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Artigos-->Histórico do Direito Processual no Brasil -- 09/01/2020 - 21:53 (gisele leite) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

 

É necessário destacar que com a Independência do Brasil, proclamada em 1822, isso não significou o imediato rompimento com o Direito Português. Ao revés, a lusitana legislação vigorou em tudo que não contrariasse a recente soberania brasileira, o que implicou na adoção das Ordenações Filipinas e, tantas outras leis extravagantes igualmente portuguesas.

 

O Direito Processual Penal oriundo dessas Ordenações era extremamente desumano[1], o que motivou fortemente as primeiras iniciativas legislativas brasileira que se voltaram particularmente para o direito penal e o direito processual.

 

Conforme aludiu Frederico Marques, na seara das instituições processuais civis, a sujeição às formas do direito comum permaneceu intacta até o CPC de 1939.

 

Os demais códigos até a edição do CPC de 1939 eram de caráter estadual e versavam basicamente sobre procedimentos.  As concepções liberais, na época, dominantes já influenciaram as normas da primeira Constituição brasileira de 1824, que estabeleceu preceitos e princípios garantidores de um processo criminal bem diferente daquele descrito nas ordenações lusitanas[2].

 

Já em 1832, dois anos após a edição do Código Criminal do Império[3], quando foi promulgado o Código de Processo Criminal do Império sob inspiração do modelo inglês, de tipo acusatório e, também no modelo francês do tipo inquisitório[4], adotando, um sistema misto.

 

O Código Processo Criminal do Império de 1841 foi alterado pela reforma[5] que visou ampliar os poderes de polícia, impondo retrocesso aos avanços liberais introduzidos em matéria processual, em razão de movimentos revolucionários que assolaram o país.

 

Portanto, em busca de restaurar a ordem criando instrumentos e meios para o governo impor sua autoridade. A reforma introduzida criou o chamado policialismo judiciário[6], confiando às autoridades policiais funções judiciais.

 

O retrocesso deu-se, particularmente, em relação à estrutura e organização judiciária, mas não, em matéria procedimental. Tendo a orientação liberal sido, no entanto, em 1871 quando a Justiça se separou da Polícia e, se criou, então, o inquérito policial[7].

 

O inquérito policial pode começar, a saber: de ofício, por portaria ou auto de prisão em flagrante; requisição do Ministério Público ou do Juiz; por requerimento da vítima; mediante representação do ofendido.

 

O inquérito policial é:

Discricionário: a polícia tem a faculdade de operar ou deixar de operar dentro de um campo limitado pelo direito. Por isso, é lícito à autoridade policial deferir ou indeferir qualquer pedido de prova feito pelo indiciado ou pelo ofendido (art. 14/CPP), não estando sujeita a autoridade policial à suspeição (art. 107/CPP). O ato de polícia é autoexecutável, pois independe de prévia autorização do Poder Judiciário para a sua concretização jurídico-material.

 

Escrito: porque é destinado ao fornecimento de elementos ao titular da ação penal. Todas as peças do inquérito serão, em um só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade (art. 9º /CPP).

 

Sigiloso: pois só assim a autoridade policial pode providenciar as diligências necessárias para a completa elucidação do fato sem que lhe seja posto empecilhos para impedir ou dificultar a colheita de informações, com ocultação ou destruição de provas, influência sobre testemunhas etc. Por isso, dispõe a lei que "a autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade" (art. 20/CPP). Tal sigilo não se estende ao Ministério Público, que pode acompanhar os atos investigatórios, nem ao Poder Judiciário.

 

O advogado só pode ter acesso ao inquérito policial quando possua legimitatio ad procedimentum e, decretado o sigilo, em segredo de Justiça, não está autorizada sua presença a atos procedimentais, diante do princípio da inquisitoriedade que norteia nosso Código de Processo Penal quanto à investigação.

 

Pode, porém, manusear e consultar os autos findos ou em andamento (art. 7º, XIII e XIV, do EOAB). Diante do art. 5º, LXIII, da CF, que assegura ao preso a assistência de advogado, não há dúvida que poderá o advogado, ao menos nessa hipótese, não só consultar os autos de inquérito policial, mas também tomar as medidas pertinentes em benefício do indiciado.

 

Com a edição da Súmula vinculante nº 14[8], garantiu-se ao advogado o amplo acesso aos elementos de prova colhidos durante o procedimento investigatório, desde que já documentados, a fim de que o seu representado possa exercer seu direito de defesa.

 

Indisponível: porque uma vez instaurado regularmente, em qualquer hipótese, não poderá a autoridade arquivar os autos (art. 17/CPP).

 

Obrigatório: na hipótese de crime apurável mediante ação penal pública incondicionada, a autoridade deverá instaurá-lo de ofício, assim que tenha notícia da prática da infração (art. 5º, I, do CPP).

 

Salvo exceções legais, a competência para presidir o inquérito policial é deferida, em termos constitucionais, aos delegados de polícia de carreira (autoridade policial), de acordo com as normas de organização policial dos Estados.

 

Como instrução provisória, de caráter inquisitivo, o inquérito policial tem valor informativo para instauração da competente ação penal. Entretanto, nele se realizam certas provas periciais que contém maior dose de veracidade, porque são baseadas em fatores de ordem técnica. Nessas circunstâncias, têm igual valor a das provas colhidas em juízo.

 

O conteúdo do inquérito, tendo por finalidade fornecer ao detentor do direito de ação os elementos necessários para a propositura de ação penal, não deixa de influir no espírito do juiz na formação de seu livre convencimento para o julgamento da causa.

 

Não se pode, porém, fundamentar uma decisão condenatória apoiada exclusivamente no inquérito policial, o que contraria o princípio constitucional do contraditório, que não existe no inquérito.

 

Sendo o inquérito mero procedimento informativo, os seus possíveis vícios não afetam a ação penal a que deu origem. A desobediência às formalidades legais pode acarretar a ineficácia do ato em si (relaxamento de prisão em flagrante, por exemplo), mas não influi na ação já iniciada, com denúncia recebida. Porém, tais irregularidades diminuem o valor dos atos a que se refiram, merecendo consideração no exame do mérito da causa.

