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Contos-->O SEQUESTRO DA FILHA DO PREFEITO -- 15/03/2003 - 10:29 (Clodoaldo Turcato) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos



Naquela tarde eu a conheci. As motos saltavam de um lado para outro, numa competição atroz. O povo vibrava ao ronco dos motores, sobre camionetas a diesel. E lá no canto estava ela, quietinha, vestindo uma camiseta básica, daquelas de combate o câncer de mama, estampando a frase: “Eu tenho peito”. Era igual a todas as outras moças, exceto pelo estado de espírito e quietude. Parecia uma pluma. Ignorei as motos e visualizei o espetáculo. Um corpo bem definido, dentro de um jeans arrebatador. Olhando melhor, ela era diferente das outras. Fiquei naquela fissuração, querendo ser o Super Homem para ter a visão de raios-X; quando o Rodrigo me tocou com uma prancheta, uma leve batidinha na cabeça me trouxe de volta.
_ Cuidado com o sonho. A gata é filha do Prefeito...
_ Filha do Prefeito!?
_ É, não sabia não? – me estendeu a prancheta e subiu numa F1000.
Eu nem sabia que o Prefeito tinha filha, e que filha.
A caneta deslizou.
Na saída do motocrós segui a moça, discretamente sem que ela percebesse. Eu, no meu Uno fui no vácuo da Ranger duplada, onde iam, além dela, uns dez outros, cantarolando, saltitando, extremamente alcoolizados Ela não: quieta, intacta, numa beleza de dar dó. Foi deixada na porta de sua casa pelo grupo, que seguiu adiante. Eu diminui a marcha, aguardei ela fechar o portão, para olhar melhor o ambiente, ver as dimensões da casa, do jardim, do arvoredo e o nível de segurança. Tudo tranqüilo. Uma residência ao desleixo; ninguém perceberia minha invasão.
Pela manhã passei a seguir os passos da moça. Foram vários dias e o mesmo itinerário: saída 7:30, volta da escola pelas 11:00, à tarde, pelas duas, iniciava seu passeio pela praça da cidade, lanche na padaria, curso de inglês e volta para casa, em torno das 17:00 h. À noite um branquela pegava ela para um passeio, inocente, nada além de amassos- isso posso garantir - quando a mãozinha boba começava agir, ela imediatamente retirava com violência. Sempre às 22:00 ela ia para cama, vestindo ora uma camisola de algodão rosinha, ora nua, totalmente nua; mas nunca tirava as meias, um lindo par de meias brancas, que davam ao seu corpo juvenil uma dimensão imensamente sensual. Puder vê-la por várias vezes ardendo em desejos, em movimentos sincronizados, seguidos por gemidos típicos da puberdade. A posição de onde eu a via era uma frondosa plantene, com folhas imitando a bandeira do Canadá. Além da “visão de longo alcance”, utilizei-me de um binóculo. Todo meu plano esteve por um fio, diante de tamanhos atributos, aos quais rendi memoráveis momentos de inspiração, nada convencionais para alguém com idéias tão perversas. Mas ao final, decidi seguir adiante.
Busquei manter cautela máxima, investindo esporadicamente em cumprimentos sutis, à distância, mas ela nem me notava, o que aumentou meu afinco em concretizar o”Plano”.
Anotei cada passo, cada gesto, cada momento vivido por ela. Sabia exatamente os momentos em que realiza suas necessidades, quando se alimentava, quando sorria, quando chorava, quando estudava, quando respirava...exagero!
Com tudo na ponta do lápis, comecei à programar o seqüestro. O melhor seria aborda-la na hora do lanche, à tarde. Iria utilizar-me de um carro, procuraria nas garagens de outra cidade, mudaria a placa e antes da chegada dela na padaria, abordaria e faria o serviço. Certamente iria me dar tempo de leva-la ao cativeiro, antes que dessem pela falta.
