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Contos-->Meia Noite -- 06/09/2000 - 20:42 (Mencio Lopes Vidal) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
MEIA NOITE



Meia-noite. Abaixe o volume da TV da sala, até que você só entenda o que diz o apresentador do telejornal se olhar fixamente para os seus lábios. Caso seja um filme dublado, esqueça. Tente entender a estória pelo contexto. Vá até a cozinha. Abra a geladeira pela décima vez. E mais uma vez desista de pegar alguma coisa. Não vale a pena o trabalho de juntar duas fatias de pão-de-forma com queijo e presunto e pôr para esquentar naquela sanduicheira que aliás está mesmo fora do alcance, dentro do armário atrás de uma dezena de panelas. Por isso, feche a geladeira. Pegue aquele copo em cima da geladeira. O copo tem um cheiro ruim, porque o pano de enxugar a louça tá precisando ser trocado já faz tempo. Vá até o filtro. Esqueça a água gelada. Dói-lhe os dentes, você sabe. Água. Prefira a água. Água é fácil. Não precisa passar margarina, sujar uma faca, usar a sanduicheira que está atrás de uma pilha de panelas de pouco uso, sujar a sanduicheira. Água é fácil. Você põe no copo, bebe, depois põe o copo de volta na bandeja sobre a geladeira. Cobre o copo com aquele paninho cheio de crochê em volta e bordado com algum desenho que você, nem ninguém mais, nunca parou para ver o que era. Olhe pela janela da cozinha, que dá para os fundos de um outro prédio que tem cozinhas e que tem janelas que dão para os fundos. E, como não há nada de interessante prá se ver, volte para a geladeira. Abra a geladeira. O vidro de geléia está vazio. Você já viu o vidro antes. Está vazio a dias, e ninguém toma uma providência. Alguém tem que jogar fora o vidro de geléia. Mas é um vidro bonito. Se lavar pode ser usado para guardar alguma outra coisa. Olhe mais uma vez para o vidro. Limpar resto de geléia dá muito trabalho. Esqueça o vidro. Volte para a sala. Noticiário. Mude o canal. Culto evangélico. Outro canal. Um filme. Aquele sujeito não é aquele que cantava na chuva? De volta ao controle. Outro filme. Tem um cara apontando uma arma para alguém que parece ser o mocinho. O mocinho faz um movimento e, de um só golpe, toma a arma do inimigo e domina a situação. Deve estar terminando. Mude o canal. Entrevista. O entrevistado responde às perguntas com um ar de quem entende do que está falando. O entrevistador parece concordar. Outro canal. Um leão monta sobre uma fêma de sua espécie enquanto uma dublagem em “off” explica o que ele está fazendo. A leoa parece estar gostando. Balança o rabo que varre a terra de alguma savana africana distante, enquanto seu parceiro termina o seu trabalho. Isto lhe lembra, qual é mesmo aquele canal que depois de certa hora passa filme de sacanagem? Procure o guia de programação. Onde está o guia de programação? Porque é que todo mundo tem que mexer no SEU guia de programação? Querem mexer? Então mexam. Mas, pelo amor de Deus, PONHAM DE VOLTA ONDE ENCONTRARAM! Na mesinha do telefone. Nada. Atrás do sofá. Nada. Na estante da sala. Debaixo da mesinha de centro. Atrás da estante. Puta que o pariu! De volta ao controle. Tente aquele canal. Comerciais. Tente outro. Lembre-se de voltar o canal a tempo de ver o nome do filme, que aparece logo depois que termina os comerciais. Novela mexicana. Canal do tempo. Noticiário em espanhol. Noticiário em inglês. Não... peraí. É alemão. Filme. Uma velha, uma garotinha e uma outra que parece ser a mãe da garotinha e filha da velha. Dramalhão americano. Você já viu este filme. Concorreu a 8 oscars e levou 7. Bela merda. Outro canal. Filme de luta made in Hong Kong. Volta para aquele canal, rápido. O filme já começou. Será que já passou o nome? Tem uma dona com um vestido apertadíssimo e um cara que parece usar dentadura. Deve ser este o canal. O clima do filme vai ficando mais tenso. Os dois se olham e, de algum modo a luz ambiente diminui enquanto a música de fundo aumenta de volume até tomar conta da cena. O cara beija o pescoço da dona e a põe sobre uma mesa cheia de papéis e um quebra-luz elegante. O cara sobe o vestido justo da mulher que joga os cabelos para trás afetadamente. Como a leoa, ela também parece estar gostando. Várias câmeras mostram os dois sob diversos ângulos, enquanto a música vai dando ritmo à cena. A dona agora já está só de calcinhas, e os seios enormes parecem ter algum tipo de armação interna de tão rijos. Deve ser silicone. O cara continua se esfregando na mulher, que tem os braços finos e os ombros muito largos. Ela passa as pernas em volta da cintura do sujeito, que agora está só de calças, e ele a carrega com visível dificuldade para o sofá. A música continua. Ele a deita e começa a tirar sua calcinha. Os seios enormes da mulher, achatados pela posição, parecem ainda maiores e a cena muda para um ângulo mais seguro, evitando o nu frontal. A câmera agora está por detrás do sujeito, que está de calças sobre a dona de braços finos e ombros largos. A cena muda para um close dos dois, enquanto a música parece ficar cada vez mais alta. E, num último compasso cheio de violinos em uníssono, a câmera fechando no rosto dos dois, eles param repentinamente atingindo seu auge e terminam a cena num beijo apaixonado. Merda. Não mostrou nem a xoxota da dona! Que merda de filme. O cara transa de calças enquanto a mulher não pára de arrumar os cabelos. É tarde. Tente outro canal. Noticiário. Cadê o MEU guia de filmes???!!!

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