173 usuários online |
| |
|
Poesias-->ABANDONO -- 12/07/2003 - 15:03 (LUIZ ALBERTO MACHADO) |
|
|
| |
Eu vi o poeta chorar
Numa sala exígua
Um canto remoto da casa
Voluntário eremita
De alados braços inertes
Um goleiro vencido no lance
Eu vi o seu choro
Desolada criança
Sem seu brinquedo preferido
E o seu brinquedo
É olhar nos olhos
E um calor de ternura
Traduzir cumplicidade
É sentir o coração
Falar alto no mais simples gesto
É a alegria por todos compartilhada
(os outros não têm lágrimas
em sua soez atitude)
eu vi o seu choro
lágrimas sem dolo
lágrimas dos afeitos à guerra
em defesa do amor
pois quem ama inventa o que vive
E chorando renegou seu passado
Deixou para trás
Seu esforço prá viver
Um futuro apagado no quadro negro
Os sonhos se derretendo
Com a deprimente solidão
Tangido feito necas para o chão
Em palpos de aranha
Pelo que fez e pelo que poderá fazer
Uma fatia de tempo de não se lembrar
E chorava baixinho
Um punhado de gratidão
O seu suficiente conteúdo mágico
A sua inquieta revelação
Se valendo das lágrimas
Para os que mal saíram do neolítico
Para os que não enxergam um palmo além do nariz
Porque aqui
É o lugar dos ofendidos
Dos ignorados
Eu vi o seu choro
Não encontrando farol na noite
Nem uma mão no dia
Um tinido no escuro
Um estalido no peito
Errou de veia e maldisse a sorte
Sacralizou o profano
E profanou o sagrado
Mera prece a malograr
E o seu mundo secreto é um ermo
Um ermo onde cabem todos seus sonhos
Sonhos de tênue felicidade
Um bônus do sofrer
Eu vi o seu choro
Todo dia sua esperança
De fôlego agitado
Prá nos dizer da vida
Uma canção de chorar.
|
|