O cativeiro já tinha lugar certo: uma fazenda afastada, de difícil acesso, nas redondezas da cidade vizinha. Teria que andar a pé um bocado, mas seria seguro. Depois de deixa-la, ligaria de um celular habilitado em outra cidade e o trocaria a cada ligação. Pelas minhas contas, seriam necessários seis aparelhos de celular. Eu ligaria direto de casa, não muito distante da casa do Prefeito, para poder acompanhar a movimentação. Mudaria de pontos, para não ser pego, e despistar a policia. O “Plano” tinha que concretizar no mesmo dia, nada de muitas horas.
O problema seria como não ser identificado por ela. Como disfarçar a minha deficiência. O rosto, tudo bem, mas e as pernas? Teria que ficar o máximo de tempo dentro do carro. Não queria usar parceiros para o “Plano”. Iria fazer tudo só. Resolvi vedar seus olhos em uma altura da estrada, assim ela não saberia jamais como fora seqüestrara e principalmente o autor.
Eu teria que me preocupar muito com as condições do cativeiro. A menina não podia ser machucada, eu não iria me perdoar se algo lhe acontecesse. Levaria uma cama boa, colchão e materiais de primeiros socorros, além de alimentos, tudo diet. Em caso de calor, seria necessário um bom ventilador e roupas apropriadas. A compra de tudo eu faria em Sorriso.
Outra questão fundamental seria o resgate. Como receberia o valor sem que me pegassem? Por vários dias me coloquei a matutar uma maneira de nunca ser preso. E qual seria o valor do resgate? Não iria querer nada pra mim. Imaginei forçar o Prefeito a efetuar uma série de doações. Claro, iria ser o Robin Hood de Lucas.
O dia foi marcado. Eu estava lá, pelas 15 horas, com toda a lista para o “ Plano “ , inclusive os telefones celulares. Como em todos os dias, ela chegou na hora. Abordei a menina devagar. Tinha colocado uma peruca velha de minha mãe, e maquiado com talco o rosto, parecendo um pote de nata. Ela ao me ver correu para o carro. Fiquei espantado, estaria facilitando minha atuação? Que negocio era aquele de ir ao meu encontro?
Ela aproximou-se e foi direto para o caroneiro.
_ Você deve ser o palhaço que meu pai contratou para a festa na APAE?
_ Eu!
_ É de Sorriso, não é?
Antes que respondesse, indicou o caminho. Fiquei sem ação, resumi a apenas acatar suas ordens. Em dez minutos estávamos dentro da APAE. Sem mais demora foram tirando do carro todas as bugigangas que eu comprara para o cativeiro e distribuindo para os internos . Todo o material que seria utilizado para o seqüestro, agora virara doação espontânea. Eu fui conduzido para o Centro do Salão, para uma suposta apresentação que estaria programada. Como eu nunca tinha apresentado nada, e com medo de que meu plano fosse descoberto, improvisei. Entre dezenas de sucessos, interpretei o famoso “ Atirei um pau no gato”, “ Fuscão Preto”, “ Estrada da Vida”, “ Biquíni de bolinha amarelinha” e por ai vai. Foi o maior sucesso. As crianças deliravam, riam de cair.
No final fui cumprimentado por todos os professores e recebi um caloroso beija dela, da filha da prefeito.
Quando tudo estava indo as mil, abriu-se a porta do salão, e alguém anuncia:
_ O palhaço chegou...
O verdadeiro dono da apresentação havia finalmente chegado. Bem mais modesto em presentes, mas bem mais palhaço. Ninguém entendeu nada. Eu gelei. Tinha caído em contradição. Quando o barraco parecia ir ao chão, ela saltou em minha frente e eloqüentemente gritou:
_ O rapaz aqui simplesmente fez a abertura, agora vocês terão a parte final, com o Tesourinha....
Todos aplaudiram. Seriam duas apresentações, mais duas horas de alegria, proporcionadas por seqüestro um fracassado.
Tudo muito bonitinho, na prancheta. Quando voltei estava sentado na tampa de uma camioneta, com a estória toda no papel. Recolhi as cinco folhas e devolvi a prancheta para o Rodrigo; peguei meu carro e fui para casa dormir, sonhei que tudo poderia ser como não foi.


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