 

Recorde-se que o processo civil conforme disciplinado na legislação portuguesa assumida durante o Império possuía fases nitidamente distintas e seu procedimento adotava a forma escrita, sendo movimentada pelo impulso dos jurisdicionados e dominado pelo princípio do dispositivo.

 

O Código de Processo Penal do Império brasileiro de 1832 além de tratamento específico dado a essa matéria, trouxe, também, em seu conteúdo um conjunto de normas chamado de “Disposição provisória” acerca da administração da justiça civil, que simplificou o procedimento, extinguiu formalidades e eliminou recursos desnecessários na área do processo civil.

 

Já a alteração de 1841 no CPP do Império modificou uma disposição provisória impondo retrocessos. Já em 1850 com a edição do Código Comercial quando editado o Regulamento 737 que era destinado a determinar à ordem do juízo no processo comercial.

 

E, por força do mesmo diploma legal se restaurou a orientação liberal do processo penal por força da Consolidação das Leis do Processo Civil que passou a ter força de lei em 1876. O responsável por essa Consolidação foi o Conselheiro Antônio Joaquim Ribas[9].

 

A legislação processual da república brasileira trouxe uma série de alterações em matéria de Direito Processual. Sendo a primeira em 1890, foi estender às causas cíveis como regra geral, a aplicação do Regulamento 737/1850.

 

Segundo Frederico Marques foi através deste que o direito comum se infiltrou na legislação processual da República. A guisa do tema mencionou in litteris: “É o tão louvado regulamento um diploma legal que bem retrata a incultura processual em que nos mantinha o praxismo então vigente. O pior é que a ele, nos mantivemos presos durante toda a fase legislativa da República, pois, os códigos estaduais e as leis da União se mostraram incapazes de se libertarem do jugo secular do ronceiro processo comum que Portugal nos legou.” (In: Manual de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 1990, v. I, p.116).

 

No ano de 1890 também foi instituída e organizada a Justiça Federal brasileira. Com a primeira constituição republicana de 1891 deu-se grande destaque ao Judiciário dentro da estrutura estatal, adotando o controle jurisdicional da constitucionalidade das leis.

 

No que tange ao processo penal além de revigorar as garantias processuais já existentes, alavancou os habeas corpus à garantia constitucional, conferindo-lhe amplitude até então desconhecida e também manteve a instituição do júri[10].

 

Ainda consagrou a dualidade de justiças e de processos. E, em razão disso, passou-se a ter uma legislação processual nacional aplicável na Justiça Federal e, as legislações processuais estaduais que eram aplicáveis nas respectivas justiças dos Estados-Membros.

 

A principal legislação federal da república brasileira em processo foi a Consolidação das Leis referentes à Justiça Federal, de 1898 que foi preparada por José Higino Duarte Pereira[11].

 

No que se refere aos Estados-Membros, a grande maioria destes elaborou suas leis processuais, tendo por base e fundamento o Regulamento 737/1850[12]. Dessa forma, perpetuou-se o antigo direito processual da época do Império.

 

Representou a Revolução de 1930 um inicial marco para obrar profundas modificações no direito processual apesar de ter inicialmente ter mantido o regime pluralista em matéria de legislação processual.


E com advento da Constituição Federal brasileira de 1934[13] restabeleceu-se a competência da União para legislar em matéria de Direito Processual, mantendo-se assim, no entanto, a dualidade de justiças ordinárias e a competência dos Estados-membros para legislar sobre suas divisões e organização judiciária.

 

Em 1936 fora promulgada a primeira lei processual de âmbito federal no Brasil, regulando os recursos sobre as decisões finais das Cortes de Apelação e de suas Câmaras cujo número elevara-se para trezentos e dezenove.

 

No que se refere ao processo penal foi o Decreto 167/1938 que instituiu o júri, o primeiro diploma legal elaborado para todo o Brasil, após a extinção do pluralismo processual.

 

Finalmente, com o advento do Estado Novo[14] restou suprimida a dualidade de justiças ordinárias com a extinção da justiça federal. A Constituição brasileira de 1937, de índole extremamente centralizadora não aduziu grandes transformações em matéria processual. E foi exatamente nesse período que foram elaborados os Códigos de Direito Processual Civil e Direito Penal.

 

O Código de Processo Civil de 1939 teve seu projeto elaborado por Pedro Batista Martins. Em 1941 foi editado o Código de Processo Penal brasileiro cujo projeto idealizado por Vieira Braga, Nelson Hungria, Narcélio de Queirós, Roberto Lyra e Cândido Mendes[15].

 

Com a edição de tais códigos, nosso país deixa embora não totalmente o sistema processual que herdamos da colonização portuguesa e dos arcaicos procedimentos do processo comum. Deu-se também a unificação federativa dos direitos processuais, extinguindo o pluralismo legislativo, fruto da primeira república brasileira.

 

Uma lembrança censurável desse período em matéria processual ficou devido à legislação especial para repressão de crimes políticos[16] (de 1937-1938) quando se criou e organizou o Tribunal de Segurança e esquadrinhou-se um procedimento inquisitivo sem garantias. Era iníquo, policialesco e reacionário em termos de matéria processual penal[17].

 

Com a Constituição brasileira de 1946 preservou-se o unitarismo legislativo em matéria processual da acusatoriedade, do contraditório, do devido processo legal e do juiz natural. Igualmente manteve o habeas corpus e restaurou a soberania do júri.

 

Com o Golpe de Estado de 1964[18] surgiram diversas alterações na matéria processual especialmente em decorrência dos Atos Institucionais (AIs).

 

Destaque-se que o Ato Institucional nº 1[19] suspendeu, por seis meses, a garantia de vitaliciedade da magistratura, o que feriu de morte a garantia do acusado de ter direito de ser julgado por tribunal independente.

 

O AI-2[20] manteve tal suspensão por tempo indeterminado e alterou a estrutura do Judiciário e restaurou a Justiça Federal de primeira instância, posicionando-a como órgão especial da Justiça comum.

 

A Constituição Federal brasileira de 1967 e a Emenda Constitucional nº1/1969 não alteraram as garantias processuais, já constantes na Constituição brasileira de 1946.

