Usina de Letras
Usina de Letras
161 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62265 )

Cartas ( 21334)

Contos (13267)

Cordel (10450)

Cronicas (22539)

Discursos (3239)

Ensaios - (10379)

Erótico (13571)

Frases (50654)

Humor (20039)

Infantil (5450)

Infanto Juvenil (4776)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140816)

Redação (3309)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1961)

Textos Religiosos/Sermões (6203)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Discursos-->A Pressão da Pulsação -- 25/03/2002 - 22:56 (Guilherme Laurito Summa) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Hoje é dia 28 de Novembro de 2001. Parece que eu tô com taquicardia. Ontem e anteontem aconteceram apresentações e foi tudo muito divertido, mas eu me cansei de carregar o tempo todo a pressão desse braço por todo o espaço do palco. Quando as pernas se cansam, por causa da bicicleta, não tem válvula de escape melhor para o suor do que o braço. Nos últimos dias eu venho sentindo muito a sensação de absoluta vontade não fazer porra nenhuma o dia inteiro, nem ir pra faculdade, nem levantar a bunda depois de cagar. Tive a capacidade pra fazer 10 flexões no Parque do Ibirapuera, e só! Me cansei depois de subir e descer de algum espaço do chão apoiado pelos braços por uns dois minutos. É trágico! Os dois minutos renderam ainda um pouco mais de dois dias de dor muscular e mais cansaço, constantemente, sem fazer nada, nem faculdade, nem trabalho, nem dever, nem nada de útil para os outros, só um pouquinho de criatividade pra incentivar levantar da cama. Minha cama passou a ser a companheira ideal pra fazer nada. Eu conseguiria ficar horas junto dela, agarrando sua massa, babando em cima, dias e dezenas de ruas e horas clareadas pela luz solar pensando nela...

O conforto da minha cama é redondo
Me faz lembrar o tempo que eu era um feto
Quando eu era menor que um crânio de gato
Eu podia me revirar que não caía cavalo

Olha só!
É vermelha e ecológica a colcha
Ela sofreu algumas queimadoras
Mas ela recebe o meu toque sempre
Então nem reclama dos cigarros

Cama é a minha maior companheira
Os dias vibrantes de hoje me afastaram
A vontade de fazer alguma coisa até o final
É a palavra que vem antes de funeral

Mas a morte está longe de mim. Nos Estados Unidos, Afeganistão, na África, em Gen, qualquer lugar frio, menos aqui! Eu me sinto tão longe da morte, mas isso não é tão bom porque eu estou queimando de rápida e circular infelicidade por dentro. Eu queria estar estável como há uns 5 anos atrás, quando eu tinha acabado de fazer o primeiro transplante, fazia exercícios e não fumava. Depois de perder o rim (ler capítulo “O Ser Humano Demostra Como É Imbecil!”) a vida se tornou meio anormal pra mim, mas normal para o resto do mundo. Agora muitos me vêem capaz de fazer muitas coisas, para um transplantado, mas só eu sei que a melhor coisa que eu tenho feito é dormir.

Dormir é bom
Pisar na grama molhada dá frio
Dormir é conforto
Andar no calor dá insolação

Dormir dá sonho
Correr dá muito cansaço
Dormir dá descanso
Nadar dá muito cansaço
Dormir dá uma pausa
Tocar dá medo
Dormir dá pesadelo

Pensar cansa
Dormir descansa
Criar é bom
Dormir mata

Eu posso explicar pra mim mesmo exatamente o que está acontecendo com o ser humano que anda fumando muito, e fumando muitos tecos da Erva da Loucura também, e que anda quase nunca pra fazer porra nenhuma, nem ir pra faculdade, ou trabalhar, toda aquele negócio de obrigações para o futuro. O que acontece é que a previsão para o futuro não é tão emocionante quanto poderia ser. Eu não conheço meu coração tão bem quanto cada rim dos meus pais, por isso não posso abusar dele e, com todo esse medo, não consigo viver tão bem como costumava ser há anos atrás. A vida sempre foi sofrimento passageiro, exceto pela sonda que passou mais de três anos da minha adolescência enfiada na minhas costas, mas o que sobra foram cirurgias e cicatrizações que rapidamente aos poucos me liberava para a normal utilização do corpo. E utilizar o corpo mexe com o corpo e não deixa a pessoa parada e dá pra fazer o que quiser quando quiser se distrair com movimentos. Tomar remédio pro resto da vida várias vezes por dia não é tão trágico quanto perder um pouco da capacidade de fazer o que quiser com o corpo. Estou no breu há muito tempo e já não agüento mais essa falta de energia!

A energia elétrica mantém tudo aceso
As usinas hidrelétricas estão secando
Logo tudo ficará escuro, então
E breu vai engolir as cidades

A desenergia acontece dentro de mim
É por isso que eu fico piscando
Eu apago, acendo, apago, acendo
Sempre fico instável

Eu não sou um energético
Apesar de parecer pra alguns
Eu não sou um energético
Eu não sou um energético

Eu não tenho a mesma energia! Tudo está ficando ocioso, muito fácil e ao mesmo tempo muito difícil. É como se eu tivesse anemia, mesmo comendo tão arroz e feijão quase todos os dias. Eu não consigo dormir calmamente de noite porque ouço uma vibração do coração no braço. Desta vez, tenho a impressão de ter um regulador de exercícios embutido! Se eu exceder o limite deste treco, o alarme cardíaco poderá disparar tão rapidamente que nem vai dar tempo de tentar agonizar. Quero tirar o alien do braço! Quero esquecer as histórias sobre seqüelas da Guerra do Kosovo e implantes tecnológicos! Quero que as pessoas não me vejam como um viciado em heroína! Quero tirar essa fístula!!!


fís.tu.la sf Med 1 Ferida profunda, que muitas vezes leva a um órgão interno, oco. 2 Ferida profunda, que permite a passagem de fluidos (como pus).



Eu tenho medo de estender o braço
porque parece que ele vai estourar!



Guilherme Laurito Summa
29 de novembro de 2001
- indignado porque é apenas um brinquedo de médico -
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui