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Ensaios-->Reflexos da inserção internacional do Brasil -- 25/01/2012 - 13:52 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Reflexos da inserção internacional do Brasil sobre seu pensamento estratégico de defesa

por *Paulo Roberto Laraburu

O redimensionamento do orçamento de defesa dos Estados Unidos da América (EUA), recentemente anunciado pelo Presidente Obama, confirma a relação existente entre a projeção internacional de um país e as capacidades militares necessárias para apoiá-la – relação que decorre da realidade da dinâmica do poder nas relações internacionais. Além de problemas fiscais, a reavaliação das prioridades da política externa norte-americana influiu sobre a decisão. O rugir do poderio chinês aumenta a importância da região do Pacífico asiático nas formulações estratégicas do Departamento de Estado e do Pentágono, atentos que estão à expansão dos interesses chineses na região. O orçamento, ao longo dos próximos anos, conviverá com cortes que pretendem diminuir a fatia correspondente ao poder militar terrestre e priorizar investimentos relacionados ao poderio aéreo e naval, bases da supremacia militar global do país.

A relação em foco estimula esta breve reflexão sobre a influência da inserção internacional do Brasil sobre o seu pensamento estratégico. Exemplo de que esse tema já atingiu o discurso de defesa está retratado em palavras de ministros da pasta. Nelson Jobim manifestava a necessidade do país possuir capacidades militares para “dizer não quando tiver que dizer não” & 8213; expressão de embasamento realista para traduzir a necessidade de desenvolvimento, a partir de bases tecnológicas autóctones, de capacidades dissuasórias de natureza extra-regional. Celso Amorim, o atual ministro, amplia a força da imagem contida na expressão anterior e afirma que o Brasil também deve ter capacidade de “dizer sim quando tiver que dizer sim” & 8213; idéia que valoriza a ação multilateralista de nossa inserção internacional, que, no campo da defesa, é traduzida pelo atendimento a compromissos no campo da paz e segurança internacionais. Ambas expressões atestam a necessidade de buscar-se a plena prontidão operacional das Forças Armadas, seja para cumprir missões decorrentes de visões de mundo realista ou liberal-institucionalista.

O Brasil já participa da construção da ordem internacional deste novo século, tanto no plano regional como no global. A contribuição à estabilidade política do Haiti e o permanente esforço de diálogo multilateral pela democratização da ordem internacional, com destaque para as áreas do comércio, finanças, meio ambiente e da segurança internacional são exemplos dessa participação. Isso justifica a necessidade de relacionar a inserção internacional do país com seu pensamento de defesa, o qual deve estar ajustado ao novo posicionamento do país na hierarquia de poder mundial & 8213; posição que corresponde a ator que já está dentre as principais economias do mundo e que almeja influir na construção de uma ordem internacional que expresse, também, seus interesses, visões de mundo, crenças e valores.

A questão colocada traz profundas implicações estratégicas, pois envolve considerações políticas a respeito da inserção internacional do Brasil no século XXI. No passado, excetuando-se o período da Segunda Guerra Mundial, implicações decorrentes da projeção internacional do país tinham pouco peso sobre a sua concepção estratégica, pois considerações de ordem regional dominavam os planejamentos militares. Hoje, com maior espaço de manobra, devido à superação dos limites ideológicos impostos pela Guerra Fria, a inserção internacional brasileira é conduzida sob o signo da busca pela autonomia, conceito que traduz a condição de uma política externa livre de constrangimentos impostos pelos mais poderosos. Portanto, a inserção internacional do Brasil, no século XXI, torna a sua equação estratégica mais complexa: aos fatores de ordem regional juntar-se-ão, com crescente grau de atenção, fatores de natureza internacional.

No plano regional, o processo de integração da América do Sul é ação de relevo da estratégia de inserção internacional do país. Essa circunstância praticamente desqualificou as hipóteses de conflito militar originárias da percepção de ameaças de natureza estatal vindas de suas fronteiras e que suscitavam planejamentos de guerra convencional, do tipo clássico. Com efeito, ao Brasil interessa construir um espaço sul-americano em bases políticas, econômicas e sociais mais sólidas. Uma América do Sul próspera, politicamente estável e livre de conflitos é de interesse estratégico das políticas de defesa e exterior brasileiras.

