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Contos-->A História Se Repete -- 21/03/2003 - 20:51 (Domingos Oliveira Medeiros) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O PÓ BRANCO E A BORBOLETA E AMARELA
(por Domingos Oliveira Medeiros)

Era dezembro. Fazia calor. A chuva caía de repente. Grossa e barulhenta; molhando árvores e calçadas. Da janela, admirava o verde de todos os matizes que, naquela época do ano, sempre enfeita a nossa cidade. E eu passei a lembrar de tudo. Como tudo tinha começado. Foi mais ou menos como um sonho, que agora tento reproduzir. Parece que estou vendo tudo de novo. A borboleta amarela, solitária, ensaia seu último passeio e voa em direção ao provável abrigo. Folhas e flores, em ritmo próprio, caem das árvores anunciando a renovação. Estamos no Verão. A vida acontecendo em harmônico sistema de cores, formas e movimentos.

O conflito, no Afeganistão, tinha começado. Moderno, eletrônico e com hora marcada. Maciços investimentos foram canalizados para o seu custeio. Foguetes e mísseis são apresentados pelo seu potencial de fogo e sofisticada tecnologia. Aviões de todos os portes e para todos os fins desfilam no relato dramático da TV.

Pequeno intervalo. Entra em cena o comercial. Propaganda do governo: Natal sem fome. Contribua doando gêneros de primeira necessidade. Preferência para os não perecíveis. Brinquedos novos ou usados também serão bem vindos. Podem ser de plástico ou de madeira, não importa. Tanquinhos de guerra, espingardas, ambulâncias, aviões e helicópteros e até soldadinhos de chumbo ou de borracha, devidamente armados e prontos para o combate.

Após o intervalo: novas notícias de guerra. Agora, em território brasileiro. Do lado dos mais fortes, mísseis, sofisticados e modernos são lançados contra a sociedade civil menos favorecida. Mísseis do tipo TBN, FIF-DI, TR, TBF, UFIR, TJLP, todos voando em grandes altitudes, para alegria dos mais poderosos. Do alto dos céus, e de todos os lados, vemos aumentar a quantidade de mísseis. E novas bombas são lançadas. Bombas, desta vez, bastante antigas, mas com alto poder de destruição: INPC, IGPM, IGP-DI, IPA-DI, IPC-DI, IPC-FIPE, IPACA e IPCA. Do outro lado, o exército de inimigos. O chamado "povão". Muito mais numeroso, porém sem acesso a tecnologia de ponta e sem recursos suficientes para bancar esta guerra, que promete ser longa e duradoura. Mais bombas.


Desta vez voando baixinho, e, nem por isso, menos destruidoras. São as bombas SM (Salário Mínimo) e Poupança Popular - com rendimento quase parando - para tristeza da grande maioria. Esta guerra, no Brasil, é antiga. Muito semelhante a guerra entre Israel e a Palestina Também é planejada. Conta, inclusive, com a ajuda política e financeira do exterior. Principalmente dos Estados Unidos da América. Tem até um fundo monetário internacional para bancá-la.

E a guerra continua. O Batalhão de Juros dá eficiente apoio logístico e auxilia a inflação - que ataca os salários - avançando sobre a tropa inimiga e segue indiferente às altas temperaturas dessa época do ano. Temperaturas, aliás, bem quentes, capazes de derreter qualquer rendimento do exército inimigo, o exército do povão. E a guerra continua firme e forte.

A inflação ameaça subir cada vez mais, até atingir o topo das montanhas. Se isto vier a acontecer, espera-se a destruição total do exército inimigo. Praticamente, destruirá toda a população. O pânico é geral. Aumenta a quantidade de desertores, que não têm mais forças para continuar lutando nesta guerra infame e desigual. Com isso, aumenta-se o nível de desemprego local. Não há mais vagas sequer para soldados rasos. Algumas vagas, apenas, para os que aceitam ganhar menos do que o salário mínimo, que, aliás, já é o máximo.

Novo intervalo. Entra em cena mais um comercial. Também do governo. Não deixe de vacinar suas crianças de zero a cinco anos de idade. Contra a difteria, a tuberculose, a varíola, o dengue, a hepatite B e C, a paralisia infantil, o sarampo, a desnutrição, a violência, a falta de escolas, enfim, contra tudo o que já deveria ter sido banido do nosso convívio. Culpa da “assimetria” da conjuntura mundial, segundo o nosso presidente. Fim do intervalo. Aproveito para trocar, por instantes, de canal. Ouço um resto de notícia de outra emissora: Bin Laden continua sem ser visto. E a guerra está quase acabando. Pelo menos em sua primeira fase. Isto tem preocupado os americanos. A guerra poderá chegar ao fim sem que seu principal patrocinador seja encontrado. Retorno ao canal de preferência.

