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Ensaios-->Liberdade de expressão e o critério duplo no Ocidente -- 11/07/2012 - 12:11 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

 

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LIBERDADE DE EXPRESSÃO E O CRITÉRIO DUPLO NO OCIDENTE:

A VISÃO DE UM MUÇULMANO

Fiquei profundamente ofendido com os acontecimentos descritos em um artigo publicado pelo "Qadhaya Dowaliyah"("International Affairs", uma publicação semanal editada no Paquistão), em 25.09.1995.

Ele fala sobre a reação furiosa de muitos intelectuais alemães ao anúncio da German Book Publishers Association, de que o famoso Book Peace Award, do ano 1995, seria concedido à Professora Annemarie Schimmel. A Dra. Schimmel, uma eminente orientalista, com um enorme cabedal acadêmico e literário, nasceu na Alemanha, em abril de 1922. Começou a estudar o árabe e o persa quando tinha 15 anos e, 20, conseguiu o seu PhD pela Universidade de Berlim, tornando-se professora aos 25 anos. A Dra. Schimmel ensinou em universidades alemãs, turcas e indianas, assim como em Harvard. É uma autoridade mundial em misticismo islâmico e seu livro, "As Dimensões Místicas do Islam", é uma das referências mais importantes sobre o assunto. Ela domina 12 línguas e traduziu muitos poemas orientais para o alemão. É autora de mais de 100 livros, ensaios e artigos, escritos em diferentes línguas. Foi membro da delegação oficial que acompanhou o presidente alemão, na última visita ao Paquistão e à Ásia Central. Após mais de 50 anos de conquistas acadêmicas, a Dra. Schimmel foi escolhida para receber o German Book Peace, de 1995, o qual deverá ser recebido por ela em 15 de outubro. Assim que este fato tornou-se conhecido, muitos intelectuais alemães expressaram sua indignação pela decisão. Centenas de escritores, acadêmicos, editores e proprietários de livrarias assinaram uma petição exigindo que a Associação não concedesse o prêmio à Dra. Schimmel. Além disso, alguns membros do parlamento alemão protestaram vigorosamente, dizendo que a concessão do prêmio era uma "farsa". O presidente alemão, que foi designado para a entrega do prêmio à Dra. Schimmel, está sendo pressionado no sentido de desistir de entregar o prêmio a ela.

"Por que tantas pessoas ficaram iradas com esta senhora, apesar de sua brilhante carreira acadêmica?", eu me perguntei a mim mesmo. Será ela uma criminosa de guerra nazista? Uma neo-nazista? Uma racista? Uma molestadora de crianças ou uma viciada em drogas?

Que crime teria cometido esta professora para causar tal onda de indignação num ís como a Alemanha? Não encontrei uma resposta que fizesse sentido. No entanto, o próprio artigo forneceu a resposta que me incomodou profundamente. O crime da Dra. Schimmel foi o fato de ela ter dito que o livro de Salman Rushdie, "Os Versos Satânicos" , era um insulto aos sentimentos de milhões de muçulmanos. Só isto. Seu erro grave e intolerável foi o de defender o direito de centenas de milhões de muçulmanos de expressarem sua cólera para com as palavras que Salman Rushdie escreveu em seu livro. Os intelectuais alemães, em sua petição contra a Dra. Schimmel, escreveram que ela deu apoio moral aos fundamentalistas muçulmanos com a sua crítica à Rushdie. Além disso, a concessão do prêmio a ela era "um tapa no rosto" daqueles que estão em campanha contra o terrorismo inspirado pela religião.

O fato de a Dra. Chimmel ter expressado sua desaprovação à sentença de morte decretada contra Rushdie não esmoreceu a crítica contra ela. A única notícia boa neste triste episódio é que o presidente alemão está determinado a entregar o prêmio à Dra. Schimmel e discursar em sua homenagem no dia 15 de outubro. Ele descreveu aquelas pessoas como "adeptas da teoria do choque de civilizações", enfatizando, ainda, a necessidade do entendimento e diálogo com a civilização islâmica. Quanto à Dra. Schimmel, quando perguntada "É verdade que a senhora se considera 50% muçulmana?", sua resposta foi "Assim é, pelo menos. Amo a civilização islâmica e sempre tentarei defendê-la, especialmente no mundo de hoje."

