Este nosso treinamento
Tem seus altos e seus baixos:
Se hesitamos um momento,
No seguinte, há “encaixos”.
Começamos devagar,
Como sói acontecer.;
Para nós basta rimar,
P ra demonstrar bem-querer.
Eis que já nos espertamos
E os versos saem perfeitos,
Os temas com que sonhamos,
Entretanto, não são feitos.
Quiséramos compreender
O segredo da poesia,
Mas, além desse querer,
Só vamos em romaria...
Um abraço muito amigo,
Naquela hora de pranto,
É bom sentimento antigo,
Fácil de pôr neste canto.
Mas será forjada a rima
E fingido o sentimento.;
Quando se tem grande estima,
Abraço não tem momento.
Um sorriso de alegria
É um reforço da coragem,
Mas, p ra pôr em melodia,
Não vemos grande vantagem.
Falamos duma experiência
Adquirida na vida:
Colocada em evidência,
Torna a alma convencida.
Falar da própria poesia
É quase sempre o assunto
P ra nosso final de dia:
Não nos ofende o bestunto.
Desta forma, vou levando
Nosso treino até o fim.;
Algum trabalho está dando.;
O resultado é chinfrim.
As rimas são repetidas?
Os versos são redondilhas?
As quadras são divertidas?
Oh! Deus meu, que maravilhas!
Entretanto, há um progresso
Que não se pode esconder:
Já temos tido sucesso
Na rapidez do fazer.
É que não chegou a hora
Dum trabalho permanente.;
É a razão desta demora
De se alegrar o escrevente.
Mas não seja ganancioso:
Vá dando corda à paciência.
O que se diz do guloso
É que engorda sem consciência.
Se a poesia é uma charada
Toda feita de mistério,
O limão dá limonada,
Como nós somos do etéreo.
Parece que temos dado
As pistas ao escrevente,
Que nos tem considerado
Bons frutos de má semente.
É bem fácil de escrever
Em sentido figurado,
Pois o que é para dizer
Vai ficando bem de lado.
Para bom entendedor,
Só meia palavra basta.;
Se a poesia está um horror,
É que a ignorância é vasta...
Caprichamos no final,
P ra deixar boa impressão.;
Não está de todo mal:
Já há alguma emoção.
Não se cansa o nosso amigo
De ver as quadras formarem-se.;
Já se torna um vezo antigo
As palavras agruparem-se.
Não se quer uma obra-prima,
Nem muito verso perfeito.;
Alegramo-nos com a rima:
Pareceu-nos grande feito.
Não tem cão? Cace com gato,
Mas não faça espalhafato
P ra caça não ir embora.
Se isto for deprimente,
Queira perdoar a gente,
Mas faça-o sem demora.
Nosso tempo já se acaba,
Nossa imantação desaba,
Chegam ao fim nossos fluidos,
Mas, num último arremesso,
Vamos virar-nos do avesso:
São graves nossos descuidos.
Num esforço de memória,
Revisando a nossa história,
Acendemos uma luz.;
Na hora da despedida,
Pedimos p ra nossa vida
As bênçãos do bom Jesus.
Ao nosso caro escrevente,
Que, pacienciosamente,
Nos aturou de verdade,
Rogamos misericórdia,
Perdoe-nos a mixórdia,
Faça-nos a caridade!
|