Continuam as notícias sobre a guerra no Afeganistão. Exaltam-se a precisão cirúrgica das estrelas do bombardeio aéreo. Abrigos e cavernas aparecem e desaparecem na tela. É o novo cenário de uma guerra sem sirenes e sem máscaras. Sem sentido, também; como, aliás, são todas as guerras.

Aviões, helicópteros, tanques e metralhadoras prontos para entrar em ação. Elogia-se, com emoção e ênfase, o potencial bélico do lado mais poderoso do confronto. Explosões, ao fundo e à distância, em formas de gigantes cogumelos, são mostradas de relance: provavelmente para não chocar à opinião pública. Ou, quem sabe, para não lembrarmos da Segunda Guerra Mundial, no Japão, onde foi jogada a primeira bomba atômica. Nascia, ali, a fama do cogumelo, símbolo da destruição e do terror. Fogo e fumaça davam a dimensão do combate. Combate, aliás, que só tem um lado. O lado que quem ataca.

Na verdade, tem-se a impressão de que tudo no local já estava destruído, antes mesmo de a guerra começar. Em todo o caso, os dados divergem entre si, segundo a fonte - ou a intenção - de quem dá a notícia. É a guerra da informação. Da tecnologia de ponta. Com regras previamente traçadas para matar e destruir. E tudo sob o argumento, paradoxal, da guerra lícita, da guerra justa, da guerra limpa. Nada de pessoal. Questão de honra, apenas. De um país - uma potência - bastante magoada, ferida em seu orgulho próprio. Que pretende reparar a ousadia de um grupelho de terroristas que não tem o que fazer. Se justiça ou vingança, só o tempo dirá.

Novo intervalo.. Lentes de contato em seis vezes sem juros. O preço anunciado custa o olho da cara. Não vale a pena. Desse jeito, continuaremos com pouca visão das coisas, a começar pelos juros escondidos nas prestações.
De volta ao Afeganistão. Desta vez, notícias, mais amenas. Soldados americanos, da força aérea, lançam toneladas e toneladas de bombas inteligentes e não conseguem acertar os alvos. Há indícios de que essas bombas não são tão superdotadas como fora propagado. Já erraram de alvo várias vezes. E até soldados americanos foram vítimas destes desacertos. A propaganda é a alma do negócio. Ou o negócio é a alma da propaganda?

Ainda bem que as condições geográficas de onde acontece a guerra - insípido e montanhoso - não permitem a existência de muitos lugares com alvos para serem acertados, mesmo em se tratando de bombas inteligentes. Talvez esteja neste fato a razão pela qual os erros da aviação americana não foram ainda maiores. Não há notícias de feridos. Ainda bem, posto que um erro de bomba inteligente não justificaria outro erro. Pelo menos tem sido assim no ditado popular. Depois do imenso bombardeio, alguns minutos de descanso para o lanche. Sobraram cavernas; e nem sinal de Bin Laden.

Aliás, caverna é o que mais tem nessa guerra. Vazias, de acesso difícil e com pouca ventilação; por isso mesmo, sem nenhum valor de mercado. Parece até o nosso garimpo de Serra Pelada!

Volta-se a falar nas bombas inteligentes. Aumenta a desconfiança de que elas não têm tanta precisão cirúrgica. Nesse caso, estamos diante de flagrante erro médico. Ou então, ditas bombas, ou seus pilotos, apresentam sérios problemas de visão. Em qualquer dos casos, sempre cabe indenização por erro médico e por danos materiais e morais. A menos que se prove que os erros se deram por conta da poeira que, naquela região, antes do inverno, é abundante.


Notícias do Brasil: Aumenta o desemprego. Falta dinheiro no mercado e a comida é escassa na mesa do trabalhador. Em compensação, o trabalhador já pode decidir, em igualdade de condições, diretamente com o patrão, a redução dos salários ou a data provável de sua demissão. Liberdade de negociação. Lembrete: o acordo que for feito substituirá as normas contidas na antiga Consolidação das Leis do Trabalho, a CLT, que foi alterada com a alegação de que tem mais de sessenta anos, e, assim, estaria defasada no tempo; e, por isso, estaria superada. A propósito, quantos anos tem mesmo o nosso presidente? Deixa prá lá!


