Quem ainda se lembra de "O Perfume"? Lançada em 1985, a espantosa história de um certo Jean-Baptiste Grenouille, que, à esquisitice de não exalar nenhum cheiro pessoal, aliava um aparelho olfativo dos mais penetrantes, impregnou por meses a fio as listas dos romances mais vendidos no mundo inteiro.
Seu autor, Patrick Süskind, nascido em 1949 em Ambach, à margem do Lago Starnberg, na Baviera, tendo estudado História em Munique, produziu roteiros para a televisão antes de ganhar o estrelato como escritor. Também tiveram repercussão mundial "A Pomba", seu segundo romance, o monólogo "O Contrabaixo" (no Brasil, encenado por Antonio Abujamra) e os contos de "A história do sr. Sommer".
Best-sellers costumam virar filmes ainda no furor das vendagens. Com o romance "O Perfume", no entanto, a transposição para as telas vai acontecer com atraso de vinte anos. A Constantin Film, do cineasta, crítico e produtor de cinema Bernd Eichinger ("A história sem fim" e "O nome da rosa"), se prepara para a finalização de um projeto que tem enfrentado toda sorte de obstáculos. As filmagens, planejadas para ter início em agosto deste ano, acabam de ser adiadas para 2005.
O motivo é que, até aqui, mesmo em se tratando do projeto de maior prestígio e com a maior soma já investida numa produção alemã, cerca de 50 milhões de euros, nenhum dos três papéis principais foi ainda preenchido.
A Constantin Film tem mantido conversações com estrelas conhecidas de Hollywood, mas ainda não chegou a uma decisão, o que absolutamente não incomoda a produtora e distribuidora, na opinião do seu presidente Thomas Friedl: "Não temos pressa. Se não dermos início às filmagens em agosto, como estava previsto, fica para maio do ano que vem".
Por muito tempo, o próprio Patrick Süskind se opôs à filmagem. Depois foi a vez de Leo Kirch, então grande acionista da Constantin, recusar o material. Por fim, o novo acionista principal da empresa, a Schweizer Highlight Communications AG, votou contra a compra dos direitos, pelos quais se pedia a soma de dez milhões de euros.
Quem deve assumir a direção é Tom Twyker. Seu prestígio como diretor se deve ao surpreendente sucesso internacional de "Corra, Lola, Corra", que catapultou Franca Potente para o estrelato. Como produtor e proprietário da X Filme, Twyker ostenta um outro sucesso incontestável de crítica e de público: "Adeus, Lênin!"
Assim, "O Perfume" vai estar em boas mãos, e cercado de requintes de produção de que nenhum outro filme alemão recente usufruiu. A imprensa alemã alimentou especulações em torno do nome de Leonardo DiCaprio, que, de acordo com Friedl, na verdade nunca foi cogitado.
Desde a genial e prolífica geração do chamado Cinema Novo Alemão, com Fassbinder, Schlöndorf, Herzog e Wim Wenders, entre outros, se projetando da Alemanha para o mundo no circuito cult, não se via nos meios cinematográficos alemães uma aposta tão decidida numa produção alemã capaz de ombrear-se com o melhor da produção internacional.
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[Texto publicado na coluna Oxouzine, jornal Tribuna Impressa de Araraquara, em 28/07/04]
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