Esta história me confundiu por um momento. Será crime defender os sentimentos dos muçulmanos? Será crime que muçulmanos expressem sua cólera a comentáriaos maldosos? Será inaceitável, no mundo de hoje, que um grupo religioso se indigne, quando sua escritura sagrada é descrita como "satânica", e que as esposas de seu amado Profeta sejam definidas como "prostitutas"? Expressar indignação para com livros ofensivos é errado? Uma intelectual excelente deve ser punida por defender o direito de expressão de um grupo que foi insultado? Por que o ocidente insiste em dizer que os muçulmanos estavam errados, quando reajiram colericamente à publicaçção do livro de Rushdie? Por que os países do ocidente não aceitaram as solicitações dos muçulmanos de banirem esse livro?

Algumas pessoas podem alegar que a razão para esta reação do ocidente esteja ligada ao desejo de alguns muçulmanos de acabarem com a vida de Rushdie. No entanto, é bem conhecido o fato de que muitos muçulmanos declararam que matar Rushdie seria errado, primeiro, por uma questão de princípio, e, depois, porque, qualquer tentativa nesse sentido, só lhe daria mais crédito, fama e fortuna que ele, de outro modo, jamais conseguiria. Por outro lado, está bem claro, pelo que aconteceu com a Dra. Schimmel, que os intelectuais ocidentais ainda consideram qualquer pessoa que critique Rushdie culpada, não obstante a desaprovação desta pessoa à decretação da morte do mesmo.

O que é fato é que a esmagadora maioria dos ocidentais justificou a atitude do Ocidente com a famosa frase mágica "Liberdade de Expressão". Se alguém lhes perguntar "Você quer dizer liberdade absoluta de expressão, mesmo que seja ofensiva e maldosa?", eles orgulhosamente afirmarão: "Sim, liberdade incondicional de expressão. Qualquer um é livre para expressar seus pontos de vista, independentemente do que o outro possa achar sobre aquelas opiniões." Se lhes perguntarmos: "Esta teoria é praticada incondicionalmente no Ocidente de hoje?" Muitos não hesitarão em responder afirmativamente. A esta altura, alguém deve dizer "Não é a primeira vez na história que tantos estiveram errados por tanto tempo."

A verdade sobre a questão é que não existe essa coisa de liberdade absoluta de expressão, nem ocidente nem em qualquer lugar. Os céticos poderiam, corretamente, pedir provas dessa afirmação. Aqui vão alguns exemplos, escolhidos ao acaso, enquanto lia jornais, revistas e livros ocidentais nos últimos meses.

Comecemos pela Alemanha. Em 1991, Guenter Deckert, lider do ultra direitista Partido Nacional Democrático, uma conferência onde um orador americano afirmava que as câmaras de gás de Auschwitz jamais tinham existido. Deckert foi processado e condenado por organizar a conferência em desrespeito à lei que proíbe o incitamente ao ódio racial. Em março de 1994, ele tentou de novo. Finalmente, ele recebeu a sentença de 1 ano de prisão . Os juízes do caso foram criticados por outros juízes por causa da pena leve. A Corte Federal de Justiça derrubou aquela sentença e ordenou um novo julgamento. O público se sentiu ultrajado pela série de acontecimentos e a lei respondeu. Em abril de 1994, a corte constitucional alemã declarou que negar do Holocausto não está ao amparo da liberdade de expressão. O Parlamento alemão, para não ficar numa posição inferior, baixou uma lei declarando ser crime, punível com 5 anos de prisão, negar o Holocausto, não importando a opinião do orador.

Uma editora alemã, com sede em Munique, voltou atrás e destruiu uma versão alemã do livro americano intitulado "Olho por Olho", de John Sack (Basic Book, 1993), porque alegava-se que Stalin tinha escolhido deliberadamente os judeus para supervisionarem as atividades da polícia secreta, nos antigos territórios germânicos da Polônia do pós-guerra.

Na Áustria, uma pessoa pode ser presa por negar a existência das câmaras de gás nazistas. Em 1992, o governo modificou os termos da lei, de modo a considerar crime "negar, minimizar, louvar ou justificar, atravésde obras impressas ou de qualquer outro meio, o genocídio ou qualquer outro crime Nacional Socialista."

Na Dinamarca, quando uma mulher escreveu uma carta a um jornal declarando o homosexualismo como "a pior espécie de adultério", ela e o editor, que publicou sua carta, foram alvos de processo.