Mais televisão. Mais guerras. Outras guerras. Peter Blake, o melhor velejador do mundo, foi assassinado às margens do Rio Amazonas, no Amapá. Roubaram-lhe o relógio de pulso. Os assassinos, chamados de "piratas" pela imprensa, já foram presos. Mais notícias. O futebol brasileiro está no final da linha. Afogado num mar de lama e de corrupção, a CPI do Futebol encerra seus trabalhos com larga vantagem: doze votos a favor e nenhum contra. O relatório foi aprovado com farta documentação, provas e indícios de ilícitos penais e administrativos devidamente apurados. Ninguém foi preso.

Entra em campo a Procuradoria Geral da República. Vamos aguardar o confronto. O campeonato promete. Muita gente já tem dois cartões amarelos. Espera-se cartão vermelho e muita expulsão. Também não era para menos. Cartolas inescrupulosos denegriram a imagem de nosso país e de nosso esporte maior. Até nossa seleção ! ... a "Pátria de Chuteiras", como dizia o saudoso Nelson Rodrigues, não ficou livre dos arranhões à ética e à moralidade pública. Mas não somos pentacampeões?

Nova guerra. Também no Brasil. Desta vez uma guerra a favor do consumidor. Há males que vêm para o bem. É a guerra travada entre as companhias aéreas para decidir quem oferece passagem mais barata, mantendo a qualidade dos serviços. Vamos aguardar prá ver. Esta guerra, pelo menos, valerá a pena, ver de novo, sempre.

Intervalo comercial. Voltando às notícias. América do Sul. Tempo e temperatura. A tempestade de que se falava nos dava conta de um furacão ou de um tornado, sem precedentes. Com ventos de mais de 200 quilômetros por hora ameaça até derrubar residências bastante sólidas, bem construídas. Raios fulminantes caíam a toda hora, assustando e deixando perplexa a população, envolta na escuridão do inusitado fenômeno. Seria o apagão?

Temendo o pior, os bancos fecharam suas portas por algum tempo. O comércio antecipava prejuízos com a perspectiva de que as chuvas inundassem os estabelecimentos comerciais e viessem a afastar os consumidores que, sem dinheiro e sem energia para enfrentar a tormenta não se atreveriam a sair de casa para as compras. As autoridades locais, por sua vez, tentavam acalmar a população.

Por instantes, pensei tratar-se de notícias oriundas de países europeus ou típicas de algumas cidades dos Estados Unidos. Mas, logo percebi que o fenômeno acontecia na Argentina, nosso eterno vizinho de futebol, de política econômica e de crises. Resta-nos torcer para que a calmaria venha logo e que os ventos da liberdade tragam de volta o sol da esperança, da paz e da liberdade para o nosso sofrido continente.

Cansado de tanta guerra, desliguei a televisão. E passei a refletir e a viajar com meus pensamentos. O que poderia estar por detrás de tudo isso? A ganância, a soberba, o orgulho ferido? Tanta coisa!

"Domingão do Faustão" e "Domingo Legal" começam a guerra pela audiência quantitativa. Mau gosto, bundas e coxas, apelos populares, emocionais, numa "mesmice" de fazer inveja ao mais idiota dos seres humanos. Isto sem falar dos programas reservados para os horários ditos "nobres" ou "quase nobres", que completam o martírio e a idiotização de massas: Briga de marido e mulher, curiosidades como a cor da calcinha desta ou daquela artista, a posição sexual preferida, lavagem de roupa suja dos programas "Eu Vi na TV", "É o Show" e "Programa do Ratinho", entre outros. Nada de pessoal, é claro! Popular, nem sempre é sinônimo de baixaria e sensacionalismo barato, dizem os estudiosos de comunicação. Em compensação temos,. Agora, o Big Brother.

Se houver vontade política o lixo podre da TV poderá ser reciclado. O mito de que o pobre não gosta, por exemplo, de música clássica, programas de cunho científico, entrevistas, etc. não passa mesmo de mito. As televisões poderiam (e deveriam), por questões de ordem econômica, correr atrás da audiência. Mas, não me parece que às custas da queda na qualidade dos programas. Ainda que estes programas melhor elaborados apresentem custos sabidamente mais elevados, o custo da ignorância da população é muito maior para o país. PS: O Raul Gil está conseguindo qualidade sem custos adicionais. Excelente o seu programa. Uma exceção, é claro.

