Nenhum ser no Universo se perde,
Qualquer dor nos abismos nos une.;
Se a consciência, por culpa, nos pune,
Nosso amor pela vida há quem herde.
Somos muitos no grupo de amigos,
Sempre ativos, dramáticos, sérios,
A tentar resolver os mistérios
Que nos dão infalíveis perigos.
Quando a coorte de antigos parceiros
Se reúne, no etéreo, infeliz,
É que teme não ter companheiros
Que lhe dêem feliz diretriz.
Sinto muito não ter pensamento
Que se ponha bem fácil na linha.;
É que tenho um medo que aninha
E não vem para fora um momento.
Estes versos que lanço na pauta
São quebrados, modestos, chinfrins.;
Gostaria de mesa bem lauta,
A servir anjos bons, querubins.
Certo vou arrastando este tema,
P’ra induzir nosso amigo a escrever.;
Vai treinando esta rima e poema,
Aprendendo de vez o mister.
Cada vez que termino uma quadra,
Sinto a voz da consciência a dizer:
— “Caravana que passa, o cão ladra,
Mas demonstra que tem bem-querer.”
Neste ritmo de verso forçado,
Melodia de pouco valor,
Conseguimos deixar registrado,
Com respeito, este nosso calor.
Se não temos qualquer bom sistema,
P’ra deixar uma quadra perfeita,
Que sigamos em frente no lema
Que é melhor que sofrer de maleita.
Quando tudo parece perdido,
Este verso se faz facilmente,
Nosso ânimo vê soerguido
O desejo de ser eficiente.
Está claro p’ro nosso escrevente
Como é fácil fazer estes versos.;
Basta ser só um pouco valente
E dizer alguns temas perversos.
Vou supor que este dia nos traga
Uma idéia de tudo perdermos.;
Restará nosso amor pela saga
Que perdura, por quanto vivermos.
Muito pouco é preciso fazer
P’ra obter nesta vida sucesso:
Ao sabor especial do querer,
Se acrescente o temor do regresso.
Alguns trancos que tenho sofrido
São só bênçãos de pura emoção,
Pois, de tudo o que tenho, duvido
Que me falte carinho e atenção.
Prevenido ficou o escrevente,
Quando soube que o verso teria
Nove sílabas, pura harmonia,
Pois o treino se faz excelente.
Entretanto, os dizeres atestam
Que não temos bem farta esta mesa.;
Os problemas, deveras, infestam
Nossas quadras, em vez da beleza.
Sofredores, os grupos se afastam,
Temerosos de o dia perder.;
Para mim estes versos me bastam,
Pois é tudo o que sempre quis ter.
Como sei que nem tudo é perfeito,
Que estas rimas se dão descoradas,
Preparei-me, trazendo no peito
A vontade e esta dor preparadas.
Por acaso, esta rima deu certo,
Como fosse trazida por Deus.;
Eis-me aqui, com amor, peito aberto,
P’ra deixar um abraço de adeus.
Ao Senhor solicito paciência,
Porque sei como sou atrasado,
Entretanto, farei diligência,
Para um dia não ser reprovado.
Já não sinto vontade agudíssima
De acertar nestes versos comuns.;
Penso agora em fazer mais alguns,
Com amor e com alma vivíssima.
Eu não sei se terei muito tempo,
Pois a rima p’ra “tempo” é difícil.;
Mesmo assim, sem sofrer contratempo,
O meu alvo eu acerto co’o míssil.
Sacudindo a poeira da estante,
Vou fazendo meus versos fluírem,
Como sei que é p’ra breve esse instante
Que tais gentes, enfim, se retirem.
— “Já não tenho certeza de nada!” —
Diz o pobre infeliz lá no Hades.;
Pois, se fosse melhor na jornada,
Bem teria outra idéia: — “Saudades!”
Pouco a pouco, esta escrita começa
A ficar bem mais fácil de ler,
Mas agora não há que me impeça
Duma prece final eu fazer.
O bom Deus, lá no Céu, me abençoe
E estes versos impróprios perdoe,
Já que o estro que tenho é pequeno.
Ao amigo escrevente, eu lhe peço
Que não tente jamais o sucesso,
Sem manter o seu ser bem sereno.
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