Talvez eu pudesse, em algum momento
Rever as dunas do esquecimento
Mas nada há em mim de passado esquecido
Tudo se renova
Todos meus versos e gritos
Ah, que as umidades persistem e a densa névoa
Sucumbe ao sol da lembrança
Açucenas azuis renascem no jardim dos sonhos
A brisa fria corta todas as tardes
Como o olhar do amor
Como as longas mãos a enlaçar o dia
Como pudesse, novamente, tomar a taça cheia da alegria
O mar em ressaca açoita os rochedos
Lanço-lhe, em desafio, a mesma nau
Desfraldo as velas
Vou-me, jogo-me no profundo oceano
Para que não me encontres
Para que tua mão desapareça
Para que o pássaro negro mergulhe
No loop fatal do destino
Não há orgulho em mim, não te enganes
Apenas uma certeza triste
E aquele velho e tosco navio
Se não sucumbo aos teus apelos
Se não me lanço aos teus braços
É porque estou triste
Ah, que há ressaca e névoa
Um poema desesperado de despedida
- pão e vinho sobre a mesa
no ar, o velho solo de sax, almíscar
como nas madrugadas antigas
choraria por ti, nesta noite
choraria por mim
escreveria o mais belo poema de amor
como fosses novamente o meu amado
como fosse o dia terno, róseo de ternuras
como fosse, de novo, um velho tempo
há silêncio em mim, agora
- uma marcha fúnebre do amor
uma maré que vaza, vaza
até descobrir a areia branca, estéril, vazia
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