No Japão, uma revista com circulação de 250.000 exemplares, Marco Polo, publicou, em sua edição de fevereiro de 1995, um artigo que dizia apresentar uma nova verdade histórica e questionava as câmaras de gás nazistas, como historicamente duvidosas. A reação a este artigo foi rápida e severa. Muitas indústrias, como a Volkswagen e a Mitsubishi, cancelaram seus anúncios, em protesto. A editora da Marco Polo voltou atrás, retirou todos os exemplares da edição de fevereiro e anunciou que a equipe da revista estava demitida e a própria revista seria fechada.

Na Austrália, qualquer matéria escrita, que possa ser identificada como incitamento racial, é banida, por um ato legislativo de 1989. O autor da matéria e o editor são passíveis de multas superiores a US$40.000.

Na Inglaterra, ainda existem leis contra a blasfêmia. Os muçulmanos britânicos tentaram fazer uso dessas leis contra Salman Rushdie e descobriram que somente a blasfêmiacontra o cristianismo está regulamentada. Isto quer dizer que uma pessoa é livre para blasfemar contra a religião de seu vizinho, desde que ele não seja cristão. Consequentemente, "Os Versos Satânicos" não foram proscritos. Curiosamente, um filme paquistanês, ridicularizando Rushdie e todo o caso, foi proibido de ser visto na Inglaterra.

Na França, a assembléia nacional francesa, em 1990, baixou novas leis endurecendo as já existentes medidas contra o racismo, "As medidas também proíbem o revisionismo - uma tendência histórica comum entre os ativistas de extrema direita, que consiste no questionamento da verdade do Holocausto judeu na 2a. Guerra Mundial." Muitos intelectuais ficaram pertubados com as palavras "medidas" que "proibem ... questionamento", incluídasna legislação francesa.

Em junho de 1995, na Universidade de Princeton, o Professor Bernard Lewis foi multado em US$2.062, por ter negado que os armênios haviam sido vítimas de genocídio na Turquia otomana, no início deste século. Além disso, Lewis foi obrigado a publicar a sentença no jornal Le Monde, e avisado de que ele se arriscaria a uma ação judicial posterior se repetisse sua afirmação em solo francês. O Professor Lewis não contestou "a terrível tragédia humana da deportação" dos armênios. Mas, ele não considera que tenha sido uma "aniquilação sistemática", e que a maior parte das vítimas morreu de "fome, doença, exaustão ou frio". Por isso que, em uma entrevista publicada no Le Monde, em novembro de 1993, quando lhe perguntaram por que os turcos ainda se recusam a "reconhecer o genocídio dos armênios", respondeu: "Você quer dizer por que eles se recusam a reconhecer a versão armênia para o fato?"

Este comentário levou a uma tempestade de protestos por parte da comunidade armênia em Paris. Trinta professores universitários escreveram uma carta-aberta, acusando Lewis de "trair a verdade e de insultar as vítimas da brutalidade turca." Primeiro, tentaram processar legalmente Lewis, com base na Lei Gayssot, baixada em 1990, que tipifica como ofensa criminosa a negação do Holocausto. Mas, foi mostrado aos armênios que o deputado comunista Gayssot havia restringido sua lei aos casos de negação da veracidade da perseguição nazista aos judeus.

Deve-se notar que Lewis é um historiador, cuja especialidade é a história da Turquia otomana. Ele é reconhecido como uma das maiores autoridades mundiais nessa questão.

Em agosto de 1995, um livro publicado na Suíça, pelo "Comitê Argelino de Ativistas Livres", foi proibido de entrar em território francês porque "sua distribuição é passível de afetar a ordem pública ... o seu tom subliminar é anti-francês", disse o porta-voz do ministro do Interior.

Nos Estados Unidos, o governo não pode fazer muito para proibir discursos ofensivos, por causa da primeira emenda constitucional. Contudo, instituições não governamentais, especialmente a mídia e as universidades, saíram em campo. Na Universidade de Michigan, um estudante disse, numa discussão em sala de aula, que ele considerava o homosexualismo uma doença tratável com terapia. Ele foi convocado para uma audição discliplinar formal, por ter violado a política da escola de proibir discursos que crucifiquem pessoas, tomando por base suas preferências sexuais. O caso gerou um processo na corte federal. Um outro estudante, que denunciou o Dr. Martin Luther King como comunista, foi punido com 30 horas de prestação de serviços na comunidade, pela diretoria da universidade.

