Usina de Letras
Usina de Letras
48 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62201 )

Cartas ( 21334)

Contos (13260)

Cordel (10449)

Cronicas (22534)

Discursos (3238)

Ensaios - (10353)

Erótico (13567)

Frases (50601)

Humor (20029)

Infantil (5428)

Infanto Juvenil (4762)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140793)

Redação (3302)

Roteiro de Filme ou Novela (1062)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1960)

Textos Religiosos/Sermões (6185)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Cronicas-->Quinhentos e sessenta e oito e cinqënta -- 09/12/2002 - 11:30 (Renato Rossi) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Ricardo e Alice viviam bem. Mais de vinte anos de um casamento feliz. Filhos, casa própria, carro do ano. Em algumas épocas até cachorro tiveram. Não me consta que tenham tido gatos, mas isto não é grave para um casamento. As pessoas podem passar anos a fio sem ter gatos.

Se no convívio tudo ia bem, no dinheiro não era diferente. Conta conjunta, cartões de crédito comuns, património seguro. A conta conjunta era operada sem dificuldades uma vez que não havia segredos, gastos a explicar, atividades paralelas que poderiam prejudicar a administração conjunta das contas. Entram os salários, saem os supermercados, as escolas, pequenas despesas e as coisas que todos temos que pagar durante o mês. De qualquer forma não custava conferir o extrato, mais para proteção contra o banco. Nunca se sabe. Ao lado de cada lançamento um "tique", como se diz, atestando a correção do fato contábil. Com a internet o "tique" sumiu, mas a conferência era constante. Mais por curiosidade do que preocupação.

Até que um dia Ricardo viajou e demorou-se mais que o habitual. No hotel, não resistiu e, viva a internet, resolveu conferir os saldos bancários. Afinal, a internet é para isto mesmo e ele era um cliente globalizado de uma banco eletrónico. Solicitou o extrato e foi conferindo. Cinquenta e sete deve ser a prestação do sapato, noventa e cinco e trinta deve ser a gasolina da semana, duzentos e vinte no supermercado, quarenta e cinco do restaurante.

Seguiu a conferência sem maiores preocupações até que, quase no final, viu um quinhentos e sessenta e oito e cinquenta, ali entre um trezentos e dezenove da escola e um noventa e três e setenta da academia.

Quinhentos e sessenta e oito e cinquenta? O que seria? Teve vontade de ligar, mas ficou constrangido. Duas semanas fora de casa, há quatro dias não ligava, ia ligar para saber sobre um quinhentos e sessenta e oito e cinquenta? Não, melhor esperar. Como Alice reagiria à uma pergunta sobre os quinhentos e sessenta e oito e cinquenta? Nunca se sabe, melhor não arriscar. Pelo menos não por telefone.

Contudo a dúvida persistia. Quinhentos e sessenta e oito reais e cinquenta centavos. O que seria? Ninguém dá um golpe de quinhentos e sessenta e oito e cinquenta. Não deve portanto ser erro do banco. Ricardo ficou imaginando o que poderia ser e, sem resultado, como perguntar sobre o fato. Não é muito dinheiro, mas também não é tão pouco. Afinal, são quinhentos e sessenta e oito e cinquenta, quinhentos e setenta, seiscentos por assim dizer. Quase mil. Muito dinheiro, mas isto não era o mais importante. O importante era saber o destino da quantia. Quem usa assim quase mil reais sem um comentário, sem mais nem menos? Alice não costuma fazer isto.

Foi quase uma semana de agonia. Telefonar perguntando? No retorno, como perguntar sobre a quantia sem explicação. Talvez fosse melhor fazer de conta que não notou. Mas Ricardo não aguentaria por muito tempo. Não, melhor enfrentar logo a questão, esclarecer e partir para outra. E se houver uma explicação boba qualquer? Com que cara ficaria? Como reagir?

Até que voltou para casa. Alice foi esperá-lo no aeroporto. Os beijos de praxe, juras de saudades, perguntas sobre as crianças, comentários sobre a sogra, fofocas do trabalho dela, amenidades sobre os hotéis onde ele estivera. Todo tipo de assunto, exceto é claro os quinhentos e sessenta e oito e cinquenta. Nem podia ser diferente. Ele não podia chegar com um "oi querida, em que foi gasto aquele quinhentos e sessenta e oito e cinquenta?". Toda uma vida em conjunto poderia ser posta a perder.

Em casa entre um e outro assunto, Alice comentou que estranhara um gasto de quatrocentos e vinte e Ricardo logo explicou que pagara uma passagem de avião para a mãe. Só ida, a irmã pagará a volta. Ágil, aproveitou a deixa e, quase ofegante, perguntou sobre os quinhentos e sessenta e oito e cinquenta.


- Alice, por falar em extrato, que foi aquele cheque de quinhentos e sessenta e oito e cinquenta

- Quanto?

- Quinhentos e sessenta e oito e cinquenta

- Hum!, deixa eu ver

Ricardo, que já estava agitado, ficou em pànico. Ela estava ganhando tempo, arranjando uma desculpa. O que haveria de tão secreto sobre estes quinhentos e sessenta e oito e cinquenta? O que fazer se ela der uma desculpa esfarrapada, ou simplesmente um desvio qualquer? Aceitar, ou investigar a fundo? Por que isto agora, quando tudo ia tão bem?

Foram longos instantes.

- Ah! Lembrei. Foi o curso de inglês dos guris. Lembra que tu achaste melhor pagar logo e aproveitar o desconto? Lembra?

- Ah! Bom.
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui