Jane não aguentou. Depois da carta de Herbert falando numa tal Karinana, do Bolshoi, ela entrou em pànico. Seu sonho de viajar a Europa com Herbert mostrando sua arte como estátua de rua, não poderia ser estragado por uma doida branquela sem nenhuma experiência.
Não. Isto Jane não permitiria. A questão era como contar ao pai, cardíaco. Se bem que ele já está muito melhor, parece mesmo recuperado da cirurgia. Criou coragem, tem que ser hoje. É mais ou menos como a eleição do Lula. É agora ou nunca.
− Paiê!!
− Que, minha filha querida?
− Se eu te disser que tomei uma decisão, você me apóia?
− Claro minha filha, eu sempre te apoiei. Por que isto agora?
− Apóia mesmo?
− Claro filha, contando que você não queira fazer alguma dessas loucuras que se vêem por aí. A gente vê cada coisa na rua. Outro dia mesmo passei pelo Conjunto Nacional e vi um grande aglomerado de gente. Na realidade, um círculo de curiosos observando. Naturalmente, fui ver o que era. Não entendi. Tinha um cara deitado no chão com a perna levantada. Dura. Dura e seca. O pessoal ali olhando, nada fazia. O rosto todo pintado de branco e uma roupa dourada, muito estranha. Confesso que não entendi. Não sei se o cara estava passando mal e ninguém o acudia, se ele estava no meio de alguma apresentação, performance como dizem. Sei lá.
− Paiê!!
− Mas sim, minha filha, diga lá. No que você precisa do meu apoio?
− Não pai, não é nada não, depois a gente conversa. Um beijão.
Não foi desta vez que Jane contou ao pai de sua intenção. Mas não mudou de idéia, pretende deixar uma carta explicando tudo. Mais uma semana e ela parte, é só o tempo de separar e aprontar suas fantasias e cenários.
Jane espera levar material para pelo menos três apresentações diferentes. A primeira sobre o penta, dizem que na Europa valorizam muito nosso título. Outra sobre a devastação da Amazónia e uma terceira sobre a poluição dos mares.
Jane sabe das coisas, tem faro para o gosto do público. Vai ser mais uma brasileira cujo sucesso só é reconhecido lá fora.