Eu ponho confiança nesta pena,
Que amor muito estimula para a rima.
Talvez não saia fácil nem amena,
Pois não se espera faça uma obra-prima,
Mas a verdade é que este bem acena
E minh’alma se alegra e reanima,
Seguindo nas pegadas de Jesus,
Que é quem mais nos conforta e nos seduz.
O entendimento desta “diversão”
Não fica fácil para quem mais sofre.
Os que versejam logo saberão
O manancial que trago no meu cofre.
Aí, hão de dizer: — “Vida de cão,
Amargurar-se assim — por Santo Onofre! —,
E ainda rir de tudo, sem malícia,
Julgando superior essa ‘delícia’.”
Esse é o destino de quem vem ao mundo,
Pois, cá na Terra, o gozo é de rigor:
Está na pele e mais lá bem no fundo,
Pois cabe à mente a sorte aqui compor.
Mas quem pensar na vida, um só segundo,
Vai ver que existe mais, seja onde for
Que der seqüência a tudo o que hoje faça,
Como é seqüência a vida que ora passa.
Discernimento, irmão, é o que requer
A trova que lhe passo nesta hora.
Se tudo o que lhe vem vem de colher,
É para que prossiga, sem demora,
A dar aos outros tudo o que puder,
Por lei universal que aqui vigora,
Que o sofrimento esconde a melhor rima,
Segundo este padrão que reanima.
Se eu preveni, é certo, para o crime,
Também devo mostrar uma saída,
Que existe sempre algo que redime
Quem não tiver ligado para a vida,
Mas não se espere ser muito sublime
A aceitação da alma arrependida:
O etéreo só faz festa para o velho
Que leu, cumpriu e amou seu Evangelho.
Aqui chegando, com seu rabo preso,
Pela malícia que empregou na Terra,
O gajo tem de despertar o vezo,
Para aplicar na idéia em que mais erra,
Porque seu protetor mantém aceso
Claro farol que a escuridão descerra,
Sabendo ler nas páginas da mente
E interpretar o coração da gente.
Não te parece certo o que te digo,
Sem compromisso algum da minha parte?
Que tal seguir um pouco mais comigo,
Sem te lembrares de acusar a arte,
Correndo, embora, o risco do castigo
Desta atitude de quem quer provar-te
Que faço versos só para dizer
Como sou lúcido no meu dever?
Caso te atires, denodado, à obra,
Não penses nunca em abafar as dores.
Alguma vez, este trabalho dobra
E não promete mais que dissabores,
Mas tudo aquilo que o dever nos cobra
Irá pagar, um dia, com amores.
Até Jesus se viu posto de lado,
Porém, no etéreo, foi glorificado.
Não perca tempo p’ra fazer o bem,
Mesmo que seja apenas de intenção,
Pois, muitas vezes, nada a gente tem,
E, nesse caso, basta uma oração,
Pois, lá no inferno, não está ninguém
A preencher a triste condição,
Quando se segue de Kardec o ensino
E, com amor, se entoa ao Pai um hino.
Não te aborreças, se estiveres mal:
A consciência, um dia, se desperta.
Esta é uma lei de cunho universal:
Quem é perfeito é que sempre acerta,
Sem exigir de um trôpego mortal
Uma outra coisa que uma mente aberta,
P’ra perceber do Pai o amor eterno,
Enquanto luta p’ra escapar do inferno.
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