Mantenha o capital bem empregado,
Que o Pai há de cobrar, até com juro.
Não deixe esta lição ali, de lado,
Que é cópia do Evangelho, em texto puro.
Às vezes, não se diz nada de agrado
E o gajo a nos voltar: — “Por que é que aturo
Quem vem com tanta bronca contra mim,
Querendo se passar por serafim?!”
Kardec é quem dizia: — “Sede atentos,
Pois haverá quem seja mau profeta.
Não é porque habitais em bons conventos,
Que a vossa idéia seja a mais correta.
Nobilitai quem tem bons sentimentos,
Vindo mostrar de forma inda incompleta,
Mas sem fugir um ponto da Doutrina,
Para terdes o bem da melhor sina.”
Quem é que faz o bem só por fazer,
Querendo do melhor p’ro semelhante?
Por certo, esse indivíduo não vai ler
O que venho dizer, ao meu talante.
É próprio de quem vive ter poder
De desligar a voz do alto-falante
Que passa apregoando o abacaxi,
Como a mais doce fruta por aqui.
É, sim, verdade o que citei acima:
Quando maduro, o fruto é bem gostoso.
Não foi apenas p’ra forçar a rima.;
Foi p’ra pensar que existe sempre o gozo
De cultivar do amigo a nobre estima.
Embora versejar seja charmoso,
É bom pensar também na dura casca,
Que, quando se remove, tira lasca.
Não vou deixar o amigo aí na mão,
Fazendo versos sem qualquer sentido.
Procura tu estrelas pelo chão:
Vais encontrar algumas, pois perdido
Apenas este autor, a dizer “não”,
Depois de haver conselhos produzido,
Que é como no Planeta a mente embaça,
Na dura comoção, que vem e passa.
Não tenho medo de não ter sucesso:
Ainda bem que existe o desafio.
Diga p’ra mim: — “O verso já não meço,
Porque, no etéreo, eu muito mais confio.
P’ra repetir, se não entendo, peço,
Pois, pouco a pouco, a chuva faz um rio.”
Mas quando o sentimento é de impaciência,
Fica difícil de manter freqüência.
Não queiras nunca desmentir o tema,
Porque as palavras são demais de grossas.
Caso duvides, usa o estratagema
De imaginar que as leis do bem endossas,
Para evitar a desventura extrema
De aqui viveres em “gentis” palhoças.
Ajuda, pois, o teu irmão na dor,
Para alcançares muito mais amor.
Caso o conselho chegue nestas tardes,
Depois que a dívida se fez, perversa,
Faze contigo, como quando encardes
A roupa branca, por quedar imersa
Em água suja. Assim, jamais aguardes
Que vais mudar-te ouvindo esta conversa:
Lava de novo e esfrega o ponto certo.;
Põe a corar ao Sol e fica esperto.
Somente agora pude compreender
Que o bom amigo briga pelo verso.
Não é questão de simples entreter:
É que quer ver o dom incontroverso
De quem exerce sobre o som poder,
A divulgar em trovas, no universo,
A angelitude, que transforma a alma
Em cânticos de amor, de paz, de calma.
Não fiques tenso: põe-te mais sereno:
Tudo virá em forma de poesia.
Esta tragédia que, agorinha, enceno
Vai resultar em dobres de alegria,
Caso consigas ver gentil, ameno,
O coração de quem te desafia.
E, se perderes tardes quase inteiras,
Outras terás, inda que tu não queiras.
Serenamente, a trova vai saindo,
Em versos soltos, pela folha afora.
Pela manhã, o dia estava lindo.
O sentimento d’alma ainda melhora,
Para fazer com que se dê por findo
O tema da poesia que demora.
Enquanto o tempo vai correndo, esperto,
O verso vem chegando, bem mais certo.
Quando pensava a trova concluída,
Dei meia volta e fui por outro rumo.
Assim é quase tudo nessa vida:
Esforço de fazer um bom resumo.
Mas, quando sinto a alma arrependida,
É certo, então, que vou perder o prumo.
Aí, cometo o grande e vil ludíbrio
De aqui ditar o verso do equilíbrio.
Eu sinto que perdi tempo demais,
Tentando desfazer minha impostura.
Mas foram os meus versos tão iguais
Que não se justifica esta procura
De dar-lhes atenção ou algo mais,
Para ver se a trova assim se cura.
Apenas reze uma oração por mim,
Nesse arremesso que coroa o fim.
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