Saudei o meu amigo com a rima
Que fiz p’ra demonstrar-lhe o meu amor,
Mas a tal trova não criou o clima,
Por não ser eu mui hábil ao compor.
Não calibrei direito a minha estima,
Decerto por sentir-me inferior.
Agora, tento a oitava, no capricho,
Que o verso não me saia um outro lixo.
Assusta-me tamanha trabalheira
De quem me apanha os versos da poesia.
É claro que é produto bom p’ra feira:
Não tem tanta elegância ou galhardia.
E isso não se dá porque não queira,
Mas, sim, porque melhor eu não faria,
Pois faltam-me os conceitos superiores,
Aqueles que nos passam os mentores.
Aí, hão de pensar que estou mentindo,
Porquanto eu aprendi que o tema é sério.
Por mais que o verso não se faça lindo,
Provém, sem dúvida, de alguém do etéreo,
Que o tempo que nós temos é infindo,
Depois que se deixou o cemitério.
Assim, se o mestre ensina, o aluno aprende:
Não há que vir dizer que não entende.
Desculpas todos têm, a qualquer hora.
O que quero dizer é que não minto.
Dizem os mestres que tal lei vigora,
Mas, que posso fazer, se inda não sinto?
Se é fácil para uns, p’ra mim demora:
Há muitos furos para um mesmo cinto.
O resultado pode ser formoso,
Mas o fazer não traz um grande gozo.
Aí, vão discutir minha alegria,
Por encerrar o sacrifício d’alma.
Irão dizer que eu não me alegraria,
Se não levasse, no final, a palma.
Não quererão ouvir um “todavia”,
Porque passei um tempo sem ter calma.
— “A inspiração não vem toda, completa:
Se o gajo não sofrer, não é poeta.”
Cantar a melodia é muito bom:
O sentimento dela nos comove.
Mas houve quem gerasse o nobre som.
Se assim não for, eu quero que se prove
Que haja alguém que tenha tanto dom
Que os versos faça, sem tirar os nove.
Ao menos p’ra aprender, sofreu bastante:
É como amar a cada semelhante.
Não sei se o meu recado já foi dado.
A bom leitor, meia palavra basta.
Mas... e se alguém for entender-me errado,
Que a inteligência às vezes mui se arrasta?
Aí, eu recomendo pôr de lado
Toda intenção de ter cultura vasta:
Vai ter de fazer versos como eu,
Lembrando, cá no fim, do Bom Judeu.
Aí, alguém dirá: — “Mas há só um?
Pensava que eram muitos, pela história.”
Eu vou ter de dizer que é bem comum
Falar daquele que alcançou a glória,
Tratando com destaque, pois nenhum
Foi derrotado e teve tal vitória.
Muitos outros merecem ressaltados.;
Mas reclamar de mim... estão errados!
A sutileza não será problema,
Para quem não tiver muita paciência.
A só leitura deste meu poema
Vai exigir do tal clarividência,
Pois, com amor e caridade extrema,
É que Kardec alçou, como ciência,
Alguns comunicados desta esfera.
E olhem que isto fez em outra era!
Coloque em cada linha uma virtude,
Para satisfazer minha poesia.
Talvez nenhum dos versos isso mude,
Pois meu apelo vai p’ra fantasia
De quem requer de mim outra atitude,
Porque versos ruins também faria.
E nisso se resume o sentimento:
É demonstrar quão grande é o meu tormento.
Vou terminar, que o dia foi glorioso:
Sofri, ao fazer versos, p’ra cachorro,
Mas não pretendo ter um outro gozo,
Porque dos trocadilhos sempre corro.
Assim, a melodia e o tema eu coso
E boto na cabeça, como um gorro:
Do lado externo, mui naturalmente,
Pois dentro não há nada nesta mente.
Vamos rezar, que é o mais que se aproveita
Desta trova boçal e pretensiosa.
— “Não posso concordar” — diz quem me aceita —.
“Até que está engraçada, por ser prosa...”
Enquanto o caro médium, com maleita,
Treme a querer que acabe logo a glosa.
No fundo, bem no fundo, até gostei,
Sem dar, contudo, a explicação de lei.
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