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Artigos-->O POETA É UM FINGIDOR ? -- 03/10/2000 - 01:29 (João Ferreira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos






O POETA É UM FINGIDOR?





Jan Muá





Um dia, em plena Universidade, uma jornalista me entrevistou para saber minha opinião sobre a Mentira dos Poetas. Quando ela me declarou ao que vinha, eu quis saber dela qual o verdadeiro sentido da pergunta.É que os Poetas mentem- disse-me de imediato... Mentem e temos poetas que reconhecem isso. Fernando Pessoa, por exemplo. Ao ouvir esta pergunta incisiva me mobilizei todo e corri atrás de uma resposta.Procurei organizar minhas idéias em cima dessa temática e ainda hoje me lembro de como me embaracei. Agora, que já meditei muito sobre o assunto, essa pergunta não me atrapalha. Ao contrário, acho que a pergunta que continua a ser feita, deve ser respondida e com objetividade. E então, dirá alguém, os Poetas mentem ou não? Eles fingem? O que é fingir em poesia? Que sentido tem essa expressão? E qual é o âmbito da ficção poética? O que entendemos por ficção poética, por mentira dos Poetas? Vamos tentar dar uma pequena resposta.



1. O texto de Fernando Pessoa



Um dos principais responsáveis por esta questão é Fernando Pessoa no poema "Autopsicografia", texto famoso, publicado na revista "Presença", em 1932, e hoje integrado no texto global das obras poéticas do autor da "Mensagem".

Esse poema é formado por três quadras. Mas é a primeira delas que enuncia o escandaloso conceito e que formula a tese que circula por aí de que os poetas mentem: "O Poeta é um fingidor/Finge tão completamnte/Que chega a fingir que é dor/A dor que deveras sente." A segunda quadra agrava ainda mais o nível de ficção da poesia. Trata de supor que o poeta finge que é dor a dor real e que, sobre as duas dores, o homem pode ainda construir uma dor inteiramente fictícia... Na terceira quadra, há uma dimensão diferente deste fingimento. A relação do coração com a razão.



2. O nível de ficção e de metaforização da poesia



Quando se pergunta se os poetas mentem ou se o poeta é um fingidor, a primeira coisa que devemos pensar, em termos objetivos, é que a literatura é uma realidade construída em cima da palavra. É uma arte combinatória de palavras, para a qual não há regras absolutas. Portanto, todo o edifício literário se constrói a partir da literariedade ou seja, a partir da mímesis, que é uma representação ou um faz-de-conta. Quando o poeta escreve, portanto, sempre ele está criando uma realidade escrita, diferente da realidade cousal e física do mundo dos objetos. Uma realidade construída em cima de signos e de símbolos, diferente da realidade das coisas onde as horas rolam. Há, por isso, um nível de ficção na poesia. Ao se falar de coisas reais, temos de pensar sempre em dois níveis: o nível da existência real e o nívekl da existência ficcional. Um faz de conta, para sermos mais claros. A realidade posta é "como se" fosse...e não que seja realmente...É um produto da mente, com características de metaforização necessárias à modelização literária.



3. O nível de verdade do poeta



Agora, pensemos. Se há um nível de ficção na palavra poética e um alto grau de metaforização num determinado texto; se é esta metaforização que faz o grande nível da palavra literária, é fácil entender que, de alguma maneira, o poeta finge. Fingir é agir a nível de ficção. No faz-de-conta, os suspiros são "como se" fossem suspiros, as saudades são como se fossem saudades, os beijos são "como se" fossem beijos, e o amor é "como se fosse" amor...Ou seja, o poeta trabalha com a representação das palavras. Para entendermos melhor isto, ajuda fazermos uma distinção na expressão poética. Primeiro, notaremos que sempre teremos poesia de raiz pessoal e subjetiva, quando o poeta/autor traduzir nos versos sua própria história pessoal. Neste caso, a poesia torna-se biografia, tradução de sentimentos que partem da verdade real da pessoa, confissões, desejos, lembranças...Tudo são formas de revestir a palavra de significação e de ajustá-la aos reais sentimentos das pessoas.

Mas há outro aspecto, talvez o mais comum, que é o da poesia enquanto expressão poética da realidade plural.- Na poesia, há um sujeito poético, ou seja, um "eu" referencial em torno do qual gira toda a história, a narração. Quando a poesia é retrato pessoal, dirímaos que a expressão procura traduzir e significar no âmbito psicológico o que o autor quer expressar mesmo. No segundo caso, o leitor, o analista e o hermeneuta terão proritariamente de buscar a referência do sujeito lírico para poderem interpretar devidamente o poema. É o segundo caso que deixa o poeta livre para fazer a mímesis, a representação da realidade. Neste caso, há um tom de ficção na poesia, ou o poeta trabalhando a palavra, sem significar tudo, ou significando de uma certa maneira...



4. O leitor de poesia perante a ficção poética



Os leitores se aproximam dos textos por várias razões. Em primeiro lugar, pelo gosto de ler poesia, ou para estudo da linguagem, pelo interesse temático, por razões de estudo. Eles sempre querem ler como se estivessem lendo a alma humana, como se estivessem abrindo o cofre do tesouro...O leitor não quer saber de "ficção" nem do jogo real da palavra. Ele quer sentir o jogo da expressão dentro de uma realidade que ele coisifica, que aproxima de si próprio, dos valores sociais e dos ideais que tem da vida. Os críticos literários entretanto terão de abrir o jogo e mostrar para o leitor esclarecido de que a palavra realmente tem este jogo de dupla representação: o jogo da mensagem pessoal e o jogo da significação distante e impessoal que muitos poetas e escritores procuram transmitir...





Jan Muá

3 de outubro de 2000
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