A mídia americana tem uma longa história de autocensura. Por exemplo, uma série de filmes, que explicavam por que os muçulmanos estavam ficando mais furiosos com o Ocidente, foram retirados do ar nos Estados Unidos. Os programadores tiveram de enfrentar um poderoso lobby, com ameaça para os anúncios. A série, intitulada "Raízes do Ódio Muçulmano", foi feita pelo Dr. Robert Fisk, que recebeu o prêmio da imprensa britânica como o melhor relato estrangeiro. A razão de tão intenso lobby contra aqueles filmes é que eles consideravam Israel o responsável por muitos ressentimentos muçulmanos contra o Ocidente. Um eminente erudito, como Noam Chomsky, que é chamado pelo New York Times como "inquestionavelmente o mais importante intelectual vivo", jamais apareceu em qualquer rede de TV mais conhecida, porque seus pontos de vista sempre incomodam a elite americana.

No verão de 1995, o Lobby dos Veteranos de Guerra (um dos mais poderosos de Washington) conseguiu retirar, de uma exibição sobre a 2a. Guerra Mundial, todo o material que descrevia as tragédias causadas pelas bombas atômicas americanas lançadas no Japão, em 1945. Muitos historiadores protestaram, considerando que o filme reforçava uma espécie de "história patrioticamente correta", que não tinha nada a ver com a "história real".

Em 1986, o autor George Gilder (cujo livro "Saúde e Pobreza" foi um best-seller mundial em 198l) teve grande dificuldade em encontrar um editor para republicar seu primeiro livro, "Suicídio Sexual", por causa dos protestos feministas que achavam (aliás, como confirmado por uma delas recentemente na ABC) que "as diferenças sexuais não devem sequer ser estudadas".

A Universidade de Oxford rejeitou o livro do Professor John Vincent, "Uma breve Introdução à História", que havia sido muito bem recebido anteriormente. A razão estava em que Vincent não havia sido politicamente correto. Ele havia usado a palavra "homens", ao invés de pessoas, referindo-se aos historiadores como "ele", excluindo, assim, as historiadoras, etc.

O último álbum de Michael Jackson gerou uma onda de protestos, porque algumas das palavras ali usadas, foram interpretadas como racistas por alguns judeus americanos. A acusação de anti-semitismo fez com que Jackson voltasse atrás e retirasse todas as palavras consideradas ofensivas.

No Canadá, a rede de televisão CTV, em seu popular programa matinal "Canada AM", recebeu, em 15.10.94,Josef Lepid, um conhecido comentarista político israelita, que, no ar, pediu "um judeu decente no Canadá" para assassinar Victor Ostrovosky (um antigo oficial da inteligência de Israel e autor de dois livros que expõem as operações secretas do serviço secreto israelita). O incidente recebeu um silêncio manifesto, por parte da mídia canadense. Os mesmos comentaristas que haviam reivindicado o direito de livre expressão para Rushdie, não proferiram uma palavra sequer de apoio ao mesmo direito para Ostrovosky.

Há alguns anos atrás, um historiador britânico estava dando uma série de conferências no Canadá, onde ele negava o Holocausto. Ele foi preso e deportado pelas autoridades canadenses. Também, um professor foi substituído porque ele ensinava a seus estudantes que o Holocausto não tinha acontecido.

Um professor universitário escreveu, no jornal de seu "campus", que uma mulher que fosse violentada por seu parceiro deveria assumir uma parte da responsabilidade pelo estupro, se ela estivesse impropriamente vestida. Seus comentários detonaram um enorme clamor no "campus". Ele foi forçado a uma aposentadoria precoce.

No Ocidente, ao que parece, não falta apenas liberdade de expressão, mas, também, liberdade de pensamento. Pode-se usufruir a hospitalidade das prisões alemãs (por cinco anos completos) por "acreditar-se" que o Holocausto jamais aconteceu. Na França, não é preciso achar que o Holocausto não existiu,basta o simples questionamento, para se ir para a cadeia. Podemos imaginar qual seria a punição se algumas pessoas negassem, completamente, a 2a. Guerra Mundial. Talvez, essas pessoas seriam executadas. Na América do Norte, o fato de não se acreditar na ocorrência do Holocausto pode provocar a perda do emprego. Esta "tolerância" talvez seja devida, em parte, pelo fato de as prisões americanas estarem com excesso de lotação. Questionar as diferenças entre homens e mulheres é tabu, e qualquer ser humano "decente" não deve discuti-las. Aqueles que olham, além dos limites considerados aceitáveis, são acusados de assédio sexual. Discussões sobre homosexualidade e raça são, de igual forma, reprimidas.

