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Artigos-->O MENINO DE BRANCO -- 22/11/2022 - 16:25 (LUIZ CARLOS LESSA VINHOLES) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

O MENINO DE BRANCO

 

L. C. Vinholes

22.11.2022

 

Nota. Em três folhas de papel desbotado, presas com dois grampos enferrujados, leio a data SP.19-II-56, seguida da minha costumeira assinatura. Não tenho a menor lembrança de ter escrito este texto, mas reconheço os tipos usados como sendo os da máquina de escrever da secretaria da Escola Livre de Música da Pró Arte em São Paulo, por mim usada nos horários fora do expediente. A capital seria São Paulo? O lugarejo de destino seria Teresópolis?

 

 

 

Era formidável ver a alegria e o comportamento do menino de branco, no comboio noturno.

O cabelo bem lambido, a gravatinha um pouco apertada levantando a gola da camisa sem goma, os sapatos marrons e as meias até os joelhos, deixavam-no com um ar importante.

Há poucas horas havíamos deixado a estação.

Com o cair da noite, o balançar dos vagões nos trilhos estreitos e o cansaço do último dia passado na capital, ele não demoraria em descansar no ombro do pai.

Com a janela entreaberta, aproveitando a brisa, eu lia os últimos telegramas com as últimas notícias.

O silêncio foi tomando conta do ambiente, enquanto as vozes não mais se faziam ouvir. O ta-lan ta-lan das rodas nos trilhos, ficou como canto solitário dentro da noite.

Creio que quase todos dormiam.

Com as primeiras luzes da manhã, vimos também as primeiras vistas da vila na qual chegaríamos em breve. A medida em que abriam os olhos, os passageiros iam comendo as bolachas compradas no dia anterior, na última estação. Um que outro trazia maças e peras. Não tardou para que o menino de branco com a roupinha amassada e de camisa aberta, olhasse, sério e meio dormindo, a gare que se aproximava.

Saltamos no pequeno lugarejo e pelas ruas estreitas separamo-nos.

À tarde, depois da hora do café, eu dei uma volta na praça e fui encontrar aquele companheiro de viagem que, reconhecendo-me, esboçou um sorriso.

Sentei-me num banco, com as costas viradas para os balaústres que cercavam o jardim no lado da Matriz, e, disfarçadamente fiquei ouvindo a conversa da pequena trinca ali empoleirada.

- Quando a Matriz fica cheia, nos dias de procissão, tem muito menos gente do que lá. Na beira das calçadas os automóveis atravessados enchiam ruas inteiras. As casas eram tão altas que ..

- Fiquei admirado de como ele narrava tudo que vira. Era criança de, mais ou menos, dez anos, inteligente como poucos da sua idade.

Cada palavra dita fazia abrir-se mais os olhos e as bocas dos que ainda não tinham podido realizar o sonho de visitar a capital.

- Conta outas coisas que você viu – dizia um deles.

- .... Tinha o palhaço vestido de cor e dando risadas, ... um ursinho sentado numa barrica de erva e outro que subia escadas ...

Era o Circo que ele tinha visto.

- Ah! Muito gostoso foi subir num carrinho puxado por correntes até chegar no alto de uma armação muito grande, feita de pau.

- Tinha ido ao parque também.

            – Lá em cima, olhando para baixo, era o mesmo que estar trepado na pontinha daquela árvore ali. Tiraram as correntes e ....

- E o carro caiu?

- Não. Ele foi correndo nos trilhos de ferro, descendo assim, que chegava a fazer frio dentro da gente, subindo um pouquinho e outra vez descendo com força, até o fim que foi tão bom e que durou tão pouco.

- Como se chamava esse trem?

Foi aqui que ficando sem poder responder aos companheiros que o menino de branco chegou junto ao banco onde eu estava. Depois que respondi, ele repetira várias vezes com os companheiros o nome da “montanha russa”. Chegou mesmo a lembrar que no bonde viu falar da “montanha russa” e que seu pai havia mostrado um desenho dela em meia página de jornal.

Notei que todos estavam muito interessados no parque, mas tiveram a atenção grandemente desperta quando falaram naquele carinho engenhoso que motivou a longa conversa que tivemos naquela tarde.

À noite, no hotel onde fiquei hospedado, só alguns passos no corredor que passava junto à porta do quarto, quebravam o silêncio.

Antes de dormir, dei mais uma olhada nos jornais da véspera. Chamou-me a atenção, num canto da página, uma nota que anunciava ter havido um desastre num parque infantil de um país europeu. Mais uma vez lembrei domeu companheiro de viagem e fiquei pensando no desastre .... Cheguei mesmo a fazer ideia de que a notícia omitia a parte onde falava da “montanha russa”. Achei que eram felizes as crianças que ainda não pensavam em ler jornal. Felizes delas que ficam alegres quando são levadas ao parque de diversão. Entretanto, mais felizes bem poderão ser o dia em que souberem o perigo que se encontra de atalaia numa ‘montanha russa”, onde vão muitos outros como o menino de branco.

 

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