 

Porém, o AI-5[21] além de manter suspenso as garantias do Judiciário, autorizou o confisco de bens e limitou o uso de habeas corpus, suspendendo-o para os crimes políticos e contra segurança nacional, a ordem econômica e social e, ainda, os crimes contra a economia popular.

 

A EC 16/1997[22] ampliou tais restrições e ainda imprimiu novas formas de controle jurisdicional da constitucional das leis. No que tange aos Códigos Processuais em face da necessidade de atualização houve a nomeação dos professores José Frederico Marques[23] e Alfredo Buzaid para a elaboração dos respectivos projetos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

[1] O Livro V das Ordenações Filipinas era o diploma penal que vigorou por maior tempo em nosso país, alcançando mais de duzentos e vinte anos, já que após a promulgação definitiva e entrada em vigor através da Lei de 11 de janeiro de 1603 deixou o ordenamento jurídico somente no ano de 1830, quando então adveio o Código Criminal do Império. A instituição de severos castigos impostos era com o objetivo conter o homem através do terror, sendo marcado por peculiar desproporcionalidade da pena e o crime cometido.

As penas eram demasiadamente duras e, frequentemente eram impostas a pena de morte. Aliás, o referido Livro V foi marcado por extrema arbitrariedade e, ainda, pela ausência de técnica na redação dos delitos, pela crueldade das penas impostas, mas refletindo em verdade o momento histórico em que a legislação foi concebida. Existiam diversas penas de morte cruéis no LIVRO V entre estas merece destaque: Morte cruel: considerada a pior de todas. Todos os tipos de tormentos eram impostos. Morte mediante tortura; Morte atroz: acrescimento à morte de alguma outra pena como queima do cadáver, confisco dos bens, esquartejamento; Morte simples: sem tortura; Morte natural: sentença mediante enforcamento; Morte natural para sempre: Além de enforcado, o cadáver ficava exposto até que apodrecesse na forca; Crime de lesa-majestade: Destinado a provocar pavor  expressão castigo exemplar” – aplicada penas excessivamente cruéis contra crimes cometidos  contra o Rei ou Estado.

[2] O Livro V das Ordenações Filipinas que previa uma série de penas: 1. perda e confisco dos bens e multas; 2. prisão simples e prisão com trabalhos forçados; 3. galés temporárias ou perpétuas; 4. desterro (condenação a deixar o local do crime); 5. degredo (condenação de residência obrigatória em certo lugar); 6. banimento ou exílio (degredo perpétuo); 7. os açoites, a decepação do membro e as várias formas de pena de morte vistas acima. Aqueles que gozassem de determinados privilégios (privilégios de fidalguia, de cavalaria, de doutorado em cânones ou leis, ou medicina, os juízes e vereadores) não poderiam ser submetidos a penas infamantes. Na pratica representava que as “penas duras” eram aplicadas somente a pobres, sem instrução, sem pertencimento às famílias importantes, vide o caso Tiradentes.

[3] Com o CÓDIGO CRIMINAL DE 1830 passou a haver: proporcionalidade entre o crime e a pena; a pena passou a ser exclusiva do condenado, não poderia ultrapassar ao infrator, não podendo ser estendida aos seus familiares; houve uma maior humanização da pena de morte, sem a tortura;  proibição das penas cruéis, sem enforcamentos e decapitações, etc. Porém, vemos uma persistência de algumas das penas das Ordenações Filipinas como degredo, banimento, galés, multas, privação dos direitos políticos, desterro (exílio)e, etc...

[4] O Livro V das Ordenações Filipinas com todo despotismo e beatice próprios da cultura lusitana arcaica onde a misoginia e o androcentrismo eram assumidos claramente. E, durante o Santo Ofício, que era uma instituição estatal na época, o rei designava o inquisidor. E, as fórmulas inquisitórias para a obtenção da verdade eram comuns as delações premiadas, onde para o delator caberia parte das multas cobradas, quando componentes das horríveis penas que então se aplicavam. Aliás, ocorreu o mesmo com os delatores da inconfidência que forjaram uma tábua de salvação, dizendo tudo o que fosse preciso, e tudo quanto inocentasse, portanto, a verdade era mera conveniência. A delação, nos crimes contra a moral da época, era a fórmula de expiação de pecados e de prevenção de reprimendas. O Título XXX do Livro V das mesmas Ordenações tratava as barregãs dos clérigos, ou seja, as amantes e amancebadas com eclesiásticos de forma muito dura. De sorte que o tipo criminal exigia que o eclesiástico fosse visto por seis meses contínuos, por sete ou oito vezes, frequentando a casa da mulher que a comunidade então entendia como a amante do clérigo.

A mulher era então sentenciada a pagar a pena de dois mil réis, bem como era degredada, por um ano, para qualquer ponto em Portugal, desde que fora dos limites da cidade, onde o crime ou pecado ocorrera. Se reincidisse, pagaria novamente 2 mil réis, e o degredo, por igual período, um ano, era fixado para fora do bispado. Além do que, a mulher seria açoitada em praça pública. Uma segunda reincidência teria como pena o degredo perpétuo, para o Brasil. Provado que a mulher era “manceba teúda e manteúda notoriamente” na casa do eclesiástico, apenava-se com o açoite público, com o degredo para fora do bispado e com o pagamento de uma pena pecuniária, livremente fixada pelo julgador. No Título XXXI do mesmo Livro V das Ordenações Filipinas, determinava-se que frades encontrados na companhia de mulheres deveriam ser entregues aos respectivos superiores; não poderiam ser presos, em nenhuma hipótese.

[5] A reforma do Código de Processo Criminal brasileiro fora finalmente sancionada após a  abdicação de Dom Pedro I, em 29 de novembro de 1832 e ofereceu maior autonomia aos proprietários rurais das províncias brasileiras, que passaram a ter o poder de escolher seus representantes políticos e os juízes de paz, que representavam a autoridade judiciária dos municípios.

