Ele pousou ali com os olhos fixos. A vida se acendia toda nele. Era pura concentração. A tal ponto, que a vida resplandecia. Puro pensamento.
Um vacilo e, zapt, estava em suas garras!
Em sua presença todo cuidado era pouco. Em sua presença havia um certo desconforto. Não se podia ficar à vontade.
Mas, contraditoriamente, sua camuflagem era justamente aquela paralisia, aquela aparente indiferença. Era se distrair, esquecê-lo, ignorá-lo para ele dá o bote.
Quando chegava fazia questão de não demonstrar sua presença, sua intenção. Preferia, como presa, os mais velhos, os mais indefesos e os mais desatentos.
Muitos viam nisso maldade, mas apenas era uma questão de sobrevivência. Não existia maldade. Precisava sobreviver e era impulsionado, pela própria estrutura, a fazê-lo. Não tinha moral. Aliás, sequer sabia do que se tratava. Para ele, moral era poder comer.
Nós tínhamos estabelecido regras, mas quando o instinto, provocado pela necessidade, coordenava as ações, era o que valia. Era a regra. E, a regra, para ele, antes de tudo, era sobreviver. Era uma questão de vida ou morte. Precisava sobreviver.
Não conhecia outras alternativas. Não lhe foram ensinadas outras. Não lhe foram dadas outras. Para ele, imoral era a nossa conduta, a nossa indiferença com as suas necessidades.
Mas, havia um jeito de espantá-lo. Bastava olhar fixamente para ele, confirmar sua presença para inibir suas intenções.
No entanto, no fundo era dócil, frágil. Se o conhecêssemos melhor poderíamos compreender as suas necessidades e aprenderíamos a amá-lo.
É inaceitável que o tratemos como um animal. Afinal, nenhum trombadinha é um bicho de sete cabeças.
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