O projeto brasileiro de integração da América do Sul reflete-se em seu discurso de defesa, que passa a ganhar um viés liberal-institucionalista e a enfatizar o fortalecimento de ações cooperativas. Abre, assim, caminho para a possível formação de uma Comunidade Regional de Segurança na América do Sul, arranjo coletivo em que os Estados membros abdicariam de resolver suas diferenças manu militari & 9472; a idéia já está em andamento, por meio do Conselho de Defesa Sul-americano. Um discurso brasileiro de natureza dissuasória não se enquadra no contexto dessa política de integração regional. As diferenças de recursos de poder entre o Brasil e seus vizinhos conferem ao país uma natural capacidade dissuasória, o que lhe possibilita optar por abrir mão da explicitação direta de seu poder e investir em uma agenda de cooperação.

Se a ordem regional permite que o pensamento de defesa brasileiro trabalhe com estratégias de cooperação, a incerteza da ordem global recomenda que se olhe para o sistema internacional a partir da perspectiva neo-realista. Essa perspectiva nos mostra que a emergência de novos poderes provoca algum tipo de tensão no sistema. Estados que dominam o sistema usufruem da hierarquia de poder já estabelecida para a consecução de seus interesses. A projeção internacional do Brasil amplia, naturalmente, a dimensão e o alcance de seus interesses, que podem vir a afetar interesses de terceiros. Com efeito, um eventual conflito de interesses pode redundar em crise, cujo desfecho pacífico e que assegure a afirmação do prestígio internacional do país poderá depender de capacidade militar dissuasória que o país ainda não possui.

Estados não abrem mão de seus interesses vitais. Estes, uma vez ameaçados, colocam em risco o prestígio e a sobrevivência soberana do Estado no sistema internacional. A estabilidade do sistema depende, em grande medida, do grau de harmonia entre os interesses vitais dos mais poderosos. Interesses vitais são aqueles que asseguram a segurança física, energética e econômica dos Estados, o bem estar e a liberdade de suas populações e a continuidade de seus valores, crenças e instituições nacionais. Recursos naturais de caráter estratégico enquadram-se nessa categoria.

O sistema internacional convive com a realidade de que Estados com capacidade de projetar poder militar não impõem limites geográficos à defesa de seus interesses vitais. O subsistema sul-americano não pode se furtar a essa realidade da política de poder, em face de seu imenso potencial de recursos naturais e minerais estratégicos, incluídos aí o petróleo, energia renovável, biodiversidade, água potável e terras agricultáveis. Todos esses recursos representam atrativo estratégico de primeira ordem, principalmente se considerarmos avaliações prospectivas sobre o agravamento da problemática global ambiental e do contínuo aumento da população mundial. A escassez desses recursos ou dificuldades de obtê-los serão fontes de tensão nas relações internacionais do século XXI.

A inserção internacional do Brasil torna o seu pensamento de defesa mais complexo, pois a formulação desse pensamento depara-se com a presença, simultânea, de fatores do subsistema sul-americano e do sistema internacional. Do subsistema sul-americano, o fator processo de integração regional é o de maior relevância, o que permite que a perspectiva liberal-institucionalista domine o discurso de defesa. Isso se reflete na valorização de ações cooperativas, forma de fortalecer o processo em curso. Do sistema internacional, o fator autonomia na política externa leva à adoção de uma perspectiva neo-realista, o que nos faz refletir sobre a urgência de revitalizar os sistemas operacionais de defesa e de criar novas capacidades dissuasórias, não somente para que o país possa “dizer não quando tiver que dizer não”, mas, também, para conferir-lhe maior prestígio no campo da paz e segurança internacionais.

*Paulo Roberto Laraburu é mestrando em Relações Internacionais (UnB) e coordenador de cursos da Escola Superior de Guerra – Brasília.

(paulolaraburu@hotmail.com).

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