[6] O modelo instituído em 1832 “era uma organização em que a autoridade se fragmentava, dividida por quantos juízes de paz”, e, nesse sentido, o governo “não valia mais que uma sombra.”  Tarquínio de Souza estava convencido de que a estabilidade política alcançada durante o  Segundo Reinado foi possível graças à reforma de 1841, pois a ordem pública dependia do  exercício de autoridades investidas de poder pelo Imperador: “Nos dias tormentosos da Regência, o Código de 1832 fez a sua prova e a convicção que se formou em toda a gente de bom senso foi que era necessário dar ao governo meios de melhor resguardar a ordem pública, acabando com a intranquilidade, insegurança e afrouxamento exagerado de qualquer disciplina, o estado de desordem permanente que se implantara. A reação contra o judiciarismo policial dos liberais de 1832, com as funções policiais entregues a juízes de paz eletivos, foi certamente excessiva com a inversão operada – o policialismo judiciário, confiadas às autoridades policiais funções nitidamente judiciárias. Mas sem a lei de 3 de dezembro (1841), o país não se livraria da anarquia e não teria logrado a estabilidade que caracterizou o longo período do segundo reinado”. (Apud TORRES, João Camilo de Oliveira. A democracia coroada. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 1964.)

[7] O inquérito policial é um procedimento administrativo informativo, destinado a apurar a existência de infração penal e sua autoria, a fim de que o titular da ação penal disponha de elementos suficientes para promovê-la. Trata-se de uma instrução provisória, preparatória e informativa, em que se colhem elementos por vezes difíceis de obter na instrução judiciária, como auto de flagrante, exames periciais, entre outros. Seu destinatário imediato é o Ministério Público (nos crimes de ação penal pública) ou o ofendido (nos crimes de ação penal privada), que com ele formam a sua opinio delicti para a propositura da denúncia ou queixa. 

Por outro lado, o inquérito tem como destinatário mediato o Juiz, que nele também pode encontrar fundamentos para julgar. Diz o artigo 12 do Código de Processo Penal: "o inquérito policial acompanhará a denúncia ou queixa, sempre que servir de base a uma ou outra". Deste dispositivo deduz-se que o inquérito não é indispensável para o oferecimento da denúncia ou da queixa. Além disso, o artigo 39, § 5º e 46, § 1º, do mesmo codex, acentua que o órgão do MP pode dispensar o inquérito. Por isso, tem-se decidido que, tendo o titular da ação penal os elementos necessários para o oferecimento da denúncia ou queixa, o inquérito é perfeitamente dispensável.

[8] "É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa."

Lutar pelo respeito aos direitos e às garantias constitucionais é dever do advogado que assumiu a defesa criminal, valendo lembrar que "Nenhum receio de desagradar a magistrado ou a qualquer autoridade, nem de incorrer em impopularidade, deve deter o advogado no exercício da profissão" (art. 31, § 2º, da Lei Federal 8.906/1994).

[9] Antônio Joaquim Ribas (Rio de Janeiro, 23 de maio de 1818 — Petrópolis, 22 de fevereiro de 1890) foi um professor, advogado e político brasileiro. Originalmente chamado de Simplício e filho de Antônio Joaquim de Macedo e de Maria Prudência Ribas, troca seu nome para Antônio Joaquim por ocasião da sua crisma, com o intuito de homenagear o seu pai. Formado pela Faculdade de Direito de São Paulo em 1840, ali ingressou como professor, lecionando aulas de história, economia política, direito administrativo, direito público, direito civil e direito eclesiástico. Foi deputado provincial em várias legislaturas, desde 1849 até mudar-se para o Rio de Janeiro, onde passou a exercer a função de advogado. Escreveu diversas obras sobre Direito. Agraciado comendador da Imperial Ordem de Cristo. Em 1871, o Governo Imperial brasileiro incumbe Antonio Joaquim Ribas de reunir e compilar toda a legislação existente no Brasil referente ao processo civil. Por meio de Resolução Imperial de 28 de dezembro de 1876 concede-se força de lei à chamada Consolidação das Leis do Processo Civil do Conselheiro Ribas. Volta a integrar uma comissão para avaliação de projeto de Código Civil, desta vez em 1881, quando da apresentação do trabalho inicial de Felício dos Santos. Desta vez, atua ao lado, dentre outros, de Lafayette Rodrigues Pereira.

A Comissão rejeita os apontamentos de Felício dos Santos, mas continua os seus trabalhos. Conselheiras Ribas, entretanto, abandona a comissão em 1883. Nesse período de sua vida, o Conselheiro Ribas já está de volta ao Rio de Janeiro, exercendo a advocacia. Antônio Joaquim Ribas vem a falecer em 22 de fevereiro de 1890, em Petrópolis. Pode-se dizer que o Conselheiro Ribas foi não apenas um pioneiro da civilística brasileira, como um estudioso de primeira grandeza. Sua formação primorosa, com o domínio de diversas línguas estrangeiras, proporcionou a ele o cabedal necessário para estudar e dominar os principais desenvolvimentos da ciência jurídica de sua época. Foi um percussor da Escola Histórica de Hugo e Savigny no país, tendo neste último o seu grande modelo. No seu famoso "Curso de Direito civil brasileiro" o maior número de citações pertence a Savigny. Assim como o jurista alemão, que sistematizou o direito romano com base nos preceitos da Escola Histórica, o Conselheiro Ribas o faz com a parte geral do direito civil brasileiro. Além disso, em sua obra "Da Posse e das Ações Possessórias", o autor recepciona amplamente a famosa tese de Savigny sobre a posse, ressalvando, entretanto, as particularidades do direito brasileiro, como ele próprio aponta no prefácio do seu livro.

[10] O Tribunal do Júri, desde sua inserção na sistemática legal brasileira, tem evoluído e se amoldado aos regimes políticos, e pela soberania dos veredictos, assegurada pela Constituição de 1988, é tido por muitos doutrinadores como um instituto imprescindível à consagração da democracia, pois além de ser um instituto jurídico, é também um instrumento político, pois retirou das mãos dos monarcas o poder soberano de decidir e julgar, compartilhando com cidadãos comuns, em determinados casos previstos em lei, o julgamento e a aplicação das leis. O instituto é, pois, a expressão da cultura de um povo, o que implica dizer que o legislador constituinte reconheceu no Júri a consagração do direito de liberdade do cidadão, bem como o exercício da democracia.