O fato pouco sabido é que o controle do pensamento existe no Ocidente. É praticado pelos governos, mídia, universidades e, principalmente, pela multidão politicamente correta. Muitos intelectuais ocidentais reconhecem este fato. Alexis de Tocqueville, por exemplo, descreveu assim a América (na época em que a América era considerada o lugar mais livre do mundo): "Não conheço outro país no qual haja tão pouca independência de pensamento e verdadeira liberdade de discussão, como a América." George Santayana, a respeito do mesmo assunto, disse: "Não há país, no qual as pessoas vivam sob tão esmagadoras compulsões ... Você deve ondular, gritar, seguir com a multidão irresistível, do contrário, você se sentirá como um traidor, um vagabundo desalmado ... Num país onde todos os homens são livres, todo homem acha que o que mais importa já foi arranjado para ele antecipadamente.

Não se deve concluir, no entanto, que as liberdades de expressão e de pensamento não existam no Ocidente. Esta conclusão seria falsa e injusta. Na verdade, hoje em dia, o Ocidente usufrui de mais liberdade de expressão do que em qualquer outro lugar. Não podemos ignorar as liberdades garantidas pelas constituições ocidentais. Não podemos menosprezar os debates e discussões relativamente abertos e livres, que acontecem nos parlamentos e salas de conferências por todo o Ocidente. Não podemos rotular de insignificante o papel da mídia ocidental, ao expor a corrupção dos políticos, como por exemplo, o caso Watergate, trazido a público pelo Washington Post. No entanto, estas liberdades não são ilimitadas e incondicionais. As opiniões que podem irritar grupos poderosos, interesses relevantes ou representam segmentos menos importantes da população, são silenciadas pelos mais diversos meios "não violentos". George Orwell, em seu artigo, "A Liberdade de Imprensa", descreveu eloquentemente a condição da imprensa ocidental: "As idéias impopulares podem ser silenciadas, fatos inconvenientes são mantidos em sigilo, sem a necessidade de qualquer proibição formal ... (A) imprensa é extremamente centralizada, e muitos de seus proprietários são homens ricos, que têm todos os motivos do mundo para serem desonestos em relação a certos assuntos. Mas, a mesma espécie de censura velada também opera nos livros e periódicos, assim como em filmes, peças e rádio. A todo o momento, há uma ortodoxia, um corpo de idéias, que afirma que qualquer cabeça bem pensante aceitará tudo sem questionamentos ... Qualquer um que desafie a ortodoxia dominante acaba se calando, com uma eficácia surpreendente. Uma opinião que esteja fora de moda dificilmente encontra espaço, tanto na imprensa popular como nos eriódicos intelectuais."

Tentemos honestamente direcionar a delicada questão da liberdade de expressão. Deve existir liberdade de expressão? Certamente que sim. Liberdade absoluta de expressão? Certamente que não. E por que? O discurso ofensivo tem consequências desastrosas, afetando os indivíduos e a sociedade, como um todo. Leva à disseminação do ódio, da animosidade e da divisão. Por exemplo, quantos seres humanos aceitariam que alguém acusasse suas respectivas mães de serem prostitutas? Deve a sociedade protejer a liberdade de expressão do acusador ou a liberdade do acusado, em relação ao discurso ofensivo? Se um grupo inteiro é chamado de "negro" por um outro grupo, deve a sociedade proteger a liberdade de expressão do grupo que ofende ou a liberdade de expressão do ofendido? Se não judeus acusam judeus de conspiração para exterminar todas as outras raças, que liberdade deve ser protejida? Se alguns homens definem as mulheres como fonte de todo o mal, que liberdade deve ser protejida? Quando um grupo de mulheres, que um bilhão de muçulmanos reverenciam mais do que as próprias mães, são chamadas gratuitamente de prostituas, por Rushdie, que liberdade deve ser protejida? No geral, as sociedades têm pouco a perder e muito a ganhar na proibição de discursos infamantes. Na verdade, todas as sociedades humanas, em grau maior o menor, praticam a liberdade de expressão. Contudo, nem todas têm sido honestas em admitir o que elas praticam. O Alcorão foi inequívoco ao proibir todas as espécies de discurso difamante:

"Ó fiéis, que nenhum povo zombe do outro; é possível que (os escarnecidos) sejam melhores do que els (os escarnecedores). Que tampouco nenhuma mulher zombe de outra, porque é possível que esta seja melhor do que aquela. Não vos difameis, nem vos motejeis com apelidos mutuamente..."

