Usina de Letras
Usina de Letras
69 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62193 )

Cartas ( 21334)

Contos (13260)

Cordel (10449)

Cronicas (22534)

Discursos (3238)

Ensaios - (10352)

Erótico (13567)

Frases (50599)

Humor (20028)

Infantil (5426)

Infanto Juvenil (4759)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140793)

Redação (3302)

Roteiro de Filme ou Novela (1062)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1960)

Textos Religiosos/Sermões (6185)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Contos-->O locutor de futebol -- 14/01/2003 - 14:17 (Clodoaldo Turcato) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O locutor de futebol

Desiludido por não arranjar vaga no time de futebol, Juvenal resolveu que seria narrador. Foi à rádio e convenceu o diretor que era bom, só precisava de uma chance, etc. Fez teste e agradou. Na verdade ele até que fazia direitinho, narrava com entusiasmo, rapidez, porém com nenhuma isenção. Principalmente nos jogos da equipe da cidade. Numa tarde substituiu um locutor e só faltou bater no juiz com o microfone, tamanho o número de impropérios que desferiu via AM. Causou tamanho constrangimento que foi escalado para jogos interclasses.
_ Você seria nosso melhor locutor, não fosse essa mania de torcer descaradamente pelo América. Em jogos pelo estadual você não vai mais – sentenciou o diretor.
E assim ficou com as demais transmissões esportivas, desde vôlei à bochas, lá estava sua narração vibrante.
Naquele ano o nosso time estava muito bem no campeonato. Tínhamos nos classificados para a semi-final. Bastava mais uma vitória para irmos as finais e conseqüente mente alcançar a primeira divisão mineira. A disputa era com a equipe do Jarí. No Jogo de ida tínhamos empatado em dois a dois. O empate favorecia o arqui rival Jarí, portanto só a vitória interessava.
Toda a cidade esperava pelo dia da consagração. Um marco para nosso município. O Juvenal estava febril. Não falou de outra cosa durante a semana. Em sua loja vendeu todas as camisas do América. Quando divulgou-se que Janjão, o centroavante goleador tinha cismado que não daria tudo, e estaria reclamando dos baixos salários, saiu em defesa do craque, dizendo que a cidade deveria pagar a diferença ao jogador.
_ Sem ele a gente não passa!
No clube foi um tormento. Ligava a cada meia hora para saber como estava a equipe.
_ E o Zózimo? Como é que tá aquela canhota? O Altuir melhorou da gripe? Não faz 4-4-2. Mete o time no ataque.
Ninguém mais agüentava o homem.
Sábado a noite o locutor escalado para o jogo bateu o carro, ficando sem condições de trabalho. O diretor ficou apavorado. Seria a cobertura de sua vida. E os patrocinadores? Essa transmissão tinha que ser a melhor. Tinha outros locutores. Mas igual ao João Alberto só o...Juvenal. Ponderou bastante, mas entre do chinfrim do Cácio Caruaru e o Juvenal... tinha que ser este. Temendo um desastre resolveu arriscar: chamou o homem.
_ Vais fazer o jogo. Mas se contenha.
_ Pode deixar. Eu já to maduro o suficiente.
_ Vê lá, preciso bota pra quebrar. Tem que ser a melhor transmissão desta rádio.
_ Pode deixar chefe!
No domingo o estádio estava pelas goelas. Não cabia mais ninguém. Eu sentei-me ao lado da cabine da Rádio Stampa. Pelo vidro via o Juvenal ao microfone. Mantinha um profissionalismo que me impressionou. Ficou calmo durante todo o primeiro tempo. Zero a zero; jogo duro, pau a pau. Parecia que ia ficar no zero, quando aos quarenta e dois minutos do segundo tempo a grande chance: pênalti a favor do América. Osvaldir invadiu a área e fora derrubado pelo beque do Jarí. Um gol, uma bola na rede seria a passagem para a primeirona. O público todo em pé. O Juvenal não se conteve. A beira de um ataque de nervos mandou pras nuvens a orientação do diretor. Subiu na mesa e com o microfone na mão narrou:
_ Pênalti meu povo! É agora! O América esta a um passo da primeirona. O povo todo em pé no estádio Belga Mineiro. Estamos lá na primeira divisão. Vai pra bola o nosso craque Janjão. Ele...ele que tem habilidade. Ele que veste como ninguém a camisa rubra. Ele que esta com vinte gols no certame. Ele que vale o quanto recebe. Que ama este clube, vai fazer a alegria dessa torcida. Bola na marca da cal. Alguns segundos nos afastam da primeira. O goleiro, o goleirinho no centro do gol. Nosso Janjão, camisa nove nas costas. O jogador incumbido de levar o América para a elite do futebol mineiro. É agora meu povo!
Dentre os torcedores o mais fanático era ele, sem dúvida, embora todos estivéssemos em situação singular. Mas sigamos a narração.
_...Atenção! Tudo pronto para o gol. Tudo pronto para o gol histórico. Tudo pronto para a primeira divisão. São quarenta e três, quase quarenta e quatro agora; segundo tempo. Estaremos na primeira divisão. Povo, meu povo! Minha gente sofredora! Minha torcida querida!Minha Nossa Senhora Aparecida ajuda ao camisa nove do América. Goleador, matador, vinte gols no certame. Ele que esta no coração do meu povo, e no meu também. E lá vai. Bola no lugar. Arqueiro a postos. Oh! Frangueiro, vai passar sim senhor. É gol do América, com certeza.
Como já vimos a transmissão já tinha ido para o espaço. O narrador passara a ser torcedor e nada mais. Sigamos:
_ Atenção! Juiz no local. Janjão aguarda com as mãos na cintura. Vamos lá meu povo. Autoriza o arbitro. Parte Janjão, perna direita, bateu...
Suspense. Foram miléssimos de segundos de uma vida. Aos olhos de todos o filme passava. Pude ver cada volta da bola. Rodando...rodando, abrindo caminho rasteiro pelo gramado. Indo...indo...indo até chocar-se caprichosamente com a trave e resvalando deliciosamente para fora.
_ Filha da puta!
Foi o berro que todo Estádio ouviu pelas ondas da Rádio Stampa.
_ Como é que pode um cara que ganha uma nota preta só pra jogar bola? Um desgraçado que só faz isso? Um homem que tem um gol todo a sua frente? Um perna de pau que joga toda a ambição de uma cidade na trave? Quem deste estádio que for homem me siga. Vou quebrar esse boiola no pau.
E não houve mais transmissão. Juvenal e mais uns vinte malucos com ele pularam o alambrado, fazendo com que Janjão fugisse para o vestiário. A rádio ficou em branco. Só se ouvia o técnico de estúdio :
_ Atenção Juvenal...alo...Por favor entre em contato conosco...Bem senhores ouvintes: estamos com problemas na transmissão. Voltaremos a qualquer momento com a partida entre América e Jarí.
Do estádio não mais falou naquela tarde. Cinco minutos depois iniciava uma programação especial de domingo com Legião Urbana. Juvenal passou a noite na cadeia e no outro dia foi demitido.
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui