A marca de nascença
Achei estranho que o filho de Samuel fosse cheio de manchas pretas daquele jeito. Ele e sua esposa eram loiros, saudáveis, aparentemente sem nenhuma doença; e o menino todo manchado.
Samuel morava num barraco, próximo da minha casa. Sua residência tinha os quesitos normais de uma habitação extremamente pobre. Sujeito honesto, sério e desempregado. Todos nos arredores mantinham uma relação de “pena-admiração”; gostava-mos muito do casal, e sempre que podíamos, ajudávamos de alguma forma. Roupas, comida, cobertores, etc; nunca faltaram aos dois.
Quando Neide, sua esposa, engravidou, o coitado teve um misto de alegria e tristeza. Alegria pelo filho, e tristeza por ser mais um a dividir sua miséria. Logo que soubemos da nova situação, procuramos tranqüiliza-lo: ajudaríamos com a criação do bebê, até a situação melhorar. Estávamos todos nos sentindo como pais da criança.
Mal o rebento despontou no mundo, a casinha foi cercada pela vizinhança, portando todas àquelas miudezas que compõe um enxoval; além de viveres para os primeiros tempos. A criança passou de colo em colo. Alguns comentaram, indelicados, às manchas pretas, principalmente nas pernas. Exames feitos, nada se constatou. Eram manchas de nascença, nada se podia fazer por ora, no futuro uma cirurgia plástica poderia resolver.
Dias depois, saindo da casa, expressei meu espanto à Dona Xica, que no alto de seus setenta anos, resumiu a causa das manchas:
_ É filho. Pobre passa tanto deseja na gravidez, que é milagre o inocente não ter nascido um carvão.
Certíssima!
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