O homem que sorria está congelado no desaparecimento.
O seu sorriso de ontem tolo fotografado
Permanece no álbum e acontece em noites de sonho.
Somos um pouco dessa tragédia filosofada,
Aspectos conjecturados, emoldurados e risonhos
Pelos quilômetros de passado de uma vida cismada.
Há o apogeu e o cataclisma, há o aprendizado,
Mas não somos o espírito santo.
Falhamos no trabalho, no amor, na amizade,
Uma falha fagocitosa que vai aumentando
Ao passo que digere o mundo.
Essa falha de dentro é uma falha tão cancerosa
Que a bomba ainda não inventada, portanto, a mais poderosa,
Não possui os megatons dessa falha que transmitimos.
Por isso amamos as mulheres de nossas vidas
E amamos também a mulher desconhecida
E a que conheceremos amanhã,
Na rua, no supermercado, no trem, no trabalho.
Por isso fazemos juras de joelhos a espelhos de felicidade
E trocamos as nossas vidas pela incerteza da miragem.
As conjecturas da miragem nos prometem certezas virtuais
Alimentos vitaminados para a falha engolidora que há em nós.
Por isso foi no tempo o homem que sorria
Múmia retumbante dos tempos de alegria
Homem-elefante mastodonte-alegoria.
A falha é uma ponte do que fomos ao que seremos,
Ela governa a manada danada que vai por aí
Neste instante.
Eu e você, amigo, estamos na manada
E na manada namoramos, casamos, geramos, morremos.
Com a bússola da vida doida nas mãos, seguimos.
A decisão é nossa e a falha está escondida nela,
De apertar ou não o botão da bomba-H
Ou de simplesmente esquecer e ir dormir.
Ontem para sempre se foi, amanhã pode ser ou não ser
Talvez nunca amanhã será.
Nós ficaremos, pode ter certeza, qualquer que seja
O resultado da decisão nobre ou canalha.
Seremos solitários ou amados,
Mas seremos sempre e absolutamente
Seremos sempre e terrivelmente
o resultado da nossa falha.
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