O rei e o gnomo
UM CAPÍTULO RECENTE DA HISTÓRIA
Era uma vez um país muito grande, chamado Lisarb, que tinha um rei de nome Ramati, que assumira o trono ao ser deposto Rolloc. Rolloc houvera sido um soberano ímprobo, numa corte carcomida pela ambição.
De Ramati esperava-se a reconciliação do Poder com a Moral.
Honesto, porém ingênuo, o novo rei não percebeu que a Moral tinha infindáveis ramificações e, enquanto tentava resgatá-la em dos seus ramos, deixava que o flagrassem em situações previamente armadas, onde ele parecia estar em comunhão com quem agia de forma ora amoral, ora imoral, em várias das modalidades em que é possível fazê-lo.
Numa festa pagã, Ramati teve a desgraça de ser fotografado ao lado de uma súdita descalça e exibicionista, que dele se acercou como Eva fizera antes com Adão. A notícia correu o reino e alcançou plagas além, angariando a censura unânime de todos os povos. Envergonhados de seu rei, os cidadãos do Lisarb tiveram de engolir a zombaria do resto do mundo.
Triste, Ramati, que já era de natureza introvertida, o que contratava de modo estranho com o seu penteado à moda chuca-chuca, penteado que o zelo da mamãe tornou imexível para sempre, não tinha sequer ânimo para estabelecer as reformas que o país demandava, vindo, após, anunciá-las com vigor ao povo, como um verdadeiro rei.
Foi num dos instantes de maior amargor, numa manhã, logo após acordar, ler os jornais e abrir a janela para aspirar a aragem estimulante que soprava desde um bosque próximo, chamado Ad Adnid, que Ramati deparou-se com um gnomo sorridente, o qual, dentre a folhagem de um arbusto fronteiriço à janela, lhe falou:
- Majestade, sois incapaz de pentear de modo outro os vossos cabelos?
Ao que Ramati respondeu:
- Sim, amigo. E muito me contrista que este topete se mostre acima da própria coroa, chamando tanto a atenção ...
O gnomo:
- Pois vos trago, da milenar cultura da minha raça, um meio capaz de vos compensar dessa inglória luta com o vosso rodamoinho capilar.
E, assim falando, o gnomo lançou para Ramati uma fumacinha em forma de pente, completando:
- Este é um pente que já os meus ancestrais usavam; chama-se senso, é inquebrável e servirá para que penteeis as vossa idéias todas as manhãs e sempre que tiverdes a necessidade de bem pensardes, sobretudo ao ponderardes sobre as incumbência monárquicas.
Ramati, já naquele momento, voltou a sorrir largamente, passando a ser feliz e um rei laborioso. Nunca mais ninguém notou o seu chuca-chuca, a não ser uma linda princesa que por ele se apaixonou tanto quanto pelo seu dono, com o qual casou-se.
E foram felizes para sempre, o rei, a rainha e a população inteira do Lisarb....
Joel Ribeiro do Prado/1994
Nota: Para identificar os personagens desta parábola, inverta alguns dos nomes.
|