Voltei cansado da vida
Que levei com desrespeito:
A rancores dei guarida,
Guardando-os fundo no peito.
Hoje estou bem mais tranqüilo,
Buscando a felicidade.;
Se tudo fiz porque qui-lo,
Reverencio a verdade.
Ponto importante a cumprir,
Nessa busca do infinito,
É passar ao Wladimir(1)
Este meu primeiro grito.
Sou Jânio da Silva Quadros,
Chegando doutras esferas.;
Fui pintor de muitos quadros
De palhaços e quimeras.
Vivi com Dona Eloá,
Boa amiga e companheira.;
E até do lado de cá
Eu a tenho bem faceira.
Entretanto, ao bom amigo
Que registra a minha voz,
Vou referir-me ao perigo
Que ameaça a todos nós.
Tudo o que for exagero,
Ou nos gestos ou nos atos,
Transforma-se em desespero
Que nos deixa estupefatos.
Passei antes por aqui,
Tendo escrito três quadrinhas:
Parece que consegui
Dar a idéia que são minhas.
Hoje volto remoçado,
Por ter sofrido na vida.
É que fui abençoado
Pela alma arrependida.
Tive algum tempo de sobra,
P ra meditar no passado:
Fui mau, ruim que nem cobra,
Mas não me vi renegado.
Algum bem que desejei
Fazer para a multidão
Foi a prece que rezei,
No fundo do coração.
Dei bom curso à inteligência,
Procurei ser muito honesto.;
Sofri da maledicência
Que dizia que não presto.
Por isso sofro um pouquinho,
Por causa da incompreensão:
Não há rosa sem espinho,
Nem amor sem frustração.
Peço a Deus bem firmemente
Que a humanidade me esqueça.
Eu rezo por essa gente
Sem miolo na cabeça.
Mas há quem vibre por mim:
São companheiros de luta.
Chegaram comigo ao fim
E o meu coração se enluta.
Contudo, nutro a esperança
De abraçá-los algum dia,
Ao final de sua andança,
Em meio a grande alegria.
Nosso médium desconfia
Deste estilo amarfanhado.
Pois não sabe que a poesia
Nos põe um pouco de lado?!...
De qualquer forma as lições
Que preciso ministrar
Se infiltram nos corações
Dos que me vêm apoiar.
Sinto ainda uma fraqueza
A penetrar-me os tecidos:
Trabalhar junto a esta mesa
Tem-me aguçado os sentidos.
Preciso fazer as quadras
De acordo co o compromisso:
Navegante sem esquadras
Não fará jus ao serviço.
Quero pedir ao parceiro
Que destrua a quadra acima,
Pois pretendo estar inteiro
Até mesmo numa rima.
Ou então anote o verso
Por estar comprometido,
Dado que se fez o inverso
Do que pus em seu ouvido.
São cuidados sem sentido
Que me põem muito nervoso.
Noutra era, houvera rido.;
Agora almejo outro gozo.
Já não posso retirar-me,
Sem abraçar este amigo,
Que desejou o desarme
Da prevenção p ra comigo.
Vou chamá-lo de colega,
Por nós sermos professores,
Pois nosso barco navega
Nos mares das mesmas dores.
Sei que fui muito infeliz
Nestas quadrinhas que fiz
Com o coração na mão:
Ainda me recomponho
Daquele pesado sonho
Que me levou de roldão.
Mas bendirei os momentos
Dos meus graves sofrimentos,
Quando me tornei inútil:
Na cadeirinha de rodas,
Vegetal depois das podas,
Senti minha vida fútil.
Hoje, remôo os tormentos
Dos sérios atrevimentos
Que me arruinaram o soma:
Deus é quem nos dá a vida,
Para ser por nós vivida,
No fim, ele no-la toma.
Aí prestamos as contas,
Que já se apresentam prontas,
Sem que possamos mudar.;
E, no fundo da consciência,
Sem alegar inocência,
Nós é que vamos julgar.
A pena que atribuímos,
Se choramos ou se rimos,
Aquela vamos cumprir.
Há um só subterfúgio:
É buscar algum refúgio
Na esperança do devir.;
E fazer algum trabalho,
Mesmo que seja um retalho
Dos grandes feitos de outrora,
Pois é chegado o momento
De mudar o pensamento
E de pôr o mal p ra fora.
Não sei se dei meu recado:
Deixe o meu nome de lado.;
Pense só nos meus ensinos.
A glória é algo que passa,
Deixando muita desgraça:
Por nós ninguém canta hinos.
Vou dizer, com emoção,
Nesta forma de canção,
Que volto regenerado:
Passei horrores no Umbral,
Onde curti todo o mal
Do tempo mal empregado.
É, com suave alegria,
Que componho esta poesia,
Ajudado pelo irmão.
Ser simples eu desejava,
Mas o de que mais cuidava
Visava a dar sensação.
Porém, as dificuldades
Resultaram das maldades
Que encheram meu coração.
Hoje curto o sofrimento
De não ter o pensamento
Conforme minha intenção.
Por isso, o médium não sai
Deste círculo que vai
Fechando-se sobre si,
A demonstrar o egoísmo,
Que se fundia em cinismo,
Nos dias em que vivi.
Vejam só que, finalmente,
Transfiro para o escrevente
O que penso sobre mim.
Se demorar mais pouco,
Acabo ficando louco,
Neste tormento sem fim.
Quero pedir uma prece,
Já que minh alma carece
Do auxílio dos protetores.
Vou pedir, com humildade,
Sufocando a crueldade
Da angústia das minhas dores.
Agradeço ao escrevente,
Por ter sido mui paciente
Com este que sofre tanto,
Pois forneceu-me as palavras
Que permitiram as lavras
Com que compus o meu canto.
Por Deus demonstro ternura
E espero cumprir a jura
Que fiz perante os mortais.
Fui, um dia, presidente,
Mas desgostei tanta gente,
Ao rejeitar os seus ais.
Vou contar, muito em segredo
(Da verdade tenho medo)
Porque foi que fiz aquilo:
É que esperava sair,
Para volver a seguir,
Com o poder mais tranqüilo.
Já chega de “lorotice”:
Tudo isto é esquisitice
De quem se julga escritor.
Digo adeus e vou-me embora,
Já faz tempo deu a hora:
Fiquem só com meu amor.
(1) As três quadras iniciais foram ditadas dois dias antes, em horário inusitado.
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