No entanto, ao limitar a liberdade de expressão, objetivando a paz social e a harmonia, nenhuma sociedade deve ir ao extremo de "condenar ... o questionamento". Esta é a mentalidade dos períodos negros da história, da inquisição, de alguns regimes ditatoriais. O mundo inteiro deve lutar para erradicar todos os traços desta mentalidade, ao invés de reforçá-los através de uma legislação democrática. O questionamento objetivo jamais deve ser proibido, qualquer que seja o motivo. Se algumas pessoas, por qualquer motivo, exploram a liberdade de questionar para incitar diferenças religiosas, sexuais, étnicas ou raciais, então, uma linha deve ser traçada, delimitando os motivos, sem, no entanto, sacrificar as preciosas liberdades de pensamento, questionamento e investigação. A Suprema Corte Canadense recentemente (20 de julho) traçou uma linha semelhante em seu poder decisório, numa lei sobre calúnia: "crítica, sim, mas acusações não fundamentadas, que afetam a reputação dos indivíduos, não."

O Alcorão não apenas garante a liberdade de pensar e questionar, como considera o ato de pensar um sinal de fé. Pensar e refletir são tidos como características da justiça:

"Na criação dos céus e da terra e na alternância do dia e da noite há sinais para os sensatos, que mencionam Deus, estando em pé, sentados ou deitados, e meditam na criação dos céus e da terra ..." (3:190-191)

O Alcorão, em seus inúmeros argumentos com os descrentes, diz que não se deve fazê-los crer, mas fazê-los pensar:

"... Assim Deus vos elucida os Seus versículos, a fim de que mediteis." (2:219)

"... Tais exemplos propomos aos humanos, para que raciocinem." (59:21)

Resumindo, todo o caso Rushdie, e suas consequências posteriores, nunca foi uma mera questão de liberdade de expressão, conforme se depreende de uma simples comparação entre o destino do Professor Lewis, na França e o tratamento que a professora Schimmel recebeu na Alemanha. O apoio que Rushdie recebeu no Ocidente, e a pressão a que foi submetida a Dra. Schimmel na Alemanha, tem muito mais a ver com uma "Islamfobia" ocidental do que com a liberdade de expressão absoluta. A indiferença em relação aos sentimentosdos muçulmanos é devida a uma enorme incompreensão, suspeita e medo dos muçulmanos e do Islam. Se o Ocidente realmente acreditasse e praticasse a liberdade de expressão absoluta, então os muçulmanos estariam errados em pedir a proibição dos Versos Satânicos, uma vez que teria sido uma violação à uma tradição ocidental estabelecida. Mas, o Ocidente nunca praticou esta imaginária liberdade de expressão absoluta e provavelmente jamais o fará. Não é inédito que algumas editoras (por medo de multas ou por receio da reação do público) deixem de publicar um livro. Por outro lado, ao incomodarem os muçulmanos, os editores dos Versos Satânicos entenderam que assim podiam torná-lo um livro mais vendável. Os editores perceberam o simples fato de que os muçulmanos no Ocidente não são poderosos nem respeitáveis, e que, perturbando-os, atrairiam a atenção de muito mais leitores que, de outra maneira, jamais teriam prestado atenção ao livro. Os muçulmanos no Ocidente são o grupo minoritário menos estudado, menos compreendido, menos acreditado e o menos respeitado. De acordo como uma pesquisa de âmbito nacional, realizada pelo Conselho Muçulmano Americano, 67% dos americanos tinham opiniões favoráveis a respeito do catolicismo, 52% do judaismo, 39% do fundamentalismo cristão e somente 23% tinham uma opinião favorável a respeito do Islam. Os muçulmanos no Ocidente, principalmente em alguns países europeus, tais como Alemanha, França e Inglaterra, vivem sob condições que podem ser descritas como de tolerância desdenhosa.

Portanto, minha conclusão é a de que os muçulmanos não deveriam ter reajido da forma como fizeram, com relação aos insultos de Rushdie. Eles precisam, primeiro, saber como criar uma presença poderosa e respeitável para eles mesmos no Ocidente, antes de pedir que tenham consideração por seus sentimentos. Eles devem compreender a lição de que alguma coisa está muito mais profundamente enraizada na tradição ocidental do que a liberdade de expressão, e que é: duplo critério.

 


 

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