Mozart; a Missa de Igor Stravinsky e, sob a regência de Isaac Karabtchevsky, a Missa Carminum, de Heinrich Isaac. Completaram o programa do Festival a Missa de Tomas Luiz da Vitória, pelo Coral Paulistano regido pelo maestro Miguel Arquerons, e, ainda, a Missa ad Fugam, de Giovanni Pierluigi da Palestrina, com Klaus-Dieter Wolff à frente do seu Conjunto Coral de Câmara, coroando uma exemplar história de três anos de estudos e conquistas.

 

Em Klaus e Koellreutter tive dois amigos com os quais convivi e compartilhei ideias e ideais, acreditando que, mesmo levando em conta suas idiossincrasias, sempre tive a impressão de que, apesar da diferença de idade, vindos de uma Europa conturbada, comportavam-se não apenas com uma cuidadosa disciplina e refinado tratamento, mas também com certo providencial distanciamento dos que com eles conviviam. Cumprindo suas obrigações, eram sempre exigentes profissionais, reservando atenções para seus colaboradores e discípulos. Ambos se entregavam de corpo e alma para aqueles que compartilhavam interesses convergentes e que neles encontravam fonte de saber e possibilidades de crescimento. Prova disto é o fato de que, em abril de 1954, na apresentação da Paixão Segundo São João, de Heinrich Shütz, fui escolhido por Klaus para desempenhar os papeis de Pedro e Pilatus.

 

Numa época em que a correspondência para o Japão levava duas semanas, tentei, na medida do possível, acompanhar as atividades de Klaus, mas, no período de 1969 a 1974, quando vivi em Assunção, nas minhas visitas a São Paulo, nos encontrávamos com frequência. E foi em uma destas visitas que apelei para Klaus me atender em seu consultório odontológico, algo que sempre aconteceu quando morei em São Paulo. Assim como eu, sendo seus privilegiados clientes, outros companheiros da Escola Livre de Música ou do Conjunto Coral de Câmara se valiam de mais esta habilidade do músico-violinista-regente.

 

Mais do que recordar detalhes do tempo fraternalmente compartilhado, creio que o melhor é registrar que, às vésperas de partir para o Japão, onde estava planejado ficar dois anos, deixei aos cuidados de Klaus uma enorme mala de couro com cartas, retratos, livros, métodos e partituras de músicas para flauta, manuscritos de música sacra a capella que compus quando fazia parte do coral da Catedral de Pelotas e tantas coisas mais, do que não mais tenho lembrança. Anos depois, no decorrer da minha segunda estada no Japão, sabendo que havíamos perdido nosso grande amigo, vali-me dos préstimos de Maria de Lourdes Gregori, a Baby irmã de Henrique Gregori, para apanhar a mala que, anos a fio, era guardada em cima do guarda-roupas do quarto de Klaus. A mala não foi encontrada e nem deixou rastro. Ficou apenas a lembrança do amigo com quem, pela música, foi criado o eterno elo de fraternidade.

 

 

 

 

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