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cronicas-->Dia 27 de outubro -- 28/10/2002 - 20:35 (Lílian Maial) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
DIA 27 DE OUTUBRO
por Lílian Maial

Cheguei da viagem de férias na véspera, já tarde, mas não poderia perder o dia do segundo turno. Esperei tantos anos por esse momento, jamais o sacrificaria, nem por maravilhosos dias em Salvador.

Dormi tarde, afinal malas e lembranças não se desfazem assim tão depressa, mas com o compromisso de acordar disposta a mais uma atitude cívica.

Pulei da cama confiante, feliz, com um sol risonho a me cumprimentar no quarto, prenúncio de dias melhores. Tudo separadinho, roupinha leve e fresquinha, já que o calor carioca não está para brincadeiras (ainda mais para uma pseudo-baiana recentemente chegada, mais morena que Gabriela).

Chego na bela e antiga escola municipal, em reformas, motivo de confusão e reclamações intermináveis no primeiro turno, aproximadamente no mesmo horário da última vez, cerca de 09:00 horas. Estranhamente as ruas estavam silenciosas, pouco movimento, em nada parecido com o dia 06 de outubro.

O clima era de calma e certeza.
As sábias árvores acenavam a mistura da folhagem nova com a antiga, numa cumplicidade verde-amarela natural.
Os pássaros brincavam ordeiros, para não distrair o eleitor mais desligado.
As calçadas aguardavam os papéis largados, exibindo as fotos sorridentes do candidato predestinado a governar, com bagagem de décadas vivenciando história.
As pessoas caminhavam pacificamente, aos rebanhos, como que em direção a um templo.

Curiosamente o movimento estava bem menor, não havia tumultos, discussões, espíritos esquentados.

Subo as escadas, observando os desenhos, os trabalhinhos das crianças da escola, leve e contente, quando escuto uma voz exaltada, áspera, distoante. Para surpresa, vinha da minha seção eleitoral, que contava com uma pequena fila de 3 pessoas. Era uma mulher baixa, de seus 35 anos, em trajes informais, talvez com roupas de banho por baixo da bermuda e da camiseta, a reclamar e esbravejar contra a votação obrigatória. Vociferava que democracia não podia ser conseguida com obrigatoriedade. Protestava que a senhora (a qual denominou velha) que estava votando naquele momento, já o fazia todo ano e ainda não tinha aprendido a apertar botões. Gritava que ela, a senhora, era eleitora do Lula (com intento pejorativo). A mulher parecia possuída por algo ruim. Sua voz ecoava por todo o segundo andar da escola quase vazia. Estava só. Completamente só. Ninguém a lhe fazer coro. Era o mal voltando para o mal. A mais solitária das criaturas, digna de pena.
Chegou sua vez. Antes, porém, fez questão de dizer que votaria no Nulo. Entrou na sala causando mal estar aos mesários, num desrespeito deplorável.

Não entrei, embora chamada, enquanto a tal figura não saiu da sala. Lamentei sua ignorància social, pólítica e de boas maneiras, mas entendi que a pobre não teve chance talvez de ser diferente. Percebi que é para evitar que toda a nossa população torne-se vazia e sem alvo, que estamos elegando um presidente do povo, um igual à maioria, um que saiba o quanto é difícil viver.
Compreendi que aquela triste pessoa era o retrato do país atual, e justamente o que se quer impedir que ocorra com toda a nação.

Quem sabe aquela mulher infeliz, alienada, apressada para ir à praia, não seja exatamente a cara do nosso país de hoje?

Por isso respirei fundo, deixei passar.
Tudo passa.
Os anos passam, as dores passam, nós passamos.
Só não deve passar a vontade de acertar, de fazer acontecer, de insistir.
Por isso votei.
Por isso acordei hoje com um presidente eleito que me fez chorar em seu discurso de improviso, humilde e tranquilo como ele. Simples em seu linguajar, direto no seu explicar, sincero no seu sentir, líder no seu civismo.
Acordei com uma vontade de cantar o Hino, de usar verde e amarelo, de sorrir para o dia.
Votei junto do país inteiro.
Apertei os mesmos botões que mais de 60% da população.
Guardei meu título com orgulho.

Tomara que aquela mulher tenha tido um belo dia de sol.
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