Usina de Letras
Usina de Letras
215 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62152 )

Cartas ( 21334)

Contos (13260)

Cordel (10448)

Cronicas (22529)

Discursos (3238)

Ensaios - (10339)

Erótico (13567)

Frases (50554)

Humor (20023)

Infantil (5418)

Infanto Juvenil (4750)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140788)

Redação (3301)

Roteiro de Filme ou Novela (1062)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1958)

Textos Religiosos/Sermões (6177)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Ensaios-->A POESIA DE ALBERTO CAEIRO -- 27/08/2011 - 13:06 (João Ferreira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

A POESIA DE ALBERTO CAEIRO
João Ferreira
Brasília -Curso de Letras-UniCeub -2004

"Criei em mim várias personalidades. Crio personalidades constantemente. Cada sonho meu é imediatamente, logo ao aparecer sonhado, encarnado numa outra pessoa, que passa a sonhá-lo, e eu não."
"Só uma grande intuição pode ser bússola nos descampados da alma; só com um sentido que usa da inteligência, mas se não assemelha a ela, embora nisto com ela se funda, se pode distinguir estas figuras de sonho na sua realidade de uma a outra." - Fernando Pessoa

QUEM É ALBERTO CAEIRO

1. “Segundo Álvaro de Campos, Caeiro é mais do que pagão: é o próprio paganismo. É o único que nunca se desdobra, que se mantém uno, conseguindo assim realizar o preceito [...] para eliminar o eterno outro e manter-se isolado, sereno e forte. Por isso é o mestre. Cirurgião lhe chamaram também os seus discípulos, porque os quer operar a todos do apêndice da alma – para serem como os deuses, apenas corpo, tendo a divindade na própria carne divina. Por isso a receita é tão simples: Não pensar, porque pensar é estar doente dos olhos; ver, apenas ver.
Caeiro ocupa o mais alto grau da despersonalização, o que está mais perto da inocência cósmica. Por isso representa para os seus discípulos uma infância e uma libertação. Também lhe chamaram bálsamo. Pretende ser, como a Ceifeira[...] uma presença der serena alegria,de alegre inconsciência. Elevar o seu hino à vida, cumprir-se como um pássaro canta, sem razão(Canta, canta sem razão...). Basta existir para ser completo, afirma Caeiro. Possui, como a Ceifeira, o maior dom: a alegria. Todos os discípulos são tristes. Por isso eles lhe chamaram bálsamo – esse bálsamo que o canto da Ceifeira derrama no coração do Poeta: Derrama no meu coração/ A tua incerta voz ondeando...
Caeiro foi criado para encarnar a saúde do mais perfeito dos animais, a ingenuidade dos meninos e o regaço imenso da Mãe Terra, preservadora da vida em vários mitods contrav as humanas iras dos deuses machos seus esposos. Tem essa argumentação infantil e feminina que Campos lhe atribui, porque não raciocina para procurar aquilo que a mente nunca logrará atingir. E tem essa capacidade feminina de er simultaneamente abissal e fecunda, solar e alegre.
Caeiro vive no alto dum monte e apascenta, metaforicamente, sensações. É um caminho a subir, no sentido inverso dessa atração do poço de negro lume em que Pessoa (em seu próprio nome) confessa afundar-se para Deus. Caeiro representa uma chamada à superfície do claro dia exterior.
"Quando é que eu serei da tua cor
Do teu plácido e axzul encanto
Ó claro dia exterior"-anseia Pessoa num poema.
Caeiro é dessa cor e desse encanto.É o único a quem seu Criador[...] atribui cor aos olhos: azuis, precisamente.”
(LOPES, Teresa Rita. “Alberto Caeiro”.In: Fernando Pessoa. São Paulo: Global, 1996, pp.21-22.
2. “Fernando Pessoa parece ter uma extrema admiração por este heterônimo. Caeiro teve pouca educação, apenas instrução primária. Por isso “escreve mal o português”. Mas é exatamente este homem e origem humilde, sem formação superior e que vivia de pequenos rendimentos, que se tornou o líder do grupo, o Mestre de todos, o influenciador literário daquela pequena plêiade de Poetas. Fernando Pessoa, em um terxto intitulado “Prefácio às Ficções do Interlúdio”, datado provavelmente de 1916, refere-se a este heterônimo com palavras entusiásticas comparando-o ao fiogo que consome as escórias e liberta os homens. Eis suas palavras: “Uns agem sobre os homens como o fogo, que queima neles todo o acidental e os deixa nus e reauis, próprios e verídicos, esses são os libertadores. Caeiro é dessa raça. Caeiro é dessa raça. Caeiro teve essa força. Que impoirta que Caeiro seja de mim se assim é Caeiro? Assim, operando sobre mim mesmo,me livrou de sombras e farrapos, meu deu mais inspiração à inspiração e mais alma à alma. Depois disto, assim prodigiosamente, quem perguntará se Caeiro existiu?”.
Bastaria este testemunho de Pessoa para nos dar toda a dimensão e toda a influência exercida por Caeiro naquela pequena comunidade de Poetas.
[...] Álvaro de Campos fala de seu paganismo e descobre nele uma semelhança ideológica com os gregos. “Isso torna-se evidente logo depois, com o diálogo sobre a flor amarela. Nesse diálogo Caeiro expõe, como se fosse sua, a filosofia de Heráclito sobre o fluir das coisas, sobre a impermanência da realidade e a doutrina dos contrários”(ib. 177).
Porém quem mais escreveu sobre Caeiro, por tê-lo conhecido melhor, foi Ricardo Reis. Foi ele que mais chamou a atenção da crítica para a direção tomada pela poesia de Caeiro que era da objetividade completa: “Caeiro –diz Ricardo Reis – no seu objetivo total, ou antes na sua tendência constante para um objetivismo total, é frequentemente mais grego que os próprios gregos”. “Cheia de pensamento, ela [a poesia de Caeiro] livra-nos de toda a dor de pensar. Cheia de emoção, ela liberta-nos do peso inútil do sentir. Cheia de vida, ela põe-nos à parte do peso irremediável da vida que é forçoso que vivamos”.
PIRES FILHO,Ormindo. “Caeiro: Paganismo em Prosa e Verso”.In: Estudos Portugueses. Recife, n. 5 (jan-dez 1995), pp.171-186.