[11] José Higino Duarte Pereira (Recife, 22 de janeiro de 1847 — Cidade do México, 10 de dezembro de 1901) foi um advogado, político, professor, magistrado, historiador, escritor e tradutor brasileiro. Republicano, elegeu-se membro da Constituinte Republicana de 1890-1891, e foi lembrada na votação da primeira eleição presidencial, realizada pelo Congresso Constituinte. Foi ministro interino da Justiça e dos Negócios Interiores, durante o ano de 1892, na presidência de Floriano Peixoto. Integrou o Supremo Tribunal Federal até 1897. Como historiador e escritor, abordou a ocupação holandesa no Brasil, tendo viajado à Holanda, de onde trouxe cópias de alentado acervo de documentos sobre João Maurício de Nassau e a ocupação holandesa no nordeste do Brasil, tendo para isso pesquisado museus, institutos históricos, cartórios e outros órgãos onde poderiam ser encontrados documentos relativos à invasão do nordeste brasileiro. O bom domínio que tinha do idioma alemão e dos diversos dialetos regionais dos Países Baixos lhe facilitava nas suas pesquisas. Também foi membro da Academia Pernambucana de Letras. Verteu para o português da sétima edição alemã o importante Tratado de direito penal de Franz Von Liszt, escrevendo, ainda, um famoso prefácio à edição brasileira, publicada em 1899. Este Tratado que ainda hoje é lido, estudado e citado, foi traduzido para vários idiomas. Os brasileiros podem orgulhar-se de ter a primazia no rol dessas traduções graças ao trabalho do ilustre sábio da Faculdade do Recife. Foi comendador da Imperial Ordem da Rosa apesar de antimonarquista. Faleceu quando participava, representando o Brasil, no Congresso Pan-americano realizado no México. Foi sepultado no Cemitério São João Batista no Rio de Janeiro.

 

[12] A primeira parte, sobre o processo comercial possuía 08 títulos relativos ao juízo comercial: legislação comercial (tribunais e juízes, jurisdição em razão de pessoas e atos, voluntária e administrativa); á ordem do juízo (da conciliação, citação, foro competente, ação ordinária, exceções, contestação, reconvenção, autoria, oposição, assistência, dilação de provas, instrumentos, confissão, juramento supletório, testemunhas, presunção, arbitramento, depoimento da parte, vistoria, prova dos usos comerciais e costumes, alegações finais e sentença definitiva); às ações sumárias; às ações especiais; às ações executivas; das coisas comuns às ações sumárias e executivas; dos processos preparatórios, preventivos e incidentes; do juízo arbitral. A segunda parte é destinada a execução, em seis títulos, sobre o início da execução (da extração da sentença e do juiz e partes competentes) as sentenças ilíquidas, sentenças líquidas (da nomeação, penhora, avaliação, editais e pregões, arrematação e adjudicação); às sentenças sobre ação real, coisa certa ou em espécie; aos embargos (do executado e de terceiros); e às preferências. A terceira parte abrangia os dois títulos sobre os recursos (embargos, apelações, revista e agravos) e as nulidades (do processo, da sentença e dos contratos comerciais). As disposições gerais estavam dispostas em quarenta e oito artigos considerando como subsidiário o processo civil e criminal. O Regulamento 737 representa o marco da história do processo civil no período Brasil-império, eis que se manteve vigente até após a República (grifo nosso), tendo influenciado diretamente os Códigos Estaduais da Federação. Oportuno salientarmos que na época em que fora redigido o Regulamento 737 ainda não haviam sido lançadas as clássicas doutrinas processuais, especialmente o livro de Oscar Büllow, “Teoria dos pressupostos processuais e das exceções dilatórias”, tido como a primeira obra sobre processo civil, que só foi publicado em 1868. Na referida obra Büllow observou a existência de dois planos de relações: o direito material e processual. Identificou e dividiu a relação jurídica processual em três aspectos: a) os sujeitos (autor – réu – juiz); b) objeto da prestação jurisdicional; e, c) os pressupostos processuais, demonstrando, portanto, a autonomia do processo em relação ao direito material.

[13] Diante da ineficiência da divisão de competências legislativas sobre processo entre União e Estados, a Constituição de 1934 atribuiu primordialmente à União e supletivamente aos Estados a competência para legislar sobre matéria processual. Em 1937, o Governo nomeou uma comissão para a elaboração do Código Nacional de Processo Civil. Os trabalhos, contudo, não prosseguiram pela existência de divergências internas na comissão. Um de seus membros, Pedro Batista Martins, elaborou um projeto que foi transformado em lei pelo Governo através do Decreto-Lei n. 1.608, de 1939.  O então novo Código trazia uma parte geral moderna ao mesmo tempo em que continha uma parte especial antiquada.

[14] Estado Novo ou Terceira República Brasileira corresponde ao regime político brasileiro instaurado por Getúlio Vargas em 10 de novembro de 1937 e que vigorou até 31 de janeiro de 1946. Foi caracterizado pela centralização do poder, nacionalismo extremado, anticomunismo e, ainda, por seu autoritarismo. É parte do período da história do Brasil conhecido como Era Vargas. Em 1937 através de um Golpe de Estado, Vargas instituiu o Estado Novo em um pronunciamento em rede de rádio, no qual lançou “Manifesto à Nação”, no qual afirmava que o regime tinha como fim reajustar o organismo político às necessidades econômicas do país. Depois da Constituição brasileira de 1937, Vargas consolidou seu poder. E, implementou a censura à imprensa e a propaganda que era coordenada pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). Houve igualmente forte repressão ao comunismo particularmente amparada pela Lei de Segurança Nacional que impedira os movimentos revolucionários, tal como a Intentona Comunista de 1935, durante todo o período. O Estado Novo também foi considerado mais tardiamente como um precursor da ditadura militar no Brasil, que teve início com o Golpe de 1964, apesar de existirem várias diferenças entre os dois regimes.

