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Artigos-->CENTENÁRIO DE MEU PAI ADERALDO PINHEIRO SILVA -- 11/07/2018 - 18:06 (HENRIQUE CESAR PINHEIRO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
AO MEU AMADO PAI NO SEU CENTENÁRIO



Hoje, 11 de julho de 2018, meu querido pai, ADERALDO PINHEIRO SILVA, faria cem anos. Entretanto, mesmo com uma saúde aparentemente boa, em janeiro deste ano, faltando seis meses para seu centenário, faleceu. Naqueles dias que antecederam seu falecimento, e dadas as expectativas ruins do quadro, vivi treze dias de tensão e ansiedade. Na última noite de vida de meu amado pai, pois sabíamos praticamente que o fim era inevitável no dia seguinte, escrevi este texto, que não publiquei na época, mas agora o faço, na data de seu centenário. Não relei e não o farei, deixarei o texto de acordo com o que sentia naquele momento.

Vendo meu pai com as horas contadas, segundo informe médico, veio-me à mente a música Relógio de Roberto Cantaral, compositor mexicano. Da música, grande sucesso no começo da década de sessenta com o Trio Yrakitan, lembrei-me, por alguns motivos, de ouvi-la, pela primeira vez, na casa de João de Andrade, grande amigo do meu pai, que morava na Colina um distrito de Pacoti, onde costumava passar férias quando criança.

Na música o compositor pede para o relógio parar, porque ele só tem aquela noite para viver seu grande amor, uma vez que o amor de sua vida fora desenganado pelos médicos. O mesmo sentimento eu tinha no quarto da UTI do hospital onde se encontrava meu pai.

Eu gostaria de ter poder e parar o tempo, para que meu pai ficasse mais essa noite com a gente; mas numa noite perpétua, dentro do meu egoísmo, claro, porque sei que ele estava já muito cansado. Muita vezes quando ia visitá-lo, quase sempre às sextas-feiras e jogávamos uma partida de buraco, ele falava que era muito triste ficar ali olhando para o tempo sem ter com quem conversar: a Sheyla, minha irmã que cuidava dele desde a morte de minha mãe, nos seus afazeres; o Jocélio, marido da Sheyla, saía para trabalhar e a Lara, a neta que morava com eles, para estudar. A única diversão era ver televisão ou ficar olhando o tempo passar lentamente sem nenhuma perspectiva ou sem um horizonte na vida. Sentado numa cadeira, de óculos escuros, com o queixo amparado numa bengala, girando de um lado para outro, era assim que costumeiramente encontrava meu pai, mas aí a euforia tomava conta dele quando eu chegava para mais um partida de baralho e conversar por algumas horas.

Em dezembro, de presente dei-lhe um rádio com dispositivo para pen drive. Ficou muito emocionado, pois podia ouvir música e alguns programas. O presente chegou atrasado, porque não sabia que ele tanto desejar um rádio. Entretanto, mesmo tendo aproveitado pouco o presente, numa das vezes que estive lá, quando cheguei, ele ouvia, feliz, Vicente Celestino, Dalva de Oliveira... Eu tinha gravado um pen-drive com algumas músicas, mas não de Vicente Celestino, ai eu disse: papai, essas eu não gravei, quem fez isso? Contente, respondeu-me que havia pedido à Lara para gravar umas músicas antigas para ele.

Nas minhas visitas semanais, era sempre recebido com a frase: "Olha ai, Sheyla, quem chegou. Não se cansa de apanhar; ou veio apanhar outra vez. " Referindo-se ao jogo de buraco que toda semana jogávamos e ele nunca conseguia ganhar, mas dizia que ganhava.

Mas voltando ao Relógio, disse que a música me veio à lembrança por vários motivos. Um foi o local onde a ouvi pela primeira vez, no Pacoti, terra que ele tanto amava, e a abraçou como sua. Depois a letra, em que o compositar, assim como eu, no rasgo de egoísmo, pede para o tempo não parar, para que ele fique para sempre junto de seu amor, não sabendo do sofrimento dele, seu amor, pensando somente no seu bem-estar, do autor.