O MISTÉRIO DAS COISAS

O mistério das coisas, onde está ele?
Onde está ele que não aparece
Pelo menos a mostrar-nos que é mistério?
Que sabe o rio disso e que sabe a árvore?
E eu, que não sou mais do que eles, que sei disso?
Sempre que olho para as coisas e penso no que os homens pensam delas,
Rio como um regato que soa fresco numa pedra.
Porque o único sentido oculto das coisas
É elas não terem sentido oculto nenhum.

(Alberto Caeiro.O Guardador de Rebanhos. Poema XXXIX)

PRODUÇÃO POÉTICA DE ALBERTO CAEIRO

1.O Guardador de rebanhos
2.O Pastor amoroso
3.Poemas Inconjuntos


ANTOLOGIA POÉTICA DE ALBERTO CAEIRO


O MEU OLHAR (Poema II de “O Guardador de Rebanhos”)

O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de, vez em quando olhando para trás...
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem...
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo...

Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender ...
O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...
Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar ...
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência não pensar...



PENSAR EM DEUS
(Poema VI de “O Guardador de Rebanhos”)



Pensar em Deus é desobedecer a Deus,
Porque Deus quis que o não conhecêssemos,
Por isso se nos não mostrou...
Sejamos simples e calmos,
Como os regatos e as árvores,
E Deus amar-nos-á fazendo de nós
Belos como as árvores e os regatos,
E dar-nos-á verdor na sua primavera,
E um rio aonde ir ter quando acabemos!...
Alberto Caeiro, em "O Guardador
de Rebanhos".

DA MINHA ALDEIA
(Poema VII de “O Guardador de Rebanhos”

Da minha aldeia vejo quando da terra se pode ver no Universo....
Por isso a minha aldeia é grande como outra qualquer
Porque eu sou do tamanho do que vejo
E não do tamanho da minha altura...
Nas cidades a vida é mais pequena
Que aqui na minha casa no cimo deste outeiro.
Na cidade as grandes casas fecham a vista a chave,
Escondem o horizonte, empurram nosso olhar para longe de todo o céu,
Tornam-nos pequenos porque nos tiram o que os nossos olhos nos podem dar,
E tornam-nos pobres porque a única riqueza é ver.
Alberto Caeiro, em "O Guardador de Rebanhos".

HÁ METAFÍSICA BASTANTE EM NÃO POENSAR EM NADA
(Poema V de “O Guardador de Rebanhos”)

Há metafísica bastante em não pensar em nada.
O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.
Que idéia tenho eu das cousas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?
Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).
O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o sol
E a pensar muitas cousas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.
A luz do sol não sabe o que faz
E por isso não erra e é comum e boa.
Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores?
A de serem verdes e copadas e de terem ramos
E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar,
A nós, que não sabemos dar por elas.
Mas que melhor metafísica que a delas,
Que é a de não saber para que vivem
Nem saber que o não sabem?
"Constituição íntima das cousas"...
"Sentido íntimo do Universo"...
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.
É incrível que se possa pensar em cousas dessas.
É como pensar em razões e fins
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores
Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão.
Pensar no sentido íntimo das cousas
É acrescentado, como pensar na saúde
Ou levar um copo à água das fontes.
O único sentido íntimo das cousas
É elas não terem sentido íntimo nenhum.
Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!
(Isto é talvez ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as cousas,
Não compreende quem fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)
Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
Uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.
Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.
E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?).
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
Penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora.

QUANDO EU NÃO TE TINHA
(De “Pastor Amoroso”)

Quando eu não te tinha
Amava a Natureza como um monge calmo a Cristo.
Agora amo a Natureza
Como um monge calmo à Virgem Maria,
Religiosamente, a meu modo, como dantes,
Mas de outra maneira mais comovida e próxima ...
Vejo melhor os rios quando vou contigo
Pelos campos até à beira dos rios;
Sentado a teu lado reparando nas nuvens
Reparo nelas melhor —
Tu não me tiraste a Natureza ...
Tu mudaste a Natureza ...
Trouxeste-me a Natureza para o pé de mim,
Por tu existires vejo-a melhor, mas a mesma,
Por tu me amares, amo-a do mesmo modo, mas mais,
Por tu me escolheres para te ter e te amar,
Os meus olhos fitaram-na mais demoradamente
Sobre todas as cousas.
Não me arrependo do que fui outrora
Porque ainda o sou.

Atividades e exercícios de leitura crítica e rememoração para o leitor

1.Descreva Alberto Caeiro como um heterônimo de Fernando Pessoa.
2.Descreva seu perfil literário com base nas palavras do próprio Fernando Pessoa, Álvaro de Campos e Ricardo Reis.
3.Nomeie os títulos de sua produção literária
4.Porque se chama a poesia de Alberto Caeiro uma poesia pagã e naturalista
5.Mostre alguns sinais do objetivismo da poesia de Alberto Caeiro
6.Como explica e em que sentido Alberto Caeiro fala que “pensar é estar doente dos olhos”
7.Descreva a posição de Alberto Caeiro frente à metafísica

João Ferreira
Brasília - Curso de Letras - UniCEUB 2004
 

Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Perfil do AutorSeguidores: 73Exibido 1660 vezesFale com o autor