[15] Cândido Mendes de Almeida (1818-1881) foi advogado, jornalista e político brasileiro, tendo sido deputado geral em cinco legislaturas e senador do Império do Brasil de 1871 até 1881, pelo Estado do Maranhão, condecorado como comendador da Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa e da Ordem de São Gregório Magno e oficial da Ordem da Rosa. Candido Mendes casou-se com Rosalina Ribeiro Campos, com quem teve dois filhos: o jornalista e senador Fernando Mendes de Almeida (1845 — c. 1921) e o jurista e professor Candido Mendes de Almeida Filho (1866 – 1939).  Também são seus descendentes, o político e escritor Candido Mendes de Almeida Júnior (morto em 1962), o bispo D. Luciano Mendes de Almeida (1930 — 2006), ex-presidente da CNBB, e o jurista Candido Antônio José Francisco Mendes de Almeida (1928), reitor da Universidade Candido Mendes.  O cardiologista Domingos Martins Costa (1851 — 1891) era seu primo em segundo grau. Em Brejo (Maranhão) na cidade em que nasceu, existe um colégio do ensino Médio chamado "Centro Ensino Cândido Mendes" em sua homenagem.

[16] De acordo com Fernando Capez: “O conceito de crime político abrange não só os crimes de motivação política (aspecto subjetivo) como os que ofendem a estrutura política do Estado e os direitos políticos individuais (aspecto objetivo)”. Há divergência doutrinária quanto à aplicação da reincidência entre as justiças especiais. Há os que entendem que entre os crimes políticos estão incluídos os crimes eleitorais, quanto a estes por expressa disposição do artigo 287 do Código Eleitoral (Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965): "Aplicam-se aos fatos incriminados nesta Lei as regras gerais do Código Penal."

[17] Para Celso Delmanto: O crime político, contra a Segurança Nacional, pois, pode ser de dois tipos: Crime político próprio: é o de opinião - deliberada, isto é, aquele que causa ameaça à ordem institucional ou ao sistema vigente, um discurso inflamado de um "líder" (por exemplo), e/ou que procura a chamada liderança (por exemplo, por meios não oficiais, em um momento histórico, determinado no tempo histórico). Crime político impróprio: é o crime comum conexo ao delito político, ou seja, um crime de natureza comum, porém dotado de conotação político-ideológica. Por exemplo: ato de guerrilha (conceito de "Pequena Guerra", ou seja, e/ou que poderia ser simplesmente), no ato de assaltar e/ou simplesmente participar e/ou colaborar no assalto de um banco para obter fundos para determinado grupo político constitui crime político impróprio - perfeito e característico de delito, princípio esse aceito pelo chamado "Tribunal Internacional de Direito".

Os crimes políticos próprios "somente lesam ou põem em risco a organização política", ao passo que os impróprios "também ofendem outros interesses além da organização política".

 

[18] O referido evento designa o conjunto de fatos ocorridos em 31 de março de 1964 no Brasil, que culminaram no primeiro de abril de 1964, um golpe militar que encerrou o governo democraticamente eleito que era o sr. João Goulart, igualmente conhecido como Jango. O golpe levou à deposição de João Goulart e fez se instalar no país uma ditadura militar que durou até o ano de 1985. Apesar de ter ocorrido no ano de 1964, o golpe passou a ser desenhado desde as primeiras medidas de João Goulart, conhecido como Jango.  O cenário de sua posse em 07 de setembro de 1961 já era conturbado: desestabilidade política, inflação, esgotamento do ciclo de investimentos do governo Juscelino Kubitschek, grande desigualdade social e intensas movimentações em torno da questão agrária. Diante desse cenário e de acordo com suas tendências políticas, declaradamente de esquerda, Jango apostou nas Reformas de Base para enfrentar os desafios lançados a seu governo.

[19] O Ato Institucional Nº 1 (AI-1), foi publicado em 9 de abril de 1964, poucos dias após o golpe que levou à destituição do presidente João Goulart e colocou no poder as Forças Armadas. Passou a ser assim chamado, AI-1, após a edição do AI-2. Em seu preâmbulo, o AI-1 defende o golpe, denominado no documento como sendo uma "revolução" que representou não o interesse de um grupo, mas de toda a Nação. Declara o Poder Constituinte da "revolução vitoriosa" que, a partir dali, destituía o governo anterior e constituía um novo governo com base na edição de normas jurídicas que não se limitariam à Constituição vigente, a de 1946. No corpo do texto, o AI-1 determinava a manutenção das Constituições vigentes, mas mudava as eleições presidenciais para o dia 11 de abril cujo mandato duraria até 31 de janeiro de 1966. Essa eleição seria realizada a partir de maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional na primeira votação, e caso não houvesse quórum, seria considerada a maioria simples dos votos. Nessa ocasião, foi eleito o general Castelo Branco. O AI-1 também permitia ao Presidente da República remeter projetos de emenda da Constituição, que deveriam ser apreciados pelo Congresso em até 30 dias.  Dentro do mesmo prazo deveriam ser também apreciados os projetos de lei enviados pela Presidência da República à Câmara dos Deputados e posteriormente, em igual prazo, no Senado. Caso as Casas ultrapassassem o prazo, a lei seria considerada aprovada. Em caso de urgência, o texto deveria ser apreciado pelas duas Casas em sessão conjunta no prazo de trinta dias.

 