Encontro-me nesta mesma situação. Meu pai tem noventa e nove anos e meio. Sempre achei que um dia ele iria nos deixar de uma maneira rápida, sem apresentar uma doença específica. Só que nós nunca estamos preparados e não sou exceção. Diante do quadro geral de saúde dele não esperava este braque logo, porque ele tinha ainda muito vigor e não apresentava sinal de qualquer doença.

Eu sempre tive grande carinho e amor por ele, mas nunca me passou pela cabeça que sentiria tanto sua falta. Amanhã, depois, tudo o tempo vai amenizando. Entretanto, hoje a saudade é imensa, enorme, e a dor latente. Horas a fio olhando os instrumentos médicos marcando as condições de vida dele: pressão, respiração, batimentos caríacos... Aquela espera

E o Relógio não para como queria Roberto Cantaral, e não quero. Sei do sofrimento dele e do nosso, vendo-o naquela condição, deitando em uma cama de hospital todo entubado. Mas mesmo assim, ainda torço para que ele fique conosco mais um tempo. Infelizmente ou felizmente não irá acontecer. Embora ele sempre dissesse: "Tudo pode acontecer numa bela madrugada." "Portanto, cuide enquanto o Brás é tesoureiro."

Na sei o que acontecerá na bela madrugada, ou se a madrugada será bela para ele ou para nós. Para nós tenho certeza que não será, pois a falta dele não nos dará uma bela madrugada. Porém, para ele será. Porque encontrará paz e descanso. Aqui, queremos uma bela madrugada, mas com um custo muito alto pago por ele. E na madrugada que ele encontrar será de felicidade, paz, pois não há como ser o contrário.

Meu pai jamais fez mal a alguém. No leito do hospital, quando ele foi trasferido para a UTI, e eu fui o último filho a falar com ele, ele reclamava que nós tinhamos posto ele numa sala onde não conhecia ninguem. Aquilo não podia acontecer com ele, pois nunca fizera mal a ninguém. Ali não tinha com quem conversar e que no outro dia ia pegar o dinheiro que tinha para ir embora para o Rio de Janeiro, encontrar um irmão.

Mas não aconteceu e ele se foi. Se foi e para sempre, enquanto estivermos aqui, sentiremos saudade eterna dea presença dele. Te amo meu pai.

Este texto era para ter sido publicado em 15 de janeiro de 2018, mas não o fim; faço hoje, dia em que completaria cem anos. Beijos e muita saudade ADERALDO PINHEIRO SILVA.



HENRIQUE CÉSAR PINHEIRO

FORTALEZA, JANEIRO DE 2018.



ALGUMAS FRASE DE MEU PAIS QUANDO JOGÁVAMOS BARALHO

- TUDO PODE ACONTECER NUMA BELA MADRUGADA - QUANDO ELE ESTAVA PERDENDO

- APROVEITA ENQUANTO O BRÁS É TESOUREIRO - TAMBÉM PERDENDO

- PIULA, SEU TRAJANO - QUANDO UMA CARTA NÃO PRESTAVA

- ESSA É FEIA QUE DÓI, PIOR DO QUE A MARIANA GODÓI - TAMBÉM SE A CARTA ERA RUIM

- COISA BOA É QUEM SABE LER - EM QUALQUER SITUAÇÃO QUE A PESSOA SE DAVA BEM

Comentarios

Eliana  - 30/01/2021

Vim ler hoje sua belíssima homenagem ao seu saudoso pai. Confesso que fiquei muito emocionada.
Como vivo a mesmo dor da saudade compreendo perfeitamente, a dor da ausência é a pior dor que existe porque NÃO HÁ COMO REMEDIAR.Deus lhe deu a chance de se despedir dele mesmo no leito hospitalar.
Lindo demais seus sentimentos expressados num momento tão difícil.
Celebrai a vida sempre poeta querido pois viver é passageiro.
Amei a história da música do "relógio".
PARABÉNS poeta Henrique César por ter tido a chance e ter expressado naquele momento da emoção e ter compartilhado com seus seguidores. Obrigada. Abraços. Eliana

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