No calor da paixão
Cidade do interior, ribeirinha, em noite quente, sem brisa, abafada.
Provável prenúncio de chuva, penso, enquanto caminho lentamente pela balaustrada, ao longo do rio que corta a cidade.
É madrugada. Pareço ser a única alma viva a vagar. Não há perigo. É uma cidade pacata, onde todos se conhecem e nada de muito horrível acontece.
Levanto os longos cabelos em rabo-de-cavalo, na tentativa de refrescar a nuca úmida de suor.
A calçada é interrompida pela rampa que leva ao rio, e observando as águas escuras, cintilantes e convidativas sob o luar, sou invadida por uma idéia louca, um desejo enorme de refrescar-me.
Sorrio e olho atentamente para todos os lados.
Ninguém. Não há sinais de vida na redondeza.
Resolvo arriscar.
Desço a rampa languidamente, antecipando o prazer que o banho me dará. Paro às margens do rio, gingando, desço a calça jeans, apertadinha.
Nova olhadela... Nada. Tudo tranqüilo.
Levanto os braços, levando junto a miniblusa branca, de algodão. Rebolando, retiro minha última peça: a tanguinha branca, com rendinha na parte frontal. Chuto o tamanquinho dos pés, lentamente recebo o abraço do rio.
Hum... Que sensação deliciosa! A água, cálida, me acaricia suavemente, aliviando o enfado causado pelo calor.
Mergulho, dou algumas braçadas lentas e sigo boiando, olhando para o céu. Perco a noção das horas. Estava tão gostoso...
Contudo, decido voltar, mesmo a contragosto.
Distraída, não me dei conta do vulto, em pé, ao lado do montinho que fiz com minhas vestes, até tê-lo praticamente à minha frente.
Estanquei, estarrecida.
Nua, corpo cintilando, cabelos escorridos e colados até a cintura, totalmente exposta ao olhar guloso e estupefato que ele me dirigia.
Estávamos ambos paralisados. Instante agoniado em que tentava, desesperadamente, encobrir minha intimidade.
Lentamente ele se aproximou, saindo da penumbra, ficando sob a luz vinda do poste.
Senti-me capturada por seu olhar, que ardia, convidava e induzia...
Ternamente segurou minha mão, virando-a e beijando-lhe a palma, sem sequer piscar. O olhar mergulhado no meu.
Um arrepio de tesão percorreu-me a espinha.
Ergueu meus braços, passando-os sob seus ombros, provocando uma aproximação entre nossos corpos que me tirou o fôlego. Com carinho e firmeza, segurou em minhas ancas, puxando-me ao seu encontro.
Não conseguia pensar em mais nada. Nada mais havia. Somente nós...
Era alto, corpo bem-definido, devia ter uns quarenta anos, deduzi, enquanto ele segurava meu rosto entre as mãos, beijando sensualmente meus lábios carnudos e úmidos. Beijo lascivo, profundo, delicioso.
Desabotoei sua camisa, ao tempo em que passava levemente a ponta da língua em seus mamilos. Senti que ele estremecia. Sorri.
Poderosa e senhora da situação, abri o cinto e baixei sua calça. Minha língua seguia o curso das minhas mãos. Eu o tinha, preso, cativo.
Corpo levemente jogado para trás, mãos apoiadas em minha cabeça, ouvia seus gemidos... ele desvairado com o carinho que lhe fazia.
Deslizamos para o chão. Avidamente percorreu minhas curvas, sondou reentrâncias... Explorou meu corpo como navegante em terras recém-descobertas.
Em pé, desfez-se das roupas, ergueu-me gentilmente, apoiando-me contra a parede.
Eu me sentia liquefeita... Desesperadamente excitada.
Senti que me invadia. Firme, vigoroso. Agarrada ao seu pescoço, dançava no ritmo de suas estocadas. Delicioso vaivém... Tive a impressão de que ia desfalecer, tão grande era o meu prazer.
Beijou-me longamente, lambendo o canto dos meus lábios, sugando-me a língua. E explodimos! Juntos, agarrados, unidos em um grito espantoso de puro prazer.
Permanecemos abraçados um longo tempo, enquanto nos refazíamos. Sem trocar sequer uma palavra, nos vestimos.
Novamente beijou-me as mãos. Olhos úmidos, como que agradecidos.
Voltando à razão, dei-me conta do que acabara de fazer. Pisquei encabulada. Virei-me e corri desabalada para casa.
Nunca mais vi meu estranho amante. Meu desbravador da beira do cais. Penso até que sonhei... que nada disso ocorreu, jamais.
Rose Oliveira
Aracaju
21/01/03
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