[20] Foi baixado pelo regime militar, em 27 de outubro de 1965, como resposta aos resultados das eleições que ocorreram no início daquele mês.  Seguindo a estratégia delineada pelos militares anteriormente a 31 de março de 1964, foi necessária a edição de mais um Ato Institucional, com 33 artigos, pois certos dispositivos da Constituição de 1946 não eram compatíveis com a nova ordem "revolucionária". Com a vitória da oposição nas eleições em cinco estados do país, mais notadamente as de Israel Pinheiro, em Minas Gerais, e Negrão de Lima, na Guanabara,  os militares avançaram com a repressão: foram reabertos os processos de cassação, partidos políticos foram extintos (com suas sedes invadidas e desativadas)  e o Poder Judiciário sofreu intervenção do Executivo. Até que, em 27 de outubro de 1965, o marechal Humberto de Alencar Castelo Branco mandou publicar no Diário Oficial e ordenou o cumprimento do AI-2, que emendou vários dispositivos da Constituição de 1946 e, sobretudo, tornou indireta a eleição para Presidente da República. A partir de então, o Poder Judiciário também sofreu intervenção direta do Poder Executivo. Desta forma, os julgamentos das ações dos revolucionários deixaram de ser competência da justiça civil e o Estado entrou em um regime de exceção ainda mais repressor das posições contrárias ao regime. O AI-2 teve vigência até 15 de março de 1967, quando Costa e Silva tomou posse e a nova Constituição de 1967, proposta pelo Executivo e ratificada pelo Congresso, entrou em vigor. O segundo Ato Institucional foi estabelecido em meio à necessidade de Castelo Branco de manter o apoio dos militares linha-dura, embora o seu regulamento alienasse ainda mais os políticos moderados e conservadores, principalmente aqueles filiados à União Democrática Nacional (UDN), dos quais o presidente dependia para sua base política civil. Carlos Lacerda, por exemplo, um dos principais líderes da UDN, reagiu ao AI-2 renunciando à sua candidatura presidencial, o que enfraqueceu o partido. Essa atitude colocou em evidência a escassez de perspectivas de qualquer político que desafiasse o governo por meio do processo político civil. Anteriormente, em julho de 1965, os governadores Carlos Lacerda (Guanabara) e Magalhães Pinto (Minas Gerais), que patrocinaram a conspiração antiJango com verbas e auxílio logístico, também tinham rompido com o governo federal. O pluripartidarismo foi totalmente extinto, desativando praticamente todos os partidos políticos. Ficaram o partido do governo, a Aliança Renovadora Nacional (ARENA), e o que reunia uma parcela da oposição, o Movimento Democrático Brasileiro (MDB). A medida garantia uma aparência democrática da política brasileira no cenário internacional, tal como fez o AI-1 criando as eleições para presidente através de um Colégio Eleitoral. O AI-2 determinou em definitivo que o presidente e o vice-presidente seriam eleitos indiretamente por maioria absoluta do Congresso Nacional, em sessão pública e votação nominal. O voto secreto assim seria evitado, prevenindo surpresas. A medida, por outro lado, tornou o presidente Castelo Branco inelegível para este pleito. O mandato de Castelo, que deveria durar até 31 de janeiro de 1966, foi prorrogado para 15 de março do ano seguinte, impossibilitando a eleição presidencial de 1965, que ocorreria diretamente, no mês de outubro.

[21] Foi o quinto de dezessete grandes decretos emitidos pela ditadura militar nos anos que se seguiram ao Golpe de Estado de 1964 no Brasil. Os atos institucionais foram a maior forma de legislação durante o regime militar, dado que, em nome do "Comando Supremo da Revolução" (liderança do regime), derrubaram até a Constituição da Nação, e foram aplicadas sem a possibilidade de revisão judicial. O AI-5, o mais duro de todos os Atos Institucionais, foi emitido pelo presidente Artur da Costa e Silva em 13 de dezembro de 1968. Isso resultou na perda de mandatos de parlamentares contrários aos militares, intervenções ordenadas pelo presidente nos municípios e estados e também na suspensão de quaisquer garantias constitucionais que eventualmente resultaram na institucionalização da tortura, comumente usada como instrumento pelo Estado. Elaborado em 13 de dezembro de 1968 pelo então ministro da Justiça Luís Antônio da Gama e Silva, o AI-5 entrou em vigor durante o governo do presidente Costa e Silva em represália violenta ao discurso do deputado Márcio Moreira Alves na Câmara dos Deputados, em 2 de setembro de 1968. No discurso, o deputado propôs um boicote ao militarismo ("Quando não será o Exército um valhacouto de torturadores?") e pediu ao povo brasileiro que ninguém participasse nas comemorações do  Dia da Independência do Brasil, além de sugerir uma greve que chamou de Lisístrata, para as esposas dos militares enquanto a democracia não fosse restaurada. Evidentemente, o decreto veio na esteira de ações e declarações de um grupo, conhecido dentro dos militares como linha-dura, que não queria devolver o poder aos civis. Em outras palavras, era mais um pretexto para implementar medidas recomendadas pelos militares desde julho de 1968. Este foi o instrumento que faltava para a ditadura, focada na figura do presidente, acabar com os direitos políticos de dissidentes e intervir nos municípios e estados. Sua primeira medida foi o fechamento do Congresso Nacional até 21 de outubro de 1969. Antes do AI-5, 19 homens já haviam sido mortos por grupos armados de esquerda, dentre eles, um jornalista (Edson Régis de Carvalho), 4 PMs, um soldado (Mário Kozel Filho) e um sargento (Carlos Argemiro Camargo) do Exército Brasileiro e dois militares de exércitos estrangeiros, Charles Chandler e Maximilian Von Westernhagen. As consequências imediatas do Ato Institucional 5 foram, a saber: O Presidente da República recebeu autoridade para fechar o Congresso Nacional e as Assembleias Legislativas dos estados; esse poder foi usado assim que o  AI-5 foi assinado, resultando no fechamento do Congresso Nacional e de todas as Assembleias Legislativas dos estados brasileiros (com exceção de São Paulo)  por quase um ano; o poder de fechar forçadamente o Congresso Nacional seria novamente usado em 1977, durante a implantação do Pacote de Abril; O Presidente da República e os Governadores dos Estados passaram a assumir, durante os períodos de recesso forçado das legislaturas federais e estaduais,  respectivamente, as funções do poder legislativo, impondo ao Presidente e aos Governadores legislar por meio de decretos-leis, que tiveram a mesma força e  efeito que as leis aprovadas pelas legislaturas. Esse poder incluiu o poder de legislar emendas constitucionais. Uma emenda constitucional global da Constituição de 1967 do Brasil (já adotada no âmbito do regime militar) foi promulgada em 1969 (Emenda Constitucional nº 1, também conhecida como a  Constituição de 1969, porque todo o texto alterado e consolidado da Constituição foi reeditado como parte da emenda), sob a autoridade transferida para o Poder Executivo pelo AI-5. A permissão para o governo federal, sob pretexto de "segurança nacional", para intervir em estados e municípios, suspendendo as autoridades locais e nomeando  interventores federais para dirigir os estados e os municípios; A censura prévia de música, cinema, teatro e televisão (uma obra poderia ser censurada até mesmo por motivos vagos, como subversão da moral ou dos bons costumes)  e a censura da imprensa e de outros meios de comunicação; A ilegalidade das reuniões políticas não autorizadas pela polícia; houve também diversos toques de recolher em todo o país. A suspensão do habeas corpus por crimes de motivação política. O poder do presidente da república de destituir sumariamente qualquer funcionário público, incluindo políticos oficialmente eleitos e juízes, se eles fossem subversivos ou não-cooperativos com o regime. Este poder era amplamente utilizado para desocupar os assentos dos membros da oposição no poder legislativo, de modo que as eleições fossem realizadas como de costume, mas a composição do legislativo resultante das eleições seria dramaticamente alterada pela cassação  de mandatos de parlamentares da oposição, efetivamente transformando as legislaturas federais, estaduais e municipais em corpos subordinados aos militares.  A cassação dos mandatos de parlamentares da oposição também afetou a composição do Colégio Eleitoral do Presidente da República (sob as Constituições de 1967 e 1969, adotadas sob o regime militar, o Presidente foi escolhido por um Colégio Eleitoral constituído por todo o Congresso Nacional e de delegados escolhidos pelas Assembleias Estaduais). Assim, não só as eleições para o Poder Executivo foram indiretas, mas as vagas criadas na composição dos órgãos legislativos afetaram a composição do Colégio Eleitoral, de modo que também se tornou um órgão subordinado aos militares. O poder do presidente de decretar a suspensão dos direitos políticos dos cidadãos considerados subversivos, privando-os por até dez anos da capacidade de votação ou de eleição. A legitimidade instantânea de certos tipos de decretos emitidos pelo Presidente, que não foram sujeitos a revisão judicial. De acordo com essas disposições, os Atos Institucionais, e qualquer ação baseada em um Ato Institucional (como um decreto que suspende direitos políticos ou remove alguém do cargo), não estavam sujeitas a revisão judicial.

[22] As emendas correspondem à primeira das espécies normativas dos incisos (I a VII) do art. 59. Seu rito começa mediante proposta: I - de 1/3, no mínimo, dos membros da Câmara ou do Senado; II - do presidente da República; III - de mais da metade das Assembleias Legislativas das unidades da Federação,  manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros (art. 60, I, II  III).Para Wellington Márcio Kublisckas, "(...) o fenômeno do  emendismo constitucional teve um outro efeito bastante claro: o aumento vertiginoso da incidência de casos de controle de constitucionalidade sobre  as normas constitucionais e, por conseguinte, da declaração da inconstitucionalidade – formal e material – de normas constitucionais. Emendas que, ao contrário de incrementarem a cultura de direitos ou aperfeiçoarem as instituições nacionais, meramente lidam com questões de pouca importância, contribuem para a negação da força normativa da Constituição à qual faz menção Konrad Hesse. O jurista alerta que a frequência das reformas constitucionais abala a confiança na sua inquebrantabilidade, debilitando a sua força normativa. Isso porque é, a estabilidade, condição fundamental da eficácia da Constituição. (In: A Constituição e sua reserva de justiça: Um ensaio sobre os limites materiais ao poder de reforma. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 234).

[23] Seu grande destaque profissional é a carreira na magistratura. Em 1937, prestou três concursos para ingresso à magistratura em São Paulo. Assim, em 1938, foi promovido para a primeira entrância, como juiz adjunto de Ribeirão Preto. Já em dezembro de 1944, chega à segunda entrância, em Avaré, sendo, em março de 1945, transferido para a comarca de Jacareí. Em 1948, Frederico Marques foi transferido para a capital do Estado. Assim, tornou-se, em fevereiro, juiz auxiliar da Vara da Fazenda Estadual e, em dezembro, promovido para a terceira entrância, como juiz substituto da capital (7ª e 16ª Varas Cíveis). Sua carreira acadêmica teve início em 1950, quando começou a lecionar na Faculdade Paulista de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Em maio de 1953, Frederico Marques torna-se professor catedrático de Direito Judiciário Civil da mesma faculdade. Completando sua titulação como grande processualista, presta concurso de livre-docência para Direito Judiciário Penal na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), não se tornando, contudo, professor no Largo de São Francisco. Avançando na magistratura, em junho de 1953, Frederico Marques é promovido como substituto no então Tribunal de Alçada. No mesmo ano, em setembro, é nomeado também como substituto no Tribunal de Justiça. Já em dezembro de 1954, tornou-se juiz do Tribunal de Alçada, o mais jovem de seu tempo, com apenas 42 anos de idade.  Do mesmo modo, torna-se depois o mais jovem desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, com 46 anos de idade. Ainda como juiz de Tribunal de Alçada, entretanto, em 1956, foi escolhido, ao lado de Vicente Rao, Mário Masagão, Cândido Motta Filho e Washington de Barros Monteiro, para formar uma lista apresentada pelo então governador Jânio Quadros, para o preenchimento da vaga aberta no Supremo Tribunal Federal, com a aposentadoria do ministro Mário Guimarães. Em 1958, juntamente com Luís Eulálio de Bueno Vidigal, Alfredo Buzaid e Galeno Lacerda fundou o Instituto Brasileiro de Direito Processual Civil.  Frederico Marques aposentou-se em outubro de 1962 como desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Em 1972, recusou convite feito pelo então ministro da Justiça, Alfredo Buzaid, para ocupar a vaga aberta no Supremo Tribunal Federal pela aposentadoria do ministro Moacyr Amaral Santos. Sua ligação com o ministro foi forte: em seguida, fez parte da comissão revisora do anteprojeto elaborado por Buzaid para Código de Processo Civil (CPC de 1973). A grandeza da obra de Frederico Marques para o direito brasileiro é inegável. Sua atuação como magistrado no Estado de São Paulo, bem como sua carreira acadêmica são notáveis. Mas é o número de seus escritos que se destacam. Podem ser citados, dentre outros: “Da competência penal” (1953), “Curso de direito penal” (3 vols., 1956), “Ensaio sobre a jurisdição voluntária” (1959), “Tratado de direito penal” (4 vols., 1961), “Instituições de direito processual civil”  (5 vols., 1958), “Estudos de direito processual penal” (1960), “Instituições de direito processual penal” (4 vols., 1961) e “Tratado de direito processual penal” (2 vols. 1980). Sua escrita era fácil e de grande qualidade, características típicas dos grandes juristas.

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