Vale lembrar, nesta linha de raciocínio, de custos de produção, que a Câmara dos Deputados aprovou a emenda constitucional que permite a participação de sócio estrangeiro (pessoa física ou jurídica) nas empresas de comunicação, restringindo aos brasileiros a definição da grade de programação das emissoras. Resolvido o problema de ordem econômica, de capitalização das empresas, resta apelar para o bom senso e que, doravante, sejam criadas as condições para que as empresas de comunicação agreguem qualidade aos seus programas. Afinal, isto aqui não é nenhuma "Casa da Mãe Joana", onde a futilidade é "Sem Limite". Até os comerciais patrocinados pelo governo deixam a desejar. "Evite a AIDS. Use camisinha em todas as suas relações. Sempre e em qualquer lugar. Ou seja: não importa a ética ou a moralidade da família. Induz-se ao sexo livre, total, desde que se use a camisinha.

Mas, voltando ao meu noticiário e, pensando bem, alguma coisa de útil esta guerra do Afeganistão nos trouxe. Ficamos sabendo, pelo menos, que "Cabul" é a capital do Afeganistão, antiga república soviética. Que "Mulá" é o título do líder máximo do antigo regime afegão, o Mulá Mohamed Omar. Nada a ver, portanto, com as mulas e os jumentinhos que pareceram logo no início da guerra.. Que Bin Laden continuará vivo, mesmo se o matarem, posto que, segundo a imprensa radical islâmica "Outro Osama aparecerá", e o "renascimento continuará a cada vez que o Osama anterior for martirizado".

O sol reaparece. Tímido. Aos poucos foi se escondendo por detrás dos prédios - e depois das nuvens - cedendo lugar à noite que se avizinha. E eu acordei de minhas lembranças. E fiquei esperando pela volta da borboleta amarela na expectativa de que ela trouxesse renovadas esperanças de que os homens pudessem, com sabedoria política, aliada ao conhecimento científico e tecnológico, reencontrar o caminho da paz e da prosperidade.


Por falar em paz, lembrei-me da cor e por extensão, do pó branco. Ninguém fala mais dele. Acho que a culpa é do Bin Laden. Se é que um dia eles existiram de fato. A única certeza de que dispomos, ao acordar, digamos, desse pesadelo, e depois de tanta bomba que foi jogada fora, é que as guerras continuam. Em todos os lugares do mundo, e .em especial aqui no Brasil, onde promotores de justiça, políticos, empresários e gente humilde são seqüestrados e mortos, todos os dias, sem que se tenha perspectivas, a curto e longo prazos, de um ponto final nesta violência que caminha a passos largos para se tornar a epidemia do século.

E mal me refazia dessas lembranças, deparei-me com outras notícias. Peguei o jornal a e pude ler: fraudes contábeis na bolsa de valores americana ameaçam a credibilidade do sistema financeiro mundial. Dólar, depois de subir próximo aos R$4 reais, desceu um pouco e agora está na casa dos R$3,15, o que já é bom para o governo, mas ainda péssimo para a população. Dívida pública soma R$950 bilhões, quase 60% do PIB. Israel continua bombardeando a Palestina. E a Palestina continua, aterrorizando Israel. Tudo em nome da paz. Mas esse jornal é um pouco antigo. Pego o jornal dessa semana.

A história se repete. Bush prometeu e resolveu invadir o Iraque. FMI continua “ajudando” os países pobres. Fernando Henrique, quer dizer, Lula anuncia as primeiras medidas. Fala em reforma da PrevidÊncia, reforma Agrária, reforma Política e que não há dinheiro para dar aumento aos servidores públicos. Este ano vai ser de aperto. A crise econômica que o país atravessa é culpa do Lula, quer dizer, do FHC.
E o servidor aposentado continua sendo procurado para servir de bode expiatório.

A guerra no Iraque está rolando solta. O pó branco reaparece nos EUA. Bom para a economia. As bolsas registram altas. Queda no dólar. Cai o risco-Brasil. Quer melhor do que isso? Viva a guerra!.... Enquanto isso, vamos continuar escrevendo nossos desabafos. Enquanto ainda somos livres para sonhar. Tudo isso por apenas R$8 reais por mÊs. Via a Usina de Letras. Vive La France!..

Domingos Oliveira Medeiros
( Reproduzido e readaptado nesta data, face à
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